quarta-feira, 12 de junho de 2013

E a mulher? Foda-se!

POR CLÓVIS GRUNER




A semana passada não foi de boas notícias. Ela começou com a demissão de Dirceu Greco, diretor do Departamento de DSTs, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, responsável pela campanha “Sou feliz sendo prostituta”. A justificativa oficial do ministro Alexandre Padilha, covarde e hipócrita, escondeu o verdadeiro motivo da saída de Greco, criticada por inúmeros profissionais que conhecem e respeitam sua trajetória como infectologista: a submissão, mais uma vez, das ações do governo à agenda conservadora, já que o estopim da demissão foram as críticas dos deputados evangélicos hoje à frente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, particularmente Marco Feliciano e João Campos, ao conteúdo da campanha, considerada pelo último uma “apologia ao crime”.

No meio da semana, cerca de 40 mil evangélicos tomaram as ruas de Brasília. Oficialmente, tratava-se de uma “Manifestação pela liberdade de expressão, liberdade religiosa e família tradicional”. Animados por Silas Malafaia, no entanto, o que se viu foi uma demonstração coletiva de ódio e intolerância que beirou às raias do absurdo: confundido com um gay, um pastor da igreja Quadrangular foi agredido por seguranças, um “mal entendido”, segundo os pastores responsáveis pelo evento. Alguns sites gays minimizaram o acontecimento, já que a quantidade de fieis foi bem menor que a esperada e prometida pelo pastor. Outros destacaram que Malafaia não é unanimidade mesmo dentro do segmento evangélico. Tudo isso é verdade, mas a história já nos mostrou que milhares de pessoas nas ruas, movidas pelo fanatismo e o ódio é algo para, no mínimo, nos preocupar.

Mas veio da Câmara de Deputados a mais estarrecedora e lamentável das notícias, com a aprovação, pela Comissão de Finanças e Tributação do Projeto de Lei 478/2007, conhecido como o Estatuto do Nascituro. Quem conhece minimamente o percurso de um PL no parlamento sabe que o projeto não chegou ainda ao último estágio: aprovado anteriormente na Comissão de Seguridade Social e Família, ele depende agora de parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça antes de, finalmente, seguir para votação no plenário. Se aprovado, segue para sanção presidencial. Mas a simples existência de um projeto de tal natureza – de autoria, aliás, de um ex-deputado petista, Luiz Bassuma – e sua aprovação por duas comissões parlamentares é, e eu vou usar um eufemismo, uma indignidade.

E um atraso. Entre outras coisas, porque o conceito que o atravessa mandas às favas todo o debate científico e jurídico em torno ao conceito e estatuto de pessoa. Ele se apoia tão somente em uma concepção de fundo religioso, ao afirmar que “Nascituro é o ser humano concebido, mas ainda não nascido”, para logo em seguida estabelecer, em parágrafo único, que o “conceito de nascituro inclui os seres humanos concebidos ainda que “in vitro”, mesmo antes da transferência para o útero da mulher.” Tal conceito, ao assegurar aos embriões os mesmos direitos que, em tese, são garantidos aos nascidos, inviabiliza e criminaliza, por exemplo, pesquisas com o uso de células tronco, uma das principais conquistas científicas dos últimos anos, aprovada pelo STF em 2008.


O DIREITO AO CORPO – Não importa que uma das matérias mais polêmicas do PL tenha sofrido uma mudança: no texto original, e contrariando a legislação em vigor sobre o tema (aliás, uma das mais conservadoras entre os países ocidentais) o aborto, independente do contexto, não apenas era criminalizado, como em sua justificativa o autor do projeto defendia sua inclusão na categoria de “crime hediondo”. A versão que segue para a Comissão de Constituição e Justiça, estabelece como ressalvas o disposto no artigo 128 do Código Penal, que autoriza o aborto em caso de risco de vida para a gestante ou quando a gestação for resultado de estupro. Mas não diz nada, por exemplo, sobre o aborto de anencéfalos, autorizado também pelo STF (só!) no ano passado.

Mesmo com a mudança introduzida, o Estatuto do Nascituro amplia a criminalização do abortamento e dificulta, por consequência, o acesso a métodos contraceptivos e ao aborto legal, hoje já bastante restrito, ao tornar a gestante objeto de uma exaustiva e intimidante vigilância. No caso de gestação decorrente de abuso violento, não apenas institui a em si abominável ideia de um auxílio estatal à gestante e ao nascituro – apelidada nas redes sociais de “Bolsa estupro” – como estabelece que, “Identificado o genitor do nascituro ou da criança já nascida, será este responsável por pensão alimentícia nos termos da lei”. É mais ou menos assim: além de ter sido estuprada e obrigada a carregar por nove meses o resultado da violência a que foi submetida, a mulher terá de conviver, pelos próximos anos, com seu estuprador, obrigado este pelo Estado a reconhecer e sustentar o filho, assumindo na prática o seu “patrio poder”. Kafka não faria melhor.

Já se falou muito sobre o tema, especialmente – mas não só – nos blogs feministas. Já se elencaram inúmeras e pertinentes razões que justificam opor-se a ele. Não vou me alongar mais, repetindo o que já foi dito e pode ser lido aqui, aqui e aqui. Mas não quero silenciar sobre uma questão que, implícita ao projeto, é de extrema urgência: o Estatuto do Nascituro não é apenas sobre o aborto e não pode ser lido e entendido somente por este prisma. O retrocesso maior está na afirmação da desigualdade, jurídica inclusive, da mulher, que vê diminuído ainda mais o direito sobre seu próprio corpo, objeto de tutela do Estado. Houve um tempo em que esta desigualdade, ainda presente no cotidiano e que se expressa de diferentes maneiras, desde a recorrente culpabilização da vítima em casos de estupro (e a Fernanda comentou isso em ‘post’ recente aqui no blog), a prisão de manifestantes pela policia atendendo a pedidos de um padre, até artigos de filósofos na grande imprensa; houve um tempo, enfim, em que esta desigualdade era assegurada juridicamente.

No primeiro Código Penal republicano, o adultério era considerado crime quando praticado por mulheres, em qualquer situação. Aos homens, eram reservadas penas mais brandas apenas se o adultério implicasse na negligência do cumprimento do seu papel de provedor da família. Tal premissa, inclusive, inocentou inúmeros assassinos de mulheres, absolvidos sempre que apelavam à “defesa da honra” como justificativa ao homicídio. Avançamos bastante desde então para aceitar, passivamente, retrocedermos a uma condição em que as mulheres, uma vez mais, estarão à mercê de uma lei retrógrada, flagrantemente inspirada em princípios que não são os da laicidade e da igualdade de direitos, mas de uma concepção religiosa e fundamentalista de mundo e de pessoa. Porque é exatamente disso que se trata o Estatuto do Nascituro: ele joga no lixo o pouco de equidade conquistada nas últimas décadas para tornar a mulher, uma vez mais, objeto da vontade fálica do Estado, tudo sob a proteção da lei. Ele diz a ela em juridiquês o que o machismo, o conservadorismo e o fundamentalismo religioso vêm afirmando desde há muito tempo: foda-se você, seu corpo e os seus direitos!

Udoende


terça-feira, 11 de junho de 2013

Toque de Midas por "mãos limpas"

POR GABRIELA SCHIEWE

O HOSPITAL DONA HELENA É O POTE DE OURO NO FIM DO ARCO-ÍRIS
“Nem tudo que reluz é ouro”! Essa frase já não pode mais ser falada aos quatro cantos do Hospital Dona Helena.

Operação policial deflagrada no ano de 2005, denominada Fariseu, que culminou com ação da Advocacia Geral da União, saiu do limbo para ganhar o noticiário de todo o país.

A investigação, que no ano de 2009 prendeu conselheiros e o ex-presidente do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), dá conta de que, por meio da MP 446/2008, o benefício da filantropia por assistência social a instituições que, pelo Decreto nº 2536/98, obriga instituições de oferecem, pelo menos, 20% de serviços gratuitos nas áreas de educação e assistência social e 60% na área de saúde, foi dado de maneira irregular e fraudulenta.

O Hospital Dona Helena, uma destas instituições que foram beneficiadas de forma fraudulenta, segundo a ação proposta pela AGU, juntamente com Luiz Vicente Vieira Dutra, o então advogado do Dona Helena, e Euclides da Silva Machado, consultor do hospital e ex-Conselheiro do CNAS e que foram presos, sendo réus em outros processos pela acusação de fazerem parte de uma organização criminosa que praticou corrupção ativa e passiva, advocacia administrativa, formação de quadrilha e improbidade administrativa no CNAS.

O benefício de entidade filantrópica concedido ao Hospital Dona Helena – e  que se encontra sob investigação – permite isenção de tributos em várias transações do hospital. No entanto, por receber valores vultuosos com atendimentos particulares e convênios e não cumprir a meta obrigatória dos 60% assistenciais, o ex-Conselheiro e consultor do hospital, Euclides da Silva Machado deu a brilhante e reluzente ideia de transformar os lucros do hospital, assim como de outras instituições investigadas, em ouro. E praticamente se tornou o “Midas” do Dona Helena.

Com essa prática, o hospital estaria maquiando seus lucros para se manter beneficiária dos efeitos de uma entidade filantrópica.

Hoje, as proporções de tais medidas ganharam sobressalto, visto que o presidente do Conselho Deliberativo do Hospital Dona Helena é o nosso prefeito “mãos limpas”, Udo Dohler.

O prefeito não se pronunciou a respeito e, através da assessoria do Hospital, informou que por ser testemunha na ação não pode se pronunciar e o hospital tão somente se resumiu a dizer que “não comprou ouro”.

