sexta-feira, 28 de julho de 2017

Trolls e bullies não são a mesma coisa. Mas ambos são infames...

POR LEO VORTIS
Muita gente confunde o “trolling” com o “cyberbullying”. O fato é que, segundo os especialistas, eles não são a mesma coisa. Em comum, há o fato de ambos passarem pelo processo conhecido por “online disinhibition effect” (perdem vergonha, ganham agressividade), mas há diferenças a considerar. Os trolls querem atenção e tentam incendiar as discussões, os cyberbullies são sádicos que querem magoar as suas vítimas.

Os trolls frequentam as caixas de comentários em blogs e jornais, por exemplo. As suas intervenções são feitas sempre de forma a interromper – ou impedir – a discussão proposta num texto, sobre a qual outros leitores provavelmente gostariam de opinar de forma séria. Um troll precisa da atenção das pessoas e, para ser notado, não se importa de fazer comentários infames e de mau gosto. Sexistas ou racistas, por exemplo.

Os cyberbullies têm outro objetivo. A intenção é atacar uma pessoa em específico (os tais comentários ad hominem, por exemplo) e em vez de declarações incendiárias preferem se concentrar numa única pessoa, de forma a ofender ou intimidar. Se encontram um motivo – uma foto, um post nas redes sociais ou uma fofoca – não perdem tempo em tentar provocar vergonha no seu alvo.

Os trolls tentam desviar o foco das pessoas de um texto e do seu autor, chamando a atenção para si mesmos. Fazem comentários estapafúrdios com a intenção de provocar comentários também estapafúrdios de outros leitores. Quando mais atenção um troll recebe, mais contente fica. Mas há o reverso da medalha: se não consegue a luz dos holofotes, o troll desanima e vai trolar noutro lugar.

Com os cyberbullies é diferente. Eles não querem chamar a atenção para si mesmos, porque o objetivo é aviltar e magoar as suas vítimas. Enquanto os trolls querem incendiar os ambientes, sem se importar se fazem alguém sofrer ou não, os bullies têm esse objetivo bem claro: a ideia é causar danos emocionais nos seus alvos. É claro que se aproveitam de pessoas mais vulneráveis.

Enfim, o que se tem são dois tipos espúrios de personalidade. Tão espúrios que sequer sabem o quão espúrios são...

quarta-feira, 26 de julho de 2017

A dor dos outros vai nos unir

POR DOMINGOS MIRANDA
O negro continua sendo o pária de nossa sociedade. Mas nem tudo está perdido, pois em julho aconteceram dois fatos que tocaram a nossa sensibilidade. O primeiro foi a Unesco, órgão da ONU voltado para a cultura, ter reconhecido o Cais do Valongo, porto de entrada dos escravos africanos no Rio, como Patrimônio da Humanidade. O segundo fato foi a repercussão e a mobilização que houve contra a execução de um negro, catador de produtos recicláveis e morador de rua, em frente a um supermercado do bairro Pinheiros, em São Paulo.

Ricardo Nascimento estava armado com um pedaço de pau na mão e levou dois tiros no peito disparados pelos PMs que o abordaram. Na hora, as testemunhas chamaram os policiais de assassinos, mas no dia seguinte a classe média e os moradores de rua fizeram uma grande passeata contra este abuso do Estado. Na missa de sétimo dia, na catedral da Sé, a morte do carroceiro foi equiparada à do jornalista Vladimir Herzog, executado pela ditadura em 1975.

No Brasil, a maioria da população é formada por negros, que ainda são tratados como cidadãos de segunda classe. Portanto, este título dado ao Cais do Valongo pela Unesco poderá nos ajudar a fazer uma reflexão sobre os 350 anos de escravidão em nosso país. Dos 4 milhões de escravos africanos que aqui entraram, 1 milhão deles desembarcaram no cais do Valongo entre 1774 e 1831. Ele também foi reconhecido como um local de “Memória sensível” por causa do sofrimento daqueles que ali desembarcavam, da mesma maneira do campo de extermínio nazista de Auschwitz. Milhões de pessoas do mundo inteiro visitam os galpões de Auschwitz e podem sentir a que ponto chega a crueldade humana.

Se for feito um bom trabalho de divulgação, ao pisar as pedras do Cais do Valongo os visitantes terão oportunidade de repensar a dor causada a estes seres arrancados do seio de suas famílias na África para serem usados como animais de trabalho, sujeito a açoites, pancadas e nunca recebiam qualquer tipo de afeto por parte dos senhores. Nossas escolas não dão a dimensão desta hecatombe, pois para o holocausto negro não existe uma máquina eficiente de divulgação como acontece com o massacre dos judeus. Ainda não fizemos a reparação necessária a esta gente; as cotas nas universidades não paga o sofrimento causado pelos brancos contra os negros.

