quinta-feira, 9 de março de 2017

Joinville 166 anos - Jordi Castan


Joinville 166 anos - Felipe Silveira


Como será Joinville em 2040?

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Neste 9 de Março, sempre é preciso lembrar da importância ideológica e discursiva que as datas comemorativas possuem para a manutenção do poder de alguns grupos sociais. Como isso já foi feito com brilhantismo dentro e fora das universidades joinvilenses, quero contribuir em outro viés, construindo uma análise sobre o futuro da nossa cidade.

Infelizmente, a cidade de Joinville sempre foi muito previsível. Quando seus comandantes e gestores quiseram ser ousados foi para manter a ordem e a lógica conservadora. Ou seja, para corrigir os rumos em prol da mesmice. Assim, é muito fácil fazer uma previsão de como estaremos em 2040. Os mandatários locais são os mesmos e circulam há décadas pelos mesmos espaços. Esqueçam essa história de 2020, 2025, 2030 ou qualquer coisa assim porque em 10 anos pouca coisa estrutural mudará, ainda que pese a velocidade da inovação tecnológica e seus impactos na sociedade. Ao falar de cidades, preciso lembrar que as suas rupturas são muito mais lentas, que merecem grandes investimentos e uma mudança de vários paradigmas, e isso está muito longe de termos por aqui, convenhamos.

Bilbau, na Espanha, é um exemplo de como o arrojo transformou a cidade (e seus habitantes) em 15 anos
A análise do futuro passa, portanto, pelo que será e o que poderia ser (focarei agora apenas no primeiro). A aprovação da Lei de Ordenamento Territorial nos dá uma grande oportunidade de entendermos como nosso espaço estará organizado pelos próximos anos. Pouco irá mudar, ainda mais devido ao espraiamento urbano provocado pelo aumento do perímetro urbano, a hype capitaneada pelos empresários visando a expansão para a zona sul e o adensamento burro nas regiões mais centrais, pois lá estarão os prédios de luxo da cidade e com menores densidades (apesar da verticalização dar ideia de que estará adensando).

Com isso, e somado a algumas políticas ultrapassadas de mobilidade urbana, pouco mudaremos para melhor em nossa forma e conteúdo. A Joinville do futuro terá suas periferias aprofundadas, com um distanciamento ainda maior da "cidade oficial", esta acessível apenas para os mais ricos. Surgirão novos bairros e novas localidades ainda mais distantes do centro e muito mais pobres. Por mais que os governos invistam em segurança, uma cidade desigual só tende a aumentar o número de crimes violentos. Copiamos um modelo perfeito que levou à destruição da qualidade de vida das grandes metrópoles brasileiras.

Já Elvis!
Sem contar a necessidade feroz para aquisição de um automóvel, as seguidas brincadeiras com a despoluição do Cachoeira, as poucas áreas de lazer (se o "parque" da cidade, para sair do papel, levou sete anos, como esperar alguma coisa maior e mais rápida?) e o pensamento desonesto de que a vocação de Joinville é industrial e por isso não precisamos da diversidade econômica e de pensamento. A UDESC em 50 anos pouco ampliou sua oferta de cursos e estamos há onze tentando fazer um puxadinho de campus da UFSC na curva do arroz. O Carnaval é perseguido. Os movimentos sociais excluídos (que diga o Conselho da Cidade) e criminalizados.

Joinville não se desenvolve. Rasteja. Mendiga. Chafurda. Contenta-se com pouco. Retrocede. E só os de sempre saem ganhando.

Eu não tenho dúvidas que as estruturas da cidade de Joinville serão as mesmas que temos hoje. Se não houver nenhuma mudança drástica, certamente elas serão ainda piores, porque o modelo adotado por aqui já deu errado em várias outras localidades. Ainda temos a mesma cara, os mesmos valores e as mesmas opções de 30 ou até mesmo 40 anos atrás. Como acreditar que, nos próximos 20, a cidade será diferente, e com a projeção de 900.000 habitantes de brinde?

