segunda-feira, 9 de março de 2015
11 mortes e somando...
POR JORDI CASTAN
O prefeito anda irritadiço, transpira nervosismo. As suas postagens nas redes
sociais revelam frustração, responsabilizam a conspiradores e inimigos, mais
imaginários que reais, pelo resultado pífio do seu governo. A sua frustração com
os resultados obtidos se esconde em frases triunfalistas e
carregadas de positivismo, com as que enche o twitter a cada manhã. Não deveria
surpreender se até o fim do mandato não publica um livro de autoajuda com uma
recompilação das melhores frases e com recursos do Simdec. Um livro que
facilmente seria um campeão de vendas entre assessores e comissionados.
Um dos temas em que o prefeito tem mostrado especial sensibilidade é com o planejamento. Ou melhor, com a falta dele. É fácil e rápido fazer uma lista de todos os casos em que o planejamento tem falhado, não cumpre prazos, estoura o orçamento e não tem alcançado os resultados pretendidos. Mais esforço exigiria identificar alguma obra ou ação que tenha sido bem planejada e executada corretamente.
Um dos episódios mais emblemáticos do elevado custo desta falta sistemática de planejamento é a duplicação da Santos Dumont. O início das obras sem desapropriar as áreas a duplicar, sem recursos para desapropriar e sem previsão para fazê-lo foi o primeiro erro. Na ânsia de querer mostrar serviço, vimos o foguetório que o prefeito de hoje criticou nos mandatários que o antecederam. Ou as mudanças de mão, reprovadas pela população desde o primeiro momento e que o tempo provou terem sido mal avaliadas - e, pior, planejadas -, além dos aumentos de custo ao orçamento original.
A falta de projetos detalhados e precisos, ainda hoje não há certeza de qual será a melhor solução no entroncamento entre a avenida Santos Dumont e a Rua Tuiuti. O prefeito, em lugar de reconhecer os erros, insiste em ver conspiração no que não é mais que pura incompetência. Há quem ache que isso tudo é falta de "geston". Que maldade confundir uma com a outra. O prefeito deveria aproveitar as primeiras horas da manhã para ler mais. Uma sugestão seria ler Thomas Jefferson, pois encontraria frases como esta: "Quando um homem assume uma função pública, deve considerar-se propriedade do público." Quem sabe assim ficasse menos irritadiço e mais humilde.
Em tempo, desde que iniciaram as obras de duplicação já houve 11 mortes. E as únicas certezas até agora são que a conclusão ainda vai demorar muito e que o número de mortes não vai parar em 11.
Um dos temas em que o prefeito tem mostrado especial sensibilidade é com o planejamento. Ou melhor, com a falta dele. É fácil e rápido fazer uma lista de todos os casos em que o planejamento tem falhado, não cumpre prazos, estoura o orçamento e não tem alcançado os resultados pretendidos. Mais esforço exigiria identificar alguma obra ou ação que tenha sido bem planejada e executada corretamente.
Um dos episódios mais emblemáticos do elevado custo desta falta sistemática de planejamento é a duplicação da Santos Dumont. O início das obras sem desapropriar as áreas a duplicar, sem recursos para desapropriar e sem previsão para fazê-lo foi o primeiro erro. Na ânsia de querer mostrar serviço, vimos o foguetório que o prefeito de hoje criticou nos mandatários que o antecederam. Ou as mudanças de mão, reprovadas pela população desde o primeiro momento e que o tempo provou terem sido mal avaliadas - e, pior, planejadas -, além dos aumentos de custo ao orçamento original.
A falta de projetos detalhados e precisos, ainda hoje não há certeza de qual será a melhor solução no entroncamento entre a avenida Santos Dumont e a Rua Tuiuti. O prefeito, em lugar de reconhecer os erros, insiste em ver conspiração no que não é mais que pura incompetência. Há quem ache que isso tudo é falta de "geston". Que maldade confundir uma com a outra. O prefeito deveria aproveitar as primeiras horas da manhã para ler mais. Uma sugestão seria ler Thomas Jefferson, pois encontraria frases como esta: "Quando um homem assume uma função pública, deve considerar-se propriedade do público." Quem sabe assim ficasse menos irritadiço e mais humilde.
Em tempo, desde que iniciaram as obras de duplicação já houve 11 mortes. E as únicas certezas até agora são que a conclusão ainda vai demorar muito e que o número de mortes não vai parar em 11.
sexta-feira, 6 de março de 2015
Lia Abreu, cadê você?
