domingo, 5 de maio de 2013

Entre balas e armaduras


POR FABIANA A. VIEIRA

Em novembro meu filhinho fez quatro anos. Rapaz esperto, inteligente, companheiro de todas as horas. Até já me ajuda a lavar a louça. Cuida da irmã menorzinha, de dois, com aquele carinho especial de quem ama, toques suaves, carinhosos. Esse pequeno homem tem uma grandeza humana que lhe reserva um futuro especial.

Para demonstrar todo meu orgulho e amor lhe dei um presente especial. Fui no setor infantil da loja de armas e comprei um rifle Crickett, modelo LR , tiro único de calibre 22, aquela bala pequenina que entra no corpo atingido, faz um buraquinho e depois circula em zigue-zague, destruindo órgãos, produzindo uma hemorragia  interna  incurável. Aqui em casa, você deve saber, há muita caça e as crianças precisam estar preparadas,desde cedo, para utilizar armas.

É por isso que a indústria já vendeu 60 mil desses modelos infantis somente em 2008. Leves, coloridos, considerados armas de brinquedo ou o ¨primeiro rifle¨, como afirma na publicidade o fabricante de armas esportivas Keystone. Até modelo rosa já tem.  Até pensei em dar um para a minha filhinha também.

Seis meses depois do presente....Boom! Uma distração, fui me livrar da gordura da cozinha e pipocou um tiro . Meu filho pegou a arminha e disparou um tiro acidental ou de brincadeira ou de fúria, nem sei, no coraçãozinho da minha filha. Acabou-se a vida da minha pequena, a minha e o futuro do meu filho, traumatizado eternamente pela perda tragicamente brutal da maninha querida.

Isso poderia ser uma história inventada. Mas não é. Aconteceu no Estado americano do Kentucki, no condado de Cumberland e a menina foi Caroline Starks, sobrenome igual ao da fábrica pós-moderna de armamentos bélicos do maior sucesso do cinema no momento, O Homem de Ferro 3.

Particularmente acho uma insensatez armas de fogo. A bancada da bala procura me convencer de que é uma prerrogativa de segurança privada, um direito básico do homem. Bobagem. Um artifício de pólvora aprisionado numa cápsula que, num pequeno toque, dispara uma bola de chumbo com potencial de matar instantaneamente não pode ser uma boa coisa.

Parto daquele princípio civilizatório elementar de que a vida humana é inalienável. Não tenho o direito de matar ninguém. Matar alguém é admitir que me matem. Portar uma arma é ter uma disposição preventiva para o contrário da vida. É admitir peremptoriamente que eu vou matar alguém. É planejar, treinar e adquirir um instrumento de morte. Ou tenho uma arma para não usar? É um enfeite para arrotar medo? Ter uma arma é confessar simplesmente que quer ser um causador de mortes.

Acho insana essa cultura de alimentar crianças com esse instinto assassino. Beira a loucura descobrir que as fábricas fazem rifles azuis, rosas, laranjas, com figurinhas coloridas para as crianças trocarem o bilhetinho da Calói por um ¨não esquece do meu rifle 22¨. O que adianta, depois do estampido, o ¨não sabia que estava carregada¨.....

O pior é quando vejo os pais da Caroline se resignarem: foi uma fatalidade, afirmam - "Deus quis assim". Naquela região norteamericana a caça é farta e, dizem, todos tem arma. Inclusive as crianças. Essa questão cultural (que precisamos em parte muito pequena respeitar), está presente na mentalidade americana. Não é a toa que os jovens compram armas militares pela internet e saem pelo colégio matando coleguinhas e professores. Loucos abandonados por bonitas namoradas descarregam tambores de balas nos novos namorados, nas ex e em si mesmo. Até chefe é perseguido por desempregado inconformado. Dizem que a matança é cultural. Mas qual cultura? A do extermínio?

