segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Chuvarada!


Chuva Ácida completa dois anos

POR COLETIVO CHUVA ÁCIDA

Hoje, dia 23 de setembro, o blog Chuva Ácida completa dois anos na internet.

Estamos cientes de que, em todo este tempo online, abrimos um novo canal para o debate, o contraponto e a crítica com conteúdo sobre os acontecimentos da cidade, do país e do mundo. Consolidamos isto em mais de 1400 postagens, que geraram quase 16 mil comentários e 570 mil visitas.

No dia de ontem os integrantes deste espaço reuniram-se em uma videoconferência (hangout do Google) para debater os objetivos do blog, os principais temas relatados neste último ano, e as expectativas para daqui em diante. A conversa foi transmitida ao vivo, via YouTube. Para quem não assistiu (ou quer ver de novo), a gravação do bate-papo pode ser conferida no vídeo abaixo:


Agradecemos a todos pelas visitas, comentários, sugestões, críticas e apoio, em todos os momentos. Os nossos propósitos seguem firmes, e esperamos melhorar diariamente, renovando-nos e refutando a estagnação e conservadorismo característicos das mídias tradicionais. É por isto que dedicamos parte de nossas vidas a este projeto. 

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A morte do Cão Tarado



Porque há histórias bonitas

POR ET BARTHES
Para quem gosta de uma história bem contada, daquelas que emocionam.


Os nomes e as coisas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

No tempo em que era criança não havia bullying. É que a palavra não exisitia (nunca ouvi alguém falar) e então a gente não sabia se sofria disso ou não. Como podem ver, o problema da minha geração era apenas sofrer de déficit semântico, porque ninguém tinha dado o nome à coisa. Aliás, se fosse pelos padrões de hoje acho que não tinha sobrevivido à minha infância e pré-adolescência.

Gente, aquilo era o reino do bullying. O Baleia era gordo. O Tiziu era um preto pequenininho. O Bode era japonês. O Mijão mijava na cama (mas era boato). O Frangão tinha um parafuso a menos. O Portuga, filho de portugueses, era burro. O Pamonha era molóide. O Barranqueiro nem me atrevo a dizer. O Pelé, nem preciso dizer. E eu era o Linguiça, por ser muito magro e alto.

É claro que a gente fazia piada e sacaneava com essas características mais marcantes dos outros. Aliás, se não houvesse motivo para pôr apelido, a gente inventava. Criança sabe ser amiga, mas também tem um certo prazer em sacanear os outros. Mas às vezes o caldo entornava e tinha gente que saía no braço. Só que ao final do dia a coisa passava e o pessoal acabava sempre amigo. Era normal para a molecada da minha geração.

Hoje é diferente. Vem especialista e diz:
- O que parece ser um apelido inofensivo pode afetar emocional e fisicamente o alvo da ofensa.

Claro que pode. Mas que culpa a gente tinha? A minha geração cresceu de outro jeito, com mais autonomia. Naquela época a gente tinha a rua, o campinho de futebol e o córrego para nadar nos dias de calor (e de frio também que criança não sofre com essas coisas). E garanto que não há maneira melhor para cimentar as amizades. Ah... e tinha o lado legal de que os pais e os professores nunca estavam nesses lugares.

Aliás, não sei que caminhos tomaram todos os meus amigos, apenas alguns. O Baleia ficou magro. O Frangão trabalha com investigação em agricultura. O Bode virou um pro dos computadores. O Portuga é engenheiro. O Tiziu tentou fazer carreira no futebol mas se deu mal. Eu fiz voto de pobreza e fui para o jornalismo. Mas sobrevivemos.


E hoje, quando vejo tanta gente a repetir essa palavra – e o tantão de gente que parece saber tudo sobre o assunto – só  penso numa coisa: ainda bem que eu não sabia inglês e nunca aprendi aprendi essa palavra bullying. Porque a minha infância podia ter sido muito chata. E viva o déficit semântico.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

E se houvesse uma troca de lugares?

POR ET BARTHES
A cidadania nossa de cada dia. Deem uma olhada na mulher do 1m08s. 


Os intocáveis



POR CLÓVIS GRUNER

Se depender da vontade do vereador James Schroeder (PDT) e de 17 de seus pares, joinvilenses que forem flagrados bebendo em lugares públicos serão considerados infratores. Assunto da semana, na última quinta-feira a Câmara de Vereadores aprovou o projeto de lei 48/2013, que visa proibir o consumo de bebidas alcoólicas em locais públicos. O projeto precisa agora passar por uma segunda votação antes de ser submetido ao prefeito Udo Döhler, que não sabe ainda se vai vetar ou sancionar a nova lei. Mas não importa seu futuro. Já é uma excrescência que ela tenha sido redigida, submetida ao legislativo e obtido ampla maioria de votos.

