sexta-feira, 30 de maio de 2014

Debate com José António Baço #3

POR FELIPE SILVEIRA 

Escrevi, na semana passada, o texto “Copa, capital e povo na rua... vai ter!”, comentando alguns posicionamentos pró-Copa. O José António Baço, parça de blog, sacou que se tratava de comentários sobre suas posições pró-Copa, e fez uma resposta, publicada no sábado, com o título “Uma certa confusão intelectual”. Publico, aqui, a tréplica. Dessa maneira, colocamos em prática uma das ideias iniciais do blog, que é o debate entre os co-autores.

Antes de prosseguir, ressalto que meu texto não comenta somente as posições do Baço, como pode parecer ao leitor desavisado. Fiz o texto com base em postagens dele e de outras pessoas nas redes sociais. E, concluindo as preliminares, explico que meus pontos não correspondem aos pontos do texto do Baço, embora possa coincidir. Ou seja, meu ponto 1 não é um comentário sobre o ponto 1 do texto dele. É apenas uma forma de organizar o texto. Aos argumentos:

1. Rejeito a sugestão de “ingenuidade”. Primeiro porque sugerir ingenuidade é uma forma de deslegitimar a fala do outro. E legitimidade é preciso. No campo em disputa que é a linguagem, sem legitimidade não dá. Então, para termos um debate, é preciso afastar essa história de ingenuidade.

2. Sobre a esquerda anacrônica, rejeito a noção aplicada ao caso. Anacronismo há na esquerda e na direita e em toda parte do mundo, vide os neonazis europeus. Mas rejeito a noção de que os protestos anti-copa partam dessa esquerda. Gosto do conceito de “multidão”, de Hardt e Negri, para tentar entender esses movimentos populares ao redor do mundo nos últimos anos. E, sim, os protestos contra a copa fazem parte desse contexto de insatisfação mundial no novo século. A copa apenas potencializou no Brasil (volto a comentar isso abaixo).

2.5. Podemos debater “socialismo moderno” a qualquer momento. Só escolher data, local e autores.

3. É preciso separar os atores do debate. Não se ignora a presença da direita, mas, pelamor, essa direita tá na mídia, nas redes sociais, e muito longe da rua. Essa direita tá sendo o que sempre foi: parasita. E, de fato, ela pode tirar proveito disso. Mas daí a dizer que são “manifestações estratégicas que têm o objetivo político de atacar o governo” é demais. É de um louvável desconhecimento dos fatos. Ou um conhecimento dos fatos muito baseado em meios de comunicação e redes sociais de direita ou governistas.

4. Massa de manobra. O discurso governista/petista é um problema, porque joga direita e esquerda no mesmo saco. Trata a esquerda como massa de manobra da direita. E assim fortalece a direita, que faz de tudo para colar na massa indignada das ruas. Há quem compra essa versão, muito distante da realidade. Refletir sobre as políticas de direita do governo... neca.

5. Para a direita não colar na esquerda é preciso dar o nome correto ao boi. Os protestos (do povo, que fique claro) contra a copa são protestos contra o capitalismo. O brasileiro, de modo geral, adora a copa, mas ela escancarou as mazelas do capitalismo para o povo. E, como fomos criados com a historinha que esse papo de direita e esquerda acabou, não sabemos dar o nome correto para o bicho. Aí a direita cola.

6. A direita é um verme que fica reclamando do 3G, vendo série gringa e planejando protestar com fitinha preta amarrada no braço na hora do jogo. Uma coisa patética, desonesta. A direita não sabe nada sobre o Brasil, sobre nossa cultura, nossa tecnologia. A direita sofre do complexo de vira-latas.

6.5. A esquerda que eu conheço e da qual faço parte não sofre. Nós acreditamos no Brasil. E por isso denunciamos, todos os dias, quem quer acabar com ele. Nós, brasileiros, somos fodas, e lindos. Não baixo a cabeça para ninguém de fora, não tenho motivos, mas também não piso em cima.

7. Esse lance de não abaixar a cabeça vale para o socialismo também. Abraço Darcy Ribeiro nessa. Às favas com os modelos - soviético, chinês, cubano... Vamos construir o nosso.

8. Sobre a indústria do futebol e também do turismo, bom, eu tenho acordo. Adoro futebol e quero que o Brasil seja o destino número um de todas as pessoas do mundo. E acho que isso pode ser desenvolvido com projetos de curto, médio e longo prazo. Acho também que deve haver investimento no turismo ao mesmo tempo que se investe em saúde, moradia, educação, agricultura. Acho que o dinheiro do primeiro pode ser investido no outro. Mas, acima de tudo, acho quem um não pode ser feito a partir do sofrimento do outro. Foi e está sendo feito dessa maneira. Espero que um dia possamos receber os turistas e mostrar nossas belezas sem ter lamentar nossas tristezas. Mas é preciso lutar por isso.

Obs.: Esse é um debate respeitoso, entre amigos, e todos estão convidados a participar, desde que com o mesmo respeito.

