terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O maior tapa na cara da história de Joinville custou R$ 1 mi

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

O bilionário que doou para o Hospital São José. Foto: Divulgação WEG.
Na última semana os jornais locais noticiaram um fato que deixou muita gente sem reação: um empresário, sozinho, havia doado R$ 1 milhão para o Hospital São José, de Joinville. O fato chamou mais ainda a atenção pelo doador: o bilionário Eggon João da Silva, sócio da fábrica WEG, de Jaraguá do Sul. Ou seja, um empresário de fora da cidade de Joinville "passou por cima" dos locais e fez, segundo o jornal Notícias do Dia, "a maior doação da história de Joinville".

Vale lembrar que o Hospital São José está em um terreno que também foi doado, através do Pe. Carlos Boegershausen (1859-1906), apóstolo de Joinville e importante figura política do século passado. O religioso (foto) doou as terras para construção de um hospital, e em troca teve outras terras de sua posse valorizadas devido a uma série de obras públicas rumo ao centro-sul da cidade, como a Estação Ferroviária. Padre Carlos, portanto, foi um do primeiros especuladores imobiliários da cidade, como explico aqui. É forte candidata ao título de "maior doação da história da cidade".

Voltando, o empresário Eggon ainda fez duras críticas aos colegas de Joinville, pois os mesmos não tiveram a capacidade de colocar grande quantidade de recursos próprios na campanha "Abrace o São José", onde estes saíram vendendo camisetas para "ajudar" o Hospital. Não pretendo seguir a linha do Felipe Silveira, mas ressaltar outra questão que envolve o tema: o PIB industrial de Joinville, em 2011, foi de R$ 7,5 bilhões, segundo o IBGE (estou desconsiderando o PIB de comércios e serviços, por exemplo). Logo, se considerarmos que a entidade empresarial que vendeu camisetas e usou o dinheiro dos outros para valorização de sua marca exploradora ideológica dominadora clientelista plutocrata social é responsável por 10% deste montante (nenhuma loucura), sobram R$ 750 milhões. Se todos os industriais desta entidade doassem para o São José 0,25% do valor de suas produções dentro de 12 meses, seria repassado ao Hospital cerca de R$ 1,875 mi por ano. Sem vender camisetas e o valor estaria dividido entre os pares.

Logo, é muito fácil considerar que a atitude do empresário jaraguaense foi o maior tapa na cara que Joinville já sofreu. Isto serve como lição para esta cidade que vê no empresário um semideus, o salvador da pátria e o responsável por tudo o que existe de bom, pois, sem eles (e seu "espírito" empreendedor), nada existiria. Entretanto, como os empresários de Jaraguá do Sul ajudam a cidade! É só pesquisar no google a quantidade de parcerias com o poder público local na manutenção, promoção e instauração de políticas sociais nos nossos vizinhos. Os de lá deixam os de cá com uma má reputação, no mínimo.

* * * * *

Outro ponto da discussão que não posso deixar remete um pouco ao meu texto de duas semanas atrás aqui no Chuva Ácida. É inconcebível que as maiores 85 fortunas sejam responsáveis por metade da riqueza deste planeta. Segundo relatório da agência Oxfam para a ONU, a riqueza do 1% das pessoas mais ricas do mundo equivale a um total de US$ 110 trilhões, 65 vezes a riqueza total da metade mais pobre da população mundial.

Penso que em grandes fortunas, como o caso do empresário Eggon, devam incidir altos impostos. Desta forma, ao invés de ricos empresários fazendo filantropia, temos um Estado que, através de impostos, faz um melhor controle redistributivo das condições sociais da população. Este é o caminho pois, segundo o mesmo relatório, "sem um esforço concentrado para enfrentar a desigualdade, a cascata de privilégios e de desvantagens vai continuar pelas gerações. Em breve vamos viver em um mundo onde a igualdade de oportunidades é apenas um sonho". 

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Apolônio Prates e seu cão Coxinha.


Manual do bom manifestante

POR JORDI CASTAN



Nestes dias Joinville tem vivido a manifestação do pessoal do MPL. Os moradores do Itinga também se manifestaram contra a falta de água, interrompendo a circulação de veículos na SC 301. Moradores de diversos bairros têm se manifestado contra o estado lamentável de ruas e logradouros públicos. Os rolezinhos são um novo modelo de manifestação.

