terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

O curto-circuito de Udo Döhler

Imagem meramente ilustrativa
POR FELIPE SILVEIRA

Deve ter entrado em curto o choque de gestão prometido pelo empresário Udo Döhler (PMDB) antes de assumir a prefeitura de Joinville. Já estamos no terceiro ano do mandato e não há sinais de que as promessas de campanha sejam cumpridas a tempo.

Não há dinheiro para concluir a duplicação da avenida Santos Dumont, a ponte do Adhemar Garcia ainda não saiu do chão, o mirante não está pronto, o parque da cidade está sem luz há muito tempo, o Plano Municipal de Políticas Culturais não tem sido cumprido, os quilômetros de asfalto prometidos estão muito longe de serem concluídos, a saúde não tem apresentado resultados expressivos e o ano letivo começa com muitas reclamações sobre as condições das escolas. Sem contar os significativos aumentos da tarifa de ônibus, que enriquecem empresários e empobrecem a população trabalhadora que mais precisa.

O povo, por sua vez, não parou de protestar desde o primeiro ano de governo. Houve inúmeros fechamentos de ruas na gestão Udo e todo tipo de protesto. Dois casos emblemáticos foram as mudanças de trânsito no bairro Iririú e na rua Guanabara, onde pessoas já morreram por causa das péssimas condições para os pedestres.

Evidentemente, há conquistas. Não se pode esperar que uma administração municipal não faça nada em quatro anos. Tem dinheiro e tem gente pra fazer. Alguma coisa vai ser feita. Mas tudo muito longe do prometido choque de gestão. Coisa que a população percebeu há tempos.

No entanto, mais do que um problema de gestão, o governo Udo Döhler tem um problema de concepção, de projeto. Não é um governo para avançar na resolução dos problemas mais básicos. Pelo contrário, é um projeto de governo que sempre visou resgatar a Joinville romântica que só existe na cabeça da elite econômica local e daqueles que se deixam influenciar por ela. E são muitos. Um exemplo disso é a proposta para a mobilidade urbana do prefeito na época em que ele ainda era candidato. Em um debate, quando perguntado sobre o tema, disse que sua meta era fazer centenas de quilômetros de asfalto. Nada mais século 20 em pleno século 21.

A questão que se impõe, então, é: qual projeto queremos para Joinville e de que forma vamos apresentá-lo?

A última eleição foi disputada por quatro grupos de força equivalente, tendo sido vencida nos detalhes (entre eles, muita grana) por Udo Döhler e o PMDB. A chapa petista saiu muito enfraquecida da briga e dificilmente conseguirá se apresentar com força para o próximo pleito. Marco Tebaldi e o PSDB disputaram sem a mínima vontade de ganhar, até porque perceberam no começo que não iriam muito longe. Kennedy Nunes (PSD), por sua vez, sentiu o gostinho da vitória, mas tiraram o doce da boca da criança nos últimos momentos. É quem está na briga para a próxima.

Mas será que Kennedy tem um projeto de cidade alternativo ao que está aí? Parece-me que não. O candidato dos elevados, embora mais populista, também pensa com a lógica de grandes obras como alternativa.

A população de Joinville precisa se organizar mais e mais para interferir no processo político – e não permitir que promessas vãs sejam um fator decisivo para o seu futuro. Há quem diga que mira o futuro, mas ainda pensa com a cabeça do século 19. O presente (convém lembrar que já estamos no décimo quinto ano do século 21) exige novas formas de organização, de ação e de democracia.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Precisamos mentir tanto?



POR JORDI CASTAN
Na semana passada, comentei aqui o tema do restaurante popular do Bucarein, fechado pelo governo municipal por conta de uma suposta reforma. Quem passe na frente não verá ninguém trabalhando, nem traços de nenhuma reforma, nem qualquer informação referente à dita reforma. Ou seja, nem data de inicio, nem data prevista para conclusão, nem valor do contrato, nem o nome da empresa ganhadora da licitação.

A impressão que fica é a de que o restaurante foi fechado e que ficou por isso mesmo. A escusa da necessidade de uma reforma não parece convincente. Conta a administração municipal com o esquecimento da população e com a impossibilidade de lembrar de todas as obras: iniciadas e não concluídas, sem data prevista de conclusão ou simplesmente abandonadas. Há que acrescentar a isto a falta de um seguimento eficiente por parte da imprensa ou da sociedade organizada, o que permite que o governo nos presenteie todos os dias com novas empulhações.

Nestes dias a SECOM (Secretaria de Comunicação) da Prefeitura Municipal de Joinville informou que  no ano de 2014 a SEINFRA (Secretaria de Infraestrutura) autorizou a construção de 1 milhão e 400 mil metros quadrados de novas edificações. Representa o maior número de metros quadrados da história de Joinville. Nunca se construiu tanto. A média histórica dos últimos quatro anos se situa na faixa do milhão de metros quadrados. 