Trata-se de uma lei repleta de furos, aparentemente ambigua em suas intenções. Exemplos: os bares que possuem mesas em calçadas, que são públicas, podem continuar a fazê-lo,  porque pagam pela ocupação do espaço, que é público! Não por coincidência, é na badalada “Via Gastronômica” e adjacências, que se localizam as principais casas que poderão continuar a utilizar as calçadas públicas como se fossem privadas. Aliás, trata-se da mesma via onde acontece o Stammtisch, um evento que nada tem de popular e, por isso mesmo, pode continuar a frequentar e usar os espaços públicos sem ser afetado pela lei.

Não são melhores os argumentos para explicar a necessidade do projeto. De acordo com Schroeder, ele atende um clamor popular, embora sua noção de “popular” seja bastante restrita, limitando-se aos conselhos comunitários de segurança (Consegs) e ao 17º Batalhão da Polícia Militar, responsável pelo policiamento na zona Sul de Joinville, que o demandaram. Em entrevista concedida a um jornal local meses atrás, o vereador explica didaticamente suas intenções: “O que queremos”, afirmou, “é justamente promover o debate sobre o consumo de álcool entre os jovens. A lei vai permitir que a polícia aja preventivamente e não precise ir até um local depois que uma aglomeração de jovens com som alto e bebidas, por exemplo, já tenha virado bate-boca ou vias de fato com vizinhos incomodados, o que acontece com frequência nos bairros”.

PRODUÇÃO DE ILEGALIDADES – Tudo junto e misturado, e a cidade pode vir a ter uma lei elitista, preconceituosa e segregacionista. Porque nem mesmo o discurso pretensamente bem intencionado – o de que o álcool é um problema de saúde pública, por exemplo – convence: medidas sócio-educativas são muito mais necessárias e eficazes para combater problemas como o alcoolismo, que proibir seu consumo em lugares públicos. Principalmente porque não é nas ruas e praças onde mais se consome álcool, mas em espaços fechados, como bares e baladas. Há o acúmulo de lixo, o barulho, as brigas, os excessos? Sim, por certo. Mas como se tratam de exceção, e não da regra, não seria mais razoável prevenir ou, se for o caso, coibir e punir os excessos usando os mecanismos e aparatos legais e policiais já à disposição, ao invés de produzir novas ilegalidades?

A resposta é simples: o objeto da lei são os bairros e populações periféricos, (o texto não podia ser mais explícito quando se refere à Zona Sul, lugar historicamente estigmatizado pelos joinvilenses mais “tradicionais”), aqueles que vivem em “vulnerabilidade social”, na definição do Charles Henrique aqui no Chuva. Os frequentadores da Via Gastronômica e do Stammtisch podem beber nas calçadas e fechar uma via pública, consumir álcool, voltar para casa dirigindo e postar suas fotos nas redes sociais. O problema, afinal, não são eles: nenhuma lei municipal ousaria tocar nos privilégios de quem circula exibindo suas Tommy Hilfiger. Mas James Schroeder, seus colegas de parlamento e os muitos joinvilenses que aplaudiram a nova medida não estão sozinhos.

No século XIX, autoridades inglesas limitaram o horário dos pubs ao perceberem que, mais que beber, seus frequentadores os utilizavam como lugar de sociabilidades e discussões políticas. No começo do século passado, praticar capoeira era delito previsto no Código de Posturas da então capital federal, o Rio de Janeiro. Andar descalço também – uma proibição que inspirou uma das mais memoráveis passagens do romance de estreia de Lima Barreto, “Recordações do escrivão Isaías Caminha”. Mais ou menos à mesma época, em Curitiba, reuniões e eventos populares – definidos como “batuques e fandangos” – organizados por negros ou imigrantes que vivessem em regiões distantes do centro, só poderiam ocorrer mediante autorização policial.