Cenas como essa, do Juquiá, continuarão existindo 
Os donos do poder não vão deixar nada original acontecer, podem apostar. Será uma cidade para o trabalho dito como "produtivo", aquele manufatureiro e que faz "Joinville ser o que é". Para eles, sempre foi preciso manter a "vocação" ou, melhor dizendo: manter a cidade do jeito que está porque assim o poder também estará mantido em suas mãos brancas, preconceituosas, centrais e masculinas. Os mesmos que te dizem que o 9 de Março é importante e o 20 de Novembro, não. Ainda bem que não acredito mais nisso. E nem no conto de fadas que a cidade irá melhorar.

Os poucos lutadores que restaram são limitados por uma grande barreira invisível e que está presente nas almas e consciências daqueles que mandam. Segundo um empresário local, "gente assim não há de prosperar por aqui". Morreremos no mesmo quintal sujo e hostil de outras primaveras?

quarta-feira, 8 de março de 2017

Vozes no feminino


O ecofeminismo, os ciclos e Dona Iraci

 POR RAQUEL MIGLIORINI
Hoje é comemorado mundialmente o Dia da Mulher. O Google nos lembra disso, as manchetes de jornais, mensagens nas redes sociais, e inúmeros “parabéns”. Como em todos os anos, tenho a sensação que corre uma história paralela a esse dia e que as homenagens do dia 08 de Março foram criadas para ofuscar essa outra face. Uma parte importante do dia de hoje é a luta das mulheres pela igualdade, respeito, valorização e, principalmente, pela liberdade dos grilhões que nos aprisionam em papéis determinados por homens e perpetuados culturalmente pela maioria das mulheres. E essa luta é longa e árdua.

Mas a história paralela nos mostra que é preciso a luta pelo feminino, que foi desvalorizado pela cultura contemporânea por ser associado à fraqueza, desespero, histeria, etc. E ele é exatamente o oposto disso. Um movimento que retrata bem o que quero dizer é o Ecofeminismo, que mostra o quanto homens e mulheres podem se ligar à Natureza se deixarem o feminino transbordar.

As mulheres perceberam isso mais cedo por terem ciclos, como os ciclos ambientais, e também porque a elas coube o cultivo da terra por milhares de anos. Ao migrarem para as cidades, trouxeram os jardins e as hortas urbanas para suas casas. O equilíbrio ambiental é entendido pelo feminino como fundamental para a qualidade de vida familiar. A preservação da Natureza, para o feminino, contrapõe o masculino que só vê no ambiente natural um local de exploração e dominação, com o único objetivo de conseguir dinheiro e poder. Dominar a natureza e as mulheres passa a ser sinônimo.

Em Joinville temos excelentes exemplos de mulheres que tiram o sustento de suas famílias em trabalhos que minimizam os impactos ambientais. Uma grande mulher é a Dona Iraci, do Paranaguamirim, que começou a primeira cooperativa de materiais recicláveis. Essa mulher conseguiu a construção de uma horta para os moradores locais e a cooperativa gerou renda para mais de dez famílias. A sabedoria dessa mulher e a forma feminina de ver o mundo é cativante. Outros exemplos são vistos na área rural, onde mulheres transformam a colheita de suas lavouras em produtos coloniais de excelente qualidade ou ainda, mulheres que tecem em conjunto para completar a renda familiar.

A luta paralela ao dia de hoje deve mostrar o quanto as mulheres tem se afastado da natureza e com isso se deixam dominar por um lado masculino muito forte, competindo de forma agressiva e devastando o Meio Ambiente com um consumo desenfreado. Em contrapartida, homens que afloram o feminino cuidam da terra, do ambiente natural, dos animais humanos ou não.