Aqui no Brasil não é diferente. Os bilionários interesses da indústria bélica inviabilizaram uma política completa de desarmamento. No plebiscito de 2005 venceu o direito da venda de armas. A falta de controle de fronteiras e do comércio legal de armamento abastece a marginalidade e estimula os argumentos da autodefesa, isso tudo diante de uma polícia a paisana. A insegurança cotidiana estimula a cegueira coletiva e o pensamento fascista de que matar é um direito de proteção. Segue o ciclo vicioso violencia, armas e morte.

Realmente fico preocupada quando vou ao cinema ver o lançamento aguardado de um filme como ¨Somos tão jovens¨, obra que resgata parte da história da lendária banda Aborto Elétrico, antecedendo a Legião Urbana, banda que veio do punk londrino e produziu memoráveis clássicos do rock nacional, e sou surpreendida por uma fila gigantesca na bilheteria. A fila era para ver os armamentos da poderosa indústria Stark e a sua armadura biônica de guerra. Do jeito que a coisa vai, um dia retornaremos a idade medieval e todos, para deleite da indústria, usarão uma armadura do tipo Stark.

sábado, 4 de maio de 2013

Um técnico com métodos de treino muito duros

POR ET BARTHES
Mesmo que você não entenda inglês, vai ver as razões para o técnico Mike Rice ser demitido. O homem é uma fera... tem muita pancadaria para cima dos atletas durante os treinos. 



sexta-feira, 3 de maio de 2013

O direito de coçar o saco


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Gente, todas as semanas deveriam ser como esta, com um feriado na quarta-feira. É que além do descanso a gente acaba por ter duas sextas-feiras. É tempo para o relax, para o dolce far niente e para manter o cérebro a vadiar. Mas cabeça vazia é a oficina do diabo. E foi São Jerônimo quem avisou, por outras palavras:
-     - Trabalha em algo, para que o diabo te encontre sempre ocupado.

Em resumo, o santo mandou um tremendo "vai trabalhar, vagabundo". Mas tem uma coisa chata nessa história. Se você acredita que o trabalho realmente dignifica o homem, então a expressão  “arbeit macht frei” (o trabalho liberta) deve soar como música para os seus ouvidos. O problema é que, por uma triste ironia, esta frase estava escrita no portão do campo de concentração de Auschwitz. É uma metáfora a ter em conta nos dias de hoje.

UMA INVENÇÃO DO DEMO - Não tenho dúvidas, caro leitor, de que o trabalho foi uma invenção do demo, o coisa-ruim. Afinal, todo mundo sabe que no paraíso ninguém trabalhava (é por essa razão que o lugar se chamava paraíso). Só depois de Adão e Eva terem sido apanhados no rala-e-rola é que surgiu aquela coisa de "comerás o pão com o suor do teu rosto". Quer dizer, o trabalho foi um castigo imposto ao homem e à mulher por eles terem caído na gandaia.

Aliás, as palavras trabalho (português), trabajo (espanhol) e travail (francês), por exemplo, vêm todas do latim tripallium, que era um instrumento de tortura na Idade Média. Está tudo dito: é uma punição. E o castigo é passarmos 8, 9, 10 ou até mais horas enfiados em ambientes sacais, na companhia de pessoas que não aturamos, a fazer coisas que não gostamos e a ganhar salários que nunca chegam para o que precisamos.

MENOS EM JOINVILLE - Todos sabemos que o trabalho é aquela coisa chata que acontece no meio da diversão. É assim em todos os lugares. Menos em Joinville, claro. Porque quem mora na cidade acaba por se sentir dentro de um livro do Max Weber. O espírito do capitalismo e a “ética” do chão de fábrica são coisas sagradas para os joinvilenses. É o culto do trabalho.

Bem... a esta hora imagino que haja leitores a torcer o nariz e a me chamar de vagabundo (certo, mas sou um vagabundo que trabalha muito). E não deixa de ser divertido que as pessoas nunca questionem a validade do trabalho, que em outros momentos da história já foi visto como uma maldição, uma vergonha. É só lembrar que os nobres, antes da queda do feudalismo, tinham pavor a pegar no duro.