Os dados são sempre do próprio governo municipal. Os números de 2014 representam um aumento de quase 40%. O que tem a ver este crescimento vigoroso e sustentado do setor da construção civil com a paixão compulsiva pela mitomania dos nossos dirigentes municipais? O prefeito não perdeu nenhuma oportunidade, nos dois últimos anos, para defender a aprovação da LOT (Lei de Ordenamento Territorial), alegando que a cidade estava parada. Ou seja, que Joinville precisa aprovar a LOT urgentemente. 

Tem acusado a judicialização da LOT e as Associações de Moradores que tem capitaneado o processo de propor uma LOT mais democrática, com mais e melhores estudos e com dados claros que evitem que seja aprovada uma lei que comprometa o futuro da cidade para as gerações futuras.

Os dados divulgados pela própria prefeitura provam que não há motivo para forçar a aprovação da LOT, que o debate com a sociedade é necessário e não deve ser apressado por conta de uma suposta paralisia ou um engessamento do setor imobiliário. Mas, mais que qualquer outra coisa, os dados divulgados reforçam a suspeita de que o prefeito ou não sabe o que diz ou, sabendo, usa seu discurso para pressionar uma aprovação expedita. Ou, o que seria mais grave, tem ataques de mitomania compulsiva, e se dedica a praticar a arte de mentira política, sabendo que suas afirmações, mesmo sendo falsas, servirão para alcançar o objetivo que almeja.

Seria melhor para todos se as declarações do prefeito fossem tomadas com menor credibilidade e mais espírito crítico. O prefeito não tem nem o dom da infalibilidade, nem o da verdade absoluta. É um simples mortal ocupando um cargo terreno, por um tempo determinado, ainda que às vezes possa agir como um semideus. E está muito longe da imagem que ele e os seus acólitos querem nos vender.



A quantidade de mentiras que escutamos todos os dias alcança níveis nunca antes imaginados. Nem vou aqui focar na corja de mitômanos que têm tomado o poder no governo federal. Lá o caso é de policia. Acho mais interessante manter o foco aqui na nossa paróquia.



sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Transformação


Ou mudamos, ou seremos mudados

                                                                                              
Você já conhece esta frase. Já ouviu em algum lugar. Nos últimos dias cansou de ver políticos a repeti-la como mantra. E cá está este jornalista a utilizar a frase novamente, que saco!

Ulysses Guimarães, famoso político brasileiro que sumiu do mapa sem que o tenham encontrado até hoje, tem um livro publicado com este título (1991). Talvez ele não tenha mudado, e alguém o mudou por conta e risco em um acidente aéreo em 1992. Políticos costumam utilizar tais frases de efeito para seduzir o eleitor. Fazer com que pensemos que a mudança que eles bradam é a mesma que nós queremos e desejamos. Pura ilusão nossa.

Vejamos a eleição municipal de 2012 em Joinville (SC). A mudança para algo diferente, novo, era o mote. Mas os candidatos, os mesmos de sempre. O atual Prefeito se elegeu com o discurso da gestão, da qual ele era o grande conhecedor. Pura quimera. Ele também já era figura conhecidíssima, nãos dos pleitos eleitorais, mas de bastidores. Para não deixar no poder quem nunca quiseram, o uso da “mudança” foi maciço. Deu certo. Mudamos? Que nada, fomos mudados para votar no que a elite local desejava. Olhem a cidade e a gestão... paramos ou até regredimos.

Mais um case? Vamos para algo novo, a eleição das mesas diretoras do Senado e Câmara dos Deputados. Notem que fomos nós, brasileiros, que elegemos e reelegemos os ocupantes daquelas confortáveis cadeiras, gabinetes com altos privilégios. No Senado, o ex-governador catarinense Luiz Henrique, ex-pupilo de Ulysses, utilizou a frase famosa do seu eterno líder ao tentar apear Renan Calheiros da presidência. O que mudaria? Apenas os nomes, pois a prática é a mesma, afinal, ambos e grande parte daquela casa não muda faz tempo. Lá estão a manipular os destinos da nação em nome dos Estados.

Eduardo Cunha, veterano na Câmara dos Deputados, também fez uso da máxima ao propor a independência daquele poder. Derrotou o candidato de Dilma, o candidato de Aécio e PSDB, com sobras. Agora manda prá valer, e é o terceiro na linha sucessória do país. Mudou alguma coisa cara pálida? Alguma prática vai mudar? Os grandes temas nacionais que sonhamos ver valendo serão efetivamente votados? Ou mudamos, ou seremos mudados. Pois é. Eles continuam mudando tudo para nada mudar, e nós apenas a observar.

