sexta-feira, 10 de agosto de 2018

"Lejuizlar" em causa própria

POR MÁRIO PAGANINI
Nesta semana sete dos onze ministros do STF - Supremo Tribunal Federal tomaram uma decisão daquelas que ninguém se atreve a pedir vistas: a autorização para incluir, no orçamento no próximo ano, um reajuste salarial de 16,3%. Tudo ainda depende da aprovação do Congresso, mas ninguém tem dúvidas de que a coisa deve passar. Até porque tem muita gente por lá com contas a ajustar com a Justiça e é melhor não cutucar o pessoal da toga com vara curta.

Isso significa que o salário dos ministros do STF vai passar de R$ 33 mil para 39 mil e mais uns cacarecos. Ora, 6 mil de aumento são peanuts no orçamento da nação. Tem gente lá dentro dizendo que o aumento até peca por ser pouco. Mas tem o povo ingrato. E logo houve chiadeira nas redes sociais a criticar o pessoal. Ora, isso só pode ser fruto da desinformação. Esse pessoal do Judiciário - e não só do STF - vive à míngua, com salários de fome. Só não vê quem não quer.

Uma prova? Quem não lembra da histórica entrevista do desembargador José Roberto Nalini, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, há algum tempo, quando questionado sobre o tal auxílio moradia. O homem explicou tim-tim por tim-tim a situação e  expôs a situação de penúria por que passa o pessoal do poder Judiciário. Imaginem que não dá sequer para ir a Miami comprar ternos. A situação que obriga a "lejuizlar" em causa própria.

Que tal relembrar esse dia? Veja o filme…com edição especial.


quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Abortar não é crime; é saúde pública

POR CLÓVIS GRUNER
Encerrou na segunda (06) a audiência pública convocada pela ministra Rosa Weber, do STF, para discutir a ADPF 442, ajuizada pelo PSOL em novembro de 2017, que descriminaliza o aborto realizado nas primeiras 12 semanas de gestação. Durante dois dias – a audiência começou na sexta-feira (03) –, representantes de 50 entidades apresentaram argumentos favoráveis ou contrários à descriminalização.

Uma das principais referências sobre o tema no Brasil e coordenadora da Pesquisa Nacional do Aborto, a antropóloga Débora Diniz (que chegou ao Supremo com escolta policial depois de ser ameaçada de morte pelos defensores da vida) fez uma das falas mais contundentes. Ancorada nos dados da pesquisa que coordenou em duas ocasiões – 2010 e 2016 –, ela apresentou um perfil minucioso do aborto no Brasil, uma prática recorrente, mas que, ilegal, é responsável pela morte de inúmeras mulheres e motivo ou ameaça de prisão para outras tantas.

De acordo com a PNA, cerca de 15% das mulheres entre 18 e 39 anos já fez pelo menos um aborto. O índice é maior – aproximadamente 18% – se tomadas como referência apenas as mulheres entre 35 e 39 anos. Na média geral, uma em cada cinco mulheres já fez aborto. O índice é maior nas regiões Norte e Nordeste – 15% e 18%, respectivamente, contra 11% e 6% no Sudeste e Sul. O corte étnico, de classe e nível de escolaridade também é significativo: 22% das mulheres que cursaram até a quarta séria já fizeram aborto, o dobro daquelas com nível superior.

O fenômeno se repete se tomada a renda familiar: 16% das mulheres com renda de até um salário mínimo já abortaram, contra 8% das com renda acima de cinco salários. Algo em torno de 25% de mulheres pretas, pardas ou indígenas já abortaram, índice bastante superior aos 9% de mulheres brancas. Ou seja, mais que uma excepcionalidade, o aborto é uma prática comum entre mulheres comuns. O incomum é sua criminalização, e é sobre ela que precisamos falar.

