sábado, 15 de junho de 2013

Uma imagem que vale ouro

                                                                               POR FABIANA A. VIEIRA


Se há uma coisa que eu reconheço no governo Udo é a preocupação com a imagem. Não sei se parte de uma cabeça, ou de um coletivo, mas o mote da imagem está bem trabalhado. Senão vejamos o episódio do anúncio da redução da tarifa de ônibus, realizada na última semana, logo após pipocar comentários maldosos sobre participação do prefeito Udo Dohler na operação Fariseu, que investiga o envolvimento do Hospital Dona Helena, de Joinville, na compra de ouro para camuflar recursos e não perder o certificado filantrópico, que garante isenção tributária até para importar equipamentos. Mesmo com resposta da assessoria isentando Udo de qualquer participação ilícita, o estrago estava feito.

Quem trabalha com marketing sabe que, num momento de crise, o segredo é tomar decisões rápidas. E a resposta veio em um anúncio reduzindo a tarifa de ônibus de Joinville - numa semana recheada de manifestações polêmicas, lideradas pelo Movimento Passe Livre (MPL) em grandes centros do Brasil com destaque para São Paulo.

A decisão foi acertada. Ninguém mais fala do ouro. Udo já trabalhou bem com isso em outras ocasiões. Na campanha ainda, a decisão de doar o salário de prefeito para entidades assistenciais, nos últimos dias de campanha, é dada para alguns estudiosos como a grande virada nas urnas. Outro momento decisivo para a imagem de Udo foi revogar o anúncio deixado por Carlito Merss, também sobre a redução da tarifa. Começou o governo no lucro midiático.

Mas voltando sobre a decisão de baixar a tarifa de ônibus na última semana, cabe salientar que a medida é resultado da decisão anunciada há  um mês pelo governo federal, que isentou as empresas de transporte coletivo do PIS e Cofins. Esta ação foi tomada, inclusive, por outras prefeituras do Brasil Em São Paulo, por exemplo, já foram seis cidades que anunciaram a redução da tarifa do ônibus após medida do governo federal. Portanto houve também um benefício para as empresas.

Na visão do Movimento Passe Livre (MPL) de Joinville essa redução de impostos atendeu as necessidades diretas dos empresários do setor - não foi uma política pública para atender a população joinvilense que usa o transporte coletivo. Outra alegação do MPL é que ainda falta discutir em Joinville a questão da licitação que pode garantir mais concessões e acabar com o monopólio do ônibus na cidade. Saindo um pouco da opinião do MPL, vale destacar a opinião de enquete realizada pelo jornal A Notícia, onde os entrevistados lembram que não adianta baixar a tarifa agora e aumentar em dezembro, como já sinalizou o prefeito.

Mesmo com essas contradições após o anúncio de Udo, eu acho que sua imagem foi preservada, ou pelo menos restaurada. Pois quem utiliza o ônibus todos os dias sabe que uma redução de 10 centavos, faz diferença no bolso no final do mês. Mesmo que sejam seis meses apenas. Acho que esse joinvilense aprovou sim o anúncio de Udo. Agora ele já pode pensar em novas estratégias para dezembro, quando as empresas irão pressionar por um novo aumento.

Momentos filosóficos dos leitores



OS COMENTÁRIOS MAIS ESCLARECIDOS DA SEMANA

1.

parabéns policia mete o pau nesses vagabundos em Bala de borracha, prisão por porte de vinagre, pancadaria... eles morrem de medo de um mundo melhor
2.
Tinha que ter levado o tiro no meio da testa! Bando de vagabundo, arruaceiros, baderneiros, socialistas do caralho! Vão destruir a casa de vocês seus maconheiros ... Os "chavistas" quebram a cidade e a polícia não pode intervir? Parabéns a PM de SP! Maconheiro se trata assim mesmo!! on Bala de borracha, prisão por porte de vinagre, pancadaria... eles morrem de medo de um mundo melhor
3.
"Um mundo melhor" feito por mauricinhos maconheiros e baderneiros. plac, plac, plac. em Bala de borracha, prisão por porte de vinagre, pancadaria... eles morrem de medo de um mundo melhor

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Bala de borracha, prisão por porte de vinagre, pancadaria... eles morrem de medo de um mundo melhor

POR FELIPE SILVEIRA

Posso estar errado, mas acredito que ocorreu nesta semana um dos fatos mais importantes da nossa história recente. Falo dos protestos contra o aumento da tarifa de transporte coletivo em várias cidades do país, mas, sobretudo em São Paulo (de R$ 3 para R$ 3,20), onde o tamanho da manifestação foi maior e contou com uma absurda violência policial proporcional ao tamanho do ato.