Há umas curiosidades divertidas. O leitor e a leitora sabem, por exemplo, de onde surgiu aquele hábito dos ricos, que esticavam o dedo mindinho sempre que seguravam uma xícara? A coisa vem dos tempos feudais e era um forma que os nobres tinham para mostrar que eram diferentes dos trabalhadores. Por terem as mãos grossas e calejadas do trabalho, os coitados não conseguiam esticar o tal dedinho. Viu? Cabo de enxada também é cultura.

UM DEFUNTO NA SOCIEDADE - Para que o leitor não fique aí a imprecar contra a minha pessoa, não sou eu a questionar o trabalho. E apresento aqui um excerto de um texto de Paul Lafargue, genro de Karl Marx (por sinal, o velho barbudo errou, porque achava que a emancipação do homem viria justo pelo trabalho):

-       Uma estranha loucura se apossou das classes operárias das nações onde reina a civilização capitalista. Esta loucura arrasta consigo misérias individuais e sociais que há dois séculos torturam a triste humanidade. Esta loucura é o amor ao trabalho, a paixão moribunda do trabalho.

Aliás, Lafargue relembra que o trabalho foi um castigo de Deus, com aquela coisa do “suor do teu rosto”. Não concorda? Pois fique a saber que há opiniões piores. E atuais. O Grupo Krisis, por exemplo, diz que o trabalho é um defunto que domina a sociedade.

-       A produção de riqueza desvincula-se cada vez mais, na sequência da revolução microeletrônica, do uso de força de trabalho humano - numa escala que há poucas décadas só poderia ser imaginada como ficção científica. Ninguém poderá afirmar seriamente que este processo pode ser travado ou, até mesmo, invertido. A venda da mercadoria “força de trabalho” será no século XXI tão promissora quanto a venda de carruagens de correio no século XX.

Imagino que muita gente nunca tenha pensado nisso. Mas o trabalho, como o entendemos hoje, logo vai ser apenas uma memória. Quem viver...

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Escola pública não é lugar de oração



POR FERNANDA M. POMPERMAIER



O estado brasileiro é laico. Ponto.


A educação pública brasileira é laica. Ponto.

Laico = secular, por oposição a eclesiástico.
Secular = Relativo ou pertencente ao Estado, em contraposição ao que se refere ou pertence à Igreja. - dicionário Michaelis.

Na prática, isso significa:
1. Neutralidade = os professores não podem influenciar nenhum aluno no sentido da sua religião, em hipótese alguma.

2. Reza = Absolutamente inadmissível realizar orações de qualquer que seja o clero dentro da instituição educacional (mesmo sob o argumento de que é a religião da maioria, até porque não existe propósito em saber a religião da maioria, o que leva ao próximo ítem).

3. É uma afronta à liberdade pessoal e religiosa questionar no momento da inscrição, qual a religião do aluno. Esse é um assunto pessoal que não importa a mais ninguém, assim como a orientação sexual.

4.  A presença de símbolos religiosos, como crucifixos ou imagens, também é um desrespeito à diversidade religiosa, pois induz os alunos a pensar que apenas aquela religião é aceita. Exclui as outras denominações.

5. A instituição educacional é, por excelência, o espaço da ciência e do aprendizado, não pode dar margem à perpetuação de dogmas religiosos.

6. O objetivo da escola é incluir TODOS, não importando o credo. Todas as crianças devem se sentir bem vindas e acolhidas, por isso o ambiente deve ser neutro, de respeito e não de julgamentos.

7. A igreja, o templo, a mesquita, o terreiro, o centro,... são os espaços para as expressões religiosas (nem a escola, nem o facebook, nem o campo de futebol).

8. No início do texto eu escrevi educação pública.

Mas eu não preciso dizer nada disso aos colegas de profissão: professores, diretoras, secretário da educação,...porque são conceitos muito básicos aprendidos na faculdade e respeitados em muitos centros de educação infantil que conheci em Joinville.

Escrevi mesmo foi pra quem não é da área e talvez esteja se equivocando e misturando religião e estado, um erro que prejudica a todos.

Aliás, feliz dia do trabalhador, Sr. Udo!

Fonte: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues
Foto-http://www.jn.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=1409899
PS.: o Projeto de Lei 5.598/2009 estabelece, em seu artigo 11, que o ensino religioso, de matrícula facultativa é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de proselitismo.

Grifo meu. Ensino religioso não é catequese.

E se o JEC ganhar do Santos...

POR GABRIELA SCHIEWE

"Sonhar não custa nada..."

Tudo bem, o Santos é um dos melhores times do Brasil na atualidade, apesar de que o futebol brasileiro está se nivelando por baixo. Mas vai que o JEC ganha do Santos. E aí?

Aí, cara pálida, tudo o que se tem visto, ou melhor, que não se tem visto até o momento, cai por terra.

O Joinville, só pra variar um pouquinho, está contratando. Nenhuma novidade, já que faz isso o ano todo e até agora não fez porcaria nenhuma, fez um Campeonato Catarinense bisonho e agora diz a diretoria que está montando o time para a Série B. A saga continua.

A verdade é que o JEC vem decepcionando sim - e muito - e mesmo os seus torcedores fiéis vão ter que concordar comigo, ou não?

Tudo bem. Se não quiser confessar em público que concorda com uma mulher no que diz respeito a futebol, eu entendo, fica tranquilo.

No entanto, é inegável o baixo aproveitamento do nosso Tricolor e se fizer valer o seu atual desempenho e tudo o que vem fazendo nesta temporada, não podemos esperar nada desses jogos contra o Santos. Se é que serão jogos e não apenas 1 jogo!

Sim, se o Santos ganhar no jogo daqui por uma diferença de mais de 2 gols, bye bye Copa do Brasil, nos restará a Série B.

Na primeira rodada da Copa do Brasil, o JEC passou ali ali, no sufoco contra um timeco qualquer, quem sabe contra o Peixe ele vire um leão e tira o coelho da cartola?

Gente, estou aqui divagando, falando umas besteiras e algumas verdades, mas no futebol tudo pode acontecer que o diga o Inter (perdeu para o tal de Mazembe), atré porque o Santos não está lá essas coisas e o empenho do Tricolor, com certeza, será bem maior do que contra seus outros adversários, mas é bem difícil esta missão.

Agora se o JEC ganhar do Santos, toda a lambança apresentada até então será imediatamente esquecida, pois agora...é assim mesmo, no futebol, na política, na vida, um ato heróico, se faz esquecer toda sujeira anteriormente existente.

terça-feira, 30 de abril de 2013

Órfãos, viúvas e carpideiras

POR JORDI CASTAN

É batata! Sempre que acaba um governo e entra outro  aparecem rebanhos de órfãos e viúvas do governo ou do partido que perdeu. Podem demorar mais ou menos, mas passado um tempo prudencial os seus lamentos tomam todo o espaço, seja nas redes sociais, seja nos jornais. Em qualquer meio disponível eles estão lá, com suas opiniões pontuais e críticas. O que não esteja sendo feito. O que podia estar sendo feito. E, principalmente, lembram todos os maravilhosos projetos e ideias que tiveram enquanto governo, mas não conseguiram implantar e não continuidade. É o que ocupa todo o mundinho dessa gente. E ainda falta espaço para conter os seus lamentos.

É uma choradeira tão grande que não lenços suficientes para enxaguar todas as lagrimas. E aí vem a visão das carpideiras. Estas profissionais do choro. Do grito desgarrado. Da dor feita alarido. Carpideiras que são mais bem pagas e reconhecidas quanto maiores e mais agudos os seus choros. Algumas chegam inclusive a  arrancar os cabelos para chamar a atenção.

No passado eram pagas pelo volume das lágrimas derramadas. E haja balde para conter tanta lágrima desconsolada. Para alguns desavisados pode parecer que há dor real, que o sentimento de perda é genuíno, mas não há que se deixar iludir pela gritaria ensurdecedora. As carpideiras são por definição mercenárias do choro. Profissionais da arte de representar a dor que não sentem. E nisso reside o mérito do seu profissionalismo, no fingimento, no histriônico da sua representação.

Não são poucos os órfãos e as viúvas que, sabendo perdida a eleição, afinaram a voz e se aproximaram dos quartéis do vencedor para buscar algum cargo. E renegando covardemente o senhor ao que até ontem serviram com fidelidade espúria. Na verdade, não serviram a outro que a si mesmos. Na ânsia de poder e necessidade de aparecer, alguns até atingem o cúmulo do dissimulo e da falsidade. O objetivo é serem reconduzidos de volta ao lugar que ocuparam por um tempo. Outros continuam firmemente agarrados às tetas lúbricas e fartas a que tão rapidamente se acostumaram e não conseguem sobreviver fora delas.

O mais curioso é o ar de ofendidos que assumem quando são identificados como órfãos ou viúvas de esta ou daquela administração. Este tipo de espécimes existe desde antes da Grécia antiga e continuarão a existir depois do PT ou de quem o venha a substituir. 

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Joinville, a vila do senso comum

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Durante muitos anos eu fechei meus olhos para algumas situações que aconteciam em Joinville. Talvez pelo meu bairrismo, ou por falta de uma noção de totalidade, não admitia que Joinville era uma vila com tamanho de cidade média. Hoje percebo o quanto estive errado, pois, ao analisar a dinâmica social de nossa cidade, identifico que o senso comum domina, e o poder de crítica é extremamente combatido.

Tudo começa quando encontramos um sistema público de ensino deficitário, em todos os níveis. Por mais que tenhamos uma grande taxa de alfabetização, somos reféns de escolas interditadas e um plano pedagógico que ceifa a construção crítica de nossos jovens, submetendo-os apenas aos "desafios" de um tal mercado de trabalho. Os poucos que escapam desta lógica que forma, ao invés de construir conhecimento, esbarram na etapa seguinte: a desvalorização.

Como o mercado de trabalho (principalmente em Joinville, reduto ideal da lógica industrial) não valoriza a crítica, muitos saem de Joinville em busca de novos ares. Nosso amigo Zé Baço sempre nos alertou sobre isso aqui neste espaço. Os que por aqui permanecem não encontram uma Universidade (pública ou privada) que seja receptiva a este tipo de pessoas. A cidade é um harém do senso comum, reprodutora de todas as principais regras deste poder simbólico (resultante de vários interesses, principalmente econômicos) que domina, segrega e aliena. O cinza característico do cenário urbano industrializado é a mesma cor da produção intelectual.

O processo é cíclico e preocupante. A participação popular, de natureza essencialmente crítica, é anulada pela opressão ou pelo preconceito construído e propagado nos espaços acríticos da cidade. Desta forma, a cidade sempre será palco para alguns e espaço de plateia para quase todos. As coisas erradas acontecem diante de nossos olhos e a vila se resigna: segregação, preconceito, violência, mídia parcial, omissão do poder público, egoísmos, falta de alteridade e coletividade, acomodação... são algumas características do típico joinvilense.

É muito mais fácil criticar quem faz a crítica sem produzir um debate de ideias. O joinvilense (sem querer generalizar) é fanático pela crítica à conduta pessoal, e não pelas concepções de mundo do criticado. É só ver os comentários recentes em vários posts aqui do Chuva Ácida. O joinvilense adora ver e ser visto. Vive de aparências, de fetiches, de fábulas urbanas. É um bolha! (Me rendo, Felipe!) Não participa. É um dominado e gosta desta condição. Acredita em tudo o que vê na TV ou ouve no rádio. Vai na onda dos outros. Lota os shoppings nos fins de semana porque tem preguiça de cobrar do poder público grandes parques ou qualidade dos passeios urbanos (calçadas e demais vias). Troca de carro todo ano por status. Critica o transporte coletivo sem utilizá-lo. Faz faculdade para ter um diploma e não para adquirir conhecimento. Faz enormes festas de formatura e casamentos por pura aparência. Considera desenvolvimento urbano a mesma coisa que crescimento econômico. Tem medo do diferente e de quem pensa diferente de si.