Talvez, quando as desigualdades diminuírem, quando os corpos das mulheres não forem mais violentados, quando a valorização for pela vida, independente do sexo, chegaremos perto do equilíbrio entre o feminino e o masculino e entre o ser humano e o ambiente natural.

terça-feira, 7 de março de 2017

Dia das mulheres: da luta ao consumo

POR SORAYA BARRETO
Embora algumas autoras tenham desmitificado o episódio que envolveu mulheres queimadas vivas numa fábrica inglesa, a data que marca o “Dia Internacional das Mulheres” é um dia de luta e reflexão sobre direitos, conquistas e perdas para mulheres ao redor do mundo. O 8 de Março é para todas nós necessário pelos diversos tipos de opressões e violências ainda vivenciadas pelas mulheres, em um suposto estado de direitos, até hoje. No dia em que nós, mulheres, formos verdadeiramente tratadas como iguais poderemos celebrar essa data, transformá-la em uma comemoração, por enquanto, ainda é uma dia à refletir, protestar e lutar.

Notamos desde as flores e chocolates, até as campanhas de cosméticos que a data vem ganhando uma significação capitalista esvaziada de seu verdadeiro teor. O 8 de março começou a ser explorado de forma comercial no inicio da década de 90. Muito diferente do real sentido concebido em 1910, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, na Dinamarca. A resolução propunha a criação de uma data anual para o debate dos direitos da mulher, e o objetivo era refletir sobre as lutas femininas e dessa forma obter suporte para conquistar o sufrágio universal.

Os Feminismos devem ser entendidos como movimentos sociais e populares que estão em luta, denunciando as diversas formas de opressão contra as mulheres, principalmente na lógica social que combina patriarcado e capitalismo. Este se fundamenta no incentivo ao consumo orientando a vida e as relações de poder, sendo fácil perceber a expansão da mercantilização em todas as suas dimensões. Sentimos este impacto especialmente com a exploração do corpo das mulheres e ao incentivo aos ditos papéis sociais, instituídos socialmente para as mulheres em “lugares domesticados” e inferiorizados.

Como exemplo, podemos citar a atual campanha da livraria Saraiva que lançou recentemente uma campanha para a “comemoração” desse dia de luta, promovendo 50% de desconto na compra de livros. Entretanto, o site da livraria disponibiliza apenas alguns títulos e temas específicos: “Os livros foram divididos nas categorias femininas: com atitude, românticas, que se cuidam, fashionistas, religiosas, que gostam de dançar, que fizeram história, mamães, de negócios, organizadas, geeks, conectadas, que curtem boa música ou que amam filme com pipoca”. Afinal de contas é assim que somos vistas, como cuidadoras, vaidosas e mães, com gêneros literários relacionados ao que se chama de “universo feminino”. O desconto não é válido para as áreas de exatas como Contabilidade e Engenharias, nem de saúde como as Ciências Biológicas, Medicina e muito menos Tecnologia. Fica claro o lugar da mulher e a ótica do consumo feminino pelas marcas. 

Conquistamos muito na ordem jurídica, mas ainda nos falta tanto para o real sentido de equidade social e a sua vivencia de forma plena. E contra esse esvaziamento do real sentido da data, pela crescente violência contra as mulheres e as perdas de direitos conquistados, iremos parar no dia 8 de março. 

É imatura e arcaica a forma como as marcas dialogam com as mulheres. Falta consultoria de gênero, estratégias que dialoguem com a equidade de gênero.



Soraya Barreto é professora Adjunta da Universidade Federal de Pernambuco, Coordenadora do Curso de Publicidade e Propaganda UFPE e Coordenadora do OBMÍDIA - Observatório de Mídia: Gênero, Democracia e Direitos Humanos da UFPE

segunda-feira, 6 de março de 2017

Semana da mulher no Chuva Ácida: queremos ouvir as mulheres!


Iniciamos hoje uma série especial de posts com reflexões sobre a Semana da Mulher.