Mulher, homem, velho, jovem, criança, repórter, cinegrafista... a PM paulista não se importou com quem tava na frente. Saiu descendo o cacete e atirando bala de borracha a uma distância de cinco metros de distância de manifestantes (distância mortal, diga-se de passagem), além de não economizar no gás lacrimogêneo. Só na quinta-feira (13), mais de 40 pessoas foram detidas por - vocês não vão acreditar - porte de VINAGRE!!! O produto usado na cozinha de qualquer casa brasileira atenua os efeitos do gás usado pela polícia. E bota usado nisso. Há muitas questões a discutir sobre isso, e vou dar uma pequena opinião sobre as que mais me chamam atenção.

Primeiro, se você defender a PM depois de se informar sobre o que aconteceu, se você defender o abuso de autoridade e todos os crimes e violência que a polícia cometeu, você é um baita de um safado, mau caráter e vagabundo. E UM BOSTA. Já discuti aqui no Chuva Ácida que a polícia no Brasil não é despreparada, como muitos dizem, mas é justamente preparada para ser assim: violenta. Uma polícia que rouba, mata, forja, trafica... E, se você duvida, eu recomendo alguns livros e filmes que podem ajudar a formar uma ideia melhor sobre o assunto. E você pode começar também pelo que houve nesta quinta, nos links abaixo:

Retratos da violência praticada pela PM

"Sem violência", diziam os manifestantes, mas a PM que precisava ouvir

Policial quebra vidro da viatura... ou será um manifestante disfarçado fazendo baderna?

Repórter é preso por porte de, pasmem, VINAGRE!

Jornalista é espancado pela polícia

É evidente que nem todo policial é vagabundo, mas a instituição é falida e quem está lá dentro dificilmente não é cúmplice das barbaridades que são praticadas contra a população pobre e negra (sim, somos um país extremamente racista), principalmente na periferia. Lá as balas não são de borracha... De qualquer forma, torço para os bons policiais, são poucos, mudarem a polícia, ainda que eu não acredite nesta possibilidade.


Segundo, é triste demais ver o rumo que o Partido dos Trabalhadores (PT) tomou e o lugar onde está. Já fui petista (hoje faço parte do PSOL) e saí por ter me decepcionado faz tempo, mas mesmo assim sou um otimista e acredito que o PT trouxe alguns avanços ao país. Trouxe e pode trazer ainda mais. No entanto, esses avanços são jogados no lixo diante de situações como essa. O prefeito Fernando Haddad (eleito na eleição de 2012 - e não custa lembrar, depois de vermos Lula apertar a mão de Maluf) parece ter cruzado os braços para a situação, e assim sua omissão passa a ser apoio à violência da polícia comandada pelo tucano Geraldo Alckmin, governador do estado.


Em terceiro lugar está a cobertura da imprensa. É vergonhosa, como quase sempre (há exceções para esta regra), mas passou dos limites dessa vez, quando o editorial do Estadão mais pareceu um chamado à ação violenta da polícia. Ultrapassou as raias da loucura quando a Veja publicou que “a polícia impediu a ação de vândalos”. Se bem que a Veja já ultrapassou as raias da loucura há tempos e dali só podemos esperar desgraça mesmo. De qualquer forma, a cobertura, da TV, principalmente, influencia negativamente demais o avanço da cidadania nessa país. Faz isso quando trata quem luta por direito como bandido e corruptos (empresários, políticos, fiscais, cidadãos) como heróis.

Ah, em tempo, se você lê a Veja (acreditando), você é um BOSTA!


E, em quarto lugar, e dessa vez, mais importante, está uma notícia boa. É apenas uma opinião pessoal, mas eu acredito que a sociedade e a forma de fazer política está mudando a passos largos. Tem a ver com a mudança de valores e de hábitos e também com tecnologia, que permite uma nova fase no campo da comunicação e -  por que não? - da ação. Primavera Árabe, Occupy Wall Street, Revolta do Vinagre (galera do twitter já achou um apelido)... são levantes contra a injustiça, liderados pela massa (e não por uma figura a ser presa ou morta), que surgem na internet e ganham as ruas, e continuam a contar com ajuda da internet, seja na articulação, na denúncia ou no apoio. É isso que me faz ter esperança em um mundo melhor.

É a primavera - e ela não pode ser detida...


Importante:

- Não discuto com e nem sobre vagabundo que fica incomodado com protesto parando o trânsito. Esse é só um lixo que a sociedade produz.

- Todo meu apoio à luta do povo e parabéns ao Movimento Passe Livre (MPL) de todo o Brasil, que puxa essa luta e tem forte atuação em Joinville contra o oligopólio das empresas de ônibus que, de mãos dadas com o governo municipal há décadas, avacalham a vida do joinvilense.

- Leia também o texto do jornalista Pedro Henrique Leal, que aborda essas e outras questões do caso. Aqui.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

E a mulher? Foda-se!