Um debate público – Um dos argumentos favoráveis à descriminalização, é de que não se trata de uma decisão simples, que acarreta quase sempre danos físicos e emocionais a quem o faz. A premissa é verdadeira e bem intencionada, mas incorre em um equívoco fundamental. Ela mantem na esfera pessoal e privada, um debate que precisa ser travado na esfera pública. Na prática, reitera em outra chave as razões alegadas pelos que são favoráveis a que mulheres sejam encarceradas ou morram por realizarem um aborto.

Quase sempre de fundo moral ou religioso, os argumentos favoráveis à criminalização tendem a reproduzir, tomando como verdadeiro, um cenário que não encontra sustentação em qualquer dado do real: descriminalizar o aborto não é obrigar mulheres a fazê-lo; nem se formarão filas em hospitais, clínicas e postos de saúde de gestantes ávidas por abortar. Não estamos falando de um “genocídio”, como defendem alguns, perversamente.

Na prática, a descriminalização, além de tratar o tema como um direito fundamental, em consonância com a Constituição 88, retira da esfera jurídica e policial o que não deveria ser um crime, e o desloca para o seu lugar de direito: o da saúde pública. E não se trata apenas de defender a vida e a liberdade de mulheres, especialmente mulheres negras e pobres, por muitas e óbvias razões as mais expostas e vulneráveis seja à prisão ou à morte em uma clínica clandestina.

Descriminalizar o aborto e tratá-lo como um tema e um problema de saúde muda, principalmente, a competência do Estado. Podendo falar dele abertamente, pode-se desenhar políticas públicas para, além de proteger, prevenir e mesmo evitá-lo, o que vimos acontecer em países onde ele já foi descriminalizado, caso do vizinho Uruguai. Tema sem dúvida controverso e delicado, o aborto demanda inúmeras formas de tratar as mulheres que a ele recorrem. A cela de uma prisão não é uma delas. A morte tampouco.

terça-feira, 7 de agosto de 2018

Bolsonaro limpando a barra dos portugueses? Não, obrigado!

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Jair Bolsonaro é um beócio. A sua personalidade é um somatório de ignorâncias. É machista, homofóbico e racista. Defende torturadores. Prega a violência. Sempre viveu de dinheiro público. Mas agora decidiu invadir a seara dos historiadores. Numa “justificação” para rejeitar as cotas, disse que não existe qualquer dívida histórica com os descendentes de escravos. Porque, segundo afirma, os africanos são os autores da própria desgraça.

Para o candidato da extrema direita, os portugueses não tiveram culpa pela escravidão. “Se formos ver a história, realmente (...), o português nem pisava na África. Eram os próprios negros que entregavam os escravos (...). Os portugueses faziam o tráfico, não caçavam os negros na costa. Eles eram entregues pelos próprios negros (...). Que dívida é essa?”, disse Bolsonaro, com ar de entendido na bagaça. 

O que tenho a dizer, enquanto português? Ora, que dispenso esse “branqueamento” da história (em Portugal a palavra “branquear” significa apagar o lado sujo dos fatos). Tal proposição nunca cairia bem, vinda de onde viesse. Mas quando vem de uma criatura deplorável como Jair Bolsonaro há ainda mais razões para ser categórico. Tentar limpar a barra dos portugueses soa a vitupério. Nem pensar!

É fato que a escravidão na África já existia há mais tempo. Mas foram os portugueses que introduziram uma lógica econômica que fomentou guerras para gerar mais escravos. No entanto, não vou perder tempo a argumentar com fatos históricos (e haveria muito por onde pegar), porque seriam palavras ao vento. O candidato Jair Bolsonaro e os seus seguidores são incapazes de entender uma argumentação séria. Passo.

O fato é que a notícia chegou até à imprensa portuguesa. O que não é novidade, porque ao longo dos tempos o nome de Bolsonaro tem aparecido nos noticiários, sempre envolto em estupefação. Os portugueses não entendem a ascensão de alguém tão desqualificado. Aliás, a reação de estranheza não é apenas em Portugal. Os europeus, de maneira geral, não engolem esse tipo de aberração política. Tempos sombrios.