Embora várias conquistas de equidade de gênero tenham sido alcançadas, elas ainda são insuficientes e estão sempre sob ameaça. No geral, as mulheres continuam a cumprir tripla jornada, são frequentemente preteridas em contratações ou promoções por serem mães ou terem o potencial de engravidar, recebem menos que os homens nas mesmas funções, e sofrem assédio moral e sexual com mais frequência.

Em média 13 mulheres são assassinadas por dia no Brasil, a maioria vítima de companheiros, ex-companheiros ou homens próximos. A especificidade desse tipo de crime é a dependência econômica, emocional e/ou social das mulheres em relação a seus agressores, que dificulta o rompimento do ciclo de violência.

Outro dado alarmante (e subnotificado) é que uma mulher é estuprada no Brasil a cada 11 minutos, muitas vezes dentro de casa. A cultura machista naturaliza o assédio, e pesquisa realizada pela ONG Think Olga mostra que meninas sofrem o primeiro assédio em média aos 9,7 anos de idade.

A violência obstétrica é comum e consiste em negar à gestante/parturiente o direito à informação e a decidir sobre seu corpo, o que gera marcas físicas e emocionais permanentes. Por outro lado, um número absurdo de mulheres morrem ou ficam incapacitadas em virtude de abortos clandestinos, ignorando-se que o aborto, antes de ser uma questão moral pessoal, é um problema de saúde pública.

O 8 de março converteu-se nos últimos anos em uma data comercial, mas a data surgiu no contexto da luta pelo direito ao voto e por melhores condições de vida e trabalho, e é uma oportunidade para refletirmos sobre nossas demandas por segurança, respeito e dignidade.

Este ano, mulheres em dezenas de países vão aderir à Greve Internacional de Mulheres (1), abraçando causas como a campanha argentina “Ni Una Menos” (2). No Brasil haverá manifestações em mais de 30 cidades, criticando principalmente a reforma da previdência proposta pelo governo Temer.

O Chuva Ácida faz um esforço constante para ser um espaço de opinião plural e diverso e uma alternativa à grande mídia. Estamos bastante satisfeitos em termos hoje 4 autoras permanentes e convidadas ocasionais.

Nesta semana em especial, convidamos nossas leitoras a deixar um comentário sobre como a cidade de Joinville pode ser mais segura e acolhedora para as mulheres, em termos de políticas públicas, serviços públicos (creches, escolas, equipamentos de saúde), mobilidade (transporte público, intermodais), segurança (delegacias especializadas, segurança e iluminação nas vias públicas), trabalho, etc.

Nós do Chuva Ácida queremos ouvir as mulheres!



(1) http://brasil.elpais.com/brasil/2017/02/10/estilo/1486744741_095547.html
(2) http://niunamenos.com.ar/

Abandonai toda esperança


POR JORDI CASTAN


"Abandonai toda esperança". A frase escrita na entrada do inferno de Dante e que dá título a este post pode até parecer dramática demais. Mas reflete com precisão o que nos espera no futuro imediato. Que sejamos cientes disso, que possamos descrever em detalhe o que vai acontecer (ou no caso de Joinville, o que não vai acontecer), tampouco poderemos evitar que nada aconteça de novo. De nada serve alimentar teimosamente a esperança de uma mudança ou de uma ação que não virá. Aqueles que insistem em alimentar esta esperança colherão como resultado uma frustração ainda maior.

A debilidade dos políticos, por um lado, e o sentimento de impotência da sociedade frente à situação atual, por outro, leva a sociedade à desesperança e ao derrotismo. O quadro atual se agrava pela soma de dois fatores que são ruins e quando unidos tornam-se ainda mais perversos. O primeiro é o baixo nível, a inépcia e falta de uma visão estratégica dos políticos locais. O segundo é a incapacidade dos governos de prestar os serviços básicos que são a sua responsabilidade e competência.

O resultado desta situação é o abandono de uma a uma das funções que deveria realizar, e de fato realizava, ainda que de forma precária e com qualidade duvidosa. A Prefeitura insiste, teimosamente em se sustentar na promessa de desempenhá-las e continuar cobrando os impostos e as taxas correspondentes aos serviços que gradativamente tem deixado de prestar. 

Incapaz de oferecer segurança, saúde e educação de qualidade, o governo joga para os cidadãos a responsabilidade de buscar suas próprias soluções. Assim, as residências se convertem em verdadeiras fortalezas, a saúde privada ocupa o espaço que deveria ser da saúde pública e, quem pode, busca escolas particulares para oferecer uma educação melhor para seus filhos. O que vivemos é a falência do Estado e o florescimento do individualismo mais feroz. Nem para tampar os buracos nas ruas e prefeitura tem equipes próprias. Hoje são todas contratadas.

Não há calceteiros, nem jardineiros e nem a limpeza das ruas é feita por funcionários públicos. Mesmo assim, a Prefeitura é hoje a maior empregadora de Joinville. Num quadro assustador e preocupante. Uma empresa sem dono, que cresce vegetativamente mais do que o crescimento econômico da cidade a que tem a obrigação de servir. A Prefeitura tem se convertido num fim em si mesma. Dirigida por políticos medíocres, incapazes de entender a gravidade da situação, permanece sem tomar as medidas necessárias para reverter um quadro, que já faz tempo escapou do controle.

Somos hoje uma sociedade impotente conduzida por um comandante, que não sabe aonde quer chegar, vagando sem mapa e sem os instrumentos que lhe permitiriam achar o rumo certo. 

sexta-feira, 3 de março de 2017

Fernando Krelling: um projeto fora de prazo

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
O jornal A Notícia publicou, esta semana, uma reportagem sobre os projetos de lei apresentados pelos vereadores já neste ano. Há uns interessantes, outros nem tanto. Mas chamou a atenção uma proposta do vereador Fernando Krelling, que tem o propósito defender os interesses dos consumidores. O projeto é bem intencionado, mas resvala para demagogia. Parece que o vereador está a legislar sobre o erro e uma percepção fraca sobre os direitos do consumidor.

Por quê? Diz o jornal que “o projeto de lei 22/2017, do vereador Fernando Krelling (PMDB), garante ao consumidor que comprar produto ou serviço com prazo de validade vencido o direito de receber gratuitamente do fornecedor um produto idêntico ou similar em condições próprias para consumo. A troca poderá ser realizada apenas mediante apresentação da nota fiscal de compra”. Não é intenção ensinar o legislador a legislar, mas o projeto parte de um pressuposto errado.

Ora, se um produto tem prazo de validade não estamos a falar de bicicletas, enxadas ou canecas. A questão é de segurança alimentar. É inconcebível, em pleno século 21, imaginar que algum estabelecimento comercial venda produtos alimentares fora do prazo de validade. Então, não seria mais adequado exigir uma fiscalização efetiva por parte das autoridades responsáveis? Que tal atalhar a questão e criar uma lei que obrigue as autoridades a garantirem a segurança alimentar da população?

Eis a questão. Antes de procurar qualquer solução, o melhor é conhecer bem o problema. E neste caso o problema não é o reembolso do consumidor, mas a segurança alimentar. O projeto de lei deveria estar focado nesta garantia. Não pode haver produtos com prazos de validade vencidos à venda. E as autoridades responsáveis têm que cumprir essa função de defesa da saúde dos cidadãos. É um projeto de lei municipal. Mas se é para ficar no município, não seria mais eficaz um projeto a exigir medidas da Prefeitura?

Mas (porque há sempre um mas) temos um problema de fundo. O projeto legisla sobre o atraso e, do ponto de vista prático, não resolve qualquer problema. E para piorar as coisas, cria um problema para a Prefeitura. Afinal, sendo uma lei municipal, cabe ao município garantir o seu cumprimento. E se hoje a fiscalização é deficiente em outros setores, imaginem garantir o cumprimento de regras de segurança alimentar. Ou seja, é um presente de grego (e não é iogurte).

