quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016
Carta aberta para o Aladdin: Fuja do mico!
Odiado por alguns, apreciados por outros, o carnaval, a tradicional festa do povo, aconteceu. Dentro de todas as problemáticas apontadas na festividade, a mais desprezada foi o racismo.
Todos os temas levantados no ano passado foram ignorados e, mais uma vez, tivemos que ver mulheres negras servindo de fantasias e a pele negra sendo ridicularizada com o blackface. Fora isso, de lambuja, tivemos que ouvir, em rede nacional, de uma subcelebridade branca, que o cabelo da Ludmilla (cantora negra) parecia Bombril.
Mas o que mais chamou atenção foi a foto de uma família formada por pais brancos e um filho negro curtindo o carnaval fantasiados como os personagens do filme Aladdin, da Disney.
Ao colocar uma criança negra nas costas muitos negros e negras interpretaram que os pais quiseram representar um macaco (Abu), personagem do filme. Alguns saíram em defesa dos pais e afirmaram que o menino estava vestido de Aladdin (protagonista), com a mesma fantasia do pai, mas em uma tentativa de retratação, no Facebook, o pai do garoto confirmou que o que filho estava fantasiado de macaco: “Muitos podem ver um macaco na fantasia de ontem. Eu vejo o melhor amigo do Aladdin, que vai conhecer o Mundo Ideal com ele e a Jasmine”.
Acontece que associar um negro a um macaco é sim racismo, por mais que a sua intenção fosse das melhores não tem como desassociar o personagem da realidade política, social, econômica e cultural do nosso país. E outra, no filme, o macaco Abu é retratado como cleptomaníaco, praticando pequenos furtos no decorrer da trama, enquanto Jasmine é uma princesa e Aladdin o moço pobre, mas com o coração puro. Todas essas informações só dão maior carga as críticas apresentadas pelos negros e negras.
Não quis me pronunciar até entender todo assunto, mas vendo a nota escrita pelo pai do menino, senti a necessidade de tentar aprofundar um pouco mais sobre a temática racial para a família.
Além dessa informação, o pai e responsável pela caracterização informou que o menino negro era adotado. O rapaz pediu desculpas para quem se sentiu ofendido e disse que não foi essa a intenção (nunca é). Informou que era artista de teatro e ousou dizer que as páginas que denunciaram a fantasia estavam descontextualizadas. Bem, como disse acima, quem está distante da realidade do país não somos nós. Desde pequenos ouvimos tal comparação e lutamos diariamente para acabar com isso. É ofensivo demais e não podemos mais reduzir isso a um simples erro de interpretação.
Gostaria de lembrar que adotar uma criança negra, casar-se com uma pessoa negra ou ser amiga de uma pessoa negra não impede de ser racista.
Acho louvável a atitude de adotar uma criança (opinião pessoal), mas acredito que é preciso ter muito mais do que boa vontade para se ter um filho – isso vale para os pais biológicos também. É preciso, antes de tudo, ter sensibilidade e humildade para aprender. Vejo uma certa preocupação dos pais sobre o que ensinarão para os filhos, mas não vejo uma grande preparação para o que aprenderão com os pequeninos.
Se tratando de adoção, essa sensibilidade e humildade são ainda mais necessários. Entender e saber tratar de assuntos como a rejeição não é tão simples assim. Para uma criança negra, além desses casos, é preciso falar sobre racismo. E não adianta achar que não tocando no assunto, esse tema nunca aparecerá. A diferença de tratamento, os olhares, o diálogo… Várias ações farão seu filho perceber que há um abismo entre ele (negro) e vocês (brancos) e se essa sensibilidade e humildade não forem trabalhadas com frequência será difícil entender as dificuldades apresentadas pela criança, detectar o problema e tentar encontrar a solução.
Neste momento pode parecer confortável ouvir as palavras dos amigos minimizando o problema em comparar uma criança negra a um macaco. Mas o problema não acaba por aí. A responsabilidade com o filho é para a vida toda. Os danos psicológicos podem ser grandiosos se você tentar reduzir ou descartar algum problema racial que o seu filho enfrente, principalmente na fase de construção da identidade dele. E acredito que aqui, apenas o amor não seja capaz de dar suporte. É preciso conhecimento, politização.
“Realmente o meu filho Mateus vai me ensinar muito como nos blindarmos do preconceito na cabeça das pessoas”.
