POR ET BARTHES
sábado, 20 de setembro de 2014
sexta-feira, 19 de setembro de 2014
Marinando
POR CHARLES HENRIQUE VOOS
Quando um candidato ganha notoriedade, sua vida é revirada por partidos, imprensa e população. Foi isto que aconteceu com a socialista. Sua atuação como Ministra foi posta em xeque juntamente com suas relações com os banqueiros e mega empresários do país. O vice escolhido, Beto Albuquerque, tem estreitas ligações com o agronegócio e contraria tudo aquilo que Marina fala. Contrariedade, digamos, é a marca registrada dela: o escândalo sobre as políticas LGBT no plano de governo fala por si só.
Em um trocadilho tosco, sempre pensei que as intenções de voto para Marina estavam "marinando" em torno do que aconteceu com o jatinho lá em Santos. E a tendência, após as semanas passarem, seria a acomodação para perto do cenário "normal", com Aécio e Marina se aproximando, e Dilma mantendo a ponta, principalmente pela força da máquina estatal e as alianças que ela possibilita. As últimas pesquisas mostram isto. Até a tão badalada vantagem de Marina no segundo turno vem diminuindo.
Quanto aos demais candidatos, outro cenário de acomodação em direção ao natural: Pastor Everaldo desce de seu posto de surpresa, e dá lugar para candidatos com propostas mais densas, como Luciana Genro e Eduardo Jorge. E o resto vira meme na internet ou é motivo de piada.
No segundo turno o jogo é outro, claro, mas a comoção acabou e a fidelidade em torno de Marina está chegando ao fim. É consenso que candidato que sobe rápido demais nas pesquisas e na hora errada, não leva. É esperar para ver.
quinta-feira, 18 de setembro de 2014
Feios, pobres e temidos

POR CLÓVIS GRUNER
Na semana passada a Associação Comercial e Industrial de
Ponta Grossa (ACIPG) foi notícia nacional. Mas não por causa da pujança
econômica dos campos gerais paranaenses: a entidade, que reúne parte da elite pontagrossense,
publicou uma cartilha de orientação aos candidatos da região onde defende,
literal e textualmente, a “suspensão do direito ao voto para beneficiados de qualquer programa de transferência direta de renda, nas esferas municipal, estadual ou federal”. O presidente da associação, Nilton Fiori, defendeu a iniciativa apelando
a uma pretendida “lisura” nas eleições. Ecoando uma ideia distorcida, que
circula principalmente pelas redes sociais, o empresário teme que programas de
distribuição de renda acabem por favorecer principalmente os candidatos
governistas, que teriam assegurado o voto dos beneficiados.
É claro que, apesar da menção às “esferas municipal,
estadual ou federal”, a proposta da ACIPG mira, principalmente, o Bolsa Família
e seus milhões de beneficiários que, a depender dos empresários e, parece,
também de alguns candidatos locais, dispostos a bancar a sugestão da entidade de
classe, teriam suspensos parte de seus direitos políticos. A proposta
reverberou no Twitter e no Facebook do deputado estadual carioca Carlos
Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro, que a repercutiu em suas redes sociais. Mas, não satisfeito, ele decidiu expandir a ideia original, acrescentando a ela um adendo.
Em um tweet, o deputado defendeu condicionar a inclusão no
programa “às cirurgias de laqueadura e vasectomia”; em sua página no Facebook,
livre das amarras dos 140 toques, ele explicou melhor: “Defendo a liberdade de escolha, normatizando, orientando e
condicionando o recebimento de bolsa-família à realização de cirurgias de
laqueadura e vasectomia”. E arremata: “em certo tempo estancaríamos a ferida
econômica aberta no Brasil e ainda estaríamos ajudando à curar a fome, a
miséria e a violência no país.” A uma seguidora que defende também a
criação de uma “lei do filho único” ele replica: “A diferença é que com nossa proposta a
cirurgia é uma escolha do cidadão, respeitando assim a sua liberdade individual!”.
