POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
É
impressionante o tantão de gente que puxa o Brasil para o atraso. Parece que há
um certo prazer em sabotar o país. E nem é preciso ir longe para constatar. A
obtusidade fez ninho na Câmara de Vereadores de Joinville (ok... não é de
agora), onde está em discussão a ideia de implantar a tal “escola sem partido”.
Uau! Agora já se tenta impor a ignorância por decretos. Ou seja, usar
a "legalidade" para cometer um crime de lesa-inteligência.
É
difícil imaginar as razões que levam a ver mérito numa proposta tão retrógrada.
Mas a vereadora-pastora Léia encontra
virtudes e, segundo o site da CVJ, até fez da “escola sem partido” uma bandeira
do seu mandato. Aliás, antes de prosseguir permito-me um parêntese. As palavras
“vereadora” e “pastora” numa mesma frase provocam comichões. Tudo remete para rebanhos
e para a velha expressão “curral eleitoral”.
Parece
ser uma questão de fé na iliteracia. A proposta parte de uma visão canhestra do
ensino, em que o professor é visto como o inimigo capaz de fazer a cabeça dos estudantes. E o que propõe a tal “escola sem partido”? Ora, uma
doutrinação reversa na qual a doutrina passa pela transformação dos estudantes em
autômatos abúlicos. Ortogênese dos corpos dóceis, diria Foucault. Parem de brincar com coisas
sérias, senhores vereadores.
A
vereadora-pastora Léia propõe, em texto no site da CVJ, evitar que os
estudantes sejam influenciados (ou doutrinados) em temas mais candentes.
“Questões políticas, religiosas e ideológicas são muitos pessoais e familiares.
Esse tipo de educação doutrinária pertence aos pais. As crianças e adolescentes
têm o direito de ter suas ideias e suas ideologias e não ser influenciados
nisso nas escolas”, afirmou.
Errado,
pastora. Aliás, como diria Chaves, “dá zero para ela”. Chaves... o outro,
porque não quero ser acusado de doutrinação bolivariana. Podemos até deixar a
religião de barato, uma vez que a sua essência é ser doutrinária. Mas no plano
familiar o prosélito defendido pela vereadora não se aplica aos temas da “política”
e “ideologia”. Porque estes obrigam ao embate de ideias. É esse um dos muito papéis
da escola.
A
vereadora-pastora e seus sequazes demonstram um entendimento canhestro dos
processos de subjetivação. Ou seja, esse pessoal acredita que o sujeito, no seu
processo de construção, é um receptáculo vazio, pronto a ser preenchido com
ideias que lhe são impostas de fora. Isso é besteira. A subjetividade resulta
de um processo negocial. Para isso são necessários interlocutores capazes de produzir
dissensos, antíteses, oposições.
Mais
debate, melhores cidadãos. Mas é exatamente isso o que se propõe retirar com o
decreto. Aliás, o nome “escola sem partido” é um slogan político inserido numa
velha estratégia: apontar um mal inexistente e depois apresentar a "solução". É capaz
de convencer os que pensam em slow motion,
mas qualquer pessoa com dois dedinhos de testa sabe que slogans não fazem
programas educacionais.
Nem
vale a pena discutir a questão pedagógica (os especialistas têm feito um bom
trabalho), porque o atraso é evidente. O ideário escondido por trás do slogan
“escola sem partido” é obscurantista. Aceitá-lo é um erro grosseiro. E que põe
o Brasil a andar na contramão da civilização. Por fim, há um fator
incontornável: a educação é coisa séria demais para ser deixada nas mãos de
vereadores cuja literacia é questionável.
É
a dança da chuva.