O Congresso Nacional saiu muito mais conservador das últimas eleições. A mudança para a qual milhões foram às ruas em 2013 vai ficar para mais alguns anos à frente. Duvidam? A não ser que ocorram terremotos nas ruas, anotem: serão enterradas a união civil de pessoas do mesmo sexo, a regulação da mídia eletrônica, o imposto sobre fortunas, a reforma política com financiamento público de campanhas, e qualquer outro projeto progressista. 

E que se cuidem os trabalhadores e trabalhadoras, pois ficarão mais 20 anos nas gavetas do Congresso temas como a redução da jornada de trabalho. E direitos trabalhistas, estes sim, poderão ser “flexibilizados”.

Ulysses Guimarães tem mais uma frase importante que compartilho aqui. “Quando as elites políticas pensam apenas na sobrevivência do poder oligárquico, colocam em risco a soberania nacional. A governabilidade está no social. A fome, a miséria, a ignorância, a doença inassistida são ingovernáveis. O estado de direito, consectário da igualdade, não pode conviver com o estado de miséria. Mais miserável do que os miseráveis é a sociedade que não acaba com a miséria.”


Ainda não superamos a miséria e as desigualdades sociais, e continuamos a nos superar na miséria intelectual, e na participação política. Os movimentos sociais estão preguiçosos, longe das lutas e das ruas. Não entenderam o seu papel nos governos petistas, e estão inertes. Não reagem, perdem a luta midiática. Os partidos são meros balcões de negócios. E assim perdemos todos. 

Olhem para os cenários políticos em todos os níveis. Vejam o que temos como lideranças para escolher nos próximos pleitos. Queremos que algo mude, de fato? Se sim, mudemos nossa ação, analisando e participando ativamente. Se não, deixemos que nos mudem para o último lugar na história.



quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Qual o papel do ensino médio?

 POR CHARLES HENRIQUE VOOS

O ensino médio no Brasil não cumpre o seu papel, desde a sua gênese. A cada dia que passa vivemos a mercantilização da aprovação no vestibular. Andando pela cidade, ainda mais nesta época do ano, presenciamos inúmeras propagandas das escolas (particulares) locais que "vendem" como seu principal produto o aluno (ou a aluna) que foi bem colocado nos mais concorridos vestibulares da região. Não fica entendido, por exemplo, se aquele aluno "formado" será bem sucedido na sua função de agente social.

A escola não dá, no ensino médio, as bases fundamentais que um jovem necessita para encarar os desafios da maioridade. Não promove o senso crítico, a boa leitura, a boa escrita, a interpretação de sistemas complexos, e não sensibiliza ninguém a ser ativo num mundo cada vez mais passivo e que aceita o status quo. Está muito claro que, para os pobres, geralmente estudantes de escolas públicas, o ensino médio é obsoleto pois não apresenta nada de novo, não prepara a juventude e nem a dá caminhos para a tão falada inclusão social e diminuição das desigualdades.

Pelo contrário. O ensino médio é um reprodutor dos problemas, pois ainda temos grandiosas taxas de jovens que saem da escola antes de completar o "terceirão" em busca de trabalhos (nos mais baixos níveis da estrutura laboral) e do sustento. Dados do Censo 2010 mostram que, em Joinville, aproximadamente 28% dos jovens de 18 a 24 não terminaram o ensino médio e nem estavam estudando para completá-lo. Com certeza este quadro se agrava ao cruzarmos com outros fatores, como a renda, a escolaridade dos membros da família, as questões de gênero e o local de moradia na cidade.

Por outro lado, o ensino médio das escolas particulares é uma preparação para o vestibular. Simulados, exames vocacionados, e aquela decoreba toda fazem parte dos alunos, diariamente. Raras as exceções em que eles são preparados para enxergar o mundo além daquilo que pede o mercado de trabalho. Não é a toa que não temos propagandas com conteúdos de conquistas sociais da formação discente, mas sim de resultados explícitos em vestibulares e etc. Os cursinhos surgiram na mesma linha e potencializaram o cenário.

Precisamos, urgente, repensar o papel do ensino médio. Não podemos achar que a roupagem técnica, de preparação para o trabalho, vai resolver o problema dos mais pobres e nem a aprovação no melhor vestibular vai garantir uma vida de sucesso para o mais rico. O ensino médio deve se voltar para a essência de seu nome, dando as mesmas condições para todos, com ensino integral e integrador, sem segregar e nem dar mais oportunidades para aqueles que carregam consigo todo o capital social de seus familiares. E sem decoreba, por favor.