34 comentários:

  1. Ah, agora despreza os modelos cubano, soviético, chinês, norte-coreano (esqueceu deste!), venezuelano (esqueceu deste também!) e quer construir "um modelo genuinamente brasileiro"!

    Que pretensão desses esquerdinhas, hein?

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  2. perguntei ao baço e ele não respondeu: o que é socialismo moderno?

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    1. É uma proposta de socialismo com pautas atuais. Como ele sugeriu, vá ler. Mas falo isso sem grosseria: vá ler, pois só tu pode construir a tua visão a respeito do tema. Um texto legal que cito no texto é "Multidão", de Michael Hardt e Antonio Negri.

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    2. Socialismo com pautas atuais? Essa foi uma das coisas mais bizarras que eu já li. Devem ser pautas iguais as chavistas. Tudo certo, então.

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    3. Ei, Anônimo das 16:18. Eu perguntaria se você já saiu do Brasil alguma vez, mas ficaria contente se você tiver lido um livro na vida. Não precisa responder, porque não é o tipo de interlocutor que me interesse.

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    4. eu vou mudar minha pergunta para ver se vcs conseguem me situar.
      quando surgiu o socialismo moderno?

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    5. O socialismo moderno (com esse nome) é coisa do século 18. Isso tá até no Wikipedia. Mas não é do que estou a falar...

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    6. foi por isso que te fiz a pergunta, pq socialismo moderno pode ser de marx à social-democracia, passando pelas tentativas do lenin de salvar o monstro que ele criou usando as forças do capitalismo, ou até, olha só, o nacional-socialismo. Mas se como disse o felipe o socialismo moderno é só uma questão de pauta então estamos falando da mesma merda de sempre, talvez com uma pegada facebookiana, lançou mão de um piercing na língua e uma tatoo o velhinho...
      Dirimida a minha dúvida passo para as reflexões do felipe: se tem uma coisa que eu gostaria de ver fora do poder é o pt, mas na boa, deixa a copa em paz, o negócio só acontece de 4 em 4 anos...
      Mas é o que dá fazer um evento desse no terceiro mundo. Como diz um amigo, copa deveria acontecer apenas na Europa - a ocidental, deixar claro...

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    7. E antes que eu me esqueça, obrigado felipe pela sugestão de leitura. Te devolvo outra: fernando pessoa, coisa fina...
      http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=15729

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    8. Escrevi uma resposta de maneira educada e apaguei. Escrevi uma na grosseria e apaguei. Gente como o 12:28 não vale a pena. Num só parágrafo demonstrou falta de compreensão do texto, limitação intelectual, arrogância e vira-latismo. Ainda bem que é anônimo. Prefiro assim do que ter o desgosto de conhecer.

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    9. Das 10:28 tu quis dizer...
      Que nada bicho, eu sou gente boa, ia dar desgosto não. Só não torço para o corinthians. E entendi teu texto sim. só acho que vai vc precisar de um pouquinho mais para derrubar o capitalismo. Que acho do males o menor. E lê o banqueiro anarquista. Rende umas boas risadas.

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    10. Vira-latismo. sim, sou vira-latas, em essência: uma mistura de povos e culturas. Mas a minha comida faço em casa, comprada com o suor do trampo.

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    11. Tava falando do complexo. Tu sabe.
      E não entendeu, como se pode notar na terceira frase do comentário das 10:28. Tivesse entendido não tinha escrito a frase.

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    12. Cara, complexo não mesmo. Nasci no Brasil e já vivi em algumas cidades. Essa terra e esse povo são fodas. Joinville então é preciosa. Nenhuma vontade de tomar "banho de primeiro mundo". Mas não dá para negar que eles fazem eventos futebolísticos melhor que os outros. e com menos grana. Melhor e com menos grana, imbatíveis..
      E desculpa se te atingi com o meu chiste, mas eu não consigo ver onde o socialismo gerou riqueza e bem estar para as pessoas, a não ser quando se juntou ao capitalismo. Mas talvez vc tenha razão, deve ser limitação intelectual minha...
      2 horas, às cervejas que hoje é sábado. abraço.

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  3. Olha Felipe, dependendo de alguns pontos de vista, o Aécio vai querer conversar contigo. Se os protestos são contra o capitalismo, as bandeiras deveriam ser: Abaixo a Fifa, Abaixo o Capitalismo. O que tenho visto é "dinheiro da educação foi pra construção de estádio". O mundo é capitalista e a Copa gera lucro. Depois da Copa teremos mais dinheiro pra investir em educação!

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    1. Laerte, eu não boto muita fé nessa história da tua última frase. O que se viu é o aumento da desigualdade social. Tu chegou a acompanhar o pós-copa na África do Sul? Tem várias reportagens que demonstram isso.

      O povo quase nunca tomou as ruas pra reclamar do capitalismo. Aí é querer demais. O povo sempre reclamou por pão e casa. Nós que fazemos a relação com o capitalismo, pois é ele que gera a falta de pão e casa.

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    2. Acho que dizer que uma copa é fator de desigualdade social é exagerar e muito, assim como é exagerar o fator copa para algum possível benefício. Como você mesmo diz o fator básico é o capitalismo que vai continuar o mesmo com ou sem copa. Vai daí que acho ingênuo o slogan "não vai ter copa" .

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    3. Pegue o caso da Ocupação Itaquera, Antonio. São cerce de cinco mil família que tiveram que deixar suas casas porque o aluguel aumentou (dobrou) do dia pra noite nas proximidades do terreno onde está o Itaquerão.

      Sou corintiano e vi a entrevista de um dos diretores do Corinthians sobre o assunto, na qual ele diz claramente: "Não tenha dúvida, o capitalismo vai fazer seus efeitos".

      O evento é uma mega-ocupação, além de gente que teve que migrar, que perdeu fonte de renda e tudo o mais. Quantos não ficaram endividados pagando o aluguel.

      Este é só um exemplo.

      Você ainda acha que é exagero?

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    4. Acho sim. Qualquer ação econômica capitalista é assim, construa metrôs, usinas hidroelétricas (Belo Monte?), o que for, o capital vai fazer exatamente isso. Então não consigo ver como não exagero esse alvoroço todo com a copa. É um evento capitalista com os mesmos paraefeitos de qualquer outro. Ocorre que pegaram isso como pólvora política de um amálgama de descontentamento genérico e elegeram a copa como bode expiatório.

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    5. Não sei se você leu o primeiro texto do debate (está linkado). Lá defendo que é justamente por ser capitalismo que vai ter protesto. Aponto que a copa é o elemento que escancarou isso ao brasileiro, e por isso ela é o que tu chama de "bode expiatório". Repito isso, de certa forma, nesse texto.

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    6. "Depois da Copa teremos mais dinheiro para a educação"...
      o post virou um campeonato de stand-up? toca a buzina no ouvido do laerte, chacrinha...

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    7. O que eu quero dizer é que existem inúmeros problemas bem mais graves e óbvios que poderiam escancarar esse descontentamento de maneira mais lógica como os próprios problemas de saúde e educação. O que eu discuto é o quanto esse descontentamento com a copa não é um evento midiático alavancado por interesses políticos que nós sabemos bem no que vai dar. Para exemplificar melhor não vejo tais protestos feitos pelas pessoas que realmente sofrem com a saúde e a educação pública, vejo os protestos de gente que usufruem da saúde e educação privada. Eleger um evento que por mais que tenha gastado não representa 1 mês de gastos com educação e "esquecer" os gastos enormes com os juros da dívida pública por exemplo é estranho.

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    8. Antonio, o texto - e o debate - é justamente sobre isso. Você leu os três textos?

      Não é porque você não vê protestos sendo feitos por gente que realmente sofre que eles não existem. Esse é o meu argumento. Vai além do lance midiático, do parasitismo da direita. Os protestos tão sendo feitos por gente sem-teto.

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    9. Eu li os textos cara e entendo tuas colocações, só não consigo ver sem-tetos nesses protestos. Vejo pessoas protestando contra coisas que no fundo elas não fazem nenhuma questão de mudar. Jogam a culpa da situação no Estado e livram a cara do capital que continua nadando de braçada na situação.Vai passar a copa e os protestos morrem e só vai sobrar o ganho político de quem aposta nisso.

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    10. Sim, mas o estado e o capital andam de mãos dadas.

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    11. Você tem toda a razão anônimo mas o mote dos protestos parece focado naquela pequena parte do Estado que não está tanto de mãos dadas.

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  4. Felipe, você é a cara da Esquerda: perdido e contraditório.

    Releia seus últimos posts sobre a copa. Mas não se preocupe, você não está sozinho, o Baço e o Clóvis te fazem companhia.

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    1. Eu curto essa gente que não entende nada de nada, mas acha que sabe alguma coisa. Mas vou passar a bola para o Clóvis, que é mais didático e tem paciência para educar adultos.

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    2. 17:10, você é a cara da direita brasileira atual: sem vocabulário, sem ideias, sem criatividade. Em resumo: um imbecil incapaz de ultrapassar a linha da estupidez e do ressentimento.

      Pronto, Zé, respondi didaticamente.

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    3. Eu não disse?

      (ressentido, eu?)

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  5. Imagino a batalha nas cabecinhas dos esquerdistas mais afoitos: “Peraí, se eu for contra a copa, sou a favor da Esquerda, porém se eu for a favor da copa mantenho meus laços com o partido picão da esquerda que é o PT”. Ó céus, de dilema...

    Jorge. Jlle

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    1. Para um desinformado que acha que a esquerda é um monolito de idéias iguais você está abolutamente certo lol.

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    2. Jorge, nossa única batalha é contra a estupidez e a ignorância de comentaristas como você. E essa, temo, é uma batalha perdida.

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