sexta-feira, 13 de abril de 2012

A sociedade do espetáculo e as máscaras

POR AMANDA WERNER

Foi-se o tempo em que éramos apenas hedonistas. Em que cultuávamos o prazer como premissa suprema da felicidade. Agora é preciso mostrar para o outro que temos momentos prazerosos o tempo todo. O “ter” e o “ser” ficaram para trás. Agora basta “parecer”.

A preocupação de, com muito esforço, adquirirmos bens e renda capazes de suprir necessidades futuras foi substituída por uma crescente preocupação em mostrar tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que nos torna melhores do que as outras pessoas. E, na medida que pensamos estar nos diferenciando, nos uniformizamos.

Hoje é importante fazer caridade, mas o mais importante é mostrar que o estamos fazendo. Teve até um caso recente na televisão local, onde a pessoa disse ter sido “acidentalmente” fotografada alimentando um animal faminto e abandonado na rua. Como somos bons. E ricos… e felizes.

Informamos ao nosso público, o tempo todo, onde estamos, com quem estamos e o quanto conseguimos comprar.

As festas de casamentos com despesas homéricas, custeando todos os novos “tem que ter” onde, por muitas vezes, por trás dos imponentes arranjos de flores e suntuosos vestidos de noiva existem recém-casados morando com os pais por conta das dívidas impagáveis, geradas pela tão sonhada festa. Por vezes verdadeiros casamentos de Chantilly (quem não se recorda do famoso casamento em um castelo na França, cuja duração não passou de três meses)? Mas este não é o propósito do texto. O casamento foi apenas um exemplo.

Aquele que pode comprar um carro zero por ano, o faz com tranquilidade. Enquanto aquele que não pode, na tentativa de ser igual muitas vezes não mede as consequências e se sacrifica para tal. Ou ainda, vive frustrado por não conseguir corresponder às expectativas.

Tomemos a superexposição nas redes sociais como outro exemplo. O Facebook (face – rosto) é o rosto que se quer mostrar. O problema de haver plateia para tudo é que acabamos por regular a nossa conduta de acordo com o que o público espera. E agimos como atores de nós mesmos, fazendo uma representação dramática da vida ideal.

Desse modo, desempenhamos papéis de forma a produzir impressões desejadas pelo público circunstante. E corremos um risco muito grande de perder a identidade. Esse novo jeito de interação social acaba por moldar o nosso comportamento. E, de repente, não sabemos mais quem somos.

O escritor francês Guy Debord já dizia: somos a sociedade do espetáculo. Nossa consciência adquirida socialmente se sobressai. Afinal, só conseguimos tomar consciência das pessoas que somos com o auxílio das outras pessoas. E a formação da nossa autoimagem nem sempre tem relação com fatos objetivos.

O risco desse tipo de conduta é nos pautarmos em fatos que nem sempre correspondem à realidade. É pensarmos que o conceito de felicidade não comporta dor, tristeza ou solidão. Afinal, não conseguimos mais ficar sozinhos, mandamos mensagens de texto o tempo todo, estamos sempre conectados na redes sociais. E mais: podemos dispor das pessoas à hora que quisermos, e até excluirmos alguém quando essa pessoa não mais nos agrada. É assim na vida real?

É possível que estejamos fabricando a nossa própria infelicidade. Como avatares de nossa própria vida, acreditamos e nos satisfazemos emocionalmente com nossas ilusões, não nos preparando para a vida de verdade. Será essa a nova vida real? As coisas são de fato o que parecem ser? A famosa indagação ainda vive: ser ou não ser? Eis a questão.

40 comentários:

  1. Caramba!!!

    Que texto pessimista.

    Apenas os idiotas é que são da maneira como a autora descreve. Conheço, de fato, alguns assim. Mas não os tenho em meu círculo.

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    1. Ah ah ah! Mas eu também já ouvi que um pessimista é apenas um otimista bem informado. Ler Debord às vezes pode ser útil para entender o mundo.

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    2. Olá anônimo! Pessimista? Não tinha analisado a questão sob este ponto de vista- pessimismo/otimismo. Pode ser um pouco pessimista sim. O fato, é que conheço não alguns, mas muitos assim. Não os considero idiotas, e não os excluo do meu círculo, pois não julgo ser dona da verdade. Creio que por vezes fazemos muitas coisas sem pensar , sem refletir. Esta é a única pretensão do texto, a de propor reflexão. Obrigada pelo seu comentário.

