terça-feira, 9 de agosto de 2016

A febre da segurança contagiou os candidatos a prefeito

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A febre da segurança contagiou os candidatos à Prefeitura de Joinville. Primeiro foram Udo Dohler e Dr. Xuxo, que escolheram dois oficiais da PM, Nelson Coelho e Adilson Moreira, como candidatos a vice-prefeito. E há poucos dias Marco Tebaldi anunciou a ex-delegada Marilisa Boehm como o segundo nome na sua chapa. Há lógica nessa guinada para o tema da segurança pública? Sim. A coisa faz sentido no plano das manigâncias políticas. A escolha não é inocente.

Não é preciso ler muitas sondagens para saber que a segurança é uma das áreas que mais preocupa os eleitores. É aí que entram em campo os “gênios” da engenharia política: se o povo está preocupado com a segurança, vamos dar o que eles querem. E faturar uns votos, claro. O problema é que qualquer pessoa com dois dedinhos de testa sabe que é um tiro n’água. Não há como cumprir essa “promessa”.

É frustante ter que dizer o óbvio. Mas imagine, leitor e leitora, que um desse três candidatos acabe eleito. O que pode um “xerife” fazer a partir da sua confortável cadeira de vice-prefeito? Pegar em armas e sair por aí a prender malfeitores? Claro que não. Isso não faz parte das atribuições de uma administração municipal. Aliás, se os prefeitos cumprissem o que prometem já seria uma vitória de valor inestimável. É ficção, claro.

Resta a artimanha. Haverá eleitores dispostos a votar nesses três candidatos por causa da segurança? Sim. E se dividirão entre os conservadores (alguns com saudades dos anos de chumbo) e os que, em termos políticos, não veem um palmo à frente do nariz. Mas há um problema: é muito papagaio para o mesmo poleiro. Com três candidatos a disputar o mesmo campo, um anula o outro... e lá se foi o diferencial eleitoral.

A escolha de Marco Tebaldi parece ser a mais bem enquadrada, no quadro dessa febre securitária. Ao escolher uma mulher também delegada, ele pisca o olho a pelo menos dois eleitorados: o feminino e o do medo. A escolha do Dr. Xuxo desponta como a mais neutra. O seu candidato a vice-prefeito não parece ter um capital político capaz de cativar grande número de eleitores, mas também não faz perder votos.

UDO DOHLER - O caso de Udo Dohler é o mais intrigante. Apesar de uma administração pouco convincente, o atual prefeito mantém a vantagem de ter a máquina administrativa da Prefeitura nas mãos. Ou seja, mesmo com uma indisfarçável rejeição, Udo Dohler ainda consegue manter uma posição que lhe permite pensar na reeleição. E fica a questão: qual o cacife político trazido pelo seu candidato a vice-prefeito?

Udo Dohler parece empreender uma fuga para a frente. O insucesso da sua administração matou a figura do “gestor”. É preciso uma nova roupa para um velho estilo. As pesquisas apontam, de forma recorrente, a “honestidade” como fator preferencial para os eleitores. Importante salientar que o apelo da honestidade não é inocente, já que resulta de informações obtidas em pesquisas de opinião. Quem não notou, nos últimos tempos, o matraquear da comunicação do prefeito nesse sentido?

O eleitor quer um síndico – e de preferência honesto. Ou mais: alguém de pulso forte que ponha ordem na casa. Sob esse aspecto, a figura de um vice-prefeito austero e durão tem muita utilidade para a semântica das eleições. Talvez Udo Dohler seja uma raposa política e veja vantagens em ter um vice ultraconservador e anti-intelectualista, entre outras “virtudes”. Mas não será exagero acreditar que a totalidade dos eleitores é conservadora?


Questões de direitos civis não decidem eleições municipais, mas podem criar anticorpos. Dohler tem os seus próprios índices de rejeição. E trazer um candidato de extrema direita, que também cria rejeição em parte do eleitorado, pode gerar contratempos. É esperar para ver. Aliás, tudo vai depender do que os seus adversários estão dispostos a fazer. Há muito material para trabalhar.

