quinta-feira, 21 de abril de 2016

A tortura, a serventia e os falsos patriotas


POR FELIPE CARDOSO

Imagine colocar ratos na sua vagina, máquinas de choque no seu ânus, arrancar suas unhas, torturar crianças, mulheres grávidas, amarrar sua boca no cano de escape de um carro, ligar e sair arrastando seu corpo. Imagine sumir com seu corpo e não dar nem a oportunidade da sua família enterrar. Imagine te prenderem em um tronco e arrancar sua carne com um chicote ou açoite. Usar ferro quente para marcar seu corpo e vários outros objetos apenas para castigar, humilhar, machucar... Torturar.

Tudo isso apenas por você se opor a um sistema de governo ou ser acusado de conspiração, ou simplesmente desobedecer a uma ordem, ou simplesmente ser negro e não querer se conformar com a escravidão.

Durante a votação do impeachment da presidenta Dilma, no último domingo, na apelidada “casa do povo”, com transmissão para todo o Brasil, o deputado Jair Bolsonaro tomou a liberdade para homenagear o coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, responsável por comandar o DOI-CODI (órgão de repressão da ditadura militar), entre os anos de 1971 a 1974. Além da homenagem tratou de humilhar a presidenta, guerrilheira torturada na época pelo coronel citado: “o pavor de Dilma”.

Com essa atitude, Bolsonaro não se dirigiu apenas aos mais de 6 mil corpos torturados durante o regime militar e seus familiares, muito menos aos 434 mortos durante o mesmo período. O deputado simplesmente enalteceu e comemorou a violência, a repressão e o fascismo dos colonizadores do país. Dos sequestradores, dos assassinos, dos estupradores.

Bolsonaro se dirigiu também aos milhares de negros e indígenas torturados e mortos durante toda a história do país, história que se repete até os dias de hoje, nas periferias dos centros urbanos e também no campo, a mando de fazendeiros e ruralistas.

Socos, chutes, pau de arara, afogamentos, ameaças, choques elétricos, pressões psicológicas... Diversas pessoas que passaram por torturas não conseguiram superar seus traumas, muitos cometeram suicídios, inclusive crianças, levadas pelos militares, acusadas de serem uma ameaça pelo simples fato de serem filhos de comunistas. Tiveram que ver seus pais torturados.

Já a presidenta Dilma, foi torturada por cerca de 22 dias. Dilma pertencia a Vanguarda Popular Revolucionária Palmares, que tinha o intuito de realizar sequestros e roubos para financiar a luta armada contra o governo militar. Em seu depoimento para a Comissão Nacional da Verdade, a presidenta relatou que teve um dente arrancado no período em que esteve presa.

“Uma das coisas que me aconteceu naquela época é que meu dente começou a cair e só foi derrubado posteriormente pela Oban. Minha arcada girou para outro lado, me causando problemas até hoje, problemas no osso do suporte do dente. Me deram um soco e o dente deslocou-se e apodreceu. Tomava de vez em quando Novalgina em gotas para passar a dor. Só mais tarde, quando voltei para São Paulo, o Albernaz completou o serviço com um soco arrancando o dente. [...] Fiquei presa três anos. O estresse é feroz, inimaginável. Descobri, pela primeira vez que estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando minha pele tremeu. Tem um lado que marca a gente o resto da vida”, conta Dilma.


Resistir ao poder do Estado, enfrentar todo o tipo de tortura e perseguição para defender a democracia foi o crime das organizações de resistência armada do país que, com grande influência da imprensa obediente as ordens dos militares, foram marginalizadas e demonizadas. Mesmo não pesando nenhuma acusação de tortura contra esses grupos de resistência ao golpe, é comum hoje vermos a distorção dos fatos, tanto que virou corriqueiro ouvirmos da boca da família Bolsonaro defesas e discursos saudosistas de uma das épocas mais tenebrosas do país.

O mais contraditório disso tudo é que Bolsonaro, hoje, pede pena de morte para os estupradores ao mesmo tempo em que enaltece e valoriza torturadores que praticavam estupros com presos políticos. Falta coerência.

