As reuniões matutinas do secretariado municipal foram um dos temas que tomaram a maioria das rodas num recente encontro gastronômico-social. É o tipo de encontro em que a comida é preparada para que seja possível utilizar só o garfo, porque as facas estão todas enfiadas nas costas dos próprios convidados. São eventos promovidos por jornalistas, colunistas sociais e outros transvestidos em profissionais da imprensa com feijoadas, costeladas ou carreteiros. O objetivo encoberto
é fazer uns trocados e ter acesso em primeira mão a comentários e boatos
lubrificados com cerveja e destilados.
Um dos vários secretários municipais presentes discorreu
sobre o formato e a efetividade das reuniões do colegiado, que em geral se
realizam bem cedo pela manhã. O formato lembraria, se for verdadeira a versão
apresentada pelo secretário, o de programas de humor que repetem a mesma
fórmula: no Brasil um dos mais conhecidos levou o nome de “Escolinha do
Professor Raimundo” e era capitaneado pelo saudoso Chico Anysio. Houve outros
programas que repetiram o modelo, como a Escola do Golias, mas o formato era em
tudo semelhante e conseguia com facilidade o seu objetivo de fazer rir com
facilidade, estereotipando alunos e professores, sem outra pretensão que a de
provocar o riso.
A reunião começa de madrugada, com a chamada dos
presentes. Aqueles que faltem ou cheguem tarde devem justificar e podem receber uma chamada de atenção. É boato que alguns secretários municipais
tenham apresentado bilhete assinado pelos pais, para justificar o seu atraso,
isso no passa de pura invencionice da oposição. Depois de feita a chamada e
anotados com caligrafia esmerada os nomes dos faltosos, que correm o risco de
ficar sem sobremesa, a reunião da início com a leitura detalhada da ata da
reunião anterior. Uma leitura feita pelo próprio alcaide, que, com entonação monótona, relata tudo o que foi decidido e determinado na reunião anterior. A leitura pode levar mais de uma hora, passada a qual cada secretario tem direito a dois
minutos. Os responsáveis pelas pastas estratégicas chegam a dispor de três
minutos para relatar o que fizeram ou justificar o que deixaram de fazer.
Transcorridas quase duas horas a reunião é encerrada.
A administração baseada no modelo de cobranças é típica de
um chefe autocrático, aquele que fala todo o tempo, conhece os problemas melhor
que ninguém e aponta soluções, sem chegar a analisar com profundidade o
problema e suas causas, assim não há necessidade de ouvir a sua equipe, que
escuta em silêncio a espera das diretrizes que emanarão do próprio prefeito. A
gestão moderna, seja ela pública ou privada, exige um perfil de liderança
diferente. Hoje é a vez dos líderes, aqueles que são capazes de motivar pessoas
comuns a obter resultados surpreendentes. Liderar equipes exige um perfil
diferente, não só há que escutar, pois é preciso saber ouvir e aceitar que o chefe
pode não ter sempre toda a razão. Para quem foi forjado no
modelo autocrático do século 19 é tarefa difícil entender a complexidade da liderança
do século 21 e os novos desafios da gestão pública, numa cidade com mais de
500.000 habitantes.
O resultado das reuniões, que deveriam servir para ser o
celeiro de novas ideias e alternativas que permitam resolver os graves
problemas que o município enfrenta, são longos solilóquios que ninguém
mais escuta, eternos monólogos repetitivos e cansativos que mais parecem
mantras para invocar o milagre da ação inexistente.