Existem momentos em que tenho vergonha de ser joinvilense e dos passos desta cidade. Não sou adepto do "ame-a ou deixe-a", mas sim do "faça de tudo para mudar aquilo que não te agrada". É por isso que luto para não sair daqui em busca de outras oportunidades.

sábado, 27 de abril de 2013

Racista, homofóbico e agora chantagista?


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Deixei passar um tempo para ver o que rolava. Como nada aconteceu, agora retorno ao assunto. Esse pessoal da “esquerda” por vezes decepciona. E escrevo esquerda com aspas porque é um guarda-chuva onde muitos querem se abrigar de forma imerecida. Os caras andavam numa sanha onde só se falava em Marco Feliciano. Era Marco Feliciano para cá para cá, Marco Feliciano para lá, Marco Feliciano para acolá. Mas agora é só silêncio.

Tudo mudou quando o estafermo do pastor veio com aquela treta de impor uma condição para deixar a Comissão dos Direitos Humanos: os deputados João Paulo Cunha e José Genoíno, ambos do PT e condenados no processo do “mensalão”, tinham que abandonar a Comissão de Constituição e Justiça. Foi tiro e queda. A partir daí não se ouviu um pio sequer sobre o tema.

Era óbvio que deputado pastor estava a fazer uma ironia e não a propor uma negociatazinha, até porque estava garantido no cargo. Mas parece muita gente levou a chantagem a sério. Ou seja, em vez de juntar a palavra “chantagista” a “homofóbico” e “racista”, esse pessoal meteu o rabinho entre as pernas e silenciou. Um erro estratégico, porque parecia óbvio que se a contestação continuasse o cara não se aguentava no cargo.

Meus amigos, vamos separar as águas: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. É mais do que óbvio que o deputado não tem perfil – e sequer qualidades deontológicas – para defender os direitos humanos. Tirá-lo de lá é uma guerra específica. A batalha para tirar José Genoíno e João Paulo da Comissão de Constituição e Justiça é outra e provavelmente terá outros interessados.

Ora, essa desmobilização não faz sentido. Há duas semanas o cara era o demo em forma de pastor e hoje está tudo bem? Ou será que as causas de internet não resistem a uns diazinhos? Ou podemos acreditar que a consistência política das pessoas não resiste a uma chantagenzinha despudorada? O cara continua lá. Vocês vão baixar os braços? Então não reclamem.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

O medo nosso (construído) de cada dia


POR FELIPE SILVEIRA

Não sei se a explosão que ocorreu durante a Maratona de Boston, na semana passada, foi um atentado terrorista praticado pelos dois jovens chechenos acusados ou um atentado terrorista armado pelo próprio governo estadunidense, como sugerem algumas teorias conspiratórias. Sei, contudo, que há muitas perguntas sem respostas sobre o caso e que precisam ser respondidas. Copio, abaixo, algumas feitas pelo jornalista Flávio Gomes (o texto completo pode ser lido aqui, e vale a pena):