Independente da orientação política, uma sociedade que aplaude o discurso covarde e agressivo de Jair Bolsonaro e sua prole desconhece ou desmerece a selvageria que foi praticada durante o período escravocrata e o regime civil-militar e que segue acontecendo nas quebradas, becos e vielas. Rafael Braga que o diga.

Vale lembrar que a ditadura militar teve interesses e influências externas, com destaque para os Estados Unidos que, inclusive, destinava instrutores para ensinar métodos de tortura aos militares brasileiros.

No cenário atual, podemos ver o mesmo interesse do passado. Diversos países de olhos bem abertos na economia brasileira, principalmente no nosso petróleo. Por isso, há tanto interesse na retirada do governo petista que deixou um pouco de lado os países desenvolvidos para firmar a economia com o BRICS e com o Mercosul. Isso não agradou alguns governos que hoje voltam a incentivar um outro golpe para que o país volte a vestir as rédeas de outrora, ficando, novamente, sob controle desses países.

Há quem se diga patriota, mas não respeita nem o princípio básico do patriotismo que é o respeito a soberania nacional. Os lobos em pele de cordeiro trabalham para entregar, mais uma vez, o Brasil para ser explorado por mãos estrangeiras. Mais uma vez.

Não podemos deixar a história se repetir.

Por todos os escravos e indígenas que não tiveram direito de se defender ou de denunciar essas atrocidades. Por todos os/as jovens que são torturados diariamente pela polícia nas periferias da cidade, por todos/as os/as torturadas durante o regime civil-militar. Por todos nós que trabalhamos diariamente para a construção de um país justo e realmente democrático. Resistir é preciso.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

O papel do jovem na nossa atual política




POR VANDERSON SOARES
A humanidade toda passa por uma convulsão mental que acomete quase todos os seres, uma revisão de valores e prioridades que assusta a qualquer um. O jovem, aquele que está começando sua vida, forjando o seu porvir, sente-se preocupado e inseguro acerca do seu futuro quando assiste os episódios recentes da política nacional.  Mas também é peculiar do jovem a ousadia e a coragem para enfrentar seu começo de vida e participar ativamente da construção de um país melhor. 

Logo o jovem, aquele preocupado com a faculdade, com o início de carreira, com o turbilhão de ideais, objetivos e aspirações, logo quando se está aprendendo a viver. 

Se me fosse permitido dar um único recado a quem está nesta fase da vida e vê o circo que a nossa política se transformou, eu diria: seja valente. 

Seja valente e não tenha vergonha de expor a sua opinião, de defender uma bandeira, de defender uma causa. Se for do seu agrado, estude a ideologia dos partidos e filie-se, milite, seja parte da solução. Ou lute para a possibilidade de candidaturas independentes.

Seja valente e ao te taxarem de coxinha, petralha, reaça ou o que quer que seja, e não mude sua opinião em troca de xingamentos. Se te convencerem pela razão, tudo bem, existe uma construção.

Muitas pessoas que estudam demais, como mestres e doutores, e não saem a campo, tem o hábito de rechaçar qualquer ideia contrária às suas, pois a vaidade acadêmica os consome. Permita-se ouvir o que eles dizem, mas tente estabelecer relações com a realidade

Seja valente e participe das eleições de sua cidade, de seu estado, seja apoiando alguém ou simplesmente pesquisando a vida dos candidatos e divulgando em suas redes sociais. 

Nossa democracia é jovem, ainda uma adolescente, e como tal é cheia de caprichos e manias. A ascensão das redes sociais, da comunicação, da internet, possibilitou a participação maior da sociedade civil na política.  E é nosso dever participar!

Seja valente e deixe seu nome à disposição, candidate-se. É notável que estamos nesse pandemônio pela falta extrema de pessoas de qualidade. Pessoas que tenham conhecimento, vivência em sociedade, que vivam as mazelas da cidade. É necessário renovar. 

Nosso país é um dos melhores do mundo, não tem terremotos, maremotos, vulcões; tudo que se planta nesta terra nasce, todo negócio por aqui prospera. Não permita que os políticos que pisoteiam toda a plantação deste povo continuem lá. Seja um jovem responsável, construa o futuro que você quer para o seu país. 

terça-feira, 19 de abril de 2016

Sem cuspe!


