terça-feira, 16 de dezembro de 2014
O pior da política
Os arautos da "liberdade de expressão" agora focam sua ira contra a RBS, por se posicionar contra os descalabros do deputado federal Jair Bolsonaro. Para essa gente que "defende" a "livre expressão", a opinião do José António Baço, que com razão disse que o Bolsonaro era "um perigo para a democracia" exige RETRATAÇÃO, e deve ser expurgada do jornal. Comportam-se como o que sempre temeu-se que fossem: fascistas, ansiosos para silenciar qualquer oposição.
Tudo isso para defender o parlamentar que manda manifestantes negros "voltarem ao zoológico", diz que "não estupra" outra parlamentar porque "ela é feia demais", diz que a ditadura errou em "torturar mas não matar", que homossexuais são todos pedófilos, entre outras. As prioridades dessas pessoas estão definitivamente no lugar certo - se por lugar certo você quer dizer nos Estados Confederados do Sul, ou na Alemanha Nazista.
Ainda essa semana, um dos herdeiros desse parlamentar tentou intimidar o vereador Renato Cinco. As páginas que demonstraram apoio ao Bolsonaro são as da pior estirpe: páginas glorificando abusos de poder da polícia, execuções, homofobia, misoginia e tortura. Alguns de seus seguidores declararam que sim, eles "estuprariam" a Maria do Rosário Nunes. É isso que acham que deveria ser a conduta e o efeito de um parlamentar. E pior, um dos mais votados do país? Estimular ameaças de estupro, agir como um valentão de ensino médio, xingar de "desequilibrada" e "vagabunda" uma parlamentar?
Uma multidão correu em defesa do deputado, dizendo que a sua vítima "mereceu". Gostaria de saber em que contexto uma ameaça velada de estupro é "merecida". Pior: tentam pintar Bolsonaro como vítima, como sendo perseguido e oprimido por quem se chocou (com toda razão) com as atrocidades que disse nesta terça feira.
segunda-feira, 15 de dezembro de 2014
A beatificação de uns e a condenação de outros
POR JORDI CASTAN
Neste país tomado por radicalismos doentios, qualquer oportunidade é boa para beatificar uns e condenar outros. A bola da vez é o episódio lamentável que tem tem posto frente a frente dois deputados federais: Maria do Rosario e Jair Bolsonaro.
Se ainda se escrevesse com tinta e papel, diríamos que correram rios de tinta para beatificar a uma e condenar ao outro. Ou para defender um e condenar a outra. Mas hoje quase deixamos de usar caneta e papel e não há mais rios de tinta.
Na história em questão, como em todas as historias, há três versões. A da deputada e seus vociferantes acólitos. A do deputado e seus radicais defensores,. E, finalmente, a verdade. Está cada vez mais difícil saber qual é a verdade. Ninguém tampouco parece ter muito interesse em que se saiba. O radicalismo tomou conta do debate e as pessoas deixam de informar-se e passam a ter posição a favor ou contra das coisas, sem considerar outro ponto que o perfil - ou melhor o partido - dos envolvidos.
Assim, qualquer tema – seja que for – que envolva o deputado Jair Bolsonaro será motivo de execração. É possível que se o deputado ousar afirmar uma obviedade, como que o sol sai pelo leste e que o faz pontualmente cada manhã, dúzias de raivosos espumantes se manifestem contra e apresentem provas, argumentos e citações provando que isso não é certo e que o autor de tal afirmação deva ser queimado em praça pública.
No caso da ex-ministra, a agressão sofrida a converteu da noite a manhã numa versão local de Joana d'Arc. Mulher modelo de ilibada honradez e de fortes princípios éticos e morais. Deus nos livre de questionar a sua idoneidade. Questioná-la é defender o estupro, Bolsonaro e a barbárie. É defender a violência contra a mulher, e provavelmente seja também defender a homofobia e qualquer outra ideia parecida. Assim ela representa hoje a reencarnação da pureza.
Assim fica proibido, sob risco de ataque furibundo, mencionar que o nome da deputada Maria do Rosário esta incluído entre outros nomes, numa lista que vincula doações da empreiteira Engevix a políticos. Num esquema que envolve suspeitas de corrupção.
E assim vamos. Corrupção, só a dos outros. Enquanto por um lado se avolumam as provas, as denúncias, os nomes e os valores divulgados, pelo outro bandos de soldados do partido se lançam a patrulhar as redes sociais e qualquer outro meio de expressão, para atacar a quem questione a honradez ou denuncie a corrupção envolvendo qualquer politico do partido de governo e seus aliados. A estratégia sempre é a mesma, não negam, porque não tem como negar, mas afirmam que corruptos são os outros e no pior dos casos o emporcalham tudo dizendo: "este é um país de corruptos" acreditando na sua estultice que isso resolve o problema.