A HISTÓRIA SE REPETE COMO FARSA – Na década de 1960, em Joinville, entre as preocupações das autoridades estavam os mendigos, jogadores e prostitutas. Para os primeiros, pretendeu-se o internamento compulsório; para os segundos, além de limites impostos pelo Código de Posturas de 1956, inúmeras batidas policiais, principalmente em bares localizados nos bairros mais à periferia. Para as últimas, o prefeito Helmut Fallgater projetou a construção de uma espécie de “centro de tolerância”: casas construídas especialmente para o funcionamento da prostituição, “tudo ficando seguramente bastante isolado (...) em zonas apropriadas, para melhor contrôle e observação da Polícia”. Em abril deste ano a Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou em primeira votação um projeto que proíbe os bailes funks nas ruas da capital paulista.

O que eventos tão distantes no tempo e no espaço tem em comum? Todos, sem exceção, não legislaram em função do bem comum mas, tão somente, proibindo e punindo práticas populares. Contaram, como o projeto de lei de James Schroeder, com o apoio da população “ordeira”, os homens e mulheres de bem. Aliás, vem do Facebook o comentário que define, sintética mas exemplarmente, o espírito da nova lei e as razões do entusiasmo com que foi recebida por alguns: meuuuuuuuuuuuu nem fala, vai ser uma benção.... a gentalha tem q se ferrar mesmo... escória da sociedade”, escreveu uma joinvilense de bem, certamente ordeira. Apesar da flagrante limitação retórica, ninguém conseguiu defini-la melhor.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

LOT e financiamento de campanhas: o caso da Estrada Barbante

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Fonte: webimprensa.sc.gov.br
Às vezes, nós aqui do Chuva Ácida somos criticados por textos e falas que são muito abstratas, conceituais ou que não se materializam diante dos olhos de todos, criando um panorama realístico sobre as coisas. Quando falamos sobre a LOT, Conselho da Cidade, corrupção, e todos os outros temas que dominam parte das discussões aqui proferidas, estamos falando de uma sociedade desigual, aquela do jeitinho, e que esconde interesses que vão contra ao bem de uma coletividade. Estamos desconstruindo coisas que acontecem, e compreendo que seja difícil, para muitos, desmascarar situações ou entender situações desmascaradas.

É sabido que as campanhas eleitorais são processos que incitam o desenvolvimento da corrupção. O financiamento privado pode colocar no jogo perspectivas particulares, através do dinheiro injetado na campanha dos candidatos. Sabemos também que o momento da alteração de zoneamento pode, por muitas vezes, representar interesses específicos de loteadores, empresários da construção civil, especuladores, etc. E o vereador tem um papel fundamental na hora das alterações de leis urbanísticas. Portanto, existe uma íntima ligação entre financiamento de campanha e alterações no zoneamento das cidades.

Para descrever isto, descobrimos nesta semana um fato muito curioso na política local, envolvendo a Toscana Construções S/A, o vereador Manoel Bento (PT) e a nova lei de ordenamento territorial. Os fatos levantados a seguir nos levam a crer que a relação entre os fatos citados existe.

Toda a suspeita começa com a inclusão da Estrada Barbante, no Morro do Meio, como uma Faixa Viária (clique aqui e entenda o que é Faixa Viária), após todas as discussões sobre LOT já estarem adiantadas nas instâncias internas da Prefeitura e da Câmara de Vereadores. Uma série de ruas e avenidas estavam incluídas previamente, e de repente, surge a Estrada Barbante.

A suspeita se desenvolve quando partimos para o entendimento do porquê da inclusão da Estr. Barbante no projeto de faixas viárias. O local é rural, não possui conectividade com outras vias troncais, e não possui nenhum motivo aparente (urbanisticamente falando) para ser uma nova faixa viária da LOT. Um erro dos responsáveis pelo projeto, aparentemente.

Entretanto, olhando a listagem dos donos de terrenos desta Estrada, aparece a Toscana Construções S/A, conforme mostra este arquivo, retirado do sistema da Prefeitura de Joinville. O terreno de 278mil m², enquanto zona rural, tem um uso muito restrito às atividades agrosilvopastoris. Enquanto faixa viária, terá seu uso amplificado, para vários tipos de empreendimentos. Ou seja: o terreno, com a LOT aprovada, vai valorizar e poderá ter empreendimentos da empresa no local, visto que a citada é uma construtora.

A consolidação da suspeita surge a partir da consulta desta empresa no sistema de informações das doações de campanhas. Em 2012, a Toscana Construções S/A doou R$ 10.000,00 (dez mil reais) para a campanha do vereador Manoel Bento (PT),conforme imagem abaixo, este eleito para mais um mandato. E que a inclusão da Estrada Barbante como faixa viária no projeto da LOT ocorreu após Bento ter sido eleito presidente da Comissão de Urbanismo da Câmara de Vereadores de Joinville (veja a versão atualizada do projeto da LOT no site do IPPUJ.


Está clara a relação entre o empresário, o político, e a LOT. Deixamos o Chuva Ácida à disposição dos envolvidos para explicarem esta doação para a campanha de Bento e as consequentes alterações no projeto da LOT, visando a valorização de um terreno particular a partir de um ato especulativo. Entretanto, não dá para admitir que a LOT (esta LOT, do jeito que está sendo feita) seja para o bem de todos, e que deva ser aprovada imediatamente, sem discussão com a população e um Conselho da Cidade democrático, sob o risco da cidade "parar". Quanto mais discussões tenhamos, mais aparecerão situações como estas, e o processo se tornará mais transparente. O acompanhamento, pela população, de questões como a LOT, direciona as políticas públicas para o caminho da efetividade, ao invés de um caminho difuso e danoso para a coletividade. Outros casos estão sendo investigados e serão divulgados oportunamente.

Atualização (25 de setembro):
A assessoria do Vereador Manoel Bento (PT), encaminhou a seguinte resposta:

Resposta ao blog Chuva Ácida
A assessoria do Vereador Bento (PT) entrou em contato com o Cientista Social Charles Henrique Voos referente à publicação feita ontem (18/09/2013) no blog Chuva Ácida. O motivo foi entender qual o embasamento para o texto presumir a relação de favorecimento da Empresa Toscana na LOT (Lei de Ordenamento Territorial).  

De acordo com Charles, sua matéria é resultado de análises de dados para sua pesquisa de doutorado. O estudo cruza informações acerca de empresas doadoras em campanhas políticas com pedidos na LOT. O Vereador Bento não nega que a empresa tenha feito uma doação em sua campanha. No entanto, é necessário esclarecer que o contato com esse grupo imobiliário de Rio do Sul, se deve ao apoio e orientação que o parlamentar ofereceu a empresa que vinha elaborando o projeto habitacional de construção de três mil moradias. Através do Programa Minha Vida, o objetivo é contemplar famílias de 3 a 6 salários mínimos no bairro Morro do Meio.  

Contudo não há em nenhum documento da Câmara (requerimento, moção, ofício) ou pedido verbal ao Vereador Bento (PT) solicitando a intervenção em questões de zoneamento na LOT. De nosso conhecimento, o único pedido de dados oficiais feito pela Toscana Construções consta como consulta branca na Seinfra para a construção de um empreendimento imobiliário do Programa Minha Casa Minha Vida. 

Até a data de 31/12/2011 não havia nenhuma indicação de Faixa Viária para a Estrada Barbante. Bem como a LOT não sofreu alterações em 2012. Atualmente, no novo projeto da LOT (Lei de Ordenamento Territorial), foi incluída a Estrada Barbante, por sugestão do Executivo.  
 O Vereador Bento entende que o estudante de doutorado tem o direito acadêmico de fazer suas análises. Porém segundo o próprio Charles, sua opinião não se baseia em nenhum documento de trâmite oficial, sem o qual jamais poderia se concretizar o pedido. 

É comum em pesquisas acadêmicas e cientificas utilizar a metodologia de análise comparativa onde o pesquisador ousa fazer essas considerações. Mas ao contrário do que foi citado, o Vereador Bento não teve nenhuma relação com a inclusão da Estrada Barbante como Faixa Viária na LOT (Lei de Ordenamento Territorial). O parlamentar manifesta seu posicionamento: 

“Estou em meu terceiro mandato e justamente por isso, tenho um compromisso com a população. Sou o presidente da Comissão de Urbanismo e no ano passado fui presidente da Comissão de Legislação e Justiça. Não encaminhei nenhuma sugestão para o novo projeto da LOT. A nova Lei de Ordenamento Territorial está sendo analisada pelo Conselho da Cidade. Prezo muito pelo respeito a cada cidadão. Portanto, tenho o direito de exigir que não sejam feitas suposições que coloquem em dúvida a minha conduta ética e moral”, diz Bento. 

Como a tese do estudante Charles ainda não foi publicada e nem julgada, o Vereador Bento sugere cautela nesse processo de pesquisa, para que não ocorram julgamentos precipitados e injustos antes da conclusão e legitimação do trabalho acadêmico. É importante que essas informações se pautem em dados factíveis.

Assessoria de Comunicação
Vereador Manoel Bento (PT)
E-mail: vereadorbento@gmail.com