Antes de flexibilizar leis, flexibilizar a inteligência

POR JORDI CASTAN


Está a tramitar, neste momento, uma proposta de flexibilização da ocupação das margens dos rios e córregos em Joinville. Mas não é o que o bom senso imagina: é para reduzir e não para aumentar. Essa gente não aprende? É hora de lembrar que as obras milionárias para minimizar o efeito das enchentes no Rio Morro Alto, primeiro, e no Rio Mathias, agora, são em boa parte o preço que todos pagamos - e seguiremos pagando - durante décadas pela genial ideia de flexibilizar a ocupação dos fundos de vale e margens dos rios de Joinville.

Não há dia que não sejamos surpreendidos por uma nova proposta de flexibilização. Flexibilizar virou a palavra de moda entre 11 de cada 10 políticos. Historicamente, as propostas tiveram o apoio dos planejadores de plantão e garantiram pingues benefícios aos empreendedores da época. Há uma atávica relação promíscua entre empreendedores gananciosos e funcionários públicos pouco honestos. Há quem diga, também, que a relação é entre funcionários gananciosos e empreendedores pouco honestos. É um caso daqueles em que a ordem dos fatores não altera o produto.

O vereador Manoel Bento, na sua condição de presidente da Comissão de Urbanismo, defende a proposta de que se deve flexibilizar o EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança). Tem até convencido seus pares na comissão para que a dita emenda seja assinada por todos. Assim não precisa levar o seu nome e a iniciativa é socializada entre os demais vereadores. Curioso este interesse em flexibilizar a legislação.

Os vereadores deveriam se empenhar mais para que todos os empreendimentos sujeitos ao EIV cumprissem a lei. Que medidas efetivas fossem tomadas no sentido de mitigar, neutralizar ou evitar o impacto negativo que o empreendimento vier a ocasionar a vizinhança em que se implante. Não fica bem apoiar iniciativas que flexibilizem o EIV para os empreendedores e penalizem os vizinhos, que perdem assim uma importante ferramenta para se defender dos impactos negativos ocasionados pelos novos empreendimentos.

A justificativa divulgada é atender as escolas públicas. A lei 366/11 do EIV é recente é não prevê que empreendimentos públicos ou privados tenham tratamento diferenciado. E isso é bom. É bom para o cidadão, que pode participar ativamente nas audiências públicas e a tomar conhecimento de como este ou aquele empreendimento alterará a qualidade de vida do seu bairro ou da sua rua. A isonomia é boa. É um direito adquirido. E esta proposta flexibilização cerceia um direito adquirido pelos munícipes.

Nem vamos entrar na discussão sobre como cada tipo de empreendimento impacta o seu entorno, seja pela redução da insolação, da ventilação, pela maior impermeabilização ou pela perda da vista sobre paisagens que formam parte do nosso patrimônio, como o Morro do Boa Vista ou da Serra do Mar. Vamos analisar o impacto sobre o trânsito de uma escola com mais de 5.000 m2 de área construída. Quem tem uma perto sabe a que me refiro. Pais buscando e trazendo filhos, horários de pico, congestionamentos.

Que tal citar um exemplo concreto a mostrar o caos de uma escola no local errado, sem que se tomem as medidas necessárias para mitigar o impacto que a escola causará? Está em análise e já teve audiência pública a instalação do Colégio Marista na Rua Benjamin Constant. No estudo apresentado pela própria escola, está claramente identificada a insuficiência de capacidade da Rua Benjamin Constant para absorver o volume de tráfego adicional que a própria escola gerará.

A solução apresentada? Que haja investimentos públicos para resolver o problema. Genial. Um empreendimento privado reconhece que criará impacto negativo sobre o tráfego da região e a solução é que nos todos paguemos por isso. E o vereador Bento, com a conivência do IPPUJ, propõe que se flexibilize o EIV. Uma flexibilização que não é boa para o morador que terá sua qualidade de vida alterada pelo impacto. 

Com certeza não deve passar pela cabeça do vereador Manoel Bento e seus pares as flexibilização da lei para beneficiar a esta ou aquela escola, este ou aquele empreendimento. As limitações ao direito de propriedade que o EIV impõe devem ser mantidas e sem flexibilizações. Afinal, têm o objetivo claro e inequívoco de resguardar os direitos, não só do proprietário, mas principalmente o interesse coletivo no sentido de que as funções sociais das propriedades urbanas sejam atendidas. É a garantia de que Joinville seja um local de convivência harmônica e saudável para todos.