Com certeza. Se você tiver a sensibilidade e a humildade de conhecer e apresentar todo o universo negro para o seu filho desde a infância, ele se tornará uma grande pessoa e saberá trilhar o próprio caminho com segurança, sabendo quem é, de onde veio e para onde pode ir. Mas sem a humildade de reconhecer o próprio erro, como o racismo – que mesmo sendo involuntário, continua sendo racismo – ficará ainda mais difícil de trilhar todo esse caminho.
Acredito que o contato com os movimentos negros e a leitura de grandes obras que tratem do assunto poderão contribuir muito para a criação do seu filho que uma hora ou outra vai querer saber mais sobre a sua história e procurará ícones que se pareçam com ele e que façam sentir orgulho de quem ele é e de como ele é.
Você poderá apresentá-lo as maravilhosas obras de Cartola, Jovelina, Jamelão, Nelson Sargento, Simonal, Pixinguinha. A grande história e contribuição política de Abdias do Nascimento e Leci Brandão. A coragem de Carlos Marighella. A luta de Zumbi, Dandara, Ganga Zumba, Tereza de Benguela. A genialidade de Ruth de Souza, Zezé Motta, Grande Otelo, Machado de Assis. A enorme contribuição de Lélia Gonzalez. Poderá incentivá-lo a ouvir as letras contundentes dos Racionais MC’s e Facção Central. Poderá contar as histórias de lutas por direitos civis e igualdade racial em outros países, como nos EUA e na África do Sul. Contar a história de líderes como Martin Luther King, Angela Davis, Malcolm X, Nelson Mandela. Histórias e ícones negros que nem sempre nos são apresentados nas escolas e nas universidades.
Adotar uma criança negra não te garante um lugar no céu, mas certamente lhe fará conhecer histórias, lugares e pessoas impressionantes, ajudando a desconstruir o seu preconceito e, principalmente, ajudando seu filho a construir a própria identidade.
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016
Udo quer ganhar de qualquer jeito
POR FELIPE SILVEIRA
Primeiro Udo Döhler vem a público para dizer que decidiu não contratar uma turma de médicos residentes para o Hospital São José, de modo que economizaria R$ 1,3 milhão aos cofres municipais. Ou seja, o prefeito/empresário se valeu de uma notícia ruim (menos médicos no hospital) para fazer uma propaganda boa de si mesmo, vendendo a imagem de “gestor”.
O anúncio, obviamente, repercutiu de maneira negativa para a prefeitura. Afinal, cortar profissionais da saúde pública, ajudando a precarizá-la, é exatamente o contrário da ideia que sua campanha eleitoral vendeu. A prioridade, diziam, era justamente a saúde, a especialidade do empresário que se candidatava ao executivo.
Diante das críticas, Udo vem a público novamente para explicar que não existiu corte algum. A prefeitura se apressou para esclarecer a “confusão” que os outros estavam fazendo. De fato, não houve demissões dos atuais residentes. Apenas não existiu a contratação de 38 novos, de uma turma de 56 que estava prevista para chegar. Ou seja, 18 serão contratados, informação que não constava na primeira nota divulgada pela prefeitura.
Ora, mas se não houve corte algum, não existiu economia alguma, conforme Udo propagandeou na primeira vez que veio a público, certo? Se houve o corte, então houve economia. O prefeito precisa decidir qual das propagandas quer fazer. Não pode simplesmente vender duas imagens que se contradizem. Ou ele cortou e economizou ou ele não cortou e consequentemente não economizou.
Eu acredito que houve o corte, pois a contratação dos residentes estava prevista e era aguardada por outros profissionais do São José. Os médicos residentes estão em fase de conclusão de curso, de modo que sua atividade é supervisionada por outros médicos. Eles fazem uma diferença enorme no atendimento à população, pois fazem as atividades que os médicos fazem, a um custo muito menor.
A indignação é geral dentro do maior hospital da região. Como os residentes tocam boa parte do trabalho médico, a previsão é terrível. Para quem vendeu a imagem de especialista em saúde, do homem que ia resolver o caos, essa é uma economia que não vale a pena.
terça-feira, 9 de fevereiro de 2016
Os maiores marxistas do mundo
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Um é marxista e tende para o marxismo. O outro
também é marxista, mas pende para a anarquia (não confundir com anarquismo).
Viveram em tempos diferentes e já foram desta para... para lugar incerto. Um
era ateu e não acreditava nesse papo de vida após a morte. O outro não levava
essa coisa de morrer muito a sério. Mas vamos ficcionar* um encontro entre dois
dos maiores marxistas da humanidade: Karl Marx e Groucho Marx, numa mesa de
bar.