Estas manifestações legítimas têm servido para que diversos setores da sociedade se posicionassem a favor ou contra. Alguns acharam as manifestações violentas. Queimar pneus, atirar ovos e tomates ou interromper o trânsito é visto como extremamente violento em Joinville. E deixar um bairro sem água por semanas ou aumentar preços e tarifas acima da inflação não parece que preocupe tanto o joinvilense médio. Há quem tenha proposto outras formas de protesto que sejam menos perturbadoras a sociedade. Aliás, o ideal seria que nem houvesse protestos e manifestações.

Depois das manifestações multitudinárias de junho de 2013, em que o povo se lançou às ruas para, num grande evento folclórico popular, protestar contra tudo e contra todos, parecia que a rua fosse transformada no espaço democrático para que a sociedade se manifeste e possa se expressar estava definitivamente aberto. Sabemos hoje, como já era previsível, que a falta de foco e de uma pauta concreta de reivindicações trazia no seu bojo o esvaziamento do movimento.

Para os movimentos que fazem das manifestações uma forma de reivindicação e para os que ainda não tem experiência nesses temas, a editora Chuva Ácida acaba de publicar o Manual do Bom Manifestante, exclusivamente em versão digital.

O Manual do Bom manifestante é uma ferramenta imprescindível para quem quer fazer da rua o seu espaço de reivindicação e manifestação política. Entre os temas abordados com seriedade e conhecimento um dos mais interessantes é:

- Com que roupa eu vou?

Manifestantes experimentados recomendam roupas cômodas, preferivelmente com cores claras no verão e roupas mais escuras na temporada outono-inverno. A Hering lançou uma coleção de camisetas básicas para manifestações. A empresa oferece estampas personalizadas de acordo com o motivo da manifestação e para pedidos superiores a 500 camisetas, a estampagem é gratuita. Entre as imagens mais comercializadas está a de Che Guevara, que continua como campeão de vendas. As de Mao Tse Tung, praticamente  desapareceram do mercado, mas ha uma volta das imagens de Marx, tanto Karl, como Groucho. Não se recomenda usar camisas polo, e menos ainda se forem Lacoste, Tommy ou Ralph Laurent.
Se o tema é calçado, a dica é um calçado cômodo. Militantes mais aguerridos não dispensam um All Star, mas há também muito Nike. Evite marcas como Puma ou Adidas e nada de usar salto alto, não é adequado e pode provocar lesões no caso que seja preciso correr. Havaianas tampouco são recomendadas apesar da sua imagem popular.

Que cores usar?

O tema da cor está muito vinculado à moda e tendência. Há os clássicos. Nenhum mais forte que o preto e o vermelho. Sempre fica bonito que uma manifestação que se preze tenha algumas bandeiras e faixas. No caso de Joinville a escolha do vermelho e do preto tem vantagens adicionais por serem as cores do JEC. Assim que não é difícil encontrar peças de tecido com essas cores no mercado local.
Alguns movimentos específicos têm as suas cores próprias que os identificam, como o arco íris dos coletivos GLS, ou o roxo feminista, ou o verde dos ecologistas. Assim, antes de participar de alguma manifestação não deixe de informar-se de quais as cores mais recomendadas.

Tecnologia. Como usá-la ao seu favor?

Para quem quer participar ativamente de manifestações e movimentos populares há disponíveis bons aplicativos, tanto para iPhone como para Android. Há aplicativos para informar sobre os itinerários das manifestações, dos locais de concentração, dos horários de início e fim, de quais manifestações tem mais homens ou mais mulheres. Aplicativos permitem escolher a musa da manifestação e o Manigram permite publicar online as imagens mais violentas da repressão policial.
A tecnologia permite também convocar e desconvocar manifestações, twittar, facebucar e usar todas as redes sociais para que aqueles que preferem acompanhar os movimentos desde o conforto do sofá e do ar condicionado não percam um único lance e possam fazer também seus comentários.
Uma boa pedida são as câmeras Gopro, que permitem gerar imagens de alta definição e resistem a impactos. Assim é possível ter imagens de alta qualidade de cada manifestação que podem ser colocadas em Youtube.
Há aplicativos que permitem avaliar as manifestações, dar pontos e escolher as melhores, as mais divertidas, as melhor organizadas, aquelas para manifestantes mais curtidos nas batalhas e as recomendadas para quem é viciado em adrenalina.

Banners, faixas e cartazes

Uma boa manifestação deve ter bom material de apoio, faixas, banners e cartazes, mas não só. São importantes palavras de ordem, cantos e um que outro golpe de efeito. Um Batman ou um Superman sempre alegram qualquer manifestação. Claro que nenhum super herói tem como concorrer com o apelo das meninas do Femen. Colocar algumas jovens com os seios ao ar é sucesso garantido e a possibilidade de ganhar a capa de algum jornal local é maior que a iniciativa de queimar alguns pneus.
Para manifestantes profissionais há bons sites de compras coletivas que permitem obter bons descontos na compra de banners e faixas.

Como se comportar?

Manifestações são bons lugares para paquerar. Há muita gente com tempo para uma conversinha. Sempre se conhece gente interessante, com boa conversa e não será difícil achar alguém que esteja "a fim de...". Um problema nas manifestações é que sempre pode aparecer algum político que queira sair na foto. Neste caso, é bom prestar atenção e, a menos que você forme parte dos denominados "papagaios de pirata", é recomendável se manter afastado deste tipo de gente.

Participar de uma manifestação faz bem a saúde?

É bom lembrar que as manifestações, diferentemente dos rolezinhos, se realizam ao ar livre. Como se caminha bastante e, se não houver contratempos, podem ser um bom exercício. Há sempre um risco de ter que sair correndo, ou de levar gás pimenta no rosto, mas em geral aqui em Santa Catarina as manifestações são bastante pacíficas. Há quem leve um lanche e aproveite a oportunidade para fazer um piquenique.

O que fazer e o que evitar?

Cada sociedade tem costumes que devem ser respeitados. O que na Europa seria visto com total normalidade, em Cuba ou na Coreia do Norte pode ser duramente penalizado. No caso de Joinville é preciso ser cuidadoso. Joinvilense tem dificuldade para lidar com os direitos dos outros e qualquer manifestação é vista com receio pela maioria da população. Questionar o "status quo" é um ato de ousadia extrema. Assim, queimar pneus ou interromper o trânsito é equiparado pelos setores mais conservadores da sociedade a atos de violência que requerem uma forte reação policial. Bom não confundir esse tipo de ações com as que envolvem depredação do patrimônio público ou privado.

O joinvilense tem a ideia ainda que uma carta a ouvidoria ou ao gabinete do prefeito é um ato que requer um elevado grau de ativismo e revelia e que mais que isso já é violência. Alguns mais ousados escrevem cartas aos jornais locais ou postam em Facebook ou Twitter e com isso tem a sua consciência cidadã tranquila. Inútil explicar que uma cidade muda não muda. Para que as coisas mudem é preciso mais, muito mais.

Da minha época de faculdade ficaram boas lembranças. Viver o final da ditadura franquista foi uma experiência interessante e correr na frente da polícia é sempre um deporte arriscado que requer velocidade e prática. Mas uma das frases daquela época, que permanece vigente na sociedade de hoje é: "falamos da violência dos rios, mas ninguém lembra da violência das margens que os oprimem". Na Joinville das enchentes e dos alagamentos pelo trasbordamento dos rios e córregos que tiveram suas margens reduzidas e confinadas pela violenta especulação imobiliária, a frase ganha outro sentido.

Assim se por um lado defendemos o direito de manifestação, um direito que não é permitido em todos os países. Defendemos com a mesma veemência uma atuação policial madura e equilibrada, sem excessos e sem violência de parte e parte. É bom lembrar que direito não é algo que alguém nos dá. Direito é aquilo que não podem nos tirar. Em qualquer democracia o direito de manifestar, protestar e discordar é um direito sagrado. Aliás, é um bom indicador do nível de democracia de uma sociedade.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Em Joinville temos presos políticos

O helicóptero da pm torrando o dinheiro do contribuinte
e tentando botar medo nos cerca de 150 manifestantes.
Passaram longe de conseguir algo parecido e arrancaram
risadas quando tiveram que ir embora.
POR FELIPE SILVEIRA

Em Joinville temos presos políticos e oficiais da pm que nunca saíram da ditadura, da sua confortável posição na ditadura. Os acontecimentos da noite de quarta-feira (22) são a prova disso. Após a manifestação contra o aumento da tarifa de transporte público (aumento dado pelo prefeito Udo Döhler na virada do ano), três manifestantes foram presos e levados para a delegacia de polícia, onde foram liberados, já que o motivo da prisão foi absurdo.

O motivo da prisão é claríssimo: repressão aos movimentos sociais. Não foi à toa que os três detidos tenham sido alguns dos militantes mais ativos dessa luta em Joinville. E aqui cabe frisar que não há líderes no movimento, como muitos que não sabem o que falam gostam de dizer. Portanto, não adianta querer acabar com o movimento dessa maneira suja.

Vamos aos fatos. Após a manifestação, na qual foram jogados ovos e tomates podres na prefeitura e na passebus, os manifestantes foram para o terminal, onde pularam as catracas e foram embora com a tarifa zero. Num desses ônibus, foi permitido o transporte de uma bicicleta. Num primeiro momento a polícia tentou impedir, mas diante da pressão popular e da liberação do fiscal no terminal, o transporte foi liberado.

Aí veio a sacanagem. Várias viaturas pararam o ônibus na altura da lanchonete Adriano Lanches (que está sempre lotada, e, portanto, para aparecer). Alguns policiais entraram e mandaram a menina da bicicleta descer. Nesse momento, alguns manifestantes tentaram dissuadir os policiais da ideia, já que a bicicleta havia sido liberada pela própria polícia no terminal.

Importante: Todo mundo que é envolvido com movimento social sabe que não seria seguro deixar uma manifestante identificada ir embora sozinha daquele ponto. Quem sabe das histórias de perseguição ao movimento social jamais permitiria essa situação.

Determinada a fazer bobagem, a polícia arranca um manifestante que fazia parte da conversa e o algema violentamente. Não por acaso foi pego um manifestante que já é conhecido dos policiais, assim como os outros dois, que foram ameaçados de prisão na primeira manifestação do ano. Nada me convence de que a polícia não estava determinada a levar aqueles cidadãos.


“Eu te amo, mas, aqui, eu te mato”

A cena que vocês vão ver abaixo é uma das mais patéticas que já vi, digna de um framboesa de ouro (o prêmio para os piores do cinema). Como vocês podem ver, um oficial da pm abraça um manifestante e cochicha algo em seu ouvido. Em seguida é entregue pelo manifestante, que acabará de ter seu dedo quase quebrado na atuação policial. “Você me ama mas você me mata, capitão?”, questionou, entregando a ameaça do oficial, que em seguida se vira e finge ter sido ameaçado.

A cena seria cômica se não fosse trágica, se não revelasse o pensamento e a forma de agir da polícia, que, pelo visto, imagina ainda estar sob o regime militar, longe de uma democracia.

Todos temos que nos juntar para combater esse tipo de ação policial, que, como eu já denunciei aqui neste espaço, faz muito pior nas periferias. E lembre-se, a polícia não tem nada de despreparada. Ela é muito bem preparada pra isso: ser truculenta com negros, pobres e movimentos sociais, como você pode ver no vídeo abaixo.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Preparada para aceitar


POR FERNANDA M. POMPERMAIER

Eu não vou fazer denúncias, apelos, apontamentos ou acusações.
Não vou falar de estatísticas, fatos, notícias, rolezinhos ou as desgraças e mazelas do dia-a-dia no Brasil. 

Eu cansei da revolta. 
Me desliguei das notícias aproximadamente um mês antes de viajar ao Brasil e passei os últimos 30 dias (até o último domingo) apenas curtindo o que nossa cidade e região tem de bom. 
Férias de verdade. Curti muito. Adorei o calor, os pães, as cucas, o chopp gelado, o escondidinho e a cachaça. Fui de olho fechado para o trânsito, alagamento, a situação dos aeroportos... enfim, fui preparada para aceitar. 

É preciso apenas aceitar as gigantescas diferenças culturais entre os países, senão qualquer viagem perde a graça. Conheço muitos suecos que passam férias em países com realidades complicadas como o Egito, o Vetnã ou a Tailândia, e voltam falando maravilhas. Tem que focar no positivo e foi isso que eu fiz. 

Também não sei até que ponto ficar aqui discutindo os problemas auxilia a encontrar soluções. A caixa de comentários do blog mostra que a maioria que lê os posts já está com a opinião formada e só comenta ou para concordar ou meter o pau. Alguém muda de opinião? Não sei, acho que não. Quem está tendencioso para este ou aquele lado, vai atrás de informações e decide por si mesmo. Quem não quer se informar, fica no senso comum e não será a minha opinião que fará alguma diferença.