Fica a dica. Na Europa, por exemplo, a ideia nem passa pela cabeça dos consumidores. Produtos fora do prazo de validade vão para o lixo. Aliás, para que os comerciantes evitem prejuízos maiores, uma diretriz europeia determina que os estabelecimentos comerciais possam vender esses produtos por preços promocionais antes do fim do prazo. Antes. A condição é haver a indicação “aproximação do fim do prazo de validade” (ver foto) para informar o consumidor.

Uma coisa interessante. Falei com algumas pessoas de Joinville a respeito e, para meu espanto, notei um certo conformismo. “Ninguém vai fiscalizar, então é melhor trocar que nada”. O problema é cultural. Muita gente passou a achar que é normal viver num ambiente de exigências mínimas. Mas quando estamos a falar de segurança alimentar, não dá para engolir.

É a dança da chuva.


Na Europa, quando um produto está próximo do fim do prazo, ele é vendido a preços promocionais. Se chega ao prazo final, é retirado do mercado.


Mulheres assediadas no Carnaval - e no resto do ano



POR CECÍLIA SANTOS
Desde 2013 o Carnaval de rua de São Paulo tem se tornado uma grata e animada surpresa, como resultado do reconhecimento, pela gestão anterior, do impacto cultural, econômico e turístico dos blocos de rua. E mesmo diante das tentativas da gestão atual de limitar o tamanho dos blocos, este ano houve 28% mais blocos do que ano passado, estima-se que o número de turistas tenham triplicado, e alguns blocos chegaram a levar mais de 350 mil pessoas às ruas.

Diversas campanhas de combate ao assédio foram veiculadas antes e durante o Carnaval, muitas delas pelos próprios blocos. A gestão Doria, que desmontou as estruturas de Políticas para Mulheres, começou a veicular uma campanha totalmente equivocada que dizia que, em caso de assédio, “o negócio é deixar pra lá, porque briga não está com nada”. Diante das críticas nas redes sociais, a prefeitura rapidamente tirou a campanha do ar e pediu desculpas pelo fiasco.

Mesmo assim, várias notícias de violência contra mulheres foram noticiadas durante o Carnaval de 2017. Na Lapa, RJ, uma folião foi agredida com dois socos no nariz depois de discutir com um sujeito que a apalpou (1). Em BH outra mulher foi agredida depois de ser assediada e ameaçar chamar a polícia (2). Em Linhares, ES, uma jovem foi estuprada durante o Carnaval (3). E a mais inacreditável de todas as notícias: mulheres que faziam campanha contra o preconceito em blocos no Rio foram agredidas e precisaram ser substituídas por... homens (4)! Fala se isso não é vergonhoso?

Eu mesma presenciei uma cena no metrô de São Paulo no sábado e acabei interferindo. Quando entrei no vagão, já havia um grupo de rapazes que se comportavam como bichos na dança do acasalamento, emitindo gritos tribais e fazendo flexões de braço nas barras do vagão. Alguns deles assediavam duas garotas num canto do vagão, pedindo beijos. Uma delas cedeu. A outra se encolhia no banco. Levantei e fui lá, a tempo de ouvir um dos 3 marmanjos exigindo que ela escolhesse qual deles beijaria. Disse pra ela bem alto: “você está precisando de ajuda? Saiba que você não é obrigada a beijar ninguém se não quiser”. Na mesma hora os valentões recuaram, já se acusando: “ninguém aqui está assediando ninguém não!” É, eu estou vendo. 

É realmente absurdo que as mulheres não possam se divertir despreocupadas no Carnaval. A campanha do #PrimeiroAssédio realizada pelo coletivo feminista Think Olga (5) contabilizou mais de 82 mil compartilhamentos da hashtag que reproduziu histórias pessoas e revelou que a idade média em que mulheres sofrem o primeiro assédio é aos 9,7 anos.

Não é por causa do Carnaval. É simplesmente porque parte dos homens aparentemente não sabe se controlar e respeitar as mulheres.