POR SALVADOR NETO
Talvez venha a ser mais um daqueles mistérios insolúveis da província, mas jornalista impertinente que sou, ouvidor das ruas e das gentes que a percorrem dia após dia na luta pela vida, e por serviços e estruturas públicas de qualidade, parodiando o Salsicha, companheiro de Scooby Doo, personagens dos desenhos animados, e também o grande poeta Castro Alves em seu poema Vozes D’África, questiono:
Lia Abreu, cadê você? Onde estás que não respondes? Será que interditaram para sempre sua voz? Será que te disseram “Porque te calas?”, e você aceitou? Cerca de um mês atrás postei em minha página pessoal no Facebook uma pequena nota sobre o afastamento de Lia Abreu, fiscal sanitarista reconhecida pela firmeza, e por vezes dureza, com que fazia seu trabalho de fiscalizar. Governadores, Prefeitos, Secretários, e os áulicos que os cercam, reclamavam das interdições que ela determinava diante do quadro deplorável de muitas escolas, estaduais e municipais, em Joinville (SC). Fui bombardeado pelo cordão dos puxa-sacos, dependentes de cargos públicos e partidários de ocasião.
E isso porque apenas perguntava: “Pergunta que
berra aos ouvidos da imprensa, e ela não corre atrás: onde anda a fiscal
sanitarista Lia Abreu? Afastada? Não mais? Onde está o contraditório? Cadê a
apuração e continuidade da matéria, ouvir secretária, a fiscal, o básico do
jornalismo? Os pagadores de impostos querem saber o que houve, porque há
escolas por aí que precisam ser fiscalizadas, e ela é uma servidora deste
público que paga impostos... Porque te calas grande imprensa da província?”
Muitos defenderam o afastamento porque ela foi
“acusada”, e seria para não “atrapalhar” as investigações (?). Ou seria o
objetivo principal o linchamento moral, a perseguição dura e direta para ser
ver livre de um calo que incomoda a muitos poderosos? Quem sabe outro motivo
teria sido impedir que várias escolas sem as mínimas condições de receber os
alunos, fossem interditadas? Aliás, outra pergunta sem resposta: quantas escolas foram visitadas, fiscalizadas, e se
foram, por quem, e quantas até hoje? Lia Abreu, cadê você?
Ontem, quinta-feira (5/3), sai nota na coluna do
jornalista Jeferson Saavedra, em A Notícia, que disse o seguinte: “A Prefeitura
de Joinville abriu sindicância contra a fiscal da Vigilância Sanitária, Lia
Abreu (foto), por supostamente agir de forma “intimidadora” durante as
vistorias nas escolas estaduais. Ela também não teria tido “bom senso” em suas
manifestações. Ela terá prazo para se defender. Lia foi suspensa por 60 dias no
final de janeiro.” Que tal? Preparando terreno para o golpe final? Ou seria uma
chantagem emocional? Pressão? Coação?
Notem que agora, depois do “afastamento”, vem a
“sindicância”, por ela agir de forma “intimidadora” (?). E tem mais: faltaria à
fiscal sanitarista “bom senso”. O que seria bom senso? Talvez deixar escolas
ruírem na cabeça das crianças e jovens da maior cidade de SC? Proporcionar aos
estudantes a maravilha de utilizar banheiros químicos porque banheiros das
unidades não funcionavam? Deixar que curtos circuitos colocassem em risco a
vida de muita gente, ou que os estudantes levassem guarda-chuvas para dentro
das salas por chover mais dentro que fora da sala de aula?
Lia Abreu, cadê você? Onde estás que não
respondes? Ou será que não foram te perguntar nada, os tais veículos de
comunicação? Nós do Chuva Ácida perguntamos sim, quais as razões para teu
afastamento, agora um processo de sindicância? Funcionária pública concursada,
com extensa carreira de serviços prestados à comunidade que paga impostos e
deseja ver a coisa pública funcionando como deveria, você precisa dar a sua
versão dos fatos. Porque a Prefeitura vem dando em doses homeopáticas em
colunas dos jornalões.
Nós, que pagamos impostos que pagam salários dos
servidores, Prefeitos, Governadores, Secretários, e também dos áulicos do
poder, queremos saber o que se esconder por trás destes silêncios
ensurdecedores. Porque as escolas continuam a espera da ação dos governantes
para sua recuperação, da mesma forma que obras de infraestrutura que só servem
para discursos fáceis e conquistas de votos. Depois, esperem, é o que nos
dizem.
O tempo da mordaça acabou há 30 anos. Assim como
a população respeitava o seu trabalho de fiscalização – menos os atingidos por
ela – ela agora precisa te ouvir e saber a verdade. Desinterdite a sua voz Lia
Abreu. A sociedade aguarda ansiosa.
quinta-feira, 5 de março de 2015
Neopolitizados contra tudo
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Não há como fugir ao poder das redes sociais.
Se os meios de comunicação social tradicionais monopolizavam a mediação da
informação, hoje esse espectro ficou muito alargado. Para o bem e para o mal. O
lado bom é que a circulação de discurso tornou-se mais democratizada. O lado
mau é que, frente a um volume enorme de inputs,
muitos patinam na hora de fazer uma gestão coerente da informação.
Um dos resultados deste novo quadro é o
surgimento dos neopolitizados (neologismo que circula por aí). Quem são?
Pessoas que antes estavam arredadas das trocas discursivas e agora encontram
lugar de expressão pública nas redes sociais. O problema é que, em expressivo
número de casos, os neopolitizados limitam-se a ser “contra tudo isso que está
aí”. Ou seja, há apenas a rejeição moralista daquilo que consideram errado.
Como caracterizar essas pessoas? Sem querer
fazer sociologia, há coisas óbvias. A rede social mais popular no Brasil é o
Facebook, com quase 90 milhões de usuários (pessoas que acessam pelo menos uma
vez por mês). Um dado interessante é o acesso por faixas etárias, que revela
uma distribuição quase equânime entre os 25 e 54 anos (o público vai até aos maiores
de 65 anos).
O que é possível concluir? Ora, muitas dessas
pessoas foram criadas nos tempos da ditadura ou apanharam os seus eflúvios. E há
coisas que demoram a desaparecer. Ainda hoje algumas influências dos anos de
chumbo parecem interferir no inconsciente social. É o que permite, por exemplo,
explicar a existência de pessoas que pedem a volta da ditadura e clamam pelo
fim da democracia.
Tendo sido criados num sem ambiente de
liberdade de expressão, muitos sentem dificuldade em compreender o debate e o
ato de esgrimir argumentos. Reclamam, reclamam e reclamam. E limitam-se a isso,
pois a indignação fica reduzida ao chorume nas redes sociais. Discursos
erráticos e rezingões não produzem mudanças.
É como diz o velho deitado: se você está contra tudo, então não está contra coisa alguma.
quarta-feira, 4 de março de 2015
Vai, Udo, na contramão do mundo!
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Clima não é problema para os bicicleteiros de Copenhague |
POR FELIPE SILVEIRA
Não esqueço de uma resposta do então candidato Udo Döhler durante a campanha à prefeitura. O tema era mobilidade urbana e Udo respondeu de bate-pronto: 300 km de asfalto. Essa era a proposta do empresário para um dos temas mais complexos e debatidos da política do nosso século.
Estava ainda no início da corrida eleitoral e acredito que Udo tenha dado respostas melhores até ser eleito. Mas, pra mim, aquela resposta foi bem representativa sobre o candidato da elite econômica da cidade. Um homem despreparado para a política do século 21, que adentrava ao jogo para seguir uma tradição da dominação econômica e política local.
O problema é que essa velha política ganhou o espaço que precisava nos últimos dois anos e tem deixado pra escanteio temas relevantes e que estavam mais avançados em um passado recente. Como o caso das políticas públicas em prol da bike como meio de transporte.
O trânsito de Joinville está cada vez pior e a gestão municipal tem uma enorme parcela de responsabilidade. Um exemplo: o atual governo deixou a cidade sem estacionamento rotativo até hoje, o que gera um caos em busca de lugar para estacionar no centro da cidade. Os donos dos estacionamentos privados é que se deram bem na história. Sem contar a questão do transporte público (que deixa empresas de outros homens da elite econômica operar um serviço público sem devido processo licitatório), sem contar que não há novidade alguma para quem opta pela bike como meio de transporte, sem contar que não se faz o debate sobre o assunto. Também pudera. Na campanha, Udo disse que no futuro todo mundo vai ter carro. Deve pensar que não importa o resto.
Enquanto isso, carros (veículos a motor em geral) seguem como um dos fatores que mais contribui para a poluição do planeta. Além de outros malefícios, como o alto número de acidentes de trânsito e os gastos com saúde por causa do trânsito (por causa da poluição ou por causa de acidentes).
Udo vai na contramão de grandes cidades do mundo que já passaram pela experiência do foco no transporte individual. Cada vez mais cidades da Europa e dos Estados Unidos fecham seus centros para carros e desenvolvem políticas de incentivo ao uso da magrela no dia a dia. Enquanto Boston derruba elevados, aqui ainda estamos tentando arrumar dinheiro para construí-los. Enquanto Londres limita a circulação de carros na área central, aqui incentivamos cada vez mais. Enquanto Copenhague integra a bicicleta ao ônibus, aqui sobrecarregamos os motoristas com a dupla função de cobrador.
As desculpas para não usar a bicicleta são muitas, mas as soluções são fáceis e conhecidas. Por exemplo, empresas podem instalar vestiários com chuveiros para funcionários se trocarem, além de estacionamento para as bikes de funcionários e clientes. O governo pode atuar para diminuir a velocidade média dos carros, com radares (oi, Udo) e campanhas de educação no trânsito. Também é preciso investir em vias para ciclistas em determinados casos. Integrar a bike ao transporte público também é fundamental, assim como gerar empregos perto dos locais de moradia das pessoas, diminuindo as distâncias que precisam ser percorridas.
É preciso colocar a bike na agenda novamente. Tratar a mobilidade urbana com a cabeça no século 21, com benefícios para as pessoas, e não com ideias ultrapassadas, elitistas, maquiadas como planejamento para o futuro.
Abaixo, um vídeo do projeto Cidade para Pessoas sobre a política de mobilidade urbana adotada em Copenhague, que a transformou em referência no assunto. Vale muito a pena ver:
terça-feira, 3 de março de 2015
O racismo por trás do preconceito musical
POR FELIPE CARDOSO

“Nossa, você vê racismo em tudo”, disse-me o branco cheio de privilégios e com medo de perdê-los. Pois eu vejo racismo em tudo porque ele está em todo o lugar. E quando um negro tenta mostrar e desconstruir é impedido justamente por quem não sofre com esse grave problema. A cultura escravista ainda persiste. Os brancos acham que até para falar ou denunciar atitudes racistas precisamos da permissão deles.
E para aumentar um pouco mais o desespero dos racistas de plantão, vamos estender a reflexão. Vamos falar do racismo na música.
Ao vivermos em sociedade percebemos que existem diferenças entre as pessoas. E é por meio dessas diferenças que construímos a nossa identidade. Se eu digo que sou “brasileiro” é porque existem pessoas que não são brasileiras. Então podemos perceber que a identidade tem uma estreita relação com a diferença.
A música também contribui para mostrar a diferença entre as pessoas e a construção de cada identidade dos indivíduos na sociedade. Até aí tudo bem. Mas o que escreverei aqui tem a ver com o etnocentrismo e o racismo existente em nosso país.
Como já havia citado no texto anterior, o etnocentrismo, segundo Everardo P. Guimarães Rocha, em seu livro “O que é etnocentrismo”, é:
“... uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é existência. No plano intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos de estranheza, medo, hostilidade, etc.”.
Logo, muitas pessoas se acham no direito de pensar que o seu estilo de música preferido é o melhor, o mais correto. Mesmo desconhecendo outros estilos, acham que podem discriminar pessoas que gostam de outros tipos de música.
Como citei no outro texto, desde o período colonial, tem-se no imaginário popular que tudo o que é/vem do negro é visto como ruim e tudo o que é/vem do branco é visto como bom e civilizado. E podemos ver que, até hoje, isso se reflete em diferentes setores da nossa sociedade, inclusive na música.
LOCAIS DE PERDIÇÃO - O samba, por exemplo, nasceu dos batuques dos escravos, no século XIX. Assim como a capoeira, o samba durante muito tempo foi perseguido e proibido de ser tocado. A elite branca da época não via com bons olhos o estilo musical e os locais onde se realizavam os pagodes eram considerados perigosos, sujos, verdadeiros "locais de perdição". Mas, na verdade, o preconceito contra os negros estava por trás desse modo de ver as coisas.
Demorou bastante tempo para o samba tornar-se o que é hoje. A cultura teve que ser aceita pelos brancos para poder ganhar mais popularidade. Inclusive muitos artistas brancos se influenciaram no samba. Somente a partir daí que os sambistas começaram a ter o respeito merecido.
Um trecho da música de Vinícius de Moraes traduz bem o que quero dizer: "O samba nasceu lá na Bahia, se hoje ele é branco na poesia, ele é negro demais no coração". O samba agora é “branco” na poesia, ou seja, é bom, podem escutar.
A partir de 2005, o samba de roda tornou-se um Patrimônio da Humanidade, um título concedido pela Unesco (órgão da Organização das Nações Unidas) para as mais autênticas manifestações culturais.
A mesma perseguição que o samba sofreu e a mesma apropriação cultural que passou e passa até hoje, aconteceu e acontece com o rap, com o axé e com o funk.
Durante a década de 1990 esses três estilos ganharam muita força no Brasil. Dominando a periferia e trazendo muito ritmo para as festas e bailes, mas sofreram resistência justamente por causa da sua raiz negra.
O rap, responsável por demonstrar a realidade das favelas brasileiras, foi perseguido e proibido de tocar em rádios, pois era considerado uma cultura marginal, ou até mesmo “sem cultura”. Racionais Mc’s, RZO, Facção Central, Sistema Negro, Consciência Humana, Realidade Cruel e tantos outros grupos e artistas mostravam e ainda mostram, através de rimas, todos os acontecimentos da periferia e denunciavam / denunciam o descaso do governo com o povo preto, as corrupções e as injustiças sociais.
O funk e o axé traziam a alegria para a periferia. Os bailes e as micaretas sacudiam o povo do morro, mas não podiam sair dali, assim como na escravidão, a música e os negros deveriam saber onde era o seu lugar.
Mas com o crescimento do interesse financeiro do setor fonográfico, investiu-se muito para tentar agradar a “população superior”, apropriando-se da cultura negra, mais uma vez. Cantores brancos passaram a se utilizar dos estilos periféricos e começaram a ganhar destaque na mídia. Mais uma vez a cultura negra precisou passar pela aprovação branca para ser tolerada.
ARTISTAS EM TRANSFORMAÇÃO - Para conseguir espaço e destaque pelo seu trabalho, muitos artistas tem que passar por uma transformação. Suas letras tem que ser alteradas, sua aparência tem que ser mudada e moldada, assim como o seu comportamento que tem que ser “padrão branco de qualidade”.
Quem não segue a regra corre o risco de perder a visibilidade. Não acredita? Tati Quebra Barraco, diva do “proibidão”, não quis mudar as seu estilo de música e, aos poucos, foi substituída por Anitta e Valesca Popozuda que, recentemente, decidiu trocar o “my pussy é o poder”, “se elas brincam com a xoninha eu te dou ate o cu”, por “beijinho no ombro”. Mc Serginho foi substituído por Naldo Benny, Mc Rodolfinho e outros ostentadores, que iludem a juventude negra, fazendo publicidade de coisas fúteis, influenciando em algumas escolhas ruins.
Eles querem se apropriar da cultura, apenas isso. Dar visibilidade não.
O mesmo aconteceu com as letras contundentes de Mv Bill, Facção Central, Racionais e tantos outros rappers. Alguns tiveram que se adaptar ao mesmo modelo para conseguir sobreviver e outros perderam a visibilidade para pessoas com discursos romantizados, rimando “ão” com “ão” e transformando um estilo que deveria representar a favela em um capítulo de Malhação.
Projota, Rashid, Emicida, Flora Matos vêm com um linguajar bem mais sofisticado e leve, muitas vezes sem críticas em suas letras, assim ganham espaço até mesmo nas rádios.
Você deve estar pensando: “nada a ver, isso pode ser apenas uma transformação cultural da juventude atual”. Ok, mas então por que raios esses estilos não ganharam visibilidade antes? Por que não podiam ser aceitos do jeito como eram? Justamente por que eram pretos. Justamente porque falavam verdades e incomodavam aqueles que se achavam superiores a tudo e a todos.
Antes as letras não eram “brancas”, não eram consideradas “civilizadas”. Não agradavam os ouvidos da cultura branca. Hoje são e agradam os ouvidos brancos e podem ser tolerados.
Mas você percebe que não houve transformação cultural nenhuma quando “rolezinhos” são perseguidos e jovens apreciadores de funk são proibidos de frequentar locais reservados “azelite”. Quando shows de rap são impedidos de acontecer. Quando a polícia continua atirando em pessoas que saem de bailes funks na periferia e continua prendendo pessoas injustamente por vestirem roupas largas.
O que eles querem é apenas se apropriar dos nossos estilos para cantar o que eles querem ouvir.
Ainda hoje a cultura negra enfrenta muita resistência e sofre muito com o preconceito. O ar de superioridade do período escravista pode ser sentido em cada comentário quando alguém passa com som alto ouvindo funk, rap ou pagode ou a cada comentário virtual em clipes desses segmentos lançados na internet.
CULTURA SUPERIOR - Esta suposta superioridade do bom gosto musical desenvolveu-se no período colonial e está atrelada a dois fatores principais: o fator financeiro/social e o fator intelectual. O primeiro é que as pessoas ricas, de classes mais altas possuem gostos mais refinados e melhores que as pessoas de classes mais baixas. Por isso todos deveriam segui-los, pois a cultura deles é superior. O segundo fator é o da intelectualidade, afinal todos querem ser associados a grupos de pessoas inteligentes. Logo, o estilo musical deve representar essa intelectualidade e tudo o que não tiver o mesmo requinte, não presta. Eles possuem uma “cultura superior” que os menos desenvolvidos não têm.
Mas graças ao poder da internet tais pensamentos podem ser desconstruídos. Mas devemos ficar atentos, pois a todo o instante eles tentam se apropriar da cultura negra para lucrar e, ao mesmo tempo, apagar a essência de tais culturas, enfraquecendo, assim, a identidade negra no Brasil.
“Não deixe o samba morrer, não deixe o samba acabar. O morro foi feito de samba, de samba para a gente sambar”.
“É som de preto, de favelado, mas quando toca ninguém fica parado”.
Algumas verdades sobre a nossa cultura preta e genial, que vai de Cartola a Tati Quebra Barraco. De Leci a Sabotage. Da mais intensa tristeza até ao maior grito de felicidade e liberdade. Da denúncia à putaria. Nossa cultura luta contra o preconceito, a intolerância e injustiças e faz, principalmente, uma grande luta pela liberdade, sem hipocrisia.
Para finalizar fica o vídeo do rapper Mv Bill deixando o Faustão perdido ao falar algumas verdades ao vivo. (Não é improviso não, a letra faz parte da música sim).
https://www.youtube.com/watch?v=4BEGSHg8TJA
segunda-feira, 2 de março de 2015
O IPPUJ, a LOT e a infalibilidade papal
POR JORDI CASTAN

Em quanto uns acham que o prefeito Udo Dohler é Deus, outros acham que é o Papa. Pessoalmente acho que é um simples mortal ocupando um cargo para o que foi eleito sem ter nem a competência, nem o conhecimento. Pior é que ele acha que tem. Mas esse é outro tema.
Em recente entrevista concedida ao jornalista Sérgio Silva,
o prefeito Udo Dohler soltou, entre outras pérolas, que o Plano de Mobilidade esta
integrado com a LOT. Difícil que esteja. Porque até prova em contrário a
LOT não concluiu ainda o seu processo de audiências públicas com a sociedade. E não há dia em que o IPPUJ não altere, acrescente ou suprima alguma coisa.
Assim é difícil que haja integração entre um e a outra. Se for o caso, o prefeito deveria informar quando e quem fez a dita integração e quando foi aprovada pelo Conselho da Cidade. Até o dia de hoje em nenhuma das reuniões do Conselho o tema da integração entre LOT e o Plano de Mobilidade entrou na pauta. Houve, sim, críticas ao fato que ambos não estivessem integrados.
Assim é difícil que haja integração entre um e a outra. Se for o caso, o prefeito deveria informar quando e quem fez a dita integração e quando foi aprovada pelo Conselho da Cidade. Até o dia de hoje em nenhuma das reuniões do Conselho o tema da integração entre LOT e o Plano de Mobilidade entrou na pauta. Houve, sim, críticas ao fato que ambos não estivessem integrados.
O prefeito deve achar que está investido da prerrogativa
da infalibilidade e que for ele a dizer, passa a ser uma verdade absoluta que
não pode ser questionada por ninguém. Para quem conhece menos os temas ligados
a infalibilidade papal, é uma prerrogativa atribuída à Igreja em sua
totalidade, ou ao Papa, para os católicos, de não errar em questões pertinentes
à fé e aos costumes, quando pretende conferir uma orientação universal e
decisiva. O prefeito age com frequência como
quem detém o monopólio da verdade e faz com ela o que quer.
Os seus acólitos do andar de cima seguem à risca as suas
orientações e adaptam a LOT, o trânsito, o planejamento da cidade e qualquer
outro tema assemelhado às suas vontades passageiras. E assim cresce Joinville,
mal e sem planejamento, sem uma visão estratégica, só orientada pelos humores e
os interesses pontuais do Papa de plantão.
Alguns exemplos de como as coisas mudam. Desde 2006 o IPPUJ
insistia, com teimosia de santo, na criação do monstrengo das ARTs (Áreas
Rurais de Transição). E agora, depois de 9 longos anos de desgastantes recursos (incluso de um risco concreto de novas ações na justiça), o mesmo IPPUJ, sem ter
conseguido apresentar um parecer da própria procuradoria do município sobre o
tema, decidiu retirar as ARTs do texto porque não há segurança jurídica que o
modelo seja adequado. A teimosa certeza de ontem tem dado lugar a uma cautelosa
dúvida hoje.
