POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
A imprensa brasileira parece sempre disposta a dar uma mãozinha a Michel Temer. Faz pouco tempo, o time do atual presidente lançou um balão de ensaio: a aposentadoria seria cada vez mais tarde. Muito mais tarde. Como é óbvio, a coisa não desceu pelo goto dos brasileiros e houve reações para todos os gostos (muitas desproporcionadas, poucas sensatas). E o governo golpista ficou com mais um abacaxi para descascar.
Mas o Brasil não tem segredo. Quem tem verbas publicitárias para distribuir pode contar com a imprensa. E a revista Exame veio em socorro do governo. A capa da edição mais recente traz uma fotografia de Mick Jagger e um aviso explícito: “você terá de trabalhar velhice adentro”. E acrescenta, com um entusiamo irritante: “a boa notícia: preparando-se para isso, vai ser ótimo”.
E a chiadeira começou, claro. Ótimo para quem, cara-pálida? Não dá para comparar Mick Jagger, que ganha a vida a cantar, com um cortador de cana, que tem uma das profissões mais insalubres do planeta. Resumo da ópera: apesar das reações indignadas, a revista cumpriu a sua missão. E espalhou a ideia. As pessoas ficaram avisadas para o que vem aí. Quando o governo tomar medidas, ninguém pode dizer que foi apanhado de surpresa.
A função da revista é óbvia: servir de muleta para o governo e convencer as pessoas de que o homo faber é o destino inevitável. Nascer. Trabalhar. Morrer. As sociedades moralistas como a brasileira ainda insistem muito numa certa “ética do trabalho”. Quem não trabalha deve ser excluído. A palavra “vagabundo” tornou-se uma ofensa. Eis um problema. O esquema mental brasileiro é tão velho que podemos ir buscar referência ao longínquo século 18.
O Traité de la Police, de Nicolas Delamare, é dessa época. Resgatado por Michel Foucault, destaca que a caça aos vagabundos era tão importante quanto a vigilância de criminosos e outros indivíduos perigosos. E ficamos a saber que, no início do capitalismo, o vagabundo – o homem que não trabalha porque não consegue emprego ou por simples recusa do modelo – é tratado ao mesmo nível de um criminoso.
O Brasil está na contramão da história, apesar de o senso comum ver o contrário. O problema é o tempo que se leva até à aposentadoria? Preocupante é a supressão do emprego que resulta das inovações tecnológicas. Interessante lembrar que, no século passado, o economista John Maynard Keynes publicou um texto a prever que, com a evolução das sociedades, as pessoas passariam a trabalhar apenas três horas por dia. O tempo livre seria para o lazer, a cultura e as coisas da vida. Ops!
A sociedade capitalista de consumo está na encruzilhada. A tecnologia elimina postos de trabalho e, claro, os salários. Sem dinheiro não há consumo. Sem consumo não há capitalismo. E as sociedades mais evoluídas procuram soluções. A Finlândia, por exemplo, tem um projeto piloto: 2 mil desempregados recebem uma verba do Estado que lhes permite continuar a consumir. É uma forma de antecipar o que, no futuro, pode vir a ser uma convulsão do sistema capitalista.
Tem medo de se aposentar tarde? Certo. Mas é importante ver mais longe. É preciso estar atendo ao seu emprego. A tecnologia é o motor de evoluções que estão a eliminar postos de trabalho. A Lei de Moore foi acelerada. E ressurge uma questão: se o usufruto das transformações tecnológicas não for socializado - e os benefícios estendidos a todos -, o sistema entra em colapso. É chegado o momento de introduzir a palavra socialismo (prefiro ecossocialismo) na semântica do cotidiano.
É a dança da chuva.
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terça-feira, 17 de janeiro de 2017
quarta-feira, 3 de abril de 2013
É possível viver sem empregadas domésticas!
POR FERNANDA M. POMPERMAIER
Depois de 5 anos casada eu sabia que em alguns momentos a divisão de tarefas era motivo de discussões. Ele demorava muito para lavar a louça ou levar o lixo, eu detestava varrer/passar aspirador, enfim,... Chegamos a passar alguns períodos sem esse serviço, e noutros com uma pessoa que vinha 1 vez por semana fazer uma faxina. Mas essas questões desgastavam a nossa relação. (oi?) - Minha opinião de brasileira, classe média, mimada.
Mas uma das grandes vantagens de mudar de país é o choque cultural. E eu aprendi que a minha preocupação, além de ser estúpida e egoísta era responsável por uma situação de quase escravatura no Brasil.
O Brasil tem uma das maiores populações de empregadas domésticas do mundo, são aproximadamente 7 milhões de pessoas e 92% dessas, são mulheres. Ou seja, resquícios tanto de machismo quanto da escravatura. Do machismo porque as mulheres ainda são, na visão de muitos, os seres mais "apropriados" para lidar com as tarefas da casa e os filhos, o que não tem nenhuma lógica. E da escravatura porque muitas dessas empregadas não tem garantidos direitos mínimos trabalhistas. Existem as que "dormem no serviço", muitas vezes mal instaladas e com trabalho que vai noite adentro; As que só podem ir embora quando tudo estiver pronto, mesmo que isso ultrapasse as 8h diárias, As que não recolhem FGTS, não tem plano de saúde ou indenização em caso de demissão e outros casos. E se isso não é escravidão, eu não sei o que é.