Não, você não leu errado: segundo Bolsonaro, apesar do Estado normatizar,
orientar e condicionar o recebimento de um benefício à esterilização dos
futuros beneficiados, tudo será feito em “defesa da liberdade de escolha” e da “liberdade
individual”. Mais que um contrassenso, um horror.
GUERRA CONTRA
OS FRACOS – Já não me surpreende, mas continua a incomodar, a maneira como
as tímidas políticas de inclusão social vem sendo tratadas por muita gente. Normalmente fruto
da desinformação e do preconceito, tem proliferado com assustadora rapidez um
discurso que insiste em condenar parcelas da população a uma espécie de
sub-cidadania, justamente quando há um esforço republicano por arrancá-las de
lá. Mas ainda não tinha lido nada parecido com a proposta de Carlos Bolsnaro, nem tão preocupante. Mas a “guerra contra os fracos” não é um fenômeno novo. E tem um
nome: eugenia.
Impulsionadas pelas teses naturalistas surgidas ainda nas
primeiras décadas do século XIX, as teorias eugênicas se desenvolvem ao longo da
segunda metade do oitocentos. Em seu cerne, a concepção da evolução humana como
resultado imediato de leis biológicas e naturais que determinam o comportamento
humano. As raças se constituiriam como o fenômeno final e resultado irredutível
do processo evolutivo, no interior do qual se configuraram e cristalizaram as
desigualdades. Esta naturalização das diferenças legitimou um conjunto de
proposições com desdobramentos políticos bastante significativos: se as desigualdades
são racialmente determinadas e estruturadas na natureza das populações, é
possível asseverar a superioridade de uma raça sobre outras, mesmo a um nível
mais cotidiano, afirmando a continuidade entre os caracteres racialmente
determinados e a conduta moral dos indivíduos, por exemplo.
Amplamente aceita pela comunidade
científica, a eugenia orientou igualmente ações políticas e governamentais já
nas primeiras décadas do século XX. Nos Estados Unidos, por exemplo, estima-se
que pelo menos 70 mil americanos foram esterilizados compulsoriamente, a
maioria mulheres. A política de esterilização em massa seduziu também cientistas
e políticos brasileiros. Uma das principais bandeiras da Sociedade Brasileira
de Eugenia, criada pelo médico paulista Renato Kehl, era a revisão do
Código Civil, no sentido de autorizar o Estado a proibir o casamento entre
indivíduos que apresentassem o risco da geração de filhos que pudessem apresentar
alguma tendência à degenerescência, exigindo como garantia de uma “boa prole” a esterilização do casal.
Mas ninguém levou a eugenia tão longe quanto a Alemanha
nazista. Os esforços americanos chamaram a atenção de Hitler, que tratou de
aprimorar as tecnologias de eliminação dos indesejados, elevando-as a
parâmetros industriais. E não é demais lembrar que, antes da guerra e dos
campos de concentração, os nazistas a
praticaram com a aprovação invejosa dos americanos. Superintendente de um
hospital na Virgínia, o Western State Hospital, Joseph DeJarnette declarou, em
1934, que “Hitler está nos vencendo em nosso próprio jogo”. Os anos
seguintes mostrariam os resultados trágicos e bárbaros deste placar.
DO BIOLÓGICO AO
SOCIAL – Não faltarão comentaristas, provavelmente anônimos, a me acusar de “exagero”
no trato da questão. Pouco importa o que pensam, principalmente se o que pensam
justamente legitima esse rebaixamento dos já subalternos a uma subalternidade
ainda mais aterradora. A ausência do componente biológico, fundamental às doutrinas de pouco mais de um século atrás, não ameniza o
conteúdo dos discursos da ACIPG e de Carlos Bolsonaro. Ambos direcionam
seu arsenal exatamente para os mesmos grupos e indivíduos que estavam na mira das
políticas eugenistas de há um século: pobres e despossuídos sejam de recursos
econômicos ou políticos.
E como ontem,
encontram um ambiente e interlocutores dispostos a respaldar e legitimar o ressentimento e o ódio, sentimentos que estruturam suas propostas, como os principais afetos políticos. Homens e
mulheres que assistiram, em uma conivência silenciosa, a ofensiva das forças
conservadoras e fascistas, o fizeram em parte movidos por um medo e um temor
diuturnamente tecidos e alimentados justamente pelas forças conservadoras e
fascistas que tinham todo o interesse em produzi-los e alimentá-los: fundamentalmente,
o medo e o temor do outro em suas múltiplas mas sempre estranhas e
desconhecidas facetas. No passado, apenas depois de testemunhar o horror muitos perceberam as implicações do monstro que ajudaram a nutrir. Hoje, a serpente continua a chocar seus ovos. Me pergunto até onde continuaremos a alimentá-la, coniventes e, graças principalmente às redes sociais, já nem tão silenciosos.
quarta-feira, 17 de setembro de 2014
Alguma coisa acontece entre a Beira-rio e a São João
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Meme em resposta à campanha anti-pixo |
POR FELIPE SILVEIRA
Dois acontecimentos me chamaram a atenção nesta semana. O primeiro é a terrível campanha anti-pixação da prefeitura de Joinville. O segundo é o terrível ataque da pm paulista aos sem-teto da Ocupação São João. Vamos falar sobre eles...
Deve estar em algum lugar do diário oficial o valor gasto com produção e veiculação da campanha anti-pixo. O vídeo custa caro e o custo de divulgação em outdoor, rádio, TV e jornal custa uma fortuna, vocês sabem. E, apesar de não ser contra a propaganda institucional, me espanta que as prioridades sejam estas. Tanta coisa para trabalhar a conscientização da população e a gente se depara com essas coisas.
Tenho pra mim que a motivação da guarda dohleriana não está no tipo tradicional que também é atacado de tempos em tempos. Acredito que as claras mensagens políticas (o pixo tradicional, estilizado, também é político, mas aqui falo de outro), sobretudo feministas, que surgiram nas paredes e muros da região central nos últimos meses tenham causado tão onerosa reação.
No governo de Dohler, não importa se a cidade está às escuras, esburacada, com obras paradas, plano municipal de cultura desrespeitado... O que importa é que em nenhuma parede esteja escrito que “outro mundo é possível”.
Nada disso surpreende. Udo Döhler fala e trabalha para satisfazer um grupo de cidadãos muito específico, que deve ter vibrado ao dar de cara com a campanha no seu jornal favorito.
É um tipo que também deve vibrar com as cenas vistas na capital paulista nessa quarta. Fico me perguntando se tem algo que dá mais prazer a certas pessoas do que ver sem-tetos serem despejados. Duvido.
Para quem não sabe, a polícia cumpriu, com muito gás lacrimogênio, uma reintegração de posse na capital paulista. Cerca de 200 famílias ocupavam o prédio há seis meses, sendo que este estava abandonado há dez anos. Não é curioso que ninguém tenha se incomodado com o prédio vazio nos nove anos e meio anteriores?
Não é curioso que as pessoas não se incomodem com as casas e terrenos vazios que descumprem a constitucional função social da propriedade? Que não se incomodem com a invasão quando ela é feita pelos ricos? Que não se incomodem com a especulação, com o rentismo, com o abuso de autoridade, com o preconceito, com a cidade às escuras, com a falta de água?
Não! A gente gosta de ver família sem teto, criança chorando por causa de gás lacrimogênio, gay assassinado e campanha contra o pixo, pois o pixo, ah, o pixo já é vandalismo!
terça-feira, 16 de setembro de 2014
Os dois maiores marxistas do mundo
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Karl e Groucho Marx |
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Um deles é marxista e tende para o marxismo. O outro é um marxista que tende para a anarquia (não confundir com anarquismo). Os dois viveram em tempos diferentes e já foram desta para... para lugar incerto. Acontece que um era ateu e não acreditava nesse papo de vida após a morte. O outro não levava essa coisa de morrer muito a sério. Mas vamos ficcionar* um encontro entre dois dos maiores marxistas da humanidade: Karl Marx e Groucho Marx numa mesa de bar.