Na ação da AGU, pelo relato da advogada da União, nas escutas telefônicas há o envolvimento do prefeito, que participou de alguns momentos da negociação diretamente com o advogado da instituição, Luiz Vicente Vieira Dutra.
Mas como já diz o sempre companheiro Lula, provavelmente será mais um no que já virou bordão “eu não sei de nada”.

Essas informações ganharam a mídia graças ao site do “Congresso em Foco” que, com exclusividade noticiou mas essa suposta maracutaia que, desde 2005, está sob investigação mas nada nunca se ouviu pelas bandas de cá.

É, minha gente, que todo este ouro não se transforme em pizza.

Joinville parou? Só para a gangue do tijolo...

POR JORDI CASTAN

Pela gritaria e os discursos inflamados da gangue do tijolo, Joinville parou. A não aprovação da LOT - Lei de Ordenamento Territorial fez a cidade retroceder, dezenas de indústrias trocaram Joinville por Araquari, a nova Manchester Catarinense, que prospera por conta da situação.

Dá para acreditar no discurso dos representantes da apocalipse? Os dados não sustentam estas afirmações. O jornalista Claudio Loetz, na coluna "Livre Mercado", no jornal "A Notícia", divulgou os dados da própria Seinfra sobre alvarás e sobre o total de metros quadrados autorizados para construir. Mesmo sob risco de ser repetitivo, cito os dados apresentados:

CONSTRUTORAS MOVIMENTAM MAIS DE R$ 1 BILHÃO

Em 2012, as construtoras de Joinville receberam autorização da Prefeitura para erguer 988.750 m². A se considerar valor do custo unitário básico (CUB) de R$ 1.220, o setor movimenta, na economia, uma receita de R$ 1,2 bilhão. Como há imóveis de valor muito mais elevado, e a julgar por uma média de R$ 2 mil o m², dá para estimar faturamento que se aproxima dos R$ 2 bilhões. Outra leitura: no período entre janeiro e abril de 2013, foram emitidos alvarás para construção totalizando 240.989 m², o que significa receita de estimados R$ 295 milhões, pelos cálculos simplificados levando-se em conta o CUB. Em igual período do ano passado, a Seinfra concedeu licenças para as construtoras edificarem 313.150 m².

29 comércios
A Seinfra autorizou a construção de 29 empreendimentos comerciais nos primeiros quatro meses do ano. Juntos, vão erguer 33.286 m². Para comparar: de janeiro a abril do ano passado, foi autorizada a construção em tamanho ligeiramente inferior (31.447 m²) para 52 empreendimentos do varejo.

Menos indústrias
E o número de indústrias instaladas em Joinville nos primeiros meses deste ano (sete) foi bem inferior às 13 autorizadas a funcionar no mesmo período do ano passado. Mas o porte das companhias é outro: a área total permitida a ser construída no quadrimestre de 2013 totaliza 41.963 m², contra 28.679 m² do ano passado".

Em 2012 de acordo com os dados da Seinfra Joinville concedeu autorização para construir quase 1 milhão de metros quadrados e isso tudo com a LOT sendo questionada na Justiça. Pelo discurso de uns, com a cidade parada. 

A insistência em aprovar a LOT de forma rápida, e no formato original, desperta dúvidas e obriga a população a ficar ainda mais atenta. Conhecer melhor o que representará para Joinville a aprovação da LOT, com as suas ARTs e suas Faixas Viárias é uma obrigação de todos. Não se deixar iludir pelo canto de sereia dos desenvolvimentistas, seus lobistas e seus representantes, parece um bom conselho neste momento.

Joinville mostra fortes indícios do esgotamento do modelo econômico atual. O Brasil ano após ano apresenta resultados pífios em crescimento econômico e o PIB é a melhor prova disso. O dinamismo da economia local tem conseguido índices de crescimento melhores que os nacionais, mas essa é uma situação que não deve se sustentar por muito mais tempo. Os aumentos de custos, o apagão logístico e a gastança descontrolada do poder público em todas as suas esferas está levando o país a um beco sem saída. No âmbito local, empresas tradicionalmente bem capitalizadas, competitivas e solventes, têm experimentado resultados pobres ou até negativos e isso nada tem a ver com a aprovação ou não da LOT.

Para quem tiver interesse em se aprofundar mais sobre o que a LOT propõe para Joinville -e as causas para o interesse desmedido de uns e outros na sua aprovação a qualquer preço -sugiro os vídeos:

É difícil não se surpreender com a genialidade dos nossos planejadores oficiais e a cobiça inesgotável da gangue do tijolo. Uma coisa está mais nítida a cada dia: pelos posicionamentos e pelos personagens que apoiam a aprovação da LOT, o leitor do Chuva Ácida pode estar seguro que a minha posição como cidadão será estar sempre no outro lado.

O radicalismo e a intransigência de um lado só deixa espaço para que nos esforcemos em melhorar os nossos argumentos e apresentemos mais dados e informações para que o debate possa sair do nível em que se encontra.