Passados 129 anos da promulgação da Lei Áurea, os negros continuam morando nas favelas, recebendo salários irrisórios e sendo a maioria das vítimas de execuções. Aquilo que aconteceu com o negro Ricardo Nascimento, em um bairro de classe média de São Paulo é o cotidiano nas favelas da periferia. O diferencial, e que a PM não imaginava que fosse acontecer, foi que a classe média viu nesta execução um abuso.

Os moradores de Pinheiros conheciam Ricardo, pois ele prestava um bom serviço à comunidade, recolhendo produtos descartáveis. Afinal, as pessoas estão cansadas da barbárie que tomou conta deste país. A vida não vale mais nada. Seria perfeitamente possível imobilizar uma pessoa indignada e armada com um pedaço de pau. Mas, habituados com a truculência nas favelas, os PMs fizeram dois disparos certeiros, jogaram o corpo na viatura e foram embora.

Uma semana depois a catedral da Sé estava lotada, não só com moradores de rua, mas, principalmente, com gente de classe média querendo mudar com estes crimes hediondos. Em 1975, nesta mesma catedral foi realizado um culto ecumênico para condenar a barbárie que resultou no assassinato de Vladimir Herzog. Ali começou o fim da ditadura militar. Esperamos que este ato do dia 19 de julho também represente uma virada nesta prática desvairada das autoridades contra os mais humildes.

Uma faixa pregada em cima da carroça de Ricardo expressava bem a vontade de todos ali presentes: “Parem de matar o povo! Queremos paz, amor e justiça”.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Lulinha: é mentira, mas eu quero acreditar. E daí?

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
A lancha de Lulinha. O jato de Lulinha. A mansão de Lulinha. A fazenda de Lulinha. A empresa de Lulinha (Friboi, claro). E a Ferrari pintada a ouro de Lulinha. Ontem juntei todas essas tontices num post (abaixo) para o Facebook. A coisa teve milhares de partilhas e hoje, ao acordar, tinha recebido quase uma centena de pedidos de amizade. Mas...

Muitas dessas pessoas eram aquilo que a fraseologia coletiva convencionou chamar “coxinhas” e os "pobres de direita". Foi estranho. O post terminava com uma ironia acerca dos “idiotas que acreditam nessas merdas”. Ora, se o objetivo era justamente escrachar o pessoal das camisas da CBF, então deve ter rolado uma má interpretação. Ou não.

O absurdo do post é tanto que parece impossível alguém levar a sério. Mas as pessoas padecem com déficits de compreensão. Não por acaso no ano passado ficamos a saber que, de acordo com o Indicador de Analfabetismo Funcional, apenas 8% dos brasileiros têm condições de compreender um texto e de se expressar. Interpretar o mundo, então...

É uma incapacidade séria. Essa gente só vê o que quer. E como quer. O acesso massificado às redes sociais tornou o Brasil um lugar onde a mentira e o auto-embuste são uma forma de vida. Não importam os fatos, mas aquilo em que eu quero acreditar. É uma reedição de Nelson Rodrigues: “se os fatos estão contra mim, pior para os fatos”.

Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é o alvo preferencial dessa perversidade coletiva. Qualquer absurdo, por mais inimaginável, ganha força quando associado ao nome Lulinha. O boato mais recente vai ao limite do escárnio: ele teria uma Ferrari pintada a ouro. E há quem acredite. Por quê? Porque sim. E basta.

É como se a verdade fosse uma questão de gosto, uma escolha à la carte. Qualquer conexão com os fatos e com a realidade pode ser dispensada. A minha versão é o meu casulo e ninguém me tira de lá. Lulinha tem a Ferrari. É a minha verdade e é com ela que eu quero viver. A mentira vira uma patologia. A sociedade fica cada vez mais doente.

É daí que vem o perigo. As pessoas fundam a própria identidade em miragens, ódios e amputação dos fatos. E é com essa visão distópica que vão interagir nos meios sociais. Não pode dar certo. Mentira e ódio são primos de primeiro grau. E o rebento dessa relação é o ambiente belicoso em que se tornaram relações, sejam reais ou virtuais.

Enfim, sobre Lulinha eu sei que é mentira. Mas vou acreditar e essa vai ser a minha verdade. E daí? E termino por onde a coisa começou. É óbvio que rejeitei a “amizade” da maioria. Amigos, prefiro ter poucos mas bons...

É a dança da chuva.

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Udo Dohler: despreparado é quem governa tentando punir o cidadão



POR JORDI CASTAN
Não obteve o resultado desejado a ação impetrada pela Prefeitura Municipal de Joinville contra um grupo de representantes de associações de moradores e organizações sociais. São entidades que, durante o longo e escabroso processo de tramitação da LOT, assumiram uma posição crítica frente aos exageros, erros e a sistemática ausência de estudos técnicos e dados que permitissem uma amplia discussão com transparência e de forma democrática. É importante salientar que todos esses princípios estiveram ausentes desde o início do debate e foram atendidos só de maneira superficial e incompleta.

Eis o fato. Não adianta querer cercear o direito que o cidadão tem de defender seus interesses. Pior ainda quando o objetivo é tolher esses direitos de forma truculenta e autoritária. Não faz sentido propor uma ação por litigância de má fé a cidadãos e cidadãs que exerceram seu direito legítimo de buscar, na Justiça, as informações e os processos que foram omitidos pelo poder público, mancomunado com os mais escandalosos interesses imobiliários.

A ação pretendia ainda punir economicamente essas pessoas, solicitando que fossem multados. Afortunadamente, o juiz Dr. Roberto Lepper não acatou a pretensão do Executivo e determinou que a ação não tinha cabimento.




É grave e preocupante a insistência do Executivo municipal, representado pelo prefeito, em agir de forma despótica, evidenciando a falta de preparo para governar, de forma democrática, uma cidade como Joinville. Este tipo de atitude não tem cabimento numa sociedade moderna, plural e democrática. Falta maturidade, temperança e capacidade de diálogo, sobram autoritarismo, prepotência e arrogância.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Vem um friozinho e o pessoal...


Robôs-sexuais serão as prostitutas do futuro

POR LEO VORTIS
POR LEO VORTIS
Quem já viu a série televisiva “Westworld” deve estar familiarizado com o tema dos robôs humanoides. A história tem lugar num futuro onde a tecnologia é capaz de produzir réplicas tão perfeitas que fica difícil saber quem é máquina e quem é humano. É um parque temático onde os robôs, chamados anfitriões, existem para servir os seres humanos. É uma terra sem lei. O visitante pode matar um robô sem que isso seja considerado crime.

Mas talvez o ponto que mais chame a atenção são as “robôs-sexuais”, que estão ali para servir os visitantes. O fato de serem sempre mulheres (o que não impede o contrário) mostra uma (cripto)sociedade que reproduz o poder do macho. Daí para a realidade é um pulinho. Porque a humanidade caminha a passos largos para a criação de androides (e ginoides) cada bez mais perfeitos. E ninguém duvida que uma das primeiras aplicações deve ser o entretenimento sexual.

Muitas das empresas que  hoje fabricam bonecas sexuais já estão a pesquisar – algumas muito avançadas – soluções tecnológicas que permitam criar modelos capazes de falar ou de se movimentar. A distância para Westworld ainda é longa, mas a indústria vai a caminho. Alguns especialistas em robótica estimam que serão necessários cerca de 50 anos até que os robôs quase humanos sejam uma realidade.

Eis um exemplo de hoje. A RealDoll Abyss Creations, uma empresa especializada no desenvolvimento de bonecas sexuais, tem “produtos” em dimensão real e com possibilidade de alguma interação. Mas a partir deste ano estão introduzindo elementos de inteligência artificial. É notável o design hipersexualizado das suas bonecas, desenvolvidas de forma a reproduzir os estereótipos da mulher destinada ao sexo.

A questão já levanta problemas éticos no mundo real. Será lícito produzir robôs para o prazer sexual dos humanos? Há quem aposte num futuro no qual “robôs-prostitutas” irão trabalhar em bordéis ou poderão ser companhia para pessoas solitárias. E há ainda quem fale em robôs usados para tratamento, em casos de violadores e pedófilos. É este último caso é o que mais levanta discussão e pede a intervenção dos estudiosos.

A questão é séria. Tanto que já existe um doutorado em Ética de Robôs e Inteligência Artificial, com uma perspectiva feminista sobre as novas tecnologias (aqui). Enfim, uma coisa é certa: são novos tempos... e exigem novas abordagens.


A empresa fabrica bonecas quem parecem mulheres verdadeiras...

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Vereador socialista Rodrigo Coelho "detona" Lula


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇOPOR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Depois da discussão sobre os galos - vai para a panela, não vai para a panela - o vereador socialista Rodrigo Coelho, do PSB, voltou a ser destaque na Câmara de Vereadores de Joinville. O vereador protagonizou o momento pelo qual o Brasil esperava: subiu à tribuna para expressar a felicidade pelo anúncio da condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E o país parou para ouvir.

Com o seu conhecido talento para a oratória e num discurso mobilizador, o vereador falou em nome próprio e do PSB de Joinville. Uma ação que faz todo o sentido, uma vez que o seu partido é feito de gente incorruptível. É uma das poucas siglas que escapa incólume ao envolvimento com a corrupção ou mesmo apoio ao cada vez mais popular Michel Temer. Não confundam: o Sport na lista da Odebrecht nada tem a ver com o seu partido.

Sem meias palavras e num tom escorreito, o vereador afirmou que o ex-presidente Lula é o “chefe de todo o esquema que foi denunciado e comprovado pela Lava Jato”. Se ainda pairava qualquer dúvida sobre a culpa, parece que agora ficou tudo muito claro. O peso da afirmação do vereador vem esclarecer os fatos e pôr uma pedra sobre a questão. Detonado por Coelho, agora o ex-presidente Lula é carta fora do baralho. É Joinville fazendo história.

A greve geral de 1917 em Joinville


POR DOMINGOS MIRANDA
"Patrões cederam, mas depois perseguiram as lideranças".

Há exatos cem anos o proletariado se uniu numa greve geral e parou, na época, a segunda maior cidade do País. A partir daí os trabalhadores passaram a ter um papel de mais destaque na sociedade. Alguns resultados, frutos desta mobilização, vieram em seguida, tais como o surgimento do Partido Comunista do Brasil (1922), a primeira lei de seguridade social (1923) e a lei das oito horas de trabalho (1943). Até hoje, toda a conquista do trabalhador se deu através de muita luta e organização.

O descontentamento da classe operária já vinha num crescente desde o início do século por conta dos baixos salários e da carestia. A erupção deste vulcão social se deu em São Paulo, em 9 de julho de 1917, quando os operários de uma fábrica têxtil entraram em greve por melhoria salarial e das condições de trabalho. Mesmo com a repressão violenta, o movimento se espalhou como fogo em palha seca e em poucos dias 70 mil trabalhadores estavam em greve geral e a capital paulista parou totalmente durante uma semana. Após intensa negociação, chegou-se a um acordo e os grevistas conquistaram reajuste salarial de 20%, sem a dispensa de qualquer participante do movimento.

A vitória teve repercussão nacional e o movimento paredista se estendeu por outras cidades de vários Estados. Em Joinville, cidade de formação educacional prussiana baseada na ordem e no respeito aos chefes, o descontentamento escapou do controle. Em 23 de julho de 1917 estouraram greves em várias fábricas pela primeira vez. Por causa da 1ª Guerra Mundial, os preços das mercadorias dispararam, provocando grande carestia e gerando descontentamento geral. O exemplo de São Paulo foi a fagulha que incendiou as mentes dos operários. Com as máquinas paradas, os empregadores foram obrigados a chegar a um acordo e se comprometeram a vender alimentos por preço de custo. A greve se encerrou no dia 1º de agosto.

Pegos desprevenidos, os empresários se mobilizaram em torno de suas associações para evitar o aparecimento de  novos conflitos trabalhistas e fizeram intensa propaganda contra “os agitadores”. No dia 4 de agosto, o jornal Gazeta do Comércio publicou manifesto dos patrões pedindo ao operariado que fechasse os ouvidos aos pregoeiros da demagogia que “outra coisa não fazem senão fomentar agitações estéreis e perniciosas ao próprio operariado”. No entanto, para os líderes dos grevistas a repressão foi mais violenta. Foram publicadas as famosas “listas negras” – onde constavam os nomes dos trabalhadores ditos  desordeiros – que foram banidos do interior das fábricas.

Passados cem anos, muita coisa mudou. Mas a razão das greves permanece a mesma, pois o patrão busca maior lucro, geralmente em cima de salários reduzidos. Isto fica evidente quando se vê a mais recente pesquisa do IBGE, com dados do cadastro da Central de Empresas, mostrando que o nível dos salários dos operários de Joinville está abaixo da média do Brasil. A greve geral de 1917 mostrou o caminho, mas a luta não pode parar.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Matamos pessoas de frio e de desigualdade hoje

POR FELIPE SILVEIRA
Na semana passada, o Profissão Repórter mostrou um pouco da realidade de pessoas que moram na rua por N motivos. A imagem de uma criança tomando banho na água fria do metrô chocou muita gente. Outras nem ligaram, mas será que ainda são gente?