O mesmo IPPUJ que ainda hoje defende a ampliação de usos
sobre os mananciais hídricos, deve achar que água não é um insumo estratégico e
acredita que nunca vai faltar. Por isso, a proposta de permitir o avanço de outros
usos que não a preservação sobre os mananciais de Joinville.
Sobre os manguezais, o IPPUJ propõe na LOT não só o aumento
dos usos e, portanto, cria um risco concreto sobre um ecossistema frágil. Os técnicos
do IPPUJ vão mais longe na sua ousadia e chegam a propor uma FV ( Faixa Viária)
em área de mangue. Deve ser esta a integração entre a LOT e o Plano de
Mobilidade a que o prefeito se refere.
É o mesmo IPPUJ quem propõe, com a benção Papal, a criação
de FVs (Faixas Viárias) a esmo sem nenhuma garantia, contrapartida ou
exigência de infraestruturas na sua concretização. Estou começando a entender a
tal de integração entre um e a outra.
O IPPUJ, mesmo
retirando do texto as ARTs, permanece com as FAIXAS VIÁRIAS RURAIS em Área
Rural, transformando usos, ocupações e índices urbanísticos de área urbana. O resultado será levar para esses mesmos lugares a insegurança jurídica das ARTs.
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015
Criminalização da homolesbotransfobia: precisamos ir além.

POR EMANUELLE CARVALHO
Em
2014, foram formalmente contabilizadas 326 mortes de gays, lésbicas,
bissexuais, transexuais no Brasil. Ou seja, a cada 27 horas, um LGBT
é morto no país. O número é um dos mais altos do mundo, e
provavelmente é subestimado em virtude das mortes não registradas
devidamente pelas delegacias. Nos casos onde a população LGBT é
também profissional do sexo, os índices são ainda mais maquiados,
sendo comumente vistos como ‘’desentendimento’’ entre
clientes. (que a deusa me livre de me desentender assim). O número
representa um crescimento de 4,1% referente a 2013.
Mas
aí o leitor pode me questionar: e quantos heterossexuais morrem
todos os dias e ninguém faz nada? Heterossexuais não morrem em
virtude de sua orientação sexual, ou sua identidade de gênero.
Ninguém é odiado, maldito, mal visto, expulso de casa ou estuprado
porque resolveu assumir-se hétero. Aliás, as pessoas sequer precisam assumir-se hétero, não passam por este constrangimento. A heterossexualidade compulsória
e a cissexualidade compulsória, ou seja, essa mania que a sociedade
tem de achar que todo mundo que está a sua volta é necessariamente
hétero e necessariamente cissexual (termo utilizados para se referir
às pessoas cujo género é o mesmo que o designado quando do seu
nascimento) funciona como uma manutenção e aprovação desta
LGBTfobia.
Além
disso, a promoção da impunidade quando não existe uma legislação
específica que trate casos como estes dificulta a investigação e
estimula que novos casos ocorram. Aproximadamente 80% dos casos não
vão a julgamento em virtude a ineficiência do poder público. Será
que apenas criminalizar esse tipo de crime é suficiente? Será que
aprisionar um homofóbico fará com que ele se ressocialize e
compreenda seus preconceitos?
Claro
que não.
A
punição colabora para que o combate aos crimes contra a vida se intensifique, mas o preconceito ainda precisará ser sistematicamente
combatido. Em 2014 a lei que define os crimes de racismo fez 25 anos
e até hoje nenhum caso se enquadrou na norma, tendo a justiça
apenas tipificado como injúria racial, tendo em vista uma pena mais
branda. Ao aprovarmos uma lei anti homofobia cairemos no mesmo dilema: o preconceito social dos agentes da lei também precisa ser revisto.
Casos
como o do Goleiro Aranha, e do técnico eletrônico Januário Alves
de Santana (que apanhou de seguranças em um estacionamento de
mercado) foram sentenciados como injúria, mesmo sendo vistos por
militantes do movimento negro, pela secretaria de igualdade social, e
lidos pela sociedade em geral como racismo.O fato é que precisamos
repensar novos formatos educacionais partindo da educação formal,
passando pela interação midiática e pela desconstrução do
preconceito no trabalho e nos espaços da academia.
Para
isso, é preciso antes de tudo, que a gente se entenda e se reconheça
enquando homolesbotranfóbico. Se nenhum de nós se considera
homofóbico, bifóbico, transóbico, lesbofóbico quem é que produz
esses preconceitos? Precisamos conversar sobre sobre homolesbotransfobia..
Hoje,
os parâmetros curriculares nacionais, os famosos PCNs que
regulamentam os temas a serem tratados nas escolas públicas de todo
os país, possuem como tema transversal a diversidade cultural, a
orientação sexual e os debates sobre identidade de gênero? Há,
inclusive verba específica do Ministério da Educação para a
capacitação e formação de professores que não tenham intimidade
com a temática (mesmo sendo pressuposto de que o professor já deva
ser orientado sobre isso em sua graduação).
Porém,
hoje em Joinville essas diretrizes não são seguidas, e qual o
motivo? O descaso com as mortes de LGBTs configura dupla violência:
a de uma sociedade doente e medieval, e a de um estado omisso,
inseguro e pouco eficaz.

POR EMANUELLE CARVALHO
Em
2014, foram formalmente contabilizadas 326 mortes de gays, lésbicas,
bissexuais, transexuais no Brasil. Ou seja, a cada 27 horas, um LGBT
é morto no país. O número é um dos mais altos do mundo, e
provavelmente é subestimado em virtude das mortes não registradas
devidamente pelas delegacias. Nos casos onde a população LGBT é
também profissional do sexo, os índices são ainda mais maquiados,
sendo comumente vistos como ‘’desentendimento’’ entre
clientes. (que a deusa me livre de me desentender assim). O número
representa um crescimento de 4,1% referente a 2013.
Mas
aí o leitor pode me questionar: e quantos heterossexuais morrem
todos os dias e ninguém faz nada? Heterossexuais não morrem em
virtude de sua orientação sexual, ou sua identidade de gênero.
Ninguém é odiado, maldito, mal visto, expulso de casa ou estuprado
porque resolveu assumir-se hétero. Aliás, as pessoas sequer precisam assumir-se hétero, não passam por este constrangimento. A heterossexualidade compulsória
e a cissexualidade compulsória, ou seja, essa mania que a sociedade
tem de achar que todo mundo que está a sua volta é necessariamente
hétero e necessariamente cissexual (termo utilizados para se referir
às pessoas cujo género é o mesmo que o designado quando do seu
nascimento) funciona como uma manutenção e aprovação desta
LGBTfobia.
Além
disso, a promoção da impunidade quando não existe uma legislação
específica que trate casos como estes dificulta a investigação e
estimula que novos casos ocorram. Aproximadamente 80% dos casos não
vão a julgamento em virtude a ineficiência do poder público. Será
que apenas criminalizar esse tipo de crime é suficiente? Será que
aprisionar um homofóbico fará com que ele se ressocialize e
compreenda seus preconceitos?
Claro
que não.
A
punição colabora para que o combate aos crimes contra a vida se intensifique, mas o preconceito ainda precisará ser sistematicamente
combatido. Em 2014 a lei que define os crimes de racismo fez 25 anos
e até hoje nenhum caso se enquadrou na norma, tendo a justiça
apenas tipificado como injúria racial, tendo em vista uma pena mais
branda. Ao aprovarmos uma lei anti homofobia cairemos no mesmo dilema: o preconceito social dos agentes da lei também precisa ser revisto.
Casos
como o do Goleiro Aranha, e do técnico eletrônico Januário Alves
de Santana (que apanhou de seguranças em um estacionamento de
mercado) foram sentenciados como injúria, mesmo sendo vistos por
militantes do movimento negro, pela secretaria de igualdade social, e
lidos pela sociedade em geral como racismo.O fato é que precisamos
repensar novos formatos educacionais partindo da educação formal,
passando pela interação midiática e pela desconstrução do
preconceito no trabalho e nos espaços da academia.
Para
isso, é preciso antes de tudo, que a gente se entenda e se reconheça
enquando homolesbotranfóbico. Se nenhum de nós se considera
homofóbico, bifóbico, transóbico, lesbofóbico quem é que produz
esses preconceitos? Precisamos conversar sobre sobre homolesbotransfobia..
Hoje,
os parâmetros curriculares nacionais, os famosos PCNs que
regulamentam os temas a serem tratados nas escolas públicas de todo
os país, possuem como tema transversal a diversidade cultural, a
orientação sexual e os debates sobre identidade de gênero? Há,
inclusive verba específica do Ministério da Educação para a
capacitação e formação de professores que não tenham intimidade
com a temática (mesmo sendo pressuposto de que o professor já deva
ser orientado sobre isso em sua graduação).
Porém,
hoje em Joinville essas diretrizes não são seguidas, e qual o
motivo? O descaso com as mortes de LGBTs configura dupla violência:
a de uma sociedade doente e medieval, e a de um estado omisso,
inseguro e pouco eficaz.
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