É a dança da chuva.






segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Quanto falta transparência, sobram questionamentos


POR JORDI CASTAN

O que há com a ampliação do ribeirão Matias? Há uma extensa lista de questionamentos feitos pelos moradores afetados pelas obras do ribeirão, que nasce na Rua Otto Bohem e tem sua foz no rio Cachoeira, na frente da própria Prefeitura. Questionam se o edital de licitação da obra foi efetuado com base em um projeto executivo da obra e o respectivo cronograma físico financeiro. 

Em caso afirmativo, pede-se que seja apresentado em via digital o respectivo projeto, cronograma físico financeiro e as ART (Anotações de Responsabilidade Técnica) dos responsáveis técnicos. Aliás, cabe aqui um parêntese importante. Quem acompanha as idas e voltas do projeto da duplicação da avenida Santos Dumont sabe que se estes passos básicos fossem regularmente cumpridos, a história daquela obra seria outra muito distinta.

Questionam também se o projeto que está sendo executado é o mesmo que foi licitado ou sofreu alterações. Caso tenha havido alterações, pedem que sejam listadas, especificadas e justificadas. Desnecessário dizer que se a administração municipal fosse tão transparente quanto diz ser, estes questionamentos não teriam razão de ser.

Outro questionamento é se estão previstas e detalhadas no projeto executivo da obra as intervenções nas infraestruturas pré-existentes (água potável, drenagem pluvial, gás, fibra ótica, energia elétrica, telefonia e outras). Quem acompanha as obras públicas municipais sabe que  planejamento, acompanhamento e fiscalização não são pontos fortes desta gestão. 

Assim, é pertinente a preocupação dos cidadãos atingidos pela obra. Pedem ainda que caso afirmativo, sejam apresentados em via digital os respectivos projetos e todos os documentos que obrigatoriamente formam parte de um projeto executivo completo. Solicitam que sejam apresentadas as ARTs dos resultados das sondagens (manuais, SPT, CPTU) realizadas em campo que permitam definir os tipos de fundações previstas no projeto executivo. 


MUITO TÉCNICO? - O texto esta ficando muito técnico? Para um leigo talvez. Mas obras públicas desta envergadura devem cumprir todos estes requisitos e muitos mais. Os moradores têm direito a exigi-los e os seus pedidos devem ser diretos, concretos e precisos, para evitar respostas vagas, inexatas e pouco precisas, que, aliás, são as que o poder público e seus órgãos técnicos normalmente fornecem quando não tem os documentos solicitados.

Como o cronograma físico financeiro atualizado da obra não está disponível, a solicitação é que seja apresentado. Assim como os contratos firmados pela Prefeitura municipal com os relatórios dos pagamentos já efetuados referentes às diversas etapas e ações da obra (projetos, planejamento, gerenciamento, licenciamento ambiental, execução e outros) com os seus respectivos aditivos.

Também solicitam o rol dos técnicos envolvidos em todo o processo e suas respectivas ARTs. Os estudos ambientais e a LAI (Licencia Ambiental de Instalação). Questionam se foi apresentado o EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança) da obra. Uma obra deste valor e impacto deveria ter um EIV e deveria ter sido amplamente discutida com os moradores especialmente aqueles afetados diretamente por ela.

Aliás, todos estes questionamentos trazem a tona não só a falta de transparência do poder público, mas também a falta de estudos técnicos para justificar tantas ações que tem sido feitas e continuam sendo feitas no planejamento urbano de Joinville. 

O governo municipal é muitas coisas. E não é muitas outras. Não é transparente, nem operoso. Tampouco é resolutivo. Mas é medalha de ouro em escusas, procrastinação e inépcia. O resultado é que os joinvilenses acreditam cada vez menos nele e, por isso tornaram-se cada vez mais críticos. Ou seja, estão menos propensos a aceitar as empulhações de quem quer justificar o que não faz. 



sábado, 6 de agosto de 2016

E dizem que não há racismo...




