sábado, 29 de março de 2014

sexta-feira, 28 de março de 2014

Abuso de poder na UFSC mostra continuidades da ditadura

POR FELIPE SILVEIRA

Nos meus últimos textos defendi a criação de atividades e espaços da memória que refletissem sobre a ditadura civil-militar (1964-1985) – e consequentemente sobre a história do Brasil e do mundo, já que este é um episódio marcante internacionalmente. Leia aqui. Mais do que isso, defendi que seja pensada e construída uma educação emancipatória cujo sentido seja não repetir a barbárie de 64. Leia aqui. E não repetir a barbárie também é enfrentá-la nas suas manifestações do dia-a-dia. Lutar para não repetir a barbárie da ditadura também é lutar contra as suas continuidades, como a que aconteceu na UFSC nesta semana.

O que a polícia fez foi um absurdo, e há inúmeras coisas a se discutir a respeito disso. Não vou abordar todas aqui, mas chamo a atenção para duas: a motivação da polícia e a reação da mesma diante da reação dos estudantes e professores.

Quanto à primeira, diz o delegado que não vai deixar que transformem a universidade em uma “república de maconheiros”. Olha aí a continuidade da ditadura. Temos o inimigo, a maconha e os maconheiros, responsáveis pelos males do mundo. E não importa se o mundo que raciocina contraria essa tese. Para uma boa parte da polícia, maconheiros são os grandes financiadores do tráfico e devem ir em cana, de preferência tomando umas porradas antes. Se for comunista, antes, durante e depois. Hoje, em uma discussão, um policial militar disse: “Comunista bom é comunista morto.”

Outra continuidade foi a reação das forças repressoras diante da reação das forças populares. Por causa de alguns cigarros de maconha (e não estou defendendo que a polícia simplesmente ignore o fato) armou-se uma guerra. Não se quis dialogar ou negociar, como poderá ser visto no vídeo e lido na entrevista linkada abaixo. E não se quis porque a ideia do agente policial era demonstrar poder. Um poder que entre 1964 e 1985 não conhecia limites. E um poder do qual muitos tem saudade ou não acham que perderam.

Alguns apontam um exagero das duas partes – polícia e universitários –, mas esqueceram que a polícia queria levar estudantes em carros não identificados. E isso me parece um bom motivo para uma reação popular, não? Não foi o único.

Neste vídeo pode ser vista a tentativa do professor Paulo Pinheiro Machado de dialogar com o delegado Cassiano:


E este é o mesmo professor tendo a resposta da polícia, ao pedir mais dois minutos para tentar dialogar:

Foto de Marco Santiago, do jornal Notícias do Dia, de Florianópolis

E aqui tem uma entrevista com o professor ao Diário Catarinense. Segue um trecho sobre como começou o confronto: "Ficamos por duas horas negociando com o delegado Cassiano da Polícia Federal. Ele foi irredutível. Quando iríamos conseguir a dispersão mútua para evitar o confronto ele decidiu levar os estudantes presos. O comandante Araújo da Polícia Militar estava cooperando conosco, mas o delegado se mostrou intransigente. Propomos que o Boletim de Ocorrência fosse feito no local ou então que um procurador e um professor acompanhasse os estudantes, mas ele disse que não poderia colocar eles no carro da polícia."


***

A truculência da polícia não é novidade. Não era nem na ditadura. A polícia é violenta desde que foi criada, mas durante o regime militar se extrapolaram todos os limites. A violência que vemos hoje –na universidade, nas comunidades periféricas, nas favelas e nas manifestações populares – é uma continuidade daquele período sombrio. Para quem não sabe como foi esse período, vale dar uma olhada nas declarações do ex-agente do CIE, Paulo Malhães, dadas à Comissão Nacional da Verdade há dois dias, nas quais admitiu a prática de tortura, mortes, ocultações de cadáveres e mutilações de corpos, cujo objetivo era impossibilitar a identificação das vítimas.