Para ter uma ideia, um dia destes li que Bolsonaro “é um perigo real e segue os passos de Adolf Hitler”. Ora, quando alguém é acusado de seguir doutrinas que podem ser comparadas ao nazismo, é porque a vaca foi para o brejo. Ou, por outras palavras, isso significa que uma parcela da população brasileira – que pode chegar aos 20% - está com as capacidades cognitivas em estado vegetativo.

Mas voltando à vaca fria. Bolsonaro não engana ninguém quando tenta aliviar para os portugueses (que, como já disse, dispensam ser defendidos por um fascista). Afinal, todos sabemos que é apenas uma tentativa de dar alguma “razoabilidade” ao seu racismo. Não dá. Até porque, segundo a imprensa, o seu vice, o general Mourão, diz que o brasileiro resulta da indolência do índio e da malandragem do negro. Dupla mais racista, impossível.

É a dança da chuva.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Cota 40: há quem queira ganhar milhões de um dia para o outro. E quem perde é você...


POR JORDI CASTAN
Estamos a ficar cansados de ter que participar em audiências públicas, mobilizar a sociedade, assinar petições e nos manifestar publicamente pela defesa da Cota 40. Porque aqueles que são contra nunca desistem, nunca dormem e estão sempre tramando uma nova artimanha para acabar com ela.


Com o discurso fácil do progresso, do desenvolvimento e da inevitabilidade do avanço da cidade sobre as áreas verdes, sempre há quem apresente novos argumentos para “flexibilizar” as restrições à ocupação da Cota 40. É bom lembrar. Desde há décadas é permitida a ocupação da Cota 40. Ou seja, não é verdade que a legislação não permita a sua ocupação. O que há, e isso é bom, são regras duras e restritivas para evitar que o verde remanescente seja destruído e dê lugar a ocupação imobiliária desenfreada e especulativa.
Enquanto há os que cabalam para que nos morros de Joinville pipoquem espigões de concreto, há os que defendem que se mantenha áreas de relevante interesse paisagístico, o verde, a biodiversidade, aquilo que a maioria das pessoas - e os especialistas em organização urbana - consideram que contribui a uma melhor qualidade vida.
Avançar é ir em outro sentido. Mais do que permanecer como está, é necessário ir além, regulamentar as ARIE - Área de Relevante Interesse Ecológico do Boa Vista e do Morro do Finder, implantar definitivamente a ARIE do São Marcos. E também garantir, com legislação suplementar, a criação de corredores ecológicos, a proteção dos morros dos Bairros América e Atiradores, proibir a mineração no perímetro urbano e assegurar para a Joinville do futuro a preservação das áreas verdes hoje ameaçadas.



O jogo é simples e sempre o mesmo. Comprar áreas de preservação, áreas de ocupação sujeita a regras e normas estritas e limitadas ou áreas rurais. Depois, com a ajuda de vereadores, funcionários e profissionais de princípios e valores elásticos e moralidade duvidosa, propor mudanças a legislação. E no fim permitir que, da noite para o dia, áreas rurais mudem de zoneamento, a cidade se expanda além do seu perímetro atual e se ganhem milhões de um dia para o outro.


O quadro é este. Não há outra novidade: de um lado, a insistência de uns em derrubar a Cota 40; do outro,  a persistente defesa dos que querem que permaneça como está. Bom que desta vez o Ministério Púbico (MPSC) também está atento e já acompanha de perto a elaboração do Projeto de Lei que ameaça a permanência da Cota 40.









É oportuno lembrar que o prefeito Udo Dohler assinou até abaixo assinado em defesa da Cota 40 e se comprometeu a garantir a sua preservação e a não empreender ações que a ameaçassem ou a pusessem em perigo. Seria bom lembra-lo do que assinou. Para ajudar a lembrar nada melhor que dar uma olhada no seu post e no comunicado oficial da própria Prefeitura e se você ainda não assinou seria bom que o fizesse. Cada assinatura conta. Mas não faça como aqueles que assinam e depois esquecem que assinaram. Defenda a Cota 40.