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    3. James Ensor era um expoente do Expressionismo Nórdico .Representava temas dramáticos e obsessivos em suas obras.Retratando uma profunda angústia e desespero existencial,tal como Edvard Munch.
      Em sua obra "A Intriga",o grotesco ,o irônico demonstra o pavor de uma sociedade dominada pela mentira,pela inveja que o ser humano adquiriu através das disputas da vida em sociedade,nesse universo fantástico e controvertido cheio de preconceito e discriminação.
      Ensor usa então a fantasia,a caricatura para retratar os sentimentos.
      Portanto concordo com a autora porque a mesma demonstra profunda sensibilidade de observação da sociedade atual,embora isso nos cause um grande choque.

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    4. James Ensor era um expoente do Expressionismo Nórdico .Representava temas dramáticos e obsessivos em suas obras.Retratando uma profunda angústia e desespero existencial,tal como Edvard Munch.
      Em sua obra "A Intriga",o grotesco ,o irônico demonstra o pavor de uma sociedade dominada pela mentira,pela inveja que o ser humano adquiriu através das disputas da vida em sociedade,nesse universo fantástico e controvertido cheio de preconceito e discriminação.
      Ensor usa então a fantasia,a caricatura para retratar os sentimentos.
      Portanto concordo com a autora porque a mesma demonstra profunda sensibilidade de observação da sociedade atual,embora isso nos cause um grande choque.

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    5. Pois eu os excluo do meu círculo sim, mesmo não me julgando dono da verdade.

      Espero que você não adoeça permanecendo perto de gente assim.

      Boa sorte e parabéns pelo altruísmo.

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  2. "Eu queria dizer a vocês que estou lendo esse texto do meu Ipad novo, dentro de meu carro importado 0 KM, indo para uma viajem internacional."

    Ironia "ON" :)

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    1. Bem lembrado, Luiz!

      Não por acaso, essa semana eu estava lendo sobre isso:
      Aqui: http://hilariodiario.wordpress.com/2012/01/02/a-necessidade-de-se-mostrar-bem/

      E aqui: http://www.administradores.com.br/informe-se/tecnologia/estudo-avalia-nivel-de-inveja-no-facebook/51729/

      Agora desligando a ironia, gostei do texto, parabéns!

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    2. Alexandre li o link e achei pertinente,tem a ver a a ideia do texto. Acho que de alguma forma, uns mais outros menos, todos fazemos parte da mesma sociedade espetaculosa. Por vezes, para nos sentirmos incluídos em determinados grupos, também abrimos mão de algumas convicções. Afinal, nem sempre queremos brigar, discutir tudo, não é? Mas, considero importante tomarmos consciência dos nossos atos ou omissões.
      Obrigada pelo teu comentário!

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    3. Viagem ou viajem? Deve ter algum dicionário entre os aplicativos para iPhone, iPad. Se não tiver, baixe alguns livros, isso pode auxiliar no correto emprego da língua portuguesa.

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    4. Poxa anônimo, apenas troquei as bolas.

      Apesar do substantivo estar incorreto, viajem com "J" também se usa como verbo: "viajo, viajas, viaja"

      O pior foi você não ter percebido a ironia, apesar de estar escrito no post.

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    5. Esse blog é de um espírito republicano ímpar. Sempre que anônimo critica um post ou comentário é criticado por ser anônimo. E se sobra espaço, vem a insinuação que é burro, ignorante, ameba, não entendeu o sentido do que fora dito, tal qual escreveu Baço. Em primeiro lugar, se você precisa explicar o que escreveu significa que escreveu mal. Por fim, entendi perfeitamente a ironia. Critiquei o erro de ortografia. Afinal, ironia é melhor que seja fina. Simples assim

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    6. Prezado Anônimo
      O seu comentário foi respondido pelo Alexandre, os administradores do blog não censuraram ou editaram nenhum comentário deste post.
      O seu comentário foi pertinente, correto e o erro de ortografia era evidente.
      Quem faz o Chuva Ácida são tanto os seus autores, os seus convidados e principalmente os seus leitores.
      Obrigado pela sua participação.