A truculência policial é somente um aspecto. A herança da ditadura é muito ampla. Continua-se calando trabalhadores e sindicatos pelas mais diversas formas, continua-se fazendo tudo em nome do lucro, continua-se destruindo o meio-ambiente e escravizando pessoas em nome do capital, continua-se comprando votos... Sem contar que destruiu uma geração de intelectuais e artistas que estava em ebulição e trabalhava pela construção de um Brasil melhor.

Que essa data simbólica seja marcada pela decisão de descontinuar esse tipo de coisa. E que seja um recomeço.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Saudades da ditadura?

POR ET BARTHES
Cenas de tortura no filme "Pra Frente Brasil", de Roberto Farias, realizado em 1982. É ficção, mas...


quarta-feira, 26 de março de 2014

A revistona e a servidão voluntária

Étienne de la Boétie

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um dia destes citei, algures por aí, o livro “Discurso da Servidão Voluntária”, de Étienne de la Boétie. E hoje vou retomar o tema, mas numa variação da abordagem. Na sua análise, desenvolvida no século 16, o filósofo francês mostrava a sua inquietação frente a um fato: pessoas que, de forma espontânea, estão dispostas a abrir mão da própria liberdade.

La Boétie fala de uma realidade concreta. Ou seja, de pessoas que abrem mão do livre arbítrio em favor de um tirano. É a partir desse ponto que me permito fazer uma extrapolação, saltando para o plano abstrato das ideias: pessoas que abrem mão da liberdade de pensar pela própria cabeça e se deixam tiranizar pela repetição uma arenga ideológica qualquer (ideologia no sentido atribuído por Marx – de deformação).

NANISMO INTELECTUAL - A servidão voluntária é para gente que, por razões de classe ou por simples abulia política, se recusa ao motu proprio. Gente que prefere repetir o tatibitate de nanicos intelectuais (tipo Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino ou o astrólogo Olavo de Carvalho) ou de projetos editoriais que sequer se preocupam em disfarçar os seus objetivos políticos.

Na semana passada pude acompanhar a repercussão, nas redes sociais, de matérias de dois meios de comunicação, a Veja e o Estadão, publicados quase em simultâneo, sobre a prisão do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto da Costa, na Operação Lava Jato. E antes de continuar é importante lembrar que nem o jornal e nem a revistona têm sido meigos com o governo de Dilma Rousseff.

UM FATO, DUAS LEITURAS - O título do jornal atém-se ao fatos (“PF prende ex-diretor da Petrobrás citado na Operação Lava Jato”) e apenas depois acrescenta que o homem chefiou uma das principais diretorias da Petrobras. Já o título da revistona procura a jugular de Dilma Rousseff (“Preso, ex-diretor da Petrobras é ‘caixa-preta’ da estatal”). E vai fundo nessa linha ao dizer que o homem fez uma doação para o PT nas eleições de 2010.

A matéria do Estadão mantém a sobriedade. O jornal dedica a maior parte do texto a falar da operação policial, mas sem esquecer de falar na Petrobras na parte final do texto. Para a revistona, o fato do dia parece não interessar. É apenas o argumento para pôr o tema Pasadena novamente na agenda. E dedica apenas um simples parágrafo no final do texto para falar da operação policial.

LEITOR QUE NÃO LÊ - É interessante como um mesmo fato pode gerar alinhamentos de textos tão díspares. Mas isso interessa aos leitores da revistona? Não. Porque eles se alimentam de restos de informação. E fazem associações simplórias: “homem preso – Petrobras – Governo Federal – Dilma Rousseff – PT – todos culpados”. Nada mais interessa.

E havia ainda a cereja no topo do bolo. A Polícia Federal apreendeu 700 mil reais e 200 mil dólares em notas. Não demorou para muitos fazerem a ligação ao PT, claro. Nem se preocuparam em saber se o homem estava a ser preso pela associação a um doleiro. É a lógica dos intelectualmente servis: nem tentaram imaginar a hipótese de doleiros terem muitos dólares e reais.