Karl Marx – Senta aí,
Groucho. Queres beber alguma coisa? Comer um bife? Ou és vegetariano?
Groucho Marx – Não sou
vegetariano, mas como animais que são. E aviso que não pago. Pagar a conta é um
costume absurdo.
Karl – Sempre o
dinheiro. A propriedade privada tornou-nos tão estúpidos e limitados que um
objeto só é nosso quando o possuímos.
Groucho – Vê-se que
morreste pobre. Sabes que o segredo do sucesso é a
honestidade. Se conseguires evitá-la, não tem erro...
Karl – O
dinheiro é a essência alienada do trabalho e da existência do homem.
Groucho – Tens
razão. Há muitas coisas na vida mais importantes que o dinheiro. Mas custam
tanto.
Karl – O dinheiro não é tudo. E, cá para nós, o
declínio da sociedade burguesa é inevitável. Por que não te juntas aos
comunistas?
Groucho –Não entro para clubes que me aceitam como sócio.
Karl – Sabes
que o capitalismo gera o seu próprio coveiro.
Groucho – Não fales
em coveiros. Eu pretendo viver para sempre... ou morrer tentando.
Karl – Tenta
entender. O comunismo não é para nós um estado que deve ser
estabelecido, um ideal para o qual a realidade terá de se dirigir...
Groucho – Ora,
estes são os meus princípios. Mas se não gostas deles, eu tenho outros.
Karl – A
revolução é o motor da história. Podes crer...
Groucho – Ok... todo mundo precisa crer em algo. Portanto,
creio que vou tomar uma cerveja.
Karl – Tens uma
falta de fé muito sólida. Mas lembra: tudo o que é sólido desmancha no ar.
Groucho – Então
vamos beber a tal cervejinha, que é líquida. E fazer um brinde às nossas
esposas e namoradas: que elas nunca se encontrem.
Karl – O meu
casamento com a Jenny sempre esteve acima dessas coisas.
Groucho – O
casamento é uma bela instituição. Naturalmente, se você gostar de viver numa
instituição. Aliás, eu fui casado por um juiz... devia ter pedido por um júri.
Karl – É isso.
Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua
escolha...
Groucho – Ahã. Karl, tu andavas na política, vivias sempre
fora de casa, no exílio e até na cadeia... e tiveste seis filhos? Ah... e
tiveste tempo para engravidar a empregada? Se trabalhasses em casa...
Karl – Ei, eu nego essa coisa da empregada.
Groucho –Também
corri atrás de uma garota por dois anos, apenas para descobrir que os gostos
dela eram exatamente como os meus: nós dois éramos loucos por garotas. Eu sou
solidário, Karl.
Karl – É... o
caminho do inferno está pavimentado de boas intenções.
Groucho – Boas
intenções? Tu não assumiste a criança. O Engels é que perfilhou o moleque.
Aliás, esse sim é um amigão...
Karl – É um companheiro de luta. Os filósofos
limitam-se a interpretar o mundo de diversas maneiras, mas o que importa é
modificá-lo. Engels percebeu isso. E fez muito por mim.
Groucho – Mas é como eu sempre digo: ninguém é completamente infeliz diante do fracasso do seu melhor amigo.
Karl – Olhaê... vou nessa. Prazer em conhecer, Groucho.
Groucho – Prazer? Ora… conheço Groucho há anos e não tive
prazer nenhum nisso.
Um Marx é pouco.
Dois é bom. Três é um trio.
sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016
Até quando cabeças vão rolar por falta de prioridade para cultura, educação e lazer?
POR SALVADOR NETO
Joinville ficou horrorizada esta semana com a decapitação de um jovem de 16 anos no bairro Jardim Paraíso, comunidade já estigmatizada como lugar de alta violência e tráfico de drogas. Afinal, a polícia ainda não sabe quem cometeu a barbárie, não sabe onde está o corpo, e tampouco se o jovem foi realmente assassinado no bairro. E mais: em que pese o comando do governo Colombo trocar comandantes da polícia civil ou militar, o que não muda é a essência, ou seja, a falta de efetividade na investigação. Se a polícia sabe de gangues, etc, porque não coíbe e prende? Mistérios para um Sherlock Holmes provinciano desvendar!