POR CLÓVIS GRUNER




A semana passada não foi de boas notícias. Ela começou com a demissão de Dirceu Greco, diretor do Departamento de DSTs, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, responsável pela campanha “Sou feliz sendo prostituta”. A justificativa oficial do ministro Alexandre Padilha, covarde e hipócrita, escondeu o verdadeiro motivo da saída de Greco, criticada por inúmeros profissionais que conhecem e respeitam sua trajetória como infectologista: a submissão, mais uma vez, das ações do governo à agenda conservadora, já que o estopim da demissão foram as críticas dos deputados evangélicos hoje à frente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, particularmente Marco Feliciano e João Campos, ao conteúdo da campanha, considerada pelo último uma “apologia ao crime”.

No meio da semana, cerca de 40 mil evangélicos tomaram as ruas de Brasília. Oficialmente, tratava-se de uma “Manifestação pela liberdade de expressão, liberdade religiosa e família tradicional”. Animados por Silas Malafaia, no entanto, o que se viu foi uma demonstração coletiva de ódio e intolerância que beirou às raias do absurdo: confundido com um gay, um pastor da igreja Quadrangular foi agredido por seguranças, um “mal entendido”, segundo os pastores responsáveis pelo evento. Alguns sites gays minimizaram o acontecimento, já que a quantidade de fieis foi bem menor que a esperada e prometida pelo pastor. Outros destacaram que Malafaia não é unanimidade mesmo dentro do segmento evangélico. Tudo isso é verdade, mas a história já nos mostrou que milhares de pessoas nas ruas, movidas pelo fanatismo e o ódio é algo para, no mínimo, nos preocupar.

Mas veio da Câmara de Deputados a mais estarrecedora e lamentável das notícias, com a aprovação, pela Comissão de Finanças e Tributação do Projeto de Lei 478/2007, conhecido como o Estatuto do Nascituro. Quem conhece minimamente o percurso de um PL no parlamento sabe que o projeto não chegou ainda ao último estágio: aprovado anteriormente na Comissão de Seguridade Social e Família, ele depende agora de parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça antes de, finalmente, seguir para votação no plenário. Se aprovado, segue para sanção presidencial. Mas a simples existência de um projeto de tal natureza – de autoria, aliás, de um ex-deputado petista, Luiz Bassuma – e sua aprovação por duas comissões parlamentares é, e eu vou usar um eufemismo, uma indignidade.

E um atraso. Entre outras coisas, porque o conceito que o atravessa mandas às favas todo o debate científico e jurídico em torno ao conceito e estatuto de pessoa. Ele se apoia tão somente em uma concepção de fundo religioso, ao afirmar que “Nascituro é o ser humano concebido, mas ainda não nascido”, para logo em seguida estabelecer, em parágrafo único, que o “conceito de nascituro inclui os seres humanos concebidos ainda que “in vitro”, mesmo antes da transferência para o útero da mulher.” Tal conceito, ao assegurar aos embriões os mesmos direitos que, em tese, são garantidos aos nascidos, inviabiliza e criminaliza, por exemplo, pesquisas com o uso de células tronco, uma das principais conquistas científicas dos últimos anos, aprovada pelo STF em 2008.


O DIREITO AO CORPO – Não importa que uma das matérias mais polêmicas do PL tenha sofrido uma mudança: no texto original, e contrariando a legislação em vigor sobre o tema (aliás, uma das mais conservadoras entre os países ocidentais) o aborto, independente do contexto, não apenas era criminalizado, como em sua justificativa o autor do projeto defendia sua inclusão na categoria de “crime hediondo”. A versão que segue para a Comissão de Constituição e Justiça, estabelece como ressalvas o disposto no artigo 128 do Código Penal, que autoriza o aborto em caso de risco de vida para a gestante ou quando a gestação for resultado de estupro. Mas não diz nada, por exemplo, sobre o aborto de anencéfalos, autorizado também pelo STF (só!) no ano passado.

Mesmo com a mudança introduzida, o Estatuto do Nascituro amplia a criminalização do abortamento e dificulta, por consequência, o acesso a métodos contraceptivos e ao aborto legal, hoje já bastante restrito, ao tornar a gestante objeto de uma exaustiva e intimidante vigilância. No caso de gestação decorrente de abuso violento, não apenas institui a em si abominável ideia de um auxílio estatal à gestante e ao nascituro – apelidada nas redes sociais de “Bolsa estupro” – como estabelece que, “Identificado o genitor do nascituro ou da criança já nascida, será este responsável por pensão alimentícia nos termos da lei”. É mais ou menos assim: além de ter sido estuprada e obrigada a carregar por nove meses o resultado da violência a que foi submetida, a mulher terá de conviver, pelos próximos anos, com seu estuprador, obrigado este pelo Estado a reconhecer e sustentar o filho, assumindo na prática o seu “patrio poder”. Kafka não faria melhor.

Já se falou muito sobre o tema, especialmente – mas não só – nos blogs feministas. Já se elencaram inúmeras e pertinentes razões que justificam opor-se a ele. Não vou me alongar mais, repetindo o que já foi dito e pode ser lido aqui, aqui e aqui. Mas não quero silenciar sobre uma questão que, implícita ao projeto, é de extrema urgência: o Estatuto do Nