POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Hoje em dia anda difícil analisar o Brasil sem
recorrer a exemplos da Alemanha dos anos 30. Mas terá que ser. É atribuída a
Joseph Goebbels a frase segundo a qual “uma mentira dita mil vezes acaba por se
tornar verdade”. Faz sentido. Mas o ministro da propaganda de Hitler nem de
longe poderia imaginar a criação da internet e nem os seus efeitos sobre as
classes médias (aquelas que Marilena Chauí chamou de aberração cognitiva). Nem a mente ardilosa de Goebbels imaginaria o Brasil de hoje.
A tese goebeliana foi ridicularizada. A lógica passou a ser “mil mentiras ditas mil vezes acabam por se tornar fascismo”. É
inacreditável o número de bacoradas que a gente ouve todos os dias. A coisa vai
às raias da razão. É insano. Um dia destes uma pessoa usou um mentira cabeluda como
argumento - dessas que pululam nas redes sociais - e tentei esclarecer. Mas a resposta foi definitiva: “pode ser
mentira, mas eu acredito no que quiser”. Caso encerrado.
O problema é esse. Quem mente para os outros é
apenas mentiroso. Quem mente para si mesmo é lunático. E um lunático movido por
uma ideia obtusa é perigoso. O caso do Brasil é ainda mais preocupante, por
causa de uma mídia dada à distorção e mesmo à mentira. Muitos
têm a mania de confundir "fatos" com as notícias que veem na TV. Não
é a mesma coisa. Aliás, parece que essa gente não assiste
o Jornal Nacional para se informar, mas para buscar um álibi para os seus desvarios.
Que tal pegar no caso mais mediático no
Brasil? A Polícia Federal anda com dificuldades para apontar, de forma
consistente, algum crime ao ex-presidente Lula. Que estranho! Porque eu próprio
conheço inúmeras pessoas que detêm provas consistentes de que ele é dono de um
triplex, de um sítio ou de um barco de alumínio. Inclusive os comentaristas
anônimos deste blog estão cheios dessas provas. Aliás, conheço uma
pessoa que tem tantas informações sobre os crimes do ex-presidente que o chama “chefe
de quadrilha”.
Há quem diga que isso é resultado de uma certa
inocência. Que as pessoas estão de boa fé e são enganadas pela pressão midiática. Talvez. Mas há mentiras
tão cabeludas que só uma pessoa muito mal intencionada pode repetir. Que Lula
estaria a tramar a morte de Sérgio Moro. Que Evo Morales ameaça invadir o
Brasil. Que Lula levou faqueiro de ouro do Palácio do
Planalto. Que a Corte de Haia quer novas eleições no Brasil. Que 90% dos
aprovados em concursos públicos são do PT. Que o preço dos militantes é um sanduíche de mortadela. E por aí vai.
É de mentira em mentira – tudo somado ao tal déficit
cognitivo – que se constrói o inconsciente social de um certo brasileiro médio. Seria cômico, até motivo de piada,
se não tivesse assumido contornos de tragédia. O discurso elaborado a partir de pequenas
mentiras aponta para a negação da democracia. E desvia a atenção das grandes questões. Pátria de tantas mentiras, o Brasil tem pernas curtas. E esse estado de coisas impede o país de cumprir o seu destino de avançar a passos largos para o futuro.
É a dança da chuva.