Karl Marx – Senta aí, Groucho. Vamos conversar...
Groucho Marx – Antes de começar a falar, tenho algo importante a dizer...
Karl – Com calma, temos tempo. Queres beber alguma coisa? Comer um bife? Ou és vegetariano?
Groucho – Não sou vegetariano, mas como animais que são. Posso comer e beber, mas não pago. Pagar a conta é um costume absurdo.
Marx – Dinheiro, sempre o dinheiro, Groucho. A propriedade privada tornou-nos tão estúpidos e limitados que um objeto só é nosso quando o possuímos.
Groucho – É por isso que morreste pobre. Aliás, sabes que o segredo do sucesso é a honestidade. Se conseguires evitá-la, não tem erro...
Karl – O dinheiro é a essência alienada do trabalho e da existência do homem.
Groucho – Tens razão, Karl. Há muitas coisas na vida mais importantes que o dinheiro. Mas custam tanto.
Karl – O dinheiro não é tudo. E, cá para nós, o declínio da sociedade burguesa é inevitável. Por que não te juntas aos comunistas?
Groucho – Nem pensar. Não entro para clubes que me aceitam como sócio.
Karl – Sabes que o capitalismo gera o seu próprio coveiro.
Groucho – Não fales em coveiros. Eu pretendo viver para sempre... ou morrer tentando.
Karl – Tenta entender. O comunismo não é para nós um estado que deve ser estabelecido, um ideal para o qual a realidade terá de se dirigir...
Groucho – Não concordo. E estes são os meus princípios. Mas se não gostas deles, eu tenho outros.
Karl – Te liga, Groucho. Podes crer... a revolução é o motor da história.
Groucho – Claro. Todo mundo precisa crer em algo. Portanto, creio que vou tomar uma cerveja.
Karl – És duro na queda. A tua falta de fé é muito sólida. Mas lembra: tudo o que é sólido desmancha no ar.
Groucho – Então vamos beber aquela cervejinha, que é líquida. E fazer um brinde às nossas esposas e namoradas: que elas nunca se encontrem.
Marx – Não brinca com isso. Sabes que o meu casamento com a Jenny sempre esteve acima dessas coisas.
Groucho – Sim. O casamento é uma bela instituição. Naturalmente, se você gostar de viver numa instituição. Aliás, fui casado por um juiz... eu deveria ter pedido um júri.
Karl – Ora, Groucho, isso é como tantas outras coisas. Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha...
Groucho – Diz aí, Karl, tu vivias metido em política, viveste muito tempo fora de casa, no exílio e até na cadeia... e tiveste seis filhos? Ah... e ainda tiveste tempo para engravidar a empregada? Imagina se trabalhasses em casa...
Karl – Eu nego essa coisa da empregada.
Groucho – Também corri atrás de uma garota por dois anos, apenas para descobrir que os seus gostos eram exatamente como os meus: nós dois éramos loucos por garotas. Mas sou solidário contigo.
Karl – É... mas o caminho do inferno está pavimentado de boas intenções.
Groucho – Boas intenções? Tu não assumiste a criança. O Engels é que perfilhou o moleque. Aliás, esse sim é um amigão...
Karl – É um companheiro de luta. Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras, mas o que importa é modificá-lo. Ele percebeu isso. E fez muito por mim.
Groucho – Mas é como eu sempre digo: ninguém é completamente infeliz diante do fracasso do seu melhor amigo.
Karl – Olhaê... vou nesssa. Prazer em conhecer...
Groucho – Prazer? Ora… conheço Groucho há anos e não tive prazer nenhum nisso.
* texto construído a partir de falas ou escritos dos dois (com as devidas liberdades poéticas).
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