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    7. Prezado Anônimo,

      Em primeiro lugar, eu não sou e nem quero parecer fino. Em segundo, a sua opinião, para mim, tem o mesmo valor de uma nota de R$ 3,00 reais.

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  3. Virgi. Acho que a Amanda vai despertar a bolha do Felipe.

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  4. "O 'ter' e o 'ser' ficaram para trás. Agora basta 'parecer'.", triste realidade...

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    1. Sim Luiz, o cenário não me parece bom. "Parecer".O que será que vem depois?
      Valeu pelo comentário!

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    2. A doutrina espírita explica.

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  5. Salve, Amanda.
    O Debord é leitura incontornável para entender a sociedade contemporânea (se bem que muita coisa mudou desde "A Sociedade do Espetáculo" - acho que "As Sociedades de Controle", do Deleuze, dão conta disso mesmo). Mas tem uns sujeitos mais diretos, como Benjamin Barber, que fala não infantilização dos adultos. Vale a pena ler. O texto é uma defesa do capitalismo. Ele diz que essa infantilização pelo consumo ("o meu iPhone", "o meu iPad", "o meu carrão importado" etc) pode levar não apenas ao fim da democracia, mas do próprio capitalismo. Diz ele: "Houve um tempo em que o capitalismo estava aliado a virtudes que também contribuíram, pelo menos de forma marginal, para a democracia, a responsabilidade e a cidadania. Hoje, ele está aliado a vícios que – embora sirvam ao consumismo – minam a democracia, a responsabilidade e a cidadania. A questão, é se não apenas a democracia mas o próprio capitalismo pode sobreviver ao etos infantilista do qual ele passou a depender".

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    1. Acho que quando o ser humano entender que cada gesto seu tem um desdobramento infinito, não apenas no seu mundo, mas na sociedade, perceberá o quanto de contribuição poderá dar agindo melhor e percebendo o outro. Creio que a pessoa só vira ser humano por meio do processo de socialização e educação, e não pela sua capacidade de consumo, ostentação e não discernimento.
      Obrigada pela dica do Benjamin Barber. Vou ler. E também pelo comentário.

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  6. Essa percepção é bem local, Amanda.
    Como muda a cultura entre países viu.
    A primeira coisa que percebi quando vim morar na Suécia foi a ausência de ostentação.
    Tudo é muito simples e discreto, (exceto os prédios imponentes de mais de mil anos) No mais, tudo é muito simples, especialmente as pessoas.
    Aqui a desigualdade social é muito pequena, não existem pobres e a maior parte da população ganha relativamente o mesmo. Então, não faz sentido você ter carrão importado, porque todo mundo sabe aprox.quanto vc ganha e sabe que não condiz com seu padrão de vida. É o contrário do Brasil, ao invés de você "fazer moral" você passa por ridículo. Claro que existe o respeito acima de tudo, cada um tem as suas prioridades na vida.
    Mas o ter não é valorizado aqui, e sim o que você tem de conhecimento.
    Quando visitei a Escola Internacional de Helsingborg, a diretora me recebeu de bermuda, camiseta e havaianas.
    Tem gente de cabelo colorido, tatuagem e piercing nos mais variados cargos na sociedade.
    Você precisa conhecer (se é que já não conhece a Suécia), vai se impressionar!
    Beijos e parabéns pelo texto, excelente!!!
    Muito melhor que a baboseira religiosa que seus amigos às vezes postam.

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    1. Fantástico Fernanda.

      Acompanho o "Chuva" desde o começo e meu maior aprendizado foi lendo o seu "post" acima. Minha reflexão e reposicionamento foram grandiosos.

      Obrigado.

      TW.

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    2. Olá Fernanda! Muito boa a tua colocação. Ainda não conheço a Suécia, mas tive a mesma impressão de outros lugares que conheci. Mas como morar é muito diferente de visitar por alguns dias, me abstenho de fazer comentários. Imagino como deve ser morar em um país que ficou em primeiro lugar do mundo no índice de democracia, entre 167 avaliados.
      Será que um dia seremos assim?
      Obrigada pelo comentário, como o TW falou, foi fantástico!

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  7. Na realidade parece que as coisas sempre foram assim, as pessoas sempre querem parecer que são melhores e tem mais do aparentam. Querem ser exemplo. A gente nunca sabe o que acontece dentro da parede do vizinho. Daí agora a rede social é a nossa nova vizinhança, graças a tecnologia, e nos aproxima de gente que há uns anos atrás perderíamos o contato pra sempre. Nosso perfil é nossa casa. A proporção de tudo aumenta muito. A questão é que os princípios continuam os mesmos, e a grama da nossa casa precisa sempre estar mais verde. Não existe mais real e virtual.

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  8. Todo mundo falando do Debord.
    Eu devo me considerar um alienígena social por sequer haver ouvido falar desta criatura? Hehehe

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    1. A boa notícia, Guilherme, é que se fores ao Google procurar "A Sociedade do Espetáculo Guy DebordPDF" acabas tendo o texto na hora e de graça. Aproveita.

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  9. Este texto tem muito a ver comigo. Eu ainda falho muito, gosto muito de aparecer e exibir-me. Admito.

    Se eu tivesse que escolher entre duas camisetas produzidas na mesma fábrica, com a mesma qualidade e uma delas tivesse uma grife ostentada, eu compraria a de grife. Admito.

    Ser mais humilde é algo que eu venho tentando mudar com o tempo. Mas crescer pessoalmente não é fácil, a reforma íntima é dolorosa. Há uma série de fatores pretéritos que derivam nesta necessidade de 'parecer', mas o fato é que independentemente das razões, não é legal e é preciso mudar.

    Obrigado pelo texto, caiu-me como uma luva.

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    1. Grande Guilherme.

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    2. Oi Guilherme, tem a ver comigo também. Afinal, somos produto do meio em que vivemos. Acredito que aqueles que dizem não sofrer nenhuma influência, apenas não conseguem percebê-la.

      Valeu pelo comentário!

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  10. É por estas que me excluí do Orkut há tempos, do Face há pouco e pensando seriamente do Twitter agora. Não significa o retorno às cavernas, e sim um basta à hipocrisia e banalidades. O que será de mim então? Coçar o saco e tomar geladas, é muuuito mais agradável.

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  11. Putz, TW, senti um tom de ironia no comentário.
    O que falei foi tão simples que não me pareceu ser capaz de provocar uma "reflexão e reposicionamento grandiosos".
    Mas td bem.

    Eu acho que o problema "Seu José" não está nas ferramentas como orkut, facebook ou twitter. Como o nome diz elas são redes sociais e o que as pessoas fazem nela? interagem. O que elas mostram é o que são e se tem coisa estranha é porque tem coisa estranha com as pessoas.
    Se vc interagisse com elas fora da internet provavelmente veria as mesmas falhas que identifica na rede: são pessoas.

    Infelizmente a pressão no Brasil em torno da imagem é grande, mas de novo, quem pode mudar somos nós.

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  12. E Amanda,
    obrigada!
    Qdo quiser conhecer a Suécia e nos visitar é só avisar.

    Eu acho que estamos longe, Amanda, de sermos essa sociedade focada no ser e não no ter. Mas tenho esperança. O problema é que o Brasil importa muita cultura dos EUA e a Suécia não sofre tanta influência americana. Sabemos que nos USA também o número de cirurgias plásticas são enormes, a venda de cosméticos, a beleza acima de tudo. Aqui, se vc disser que quer por silicone, as mulheres vão ficar olhando com estranhez pensando "mas pra que?".
    Cada cultura com suas características, né.

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    1. Pô Fernanda, também pudera. Cá prá nós, sueca botar silicone prá que, né?

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  13. É, as suecas são muito livres no sentido sexual pra ter que depender de silicone pra se sentir seguras e confiantes.
    As mulheres brasileiras vendem uma imagem de sexys, daquele tipo de fazer joguinho. Bota um decotão, uma saia curta e "pode olhar mas não pode tocar". Na Suécia é o oposto, as mulheres não se vestem pra seduzir, mas se estiverem interessadas num rapaz (ou noutra mulher) chegam e dizem mesmo.
    Fazem sexo sem culpa, muito melhor.

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