"1. Onde está a tal SUV Mercedes que teria sido roubada pelos garotos da Chechênia? Quem é seu proprietário? Alguém falou com ele? Os meninos disseram ao dono, realmente, que eram os responsáveis pelas bombas? A troco de quê diriam isso? Numa cidade/região monitorada por câmeras a cada esquina, por que não apareceu nenhuma imagem desse carro sendo conduzido pelas ruas em fuga?
2. Os dois garotos, segundo as autoridades, foram perseguidos pela polícia. Houve tiroteio e granadas lançadas. Outras bombas atiradas. Sabemos o contingente que a polícia americana desloca para qualquer ocorrência. Como é que o menino de 19 anos conseguiu fugir ao cerco? A pé? Como assim? Se escondeu onde? Como é possível demorar tanto para encontrar um garoto de 19 anos que estava cercado pela polícia?
3. O que é que os meninos chechenos estavam fazendo no MIT na noite de quinta-feira? Por que é que não fugiram da cidade depois de explodirem as bombas? Terroristas de verdade ficariam batendo perna pela cidade onde cometeram seus atentados por qual motivo? Há alguma explicação para isso? Se você explodisse uma bomba nos EUA ficaria na cidade? Não teria um plano de fuga? Não sumiria? Por que atiraram num policial no campus? Não há imagens desse confronto no campus da universidade, monitorado por câmeras em todos os cantos?"

A indignação do Flávio Gomes é com esse tipo de jornalismo que não faz pergunta, que publica tudo que a autoridade diz, que compra a versão oficial. Versão que aprendemos que deve ser a primeira a ser questionada. No entanto, trouxe a questão aqui para o Chuva Ácida por outro motivo.

O que aconteceu em Boston após os atentados, com comemorações nas ruas após a morte de um dos suspeitos, é um sintoma de uma sociedade que vive com medo, em paranoia. Um medo alimentado dia a dia pelo sistema, pelo governo, pela mídia...

(Talvez valha lembrar aqui que medo é uma coisa que vende, seja sistema de segurança ou seguros de vida.)

Apesar de ter ido até Boston neste texto, a reflexão que quero fazer é sobre Joinville mesmo. Ainda estamos muito longe de viver nessa sociedade paranoica como a americana (principalmente depois de 11 de setembro de 2001), mas me parece muito claro que esse medo é construído é diariamente.

Quando um vereador diz que proibir o consumo de bebidas alcoólicas em espaços públicos “será um avanço social para a cidade” o medo de viver em sociedade é construído. Se uma proibição como essa for um avanço, eu tenho medo do que pode ser o retrocesso. E não se trata aqui de defender o próprio direito de beber, pois eu não lembro de ter feito isso em local público. Trata-se de entender que leis como essa inibem o encontro em público, a confraternização no parque, o uso da praça e da própria calçada. É a lógica de empurrar as pessoas para dentro de casa, onde não conversam, não questionam, não protestam. Vivem como indivíduos, e não como coletivos.

Sem contar, claro, do papel de “higienização” da cidade, desejado por muitos. Resolver o problema do mendigo ninguém, mas expulsá-lo para longe da vista interessa muito aos moradores do centro e dos bairros nobres (vocês não gostam do termo elite, né?).  E interessa, principalmente, ao mercado imobiliário, que precisa vender essa cidade "limpa".

Muros cada vez mais altos, câmeras de vigilância em todo lugar, violência na mídia, violência no trânsito, guarda municipal, blitzes surpresas da PM, proposta de redução da maioridade penal, abandono dos espaços públicos... São coisas como essas que vão, aos poucos, formando uma sociedade cada vez mais amedrontada. Gente que vive cada vez mais dentro de casa ou dentro do shopping (o local seguro por excelência, onde você pode comprar, comprar e comprar mais), que vive como indivíduo e não como coletivo.

Apesar disso tudo há muita gente na direção contrária. Mas essa é uma luta política e é preciso acordar para a vida e não aceitar tudo que nos é imposto pelo governo e pela mídia. Ou daqui estaremos todos trancafiados dentro de casa e aceitando tudo que o governo fala e a TV reproduz, como a história lá do começo do texto.

P.S.: Na semana passada eu reclamei das luzes apagadas do Parque da Cidade. A comunidade também reclamou bastante. Soube que houve esforço de alguns setores da Prefeitura para ligar novamente. Ontem as luzes estavam acesas, permitindo que a população pudesse usar o espaço. Obrigado e parabéns ao pessoal do governo que está atento e disposto a trabalhar por uma cidade melhor.