Júlia Rocha vive em Minas Gerais e divide a sua vida entre a medicina (é médica de família e comunidade) e a música (é cantora). Mas também é uma pessoa atenta às questões dos direitos civis. Foi uma das pessoas que denunciou o médico paulista do episódio da “peleumonia”, em que debochou de um paciente. Mas o clima de intolerância os racistas não perdem tempo. Eis…



sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Olha! Apareceu o prefeito!


POR FILIPE FERRARI

As redes sociais, grupos de Whats e espaços que frequento andam preocupados com o sumiço de algumas pessoas. Cada um em seu âmbito, muito se fala sobre o desaparecimento midiático do senador Aécio Neves, e aqui na nossa cidade, procurava-se desesperadamente um prefeito que deu o ar da graça essa semana para anunciar sua chapa que concorrerá ao paço municipal.

O chá de sumiço tem sido uma estratégia política importante na atual conjuntura brasileira, pois muitos políticos preferem ser esquecidos (e adotar estratégias agressivas de marketing nas eleições), do que estar sempre na linha de fogo da opinião pública. Quem deve, teme. Para estes, o esquecimento tem um papel importante em suas estratégias de campanha.

O historiador francês Paul Ricouer tem trabalhos interessantes sobre essa função da memória: o esquecer. Ele defende, inclusive, o direito ao esquecimento. Realmente, em alguns casos isso é importante, apesar dos diferentes tipos da ação do não-lembrar. O trabalho do governo alemão pós-holocausto é um exemplo. Fez-se um julgamento, colocou-se nome nos culpados, que foram então penalizados, ergueram-se (ou preservaram-se) museus e lugares de memória, e hoje a nação alemã tem sobre si a sombra do genocídio, mas essas gerações não precisam carregar a culpa. Foi. Aconteceu. Lembremos, mas esquecendo e nos libertando. É um trabalho psicológico de Estado e de cultura nacional.

Trabalho esse que foi desenvolvido em alguns países da América Latina com as Comissões da Verdade pós ditaduras. Trabalho que demorou a ser feito no Brasil, e que ainda não teve o alcance necessário, visto as aberrações que vemos nas últimas manifestações, ou mesmo as aberrações no congresso que pedem e defendem a Ditadura Militar.

Em época eleitoral, a estratégia do esquecimento é utilizada de forma canalha. Querem que se esqueça do candidato que foi condenado (sim, condenado; não delatado, julgado, suspeito...) por desvio de dinheiro público, querem que se esqueça do prefeito que fez mil promessas em cima da sua capacidade de gestão, e que paralisou a cidade.

Em determinados casos, o esquecimento é um direito, mas lembrar é um dever.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Essa nossa obtusa e anônima cordialidade


POR CLÓVIS GRUNER

No dia 19 de setembro de 2014, Hiago Augusto Jatobá de Camargo, de 21 anos, cabo eleitoral da campanha de Dilma Rousseff, do PT, foi esfaqueado durante uma briga na praça da Ucrânia, em um bairro nobre de Curitiba, durante uma discussão com outros cabos eleitorais e um morador local que chutara uma das placas da candidata. Embora a polícia tenha descartado, rápido demais, a hipótese de crime com motivação política, a morte de Hiago foi um dos primeiros e mais trágicos indícios de que o acirramento não era algo restrito ao ambiente eleitoral. 

O clima de hostilidade já afetou gente à direita e à esquerda – de Janaína Paschoal a, mais recentemente, Letícia Sabatella –, em graus variados de violência. Uma de suas faces mais visíveis não é necessariamente nova, embora esteja a ganhar contornos cada vez mais sombrios. Falo de uma moral e uma conduta conservadoras (porque, a rigor, não se pode falar de um “pensamento conservador”), franca e abertamente reacionárias, responsáveis diretas pela proliferação da ignorância, o empobrecimento do debate e do ambiente políticos, a disseminação da truculência e a legitimação da intolerância como práticas cotidianas.

É interessante (e não deixa de ser também um pouco incômodo) que depois de oito décadas o “homem cordial”, o tipo ideal weberiano forjado por Sérgio Buarque de Holanda em seu “Raízes do Brasil”, ainda nos sirva como uma categoria de análise capaz de iluminar aspectos do comportamento político do brasileiro médio de hoje. Em linhas gerais, a cordialidade, segundo Sérgio Buarque, sintetiza nossa distância e indiferença em relação aos ritos que caracterizam a vida pública, mantendo a supremacia dos valores privados e domésticos. 

No Brasil, essa separação rígida entre as esferas pública e privada constitui-se na contramão dos valores liberais que estão no cerne das democracias modernas. Historicamente, foi a “vida doméstica” quem forneceu o modelo no interior do qual foram forjadas nossas composições sociais. E não há nada de positivo nisso: fundada nos laços e arranjos familiares, a cordialidade se estendeu até o espaço público, precarizando-o ao subordiná-lo aos interesses privados e familiares. 

O custo ético e político dessa subordinação é altíssimo. Porque no mundo moderno a palavra “público” não designa apenas “uma região da vida social localizada em separado do âmbito da família e dos amigos íntimos”, de acordo com o sociólogo americano Richard Sennett. Mas também, e principalmente, a possibilidade de conviver com uma diversidade significativa de pessoas pertencentes a classes, gêneros, etnias, religiões, hábitos, etc..., distintos dos nossos e daqueles que nos são próximos e íntimos. Ao abolirmos a distância entre as esferas privada e pública, fragilizamos nossa capacidade de conviver com o outro e passamos a tratar os assuntos e problemas públicos como se fossem, nas palavras de Sennett, “questões de personalidade”. 

“Em verdade, temos medo” – O resultado está aí, nas ruas, redes socais e caixas de comentários de blogs e sites de notícias. Em debates, tornou-se corrente o uso de termos como “idiota”, que eximem quem o utiliza de argumentar com o mínimo de razoabilidade. Se o assunto são os direitos humanos e das chamadas minorias – negros, gays e mulheres, principalmente –, os parâmetros para o diálogo, invariavelmente, reafirmam a incapacidade de compreender e conviver com as razões e motivações do outro em uma arena comum de coexistência, com a prevalência do “eu não gosto” ou o “eu não concordo” como arremedos de argumentação. 

Fala-se na precariedade das penitenciárias, na violência urbana e policial ou contra a redução da maioridade penal, e não faltará quem sugira “levar para casa” criminosos maiores ou menores de idade, porque não ocorre a quem o sugere que a segurança é um problema público, cujas soluções não são domésticas nem familiares. Gente que mal sabe localizar a Venezuela no mapa se arvora uma autoridade no país e em seus problemas. São os mesmos que falam em “meritocracia” e “Estado mínimo” quando o que está em jogo é assegurar direitos básicos e elementares à população mais fragilizada, mas não hesitam em apoiar o Estado no uso do aparato militar e repressivo contra movimentos sociais, por exemplo.

Nas páginas iniciais de “Kaputt”, o misto de reportagem e ficção escrito pelo italiano Curzio Malaparte nos anos de 1940 (e adaptado, no Brasil, para uma graphic novel simplesmente maravilhosa pelo quadrinista Guazzelli), o narrador apresenta os alemães como indivíduos amedrontados, que matavam e destruíam por medo: “Os alemães têm medo. (...) têm medo de tudo que é vivo, de tudo que é vivo fora deles. Medo de tudo que é diferente. (...) Têm medo sobretudo dos fracos, dos indefesos, dos enfermos, dos velhos, das crianças...”. 

Foi a gestão desse medo que produziu indivíduos precarizados e atomizados, dispostos a legitimar a barbárie nazista, ainda que pela indiferença. E pelo menos desde a análise do julgamento de Eichmann pela filósofa alemã Hannah Arendt, tornou-se mais ou menos comum a afirmação de que os regimes totalitários e autoritários – além do próprio nazismo, o stalinismo e outros tantos – sobreviveram não apenas pelo poder da força, mas pela sua capacidade de mobilizar afetos e lealdades do chamado “cidadão comum”, honesto, trabalhador e de bem. 

E ainda que se possa falar de uma “cultura do medo”, não devemos perder de vista que se trata, uma vez mais, de organizar o espaço público a partir de afetos privados. Há diferentes motivos que explicam essa permanência, atualizada, de nossa cordialidade, e a sistemática política do esquecimento que vigora desde o processo de abertura, no final dos anos de 1970, é um deles. O homem cordial brasileiro do século XXI, como o alemão dos anos de 1940, tem medo. E sabemos muito bem que o medo pode gestar e parir bem mais que a estupidez verborrágica dos comentários anônimos.

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

A escolha é sua



POR RAQUEL MIGLIORINI
Na década de 50, após a derrota do Brasil para o Uruguai, Nelson Rodrigues cunhou o termo “Complexo de Vira-lata” para denominar a falta de auto-estima que tomava conta do brasileiro. Particularmente nunca gostei desse termo porque acho que os vira-latas são animais com personalidade e que não se deixam abater diante das adversidades. Mas não vou discutir com Nelson Rodrigues.

Após a humilhação da derrota na Copa do Mundo em casa (tadinho do Nelson, nem sabia o que esperava a seleção brasileira em 2014), todo o cenário nacional passou  por mudanças mais drásticas. Getúlio Vargas morreu/se suicidou em 1954 e quem assumiu foi Café Filho, num governo curto e desastroso. Daí veio a era JK com a construção da nova capital e muitos rumores de superfaturamento nas obras (não, não começou com o PT), seguida pela  renúncia de Jânio Quadros  e a queda de João Goulart pelo golpe militar.

Nas duas décadas em que isso tudo aconteceu, o Brasil cresceu  em diversos setores. Música, Cinema, industrialização, políticas sociais, e dois títulos mundiais de futebol trouxeram novos ares para a nação. O golpe militar interrompeu essa trajetória e o país voltou a se sentir inferiorizado, entregue ao poder e resignado. A imprensa e a elite hipervalorizavam o que era feito fora do país e, de repente, a música e o cinema internacional eram muito melhores que os nossos. Paramos de produzir tecnologia para nos transformarmos em mão-de-obra barata para empresas multinacionais. E pior, acreditamos que éramos realmente imprestáveis  e que, sem o reconhecimento de europeus e norte-americanos, nada do que era feito aqui valia a pena.

Observe que na época pré-ditadura, assim como  agora, as pessoas mais pobres começaram a se sentir parte da mudança, percebendo-se  capazes de melhorar de vida, de estudar, de ter o emprego e a profissão que quisessem, porque não aceitavam mais a imposição da classe social ou da etnia. O  complexo de vira-latas começou a ser atenuado e  fez com que os interessados em manter o povo brasileiro cabisbaixo e sem nenhuma auto-estima começassem  a usar artilharia pesada para voltarmos com “lá fora é muito melhor”, “só nesse país acontece isso”, “quero que meus filhos cresçam longe daqui”, “visitei Paris e é tudo diferente daqui”. Afinal, dominar e manipular quem se acha fracassado é muito mais fácil.

E assim, virou esporte nacional a degradação do Brasil e dos brasileiros. Me desculpe, mas não quero participar disso. Não uso o viés ideológico do “Ame-o ou deixe-o”, até porque, sabemos bem como funcionava, mas quero trocar por “Ame e cuide”, “Ame e faça sua parte”. Precisamos com urgência abandonar a condição de colônia. Estou farta de escutar que a Educação aqui é ruim mas não vejo pais nas escolas exigindo que os filhos estudem, leiam e respeitem os professores. Escutar que a Saúde é ruim e presenciar Unidades de Saúde lotadas às segundas-feiras para  fulanos e sicranos conseguirem atestados por um final de semana de esbórnia. Pais que trazem atestados médicos justificando a falta dos filhos nas provas e no Facebook aparece o cidadão na Disney.

Essas mesmas pessoas comparam o Brasil com países da Europa e da América do Norte sem usar contexto algum, por ignorância ou má fé. Como foi que chegaram aonde estão? Quantos anos eles tem de democracia? Como foi a colonização e em quantas guerras se envolveram? Não é visitando um país ou só lendo matérias seletivas sobre ele que  se pode concluir o que dá certo ou não e se precisamos daquele modelo.

Vamos pensar nas Olimpíadas. Está tudo ruim? Claro que não. Perfeito? Também não. Tem coisa que poderia ser evitada ou melhorada, mas isso não nos faz pior. Eu, por exemplo, não queria ver a Anita na abertura do evento, mas se ela foi convidada é porque o brasileiro gosta. Vai lá e coloca um “Prepara” pra ver se a galera não sabe a coreografia todinha. Elogiar os mascotes Tom e Vinícius não ouvi ninguém. Sinhô mandou criticar e achar ruim, colônia vai lá e faz.

A bola está com você, que pode escolher se vai continuar se achando a mosca do cocô do cavalo do bandido ou se vai se apropriar desse país maravilhoso, com cultura e beleza ímpar e deixar de ser manipulado e resignado. Temos capacidade para melhorar. Para isso, precisamos mudar o olhar e atitude.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Letícia Sabatella e o infeliz encontro com o Sr. Nada

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Puta. Puta. Você é puta”.

Mesmo que imaginasse mil formas de cometer uma estupidez, nunca passaria pela cabeça chamar Letícia Sabatella de puta. Nem ela e nem outra mulher qualquer. Mas, como todos assistimos – e lamentamos –, em Curitiba houve um homem que, sem qualquer pudor, partiu para a agressão verbal, aos grito de "puta". Quem teria topete para fazer uma coisa dessas? Ora, só alguém com um péssimo caráter ou mesmo ausência total dele.

Depois do episódio, começaram a surgir os links. A história do sujeito e da sua família veio logo à tona. E com fatos deploráveis. Mas não é o que interessa aqui. Quem teve a curiosidade de dar uma passada no perfil de Facebook do sujeito viu que ele aparece ao lado de uma menina, presumivelmente sua filha. E muitos, como eu, terão perguntado: será que ele nunca a imaginou a crescer e um dia a ser tratada como ele tratou Letícia Sabatella?

Mas não foi apenas o tal homem. Uma récua de senhoras histéricas se esgoelava a gritar tolices como “ladra, aproveitadora”, “acabou a mamata”, “cria vergonha” e o indefectível “nossa bandeira jamais será vermelha”. Ouch! Tantas bestas em tão pouco espaço. Quem olha para as imagens pode tirar uma conclusão: essas pessoas imaginam estar a fazer uma espécie de “justiçamento”. É a justiça do fáscio. A justiça do Sr. e da Sra. Nada.

Quem são o Sr. e Sra. Nada? Ora, gente que antes vivia isolada a remoer os seus ódios e as suas intolerâncias, mas sem formas de expressão coletiva. As hienas só sabem atacar em grupo. E a onda de reacionarismo que tomou conta do Brasil veio criar o palco perfeito para esses delírios fascistas. Wilhelm Reich diz que o fascismo é “a expressão da estrutura irracional do caráter do homem médio”. É o retrato das ruas. Gente enlouquecida vestida de amarelo.

Desnecessário lembrar os perigos do fascismo. O ideário fascista é o húmus que fez brotarem exércitos de sras. e srs. Nada pelo Brasil. E não se deixem distrair, leitoras e leitores. Esses exércitos são monstros sem cabeça que só entendem a linguagem do obscurantismo, da intolerância e do ódio. A vítima mais recente foi Letícia Sabatella, mas qualquer pessoa que tenha um QI maior que o de um chimpanzé é um alvo potencial. É a ascensão do Sr. Nada.


É a dança da chuva.