De volta ao princípio: no Brasil destes dias, o discurso da servidão voluntária é o discurso dos que se limitam a repetir, adestradamente, um discurso para lá de manjado.

Em tempo: não adianta tentar discutir Pasadena comigo. 1. Porque não é o tema deste texto. 2. Porque não entendo nadinha dessa coisa de put option (e nem a maioria de vocês).


Os links das matérias, que deveriam ser estudadas nos cursos de jornalismo:

terça-feira, 25 de março de 2014

Na ALESC, Nilson Gonçalves faltou a 37% das sessões; Darci, Sandro e Clarikennedy mais de 20%

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Os deputados estaduais de Joinville e região pouco aparecem na mídia para apresentarem seus trabalhos na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC), e isto é justificado se contarmos as presenças destes nas sessões ordinárias, disponibilizadas pelo portal da transparência (controlado pelo poder legislativo de SC). No levantamento feito em todas as sessões desde agosto de 2013 até a presente data, contabilizamos 81 sessões, e os deputados que representam a cidade deixam a desejar no quesito frequência.

Antes de mostrar os resultados, gostaria de ressaltar que o trabalho de um deputado estadual vai além da sessão ordinária, momento onde acontecem as votações e outras importantes deliberações. Representações em funerais, acompanhamento de exames médicos da filha, e viagens particulares entram como importantes motivos para as faltas justificadas. Somado a estas, não podemos esquecer das "agendas previamente estabelecidas", campeãs entre os motivos apresentados pelos deputados da cidade. 

A sessão ordinária é o momento mais importante (apesar de não ser o único), pois ali acontecem as votações finais, onde a população pode saber de forma direta qual o posicionamento do seu representante. Também mostra como o deputado lida com seu mandato; se segue linhas partidárias ou realmente representa os interesses do povo. Ou seja, a sessão é o momento de maior exposição do processo legislativo.

Vale ressaltar que este levantamento não leva em conta viagens em missões internacionais ou demais viagens representativas. É um puro levantamento quantitativo. E, desde já, os deputados tem canal aberto no Chuva Ácida para apresentarem possíveis respostas ou contradições aos fatos aqui apresentados.

O campeão de ausências desde agosto até março é o deputado Nilson Gonçalves (PSDB), com faltas em 37,07% das sessões. Foram 30 faltas em 81 reuniões. Este número representa quase três meses inteiros de sessões. Se de agosto a março tivemos sete meses de sessões, Nilson teve uma baixíssima participação em termos de temporalidade. 

O segundo lugar fica para Sandro Silva (PPS), apesar de contabilizarmos apenas as sessões de 2014 (Sandro não participou regularmente de sessões no segundo semestre de 2013). Sua ausência foi contabilizada em 23,8% das sessões de 2014. 

Em terceiro está Clarikennedy Nunes (PSD), que faltou à 23,45% das sessões realizadas entre agosto e março. "Clari" foi o que mais faltou devido a viagens e representações oficiais para a Bolívia, o Uruguai e a cidade de São Paulo. Se isto não for levado em conta, ele é o deputado de Joinville mais presente nas sessões.

Em último (mas não muito distante dos demais) está Darci de Matos (PSD), faltante em 21,21% das sessões. Darci, entretanto, esteve ausente entre agosto e setembro, dando lugar a um suplente. Esta porcentagem de faltas não contempla o período em que seu suplente assumiu.

É inadmissível que os deputados da região faltem tanto aos momentos obrigatórios, como uma sessão. Independente do motivo, seus salários não são afetados por curtas faltas. Não é compreensível, ainda, que deputados agendem reuniões ou outras demandas justo no dia e horário de sessões, as quais possuem agenda amplamente divulgada (e com muita antecedência). O trabalhador, eleitor, e que diariamente luta para se sustentar não tem todas estas mordomias. Se possui falta injustificada, tem desconto no salário. Se falta frequentemente, é demitido.

O deputado estadual não. E ainda tem gordas diárias para utilizar quando está fora de Florianópolis em dias de sessão. Uma bonificação pelo desalinho.