Mas, para além da alta criminalidade que não vem de hoje na maior cidade catarinense, há aspectos que a elite empresarial, social e política joinvilense não gosta de tocar. Nossa juventude está à mercê dos chefes do crime por pura falta de oportunidades culturais, de lazer, de esportes, de inclusão no mercado de trabalho que lhes garantam uma vida digna, saudável e longe do mundo das drogas, do tráfico, das ruas que engolem esses adolescentes para o dinheiro fácil. A Prefeitura de Joinville – governo Udo Döhler do PMDB cortou recursos para a única festa popular, o carnaval. Preferiu gastar na festa alemã Bierfest, que não deu em nada.
Enquanto a cultura, a educação integral,
o lazer e os esportes não forem prioridades para os governantes, a grana gasta
em segurança com câmeras, mais soldados, viaturas – e é sempre bom lembrar que
é o nosso dinheiro suado que paga tudo – servirão apenas para agradar a elite
assustada que mora em áreas centrais, longe da periferia que assiste essas
barbáries em frente às suas casas, causar “sensação” de segurança e fonte para
imagens para lindos vídeos de propaganda dos “governos” atuantes que temos
(??).
Em mais um lance que exemplifica o que
digo, que mais lazer, cultura, educação não são prioridades, o governo Udo
Döhler desistiu da construção de um Ponto de Cultura com recursos já garantidos
pelo Governo Federal da ordem de R$ 1,2 milhão, que seria construído no bairro
Vila Nova, zona oeste da cidade. Irônico é que no mesmo ano de 2015 o vice de
Udo, o advogado Rodrigo Coelho que também preside a Fundação Cultural de
Joinville, anunciou que a obra era uma “prioridade” do governo do PMDB.
Nota-se. E a população também nota. Afinal, prioridade é palavra forte, bonita, mas só da boca para fora.
É lastimável que as lideranças políticas
que se sucedem no comanda da cidade continuem a usar as mesmas práticas
retóricas, discursos bonitos, e práticas iguais a seus antecessores. Este
governo atual se consagra no quesito abandono da cidade, pois carros, ônibus e
bicicletas afundam nos buracos das ruas; as praças e parques que ainda existiam
razoavelmente cuidados, hoje estão largados ao relento e esquecimento;
mobilidade urbana é miragem e outra peça de ficção na propaganda oficial, e
paro por aqui, pois faltaria espaço para elencar o atraso em que nos
encontramos.
Por tudo isso é que, contrariando os
puxa-sacos oficiais e os mal informados, continuo a
denunciar – e isso vale não só para Joinville – que ou a sociedade
definitivamente muda seu modo de agir na fiscalização, acompanhamento e cobranças
de suas lideranças políticas e empresariais (sim, está na hora de deixarem os
pobres subirem os degraus na escala social, pagando melhores salários e
distribuindo lucros), exigindo investimentos em cultura, esporte e lazer de
fato, ou continuaremos a ver cabeças rolando em sacolas, corpos em malas
jogados em rios, mortos perfurados com dezenas de tiros em frente às casas.
A violência se combate com educação,
cultura e lazer. Sem isso, a barbárie chegará também nas casas da elite, e aí
pode ser tarde demais para quem se horroriza pela tv, jornais e rádios. Nossa juventude está literalmente perdendo a cabeça no crime, como vemos em grandes centros, e nós estamos passivos observando o que virá adiante. Que rolem cabeças no poder político via uso do voto
popular e participação efetiva do povo na fiscalização, não mais nas ruas da
cidade que elegemos para morar, viver e criar filhos e netos.
É assim nas teias do poder...
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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016
Clio revisitada
POR VALDETE DAUFEMBACK
A arte de escrever é uma responsabilidade desafiadora de se
expor e de se explicar aos leitores naqueles pontos discordantes, especialmente
quando o mundo celebra o espírito da ambivalência e da intolerância cada vez
mais expressiva. Todos têm algo a dizer, a opinar, mesmo que seja pela visão
alheia descolada de qualquer fundamento que legitime a sua verdade. Para
alguns, significa a consolidação da democracia, para outros, o princípio de uma
nova babilônia.
Esta disposição opinativa multifacetada em universo
polifônico tem seus reflexos nas instituições de ensino, as quais, para
acompanhar as tendências do mercado cultural buscam modelos de aprendizagem que
as tornem modernas, dinâmicas, mas sem perder o prestígio e a segurança de um
modelo pedagógico tradicional. As reformas têm a serventia de ousar um vôo para
alicerçar o futuro e, ao mesmo tempo, moderar a sua intensidade para assegurar
a credibilidade conquistada. Ou seja, é preciso manter ao mesmo tempo asas na
cabeça e chumbo nos pés para equilibrar as duas extremidades e manter sob
controle a ousadia das vorazes tendências e a rigidez do conservadorismo. Assim
ficam a salvo o processo de ensino e suas instituições.
Mas o que caracteriza o ensino? Certamente você já deve de
ter ouvido em palestra motivacional que o ensino é um negócio complexo que
envolve, de um lado, uma empresa com objetivo de vender uma mercadoria
(certificado) e, do outro, clientes que desejam comprar a mercadoria. E no meio
tem um sujeito (o professor) que dificulta essa transação comercial.
Afora esta brincadeira que tenta sutilmente mostrar a
relação do ensino com a lógica do mercado, as instituições, privadas ou
públicas, têm se preocupado continuamente em reformar os modelos de ensino e
seus métodos pedagógicos para acompanhar tendências e modos de vida que, em última
análise, se configuraram como produtos do mercado. Estas reformas são
estratégias para mudar um processo em curso que se esgota em sua própria lógica.
E para não parecer fracasso do sistema se propõe mudanças com novas
nomenclaturas às antigas práticas.
De Pombal a Passarinho, como destaca Lauro de Oliveira Lima (1974)
ao escrever sobre a educação no Brasil, o ensino superior foi “marcado por
concessões e reformulação pouco significativas para atender as populações de
forma geral. O privilégio em geral era para aqueles que já detinham algum ou
certo poder aquisitivo”. Mas o histórico das universidades dificilmente serve
de base para mostrar a validade de programas que estendem vagas a estudantes de
baixa renda e que historicamente foram excluídos da possibilidade de entrarem
no universo acadêmico. Aqueles que detêm o poder econômico continuam a defender
a meritocracia (leia-se a reprodução do poder simbólico), por isso demonizam a
democratização do ensino.
No entanto, a universidade, como uma instituição social e
autônoma, mediante a reestruturação do capital na fase da acumulação flexível
ficou vulnerável à introdução de critérios administrativos e pedagógicos
utilizados por empresas de produção fabril e passou a avaliar a sua gestão por
índice de produtividade. Além do mais, empresas de capital financeiro também
entraram no ramo de ensino (presencial ou à distância) com uma parcela de seus
investimentos para dar “visibilidade ética” aos negócios. Esta estratégia
acelerou a concorrência entre as instituições e projetou a necessidade de
apresentar um diferencial para se manter no mercado.
Diante da concorrência, qual instituição consegue obter
melhores resultados no mercado de ensino? Aquela que tem a melhor proposta
pedagógica? Aquela que tem o melhor marketing? Aquela que tem o preço da
mensalidade mais acessível?
De acordo com Meszáros (2008), não será possível pensar uma
mudança substancial no sistema educacional dentro da lógica de mercado que
reproduz a assimetria social. Neste universo, todas as inovações pedagógicas,
por mais criteriosas que sejam, fazem parte das estratégias de mercado para
legitimar a personificação do capital e a reprodução do poder. E para
acompanhar as tendências neste mundo ambivalente, até mesmo inovações
pedagógicas são criadas por empresas privadas, as quais têm como compromisso de
alcance imediato o lucro e por isso vendem seus pacotes recheados de nuances
técnicas a serem esgotadas até a próxima invenção tecnológica.
quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016
A 4ª Revolução Industrial e a Política Velha
POR VANDERSON SOARES
Já não há mais como negar que estamos vivenciando uma grande revolução no mundo. A 4ª Revolução Industrial, tema do World Economic Forum que ocorreu esse ano em Davos, foi amplamente discutida, bem como analisada dos mais diversos pontos de vista.
Os indícios que diferem esta Revolução em curso de algo pontual são basicamente três: 1) A velocidade. O ritmo de evolução é exponencial, a cada dia surge algo novo; 2) A revolução digital, que é responsável por difundir a informação entre os bilhões de seres humanos, mudando paradigmas e formas de enxergar a vida; e 3) É o impacto efetivo que tem dentro, fora e entre as nações.
O exemplo mais palpável que me vem à mente para exemplificar a força dessa Revolução é a Primavera Árabe, que através das redes sociais as populações do Egito, Tunísia, Líbia, Síria, Iêmem e Barein, conseguiram derrubar ditaduras.
Tal Revolução é pautada na tecnologia, na velocidade com que o conhecimento e a informação se desdobram. Isso inclui biotecnologia, inteligência artificial, robótica e também na forma como enxergamos a vivência em sociedade, como trabalhamos e consumimos. A inovação é a palavra de ordem neste processo, o que era novidade ontem, deixou de sê-la hoje, e assim diariamente.
Os modelos virtuais de compartilhamento cada dia mais efetivos e ambiciosos, é só reparar no Uber, WhatsApp, NetFlix, aplicativos para qualquer coisa, desde monitorar o seu rendimento numa corrida ou para agendar encontros casuais.
E como a Política interfere nisso? Hoje, a nossa política tenta barrar a qualquer custo essa revolução. Você consegue observar o nível de corrupção de uma cidade, apenas vendo o quão resistente um governo é ao Uber, por exemplo. É possível ver a força contrária que um governo da Política Velha tem quando tenta barrar estes frutos da inovação e da tecnologia.
Chegamos num ponto que é preciso decidir se continuaremos a apoiar este modelo velho, feudal e antiquado de política, barrando a inovação e o compartilhamento ou se iremos com força total, apoiar e incentivar este crescimento, esta nova forma de economia, de trabalho e de vida. Esta nova forma de propagar conhecimento e informação.
terça-feira, 2 de fevereiro de 2016
Trabalhar dá muito trabalho
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Gente, estes dias têm sido muito bons. É que estou de férias. No Brasil,
claro. Têm sido dias de relax, cervejinha e muito papo com os amigos (um bando de vermelhinhos). Um tempo
de dolce far niente e de manter o
cérebro a vadiar. Discordo de quem diz que cabeça vazia é a oficina do diabo. Foi
São Jerônimo quem avisou, por outras palavras.
-
Trabalha em algo, para que o diabo te encontre sempre ocupado.
Mas todos sabemos que o trabalho é aquela coisa chata que acontece no
meio da diversão. Aliás, trabalho sempre foi coisa de pobre e em outros
momentos da história foi visto como uma maldição, uma vergonha. É só lembrar
que os nobres, antes da queda do feudalismo, tinham pavor a pegar no duro.
O trabalho é um interessante tema de estudo. E tem muitos analistas críticos,
como Paul Lafargue, genro de Karl Marx (o velho barbudo, para quem a
emancipação do homem viria justo pelo trabalho). Lafargue vê no trabalho – pelo
menos nos moldes capitalistas – uma obsessão esquisita e contra a natureza do
ser humano.
-
Uma estranha loucura se apossou das classes operárias das nações onde
reina a civilização capitalista. Esta loucura arrasta consigo misérias
individuais e sociais que há dois séculos torturam a triste humanidade. Esta
loucura é o amor ao trabalho, a paixão moribunda do trabalho.
Aliás, Lafargue relembra que o trabalho foi um castigo de Deus, com
aquela coisa do “suor do teu rosto”. Não concorda? Pois fique a saber que há
opiniões piores. E atuais. O Grupo Krisis, por exemplo, diz que o trabalho é um
defunto que domina a sociedade.
- A produção de riqueza
desvincula-se cada vez mais, na sequência da revolução microeletrônica, do uso
de força de trabalho humano - numa escala que há poucas décadas só poderia ser
imaginada como ficção científica. Ninguém poderá afirmar seriamente que este
processo pode ser travado ou, até mesmo, invertido. A venda da mercadoria
“força de trabalho” será no século XXI tão promissora quanto a venda de
carruagens de correio no século XX.
Os homens do Krisis pegam pesado. E dizem também que “quanto mais fica
claro que a sociedade do trabalho chegou a seu fim definitivo, tanto mais
violentamente este fim é reprimido na consciência da opinião pública”. Ooops! O
problema é que a coisa realmente vai piorar.
Tenho escrito – mas o tema passa
batido para a maioria – que a Quarta Revolução Industrial (ou Segundo
Renascimento) vai provocar mudanças profundas na vida de todos. A começar
pela questão do trabalho e do emprego, que estão a ser postos em xeque, como
mostra uma pesquisa recente: cinco milhões de empregos a menos (e o Brasil está
incluído no estudo).
Os trabalhos rotineiros tendem ao
desaparecimento, porque as máquinas poderão fazer – e já fazem – muitas dessas
tarefas. Aliás, em muitos casos fazem até onde parece inesperado. Penso, por
exemplo, no caso da escrita, seja no jornalismo ou na publicidade. Hoje há
robôs que produzem textos, apesar de que em condições ainda insipientes. Ou
seja, só os redatores que fizerem alguma diferença – pela criatividade,
conhecimento ou capacidade de inovar – poderão preservar os seus lugares. O certo
é que vai sobrar para muita gente.
É a dança da chuva.
segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016
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