A imagem de pessoas em situação de rua, sejam elas crianças, mães, pessoas que perderam tudo ou outras em situação de drogadição não é novidade para quem se chocou vendo pela TV. Quem sempre se preocupou com os direitos básicos das pessoas sabe a dimensão do problema, os fatores causadores e o quanto estar na rua amplia os problemas dessa população que fica mais sujeita à violência, à falta de saúde, de educação…

E um comentário resume bem a contradição quando a questão é moradia: “Tanta gente sem casa, tanta casa sem gente”.

A quantidade de casas vazias poderia abrigar tranquilamente as famílias e pessoas que estão nas ruas, mas “nós” não queremos isso. Queremos a manutenção de um sistema que jogue gente na rua, sem importar se as crianças vão passar fome, tomar banho gelado e ficar doente. Ou se os mais velhos vão morrer de frio nas calçadas.

Hoje fez frio e muita gente ficou preocupada com gente na rua. Talvez até tenha doado algum cobertor, levado comida para alguém. É uma atitude louvável. Mas não é o que resolve o problema. Temos que resolver é este sistema que deixa pessoas sem casa e deixa as casas vazias.

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Joinville é uma cidade governada pelo achismo



POR JORDI CASTAN

Alguém realmente acredita que quando foi alterada a circulação frente ao Mercado Público, os decisores sabiam o que faziam? Ou que, quando da aprovação da LOT, alguém apresentou os estudos técnicos que avalizem as decisões tomadas pelos técnicos do extinto IPPUJ, da Câmara de Vereadores e dos próprios vereadores? Ou do aumento escandaloso da COSIP?


Os prazos de execução das obras públicas, os custos dos projetos ou a falta de relação entre o projetado e os resultados alcançados são exemplos de ignorância supina. E fica a pergunta: por que Joinville não levanta cabeça?

Com certeza há muitas razões para que Joinville esteja no atoleiro em que está metida. Uns dizem que a cidade anda em círculos. Outros que anda para trás, como os caranguejos. A verdade é que a cidade não sobrevive à comparação com cidades próximas em muitos quesitos, como segurança, mobilidade, qualidade de vida, saúde ou qualquer outro que utilizemos.

Assumo o risco de ser simplista demais, de reduzir o debate a um único critério. Mas mesmo assim vou propor uma análise sobre o processo de decisão municipal. É importante esclarecer que este processo de decisão e de tomada de decisão não é novo. Vem sendo praticado faz décadas e o resultado é que sem estudos, sem informações precisas e sem conhecimento adequado, as decisões tomadas pelos gestores municipais são puro achismo. 

O resultado não é o previsto, porque Joinville está cada dia pior. Um gestor precisa tomar decisões a cada dia. E, grosso modo, podemos dizer que há três processos que envolvem a forma de decidir. 

1. Há decisões das que sabemos os resultados. Esse é o jeito melhor e mais simples de tomar decisões. Se solto a bola que tenho na mão ela cairá no chão, não tem erro. O resultado da decisão é conhecido e não é preciso ser um Isaac Newton para saber.

2. Há aquelas em que os resultados são desconhecidos, mas as probabilidades são conhecidas. Em esse caso há um risco inerente à decisão que estamos tomando. É como entrar num casino e apostar, pois sabemos quanto estamos apostando e quais as probabilidades. Não há surpresas e não há resultados que possam ser alterados por uma terceira pessoa.


3. Finalmente há aquelas em que os resultados são desconhecidos, assim como as probabilidades. Isso é incerteza. É não saber o que vai acontecer como resultado das decisões que acabamos de tomar. É essa incerteza a que tem pautado as decisões tomadas em Joinville e que estão  transformando a cidade no que é hoje.

Os gestores acreditam que tomam suas decisões baseados no segundo modelo. Mas o fato é que estão prisioneiros do terceiro modelo, o da incerteza. Porque acham que estão tomando as decisões a partir do conhecimento as probabilidades, mas na verdade não as conhecem. Porque as ignoram, não têm a menor ideia de qual será o resultado e tampouco das probabilidades envolvidas.

Joinville poderia até se desenvolver se as decisões fossem tomadas a partir do risco, se houvesse um coeficiente de risco e os nossos gestores e os técnicos que os subsidiam e os abastecem com informações corressem riscos, riscos calculados, riscos conhecidos, riscos que a cidade pudesse correr.


Mas Joinville está gerenciada desde a ignorância, desde o desconhecimento, desde o mais puro achismo.  A cidade segue à deriva comandada por uma tripulação sem bússola, sem cartas náuticas e por comandantes que insistem teimosamente em sinalizar o rumo da barca sem conhecimento e guiados pela pertinaz ignorância. Por isso Sêneca esta mais atual que nunca: “Não há bons ventos para quem não sabe aonde vai”.