O EIV é um instrumento de planejamento local que não pode, nem deve ser flexibilizado, para atender a interesses pontuais e particulares. É o nosso direito o de participar ativamente nas audiências públicas e decidir sobre os efeitos da implantação de qualquer empreendimento na nossa vida.

Texto publicado pelo jornalista Jefferson Saavedra no AN Portal

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Ontem o mundo viu o show da Xuxa



POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Não há muito a dizer sobre o sórdido espetáculo da noite passada. Rendido a um grupo de crápulas, o país deixou de lado qualquer espécie de escrúpulo. Não é difícil vaticinar o pior para o futuro. Mas o texto de hoje não vai falar sobre isso. A ideia é dar uma amostra da imagem que o Brasil está a passar para o mundo. Porque a pantomima não passou despercebida aos olhos da imprensa internacional.

No espanhol El País, a correspondente María Martins é quem traz a referência ao show da Xuxa e à patetice das declarações de voto. “Os deputados defenderam o impeachment de Rousseff pelos mais diversos motivos: "para minha esposa Paula", "para minha filha que vai nascer e minha sobrinha Helena", "meu neto Gabriel ", "a tia que cuidou de mim desde pequeno" "para minha família e meu estado " , "Deus" , " pelos militares [ golpe ] de 64, "pelos evangélicos ", "pelo aniversário da minha cidade", "pela defesa do petróleo", "agricultor", "pelo café " e até mesmo "pelos corretores de seguros no Brasil ".

E lembra que os reais motivos para a votação foram esquecidos. “Para trás ficaram as manobras fiscais, o verdadeiro motivo para abrir o processo, completamente esquecidas pelos nobres deputados. Exaltados ante o microfone, exprimiram até o último segundo de glória que, para muitos o plenário oferecia pela primeira e, quem sabe, última vez . Os parlamentares fizeram lembrar os telespectadores de Xuxa, que usavam a participação ao vivo no programa para sempre cumprimentar mãe, marido, amante, primo, neto, vizinho, amigos e até o goleiro".

O show da Xuxa também não passou despercebido ao francês Liberation, que publicou um texto chamado “Brasil : entre crianças, bugigangas religiosas e camisas de futebol, o dia incomum dos deputados”. O jornal fala em declamações, “por vezes tendendo à postura teatral, muitas vezes aproveitam a oportunidade de tomar o tempo e holofotes, ao vivo na televisão, para enviar mensagens pessoais, dando pouca relevância às operações fiscais formalmente imputadas Rousseff”.

O Libé prossegue e narra que “além das múltiplas invocações a Deus e a Jesus , havia também se opondo à liberdade sexual e outros reivindicando o oposto.  Palavras duras também foram dirigidas contra o controverso presidente Eduardo Cunha, considerado o eixo do processo de impeachment , e teve que, sem pestanejar, ouvir insultos como 'bandido', 'ralé', 'corruptos'".

Em texto no jornal português Público, o analista Manuel Carvalho não tem meias medidas. E descreve aquilo a que chama uma turba perigosa e sem escrúpulos. Durante três penosas horas, a Câmara dos Deputados em Brasília dedicou-se a debater a destituição da presidente Dilma Rousseff e transformou-se nesse lugar estranho onde subsiste o pior que há no Brasil: a política", escreveu.

O jornalista é implacável. “O deplorável ambiente de comício, a inacreditável facilidade com que se trocavam insultos, a essência do Estado laico a ser torpedeada por persistentes clamores evangélicos, o deboche egocêntrico que levou uns a citar os filhos e outros os lugarejos de origem (sempre deu para saber que no Maranhão existe uma Itapecuru) foram apenas mais uma prova de que o Brasil está entregue a uma horda de predadores a quem não se pode confiar uma chave de casa, quanto mais o destino de uma Presidente eleita. Entre as intervenções dos 25 partidos e as dos líderes das bancadas do Governo e da minoria, raramente se falou no que estava em causa”.


É a dança da chuva.