Primeiro, os corruptos eram os outros. Ante as denúncias e as condenações por corrupção desta corja que está no poder, o discurso mudou e passou a ser "os nossos corruptos são menos corruptos que os outros". Divulgados os valores pagos e as novas denúncias do chamado "Petrolão", também este argumento cai por terra e surge a nova estratégia, "somos todos corruptos". Somos todos companheiros sujos de lama na mesma pocilga. É a nova versão de: "quem estiver livre de pecado que atire a primeira pedra".
O filme e o evento.
O filme e o evento.
sexta-feira, 12 de dezembro de 2014
Sheherazade e os lulus intelectuais
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Quem lê gosta de debater. Quem debate se educa para a
democracia. Quem é democrata sabe conviver com ideias diferentes. Mas nos dias
que correm no Brasil, é difícil aceitar muitas dessas “ideias diferentes”.
Porque estão fundadas no sectarismo de classe, na informação precária e na
fragilidade de caráter.
Tudo isso para apresentar Rachel Sheherazade. Já disse aqui
mesmo que é apenas uma burguesinha mimada a quem alguém, de forma imprevidente,
deu um microfone e espaço midiático para dizer besteirinhas. Em tempos de
insanidade intelectual, é natural que ela tenha se tornado referência para energúmenos
que criam aranhas no cérebro.
Mas por que falar nela? Respondo com uma
pergunta aos leitores: que mulher no Brasil seria capaz de vir a público defender
o deputado federal Jair Bolsonaro, na cafajestada a envolver a deputada Maria
do Rosário: “não lhe estupro porque você não merece”. Sim, Rachel Sheherazade
foi capaz de tentar explicar a insanidade. A moça não para de se superar.
Mal surgiu o escândalo, ela correu a escrever um texto
no seu blog para livrar a cara do boçal Bolsonaro. Mas rolou uma comédia de
erros. Porque no seu arrazoado ela recorreu a mentiras já desmascaradas
milhentas vezes, uma delas, inclusive, surgida num blog de humor (que não faz
rir). Ora, um jornalista não deve checar as informações?
Então, qual o problema de Sheherazade? Não é apenas o
fato de ser uma jovem reacionária. O que não se aceita é a fragilidade
intelectual e moral das suas análises. Porque entre as pessoas com projeção na
mídia brasileira, ela deve ser uma das mentes femininas mais tortuosas, iliteratas e
arrogantes. É a incultura a fazer escola.
Tenho saudades daqueles tempos em que era possível
ouvir os caras de direita sem ter frouxos de riso ou vontade de cortar os
pulsos. Essa ascensão da mediocridade, que dá significância a insignificantes como
Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino, Olavo de Carvalho ou a própria
Sheherazade, só mostra uma cultura ladeira abaixo rumo ao terceiro mundo.
A sorte é que esse exército de "chiens de garde" é formado por lulus intelectuais: fazem muito barulho mas não mordem. E foi por isso que mal viu a cagada, ela correu apagar o post. Foi sensato, mas também covarde. E, claro, uma admissão explícita de fragilidade intelectual.
quinta-feira, 11 de dezembro de 2014
Alguma mulher merece ser estuprada?
POR CLÓVIS
GRUNER
De acordo com o
deputado federal Jair Bolsonaro, do PP carioca, sim. Em discurso na tribuna da
Câmara dos Deputados terça-feira, o parlamentar – conhecido pelo que os
meios de comunicação chamam, eufemisticamente, de “posições polêmicas” – afirmou
textualmente, dirigindo-se à deputada petista Maria do Rosário: “Só não te
estupro porque você não merece”. Não foi a primeira vez: em 2003, durante
debate na Rede TV!, Bolsonaro afirmou exatamente a mesma coisa, também para
Maria do Rosário. Em entrevista concedida ontem ao jornal Zero Hora, ele voltou
ao assunto: “Ela não merece porque ela é muito
ruim, porque ela é muito feia. Não faz meu gênero. Jamais a estupraria”. E
completa: “Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar, porque não merece”.
A alguns
parecerá positivo saber que o Parlamento brasileiro não abriga um estuprador,
apenas um apologista do estupro. Mas há coisas importantes implicadas nas falas de
Bolsonaro, na tribuna e na entrevista ao ZH, e não é preciso muito
esforço para identificá-las. Primeiro, e o mais óbvio: se Bolsonaro considera
que Maria do Rosário não é “digna” de ser estuprada porque é “feia”, a dedução óbvia é de que, na
sua mentalidade machista, há aquelas mulheres que merecem sê-lo e que ele pessoalmente, se fosse
estuprador, estupraria. Ou seja, as mulheres “bonitas” – ou aquelas consideradas bonitas segundo a perspectiva do nada nobre
deputado –, merecem ser estupradas; as “feias”, não.
Bolsonaro
concorda, embora por caminhos distintos, com outro apologista do estupro, o
humorista Rafinha Bastos, para quem mulheres feias devem não acusar, mas
agradecer seu estuprador. Ou com os publicitários membros do Conar que, no ano
passado, decidiram manter no ar a campanha da cerveja Nova Schin sob a alegação
de ser “baseada em uma situação absurda”. Afinal, na peça publicitária, o homem
que constrange mulheres e invade seu vestiário, provocando visível horror e
medo, é invisível. Segundo alguns, se a mulher for feia ou homem, anônimo, o
estupro é válido e, em alguns casos, pode ser até divertido. Para Bolsonaro, se
ela for bonita, o estupro é não apenas válido como merecido.
CULTURA DO
ESTUPRO – Bolsonaro é truculento, mas não é um ignorante. Ou seja,
ele não ignora que os números da violência de gênero no Brasil são alarmantes e
agravam a sensação de que vivemos em uma cultura que tem feito pouco caso das
agressões contra mulheres, não raro praticadas nos ambientes domésticos,
por conhecidos e mesmo familiares (pais, irmãos, maridos, amigos, vizinhos, etc...). Segundo o Mapa
da Violência de 2012, as taxas de homicídio de mulheres foram de quase 4.500 em
2010 (4,6 homicídios por 100 mil habitantes). No caso do estupro, foram mais de 51 mil casos registrados somente em 2012, uma taxa de
26,3 por 100 mil habitantes, segundo o Anuário de Segurança de 2013. Como a
qualidade dos registros varia entre os estados, e muitos casos sequer chegam a
ser denunciados, é bastante provável que os números, já altos, sejam ainda
maiores: sabe-se que muitas vezes as vítimas, por vergonha ou porque ameaçadas,
optam pelo silêncio.
O fato de Jair Bolsonaro conhecer estes números e menosprezá-los
torna ainda mais abjeta sua declaração, que não teve no Congresso a repercussão
que merece. Os dois maiores partidos de oposição – DEM e PSDB – silenciaram. O
PSC manifestou apoio a Bolsonaro. Na base aliada, fora alguns petistas solidários
à Maria do Rosário, a reação foi acanhada: o PP não se manifestou e o PMDB
repudiou apenas timidamente o episódio. Coube aos partidos de esquerda,
especialmente os chamados “nanicos”, junto com parte da bancada petista, a
tarefa de apresentar representação contra o deputado, pedindo sua cassação –
que provavelmente não ocorrerá. Do Palácio do Planalto – pelo menos até o momento
em que escrevo essas linhas – nenhuma manifestação, o que não me surpreende: o
silêncio de agora apenas reverbera a conivência silenciosa com que, em 2012, o
governo petista tratou a eleição de Marco Feliciano à presidência da Comissão
de Direitos Humanos e Minorias do Congresso.
Fora dos
corredores e gabinetes parlamentares e palacianos, a declaração de Bolsonaro
encontrou o respaldo esperado para um deputado eleito com mais de 400 mil votos – o mais votado do
Rio de Janeiro. E que se tornou, desde há algum tempo, o principal porta voz de uma
direita conservadora que fez e faz do ódio, do medo e do ressentimento os
principais afetos da política. Eu sei que à direita há aqueles, e não são poucos,
que repudiam os discursos e as práticas do deputado progressista e que não se
veem representados pela sua atuação parlamentar. Mas sei também que,
lamentavelmente, Bolsonaro representa, incorpora e multiplica, contando para
isso com um suporte midiático privilegiado, o que há de pior e mais perigoso em
nossa vida pública, os grupos conservadores, fanatizados em sua repulsa por tudo e todos que são diferentes da sua obtusa concepção de “normalidade”.
PS.: Uma petição online, organizada no site Avaaz, pede a cassação do mandato do deputado Jair Bolsonaro. Se você quiser assiná-la, clique aqui.
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