É apenas isso que a PEC das empregadas domésticas quer aprovar: direitos básicos.
Fácil agora ouvir de todo lado o mimimi da classe média que vai ter que começar a limpar o próprio banheiro porque empregada doméstica irá virar artigo de luxo.
Acho ótimo. Elas são trabalhadoras como qualquer outra e merecem o mínimo de respeito.
Eu aprendi na Suécia que é possível e até saudável fazer a divisão do trabalho doméstico, já que a prática imprime um maior senso de responsabilidade. Se somos nós que limpamos, acabamos cuidando mais na hora da sujeira, não é?! E esse conceito se estende para toda a sociedade que sabe que o governo deverá pagar alguém para limpar a sujeira que eu deixar nas ruas, dinheiro que poderia ser mais bem aplicado. Existe uma relação direta entre limpar a própria sujeira e ter responsabilidade.
Além disso, quando são os próprios donos que limpam, eles se preocupam mais com a qualidade do material usado e o tempo economizado o que faz com que invistam em facilitadores do trabalho. A maior parte das casas aqui tem máquina de lavar louça, secadora de roupas, lenços descartáveis para banheiro e janelas, entre outros recursos.
E não que contratar o serviço de uma diarista seja impossível. Se estiver disposto a pagar aproximadamente 120kr/hora, algo como 40 reais por uma hora de trabalho, tudo devidamente registrado, pagando imposto, vai poder.
A vantagem nisso tudo é saber que a pessoa que está limpando a sua casa tem as mesmas condiçöes de comprar roupas e ir ao cinema, que você tem. Considerando que educação é de graça e de qualidade, ela pode até ter mais formação acadêmica e falar mais línguas que você. Gera uma sociedade mais igualitária, com menos criminalidade e mais segurança, o que eu não troco por nada.
Se limpar nossos banheiros for uma das responsabilidades que devemos assumir para muitas pessoas viverem com mais dignidade, podemos fazer, não é?!
PS.: A foto que ilustra o post vem de um artigo do jornal local sobre a possibilidade de jovens estudarem e completarem sua renda com trabalhos de limpeza, que muitos idosos contratam.
http://www.aftonbladet.se/minekonomi/article11286306.ab
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
Lamber botas é profissão?
JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Um dia destes tive
uma troca de impressões interessante com um leitor. O argumento era de que eu estava a cometer uma
injustiça ao usar a expressão “teta pública”. Porque fica a parecer que todas
as pessoas no serviço público só querem ficar à sombra da bananeira. E reiterou: tem muita gente
que, apesar de ocupar cargos por indicação política, é competente e trabalha
duro.
Ok... para que não
restem dúvidas, vou esclarecer o meu ponto de vista. Quando falo em gente que
mama na teta pública é uma referência a pessoas que, por indicação política,
ocupam cargos para os quais não estão minimamente qualificadas. Ora, se uma pessoa tem as qualificações necessárias, nada a dizer.
Não vou citar
nomes, mas o pessoal mais atento provavelmente conhece alguém que ao longo dos
tempos tem conseguido viver desse expediente. Entra governo, sai governo e os
caras sempre conseguem uma boquinha, mesmo que em cargos menos importantes. E sem qualificação suficiente para a
iniciativa privada, acabam virando dependentes de empregos públicos.
Nestas últimas
eleições deu para acompanhar alguns casos. Mas em especial o de um tipo que quase sempre conseguiu se
manter enquistado na administração pública. Aliás, para que tenham a noção da
qualidade profissional do sujeito, é suficiente dizer que é como ter um cego a
arbitrar um jogo de futebol.
Eis a história.
Ainda só havia pré-candidatos e o cara manifestava publicamente o apoio a um nome.
Mas aí a candidatura não evoluiu e, ao mesmo tempo, Marco Tebaldi surgiu como
candidato. Foi o que bastou para o tipo declarar o seu apoio incondicional ao
deputado que, claro, liderava as pesquisas.
Mas a casa caiu
para Tebaldi logo no primeiro turno. O sujeito nem pestanejou. No dia seguinte,
para ele Kennedy Nunes, que também aparecia a liderar as pesquisas, era o
melhor candidato do mundo. Com a vitória tida como certa, lembro de ter visto o
cara bater forte e feio em Udo Dohler, usando uma adjetivação nada simpática.
Diz o ditado que
quando neguinho está de azar, urubu de baixo caga no urubu de cima. E não deu
outra: a inesperada virada de Udo Dohler deixou o sujeito numa saia justíssima. O que ele fez, então? O de sempre. Passados
poucos dias, já tenho visto, aqui e acolá, o tipo a insinuar que, afinal, Udo
Dohler não é assim tão mal. Sentiram?
É esse o meu ponto
de vista. Há uns sujeitos que sempre conseguem manter um lugarzinho, mesmo que
para isso tenham que se humilhar e lamber botas. E não duvido que neste exato
momento o tal sujeito já esteja a telefonar para pessoas conhecidas ou a enviar
e-mails a pedir emprego. É essa a minha posição: a administração pública
precisa se livrar desses sujeitos.
Há pessoas que não
têm espinha dorsal. Porque fica mais fácil se dobrar para lamber botas.
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