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terça-feira, 16 de setembro de 2014

Os dois maiores marxistas do mundo

Karl e Groucho Marx

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um deles é marxista e tende para o marxismo. O outro é um marxista que tende para a anarquia (não confundir com anarquismo). Os dois viveram em tempos diferentes e já foram desta para... para lugar incerto. Acontece que um era ateu e não acreditava nesse papo de vida após a morte. O outro não levava essa coisa de morrer muito a sério. Mas vamos ficcionar* um encontro entre dois dos maiores marxistas da humanidade: Karl Marx e Groucho Marx numa mesa de bar.

Karl Marx – Senta aí, Groucho. Vamos conversar...
Groucho Marx – Antes de começar a falar, tenho algo importante a dizer...
Karl – Com calma, temos tempo. Queres beber alguma coisa? Comer um bife? Ou és vegetariano?
Groucho – Não sou vegetariano, mas como animais que são. Posso comer e beber, mas não pago. Pagar a conta é um costume absurdo.
Marx – Dinheiro, sempre o dinheiro, Groucho. A propriedade privada tornou-nos tão estúpidos e limitados que um objeto só é nosso quando o possuímos.
Groucho – É por isso que morreste pobre. Aliás, sabes que o segredo do sucesso é a honestidade. Se conseguires evitá-la, não tem erro...
Karl – O dinheiro é a essência alienada do trabalho e da existência do homem.
Groucho – Tens razão, Karl. Há muitas coisas na vida mais importantes que o dinheiro. Mas custam tanto.
Karl – O dinheiro não é tudo. E, cá para nós, o declínio da sociedade burguesa é inevitável. Por que não te juntas aos comunistas?
Groucho – Nem pensar. Não entro para clubes que me aceitam como sócio.
Karl – Sabes que o capitalismo gera o seu próprio coveiro.
Groucho – Não fales em coveiros. Eu pretendo viver para sempre... ou morrer tentando.
Karl – Tenta entender. O comunismo não é para nós um estado que deve ser estabelecido, um ideal para o qual a realidade terá de se dirigir...
Groucho – Não concordo. E estes são os meus princípios. Mas se não gostas deles, eu tenho outros.
Karl – Te liga, Groucho. Podes crer... a revolução é o motor da história.
Groucho –  Claro. Todo mundo precisa crer em algo. Portanto, creio que vou tomar uma cerveja.
Karl – És duro na queda. A tua falta de fé é muito sólida. Mas lembra: tudo o que é sólido desmancha no ar.
Groucho – Então vamos beber aquela cervejinha, que é líquida. E fazer um brinde às nossas esposas e namoradas: que elas nunca se encontrem.
Marx – Não brinca com isso. Sabes que o meu casamento com a Jenny sempre esteve acima dessas coisas.
Groucho – Sim. O casamento é uma bela instituição. Naturalmente, se você gostar de viver numa instituição. Aliás, fui casado por um juiz... eu deveria ter pedido um júri.
Karl – Ora, Groucho, isso é como tantas outras coisas. Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha...
Groucho  Diz aí, Karl, tu vivias metido em política, viveste muito tempo fora de casa, no exílio e até na cadeia... e tiveste seis filhos? Ah... e ainda tiveste tempo para engravidar a empregada? Imagina se trabalhasses em casa...
Karl – Eu nego essa coisa da empregada. 
Groucho – Também corri atrás de uma garota por dois anos, apenas para descobrir que os seus gostos eram exatamente como os meus: nós dois éramos loucos por garotas. Mas sou solidário contigo.
Karl – É... mas o caminho do inferno está pavimentado de boas intenções.
Groucho  Boas intenções? Tu não assumiste a criança. O Engels é que perfilhou o moleque. Aliás, esse sim é um amigão...
Karl – É um companheiro de luta. Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras, mas o que importa é modificá-lo. Ele percebeu isso. E fez muito por mim.
Groucho  Mas é como eu sempre digo: ninguém é completamente infeliz diante do fracasso do seu melhor amigo.
Karl – Olhaê... vou nesssa. Prazer em conhecer...
Groucho – Prazer? Ora… conheço Groucho há anos e não tive prazer nenhum nisso.

* texto construído a partir de falas ou escritos dos dois (com as devidas liberdades poéticas).


terça-feira, 3 de julho de 2012

Percepção



POR JORDI CASTAN

A forma como cada um de nós percebe as coisas depende de dezenas de elementos. No trabalho que já me levou a quatro continentes e mais de 20 países, um dos elementos que se repete em cada país e em cada grupo de trabalho e o que desenvolve a percepção. Cada participante recebe o mesmo texto, pouco mais de quatro ou cinco frases, que são lidas em voz alta, de forma pausada. Depois, todos os participantes devem responder a uma série de 10 questões. As opções são "certo", "falso" e "não sei". 


Um exercício simples. Tão simples que nas mais de cinquenta vezes em que o realizei, com perto de mil participantes, nenhuma única vez houve a unanimidade em nenhuma das respostas. O resultado permite que os participantes sejam confrontados com a forma como percebemos as mesmas coisas.

Agora imagine você um texto como este, com mais de dois mil e quatrocentos toques e dezenas de frases. É evidente que a percepção que cada um terá do texto será diferente e na maioria das vezes até antagônica. O que somos, a formação que temos ou não temos. As nossas experiências anteriores, o emprego que temos, o cargo que ocupamos. Até o que temos ou deixamos de ter, inclusive o que gostaríamos de ter e não temos. Tudo absolutamente tudo influencia de forma marcante e definitiva a nossa percepção.

Aqui no Chuva Ácida, cada um dos membros do coletivo incorpora nos seus posts, além da sua bagagem pessoal, a sua percepção dos fatos e situações que relata. A esta visão particular há que acrescentar a percepção que cada um dos leitores faz de cada texto. Eu mesmo já recebi críticas e elogios intensos pelo mesmo texto. Os bons textos despertam tanto opiniões a favor, como opiniões contrárias. Numa situação que se repete cada vez com maior frequência e que depende exclusivamente da percepção de cada um.

No período eleitoral - e especialmente com o início oficial da campanha - é importante que agucemos os nossos níveis de percepção, que tenhamos a capacidade de perceber além do visível, enxergar o visível e o invisível de cada mensagem. O que está em jogo e, hoje mais que nunca, não é tanto como são as coisas realmente e sim como são percebidas pelo eleitor. E neste campo há especialistas em vender gato por lebre, há profissionais que brincam e distorcem a percepção das coisas. Dizendo-nos o que queremos ouvir, nos mostrando uma realidade fantástica que gostaríamos de ver.


Olho vivo, porque entramos num período em que luzes e sombras serão usadas para criar imagens distintas das reais, imagens nas que passaremos a acreditar e que podem mudar radicalmente depois que a festa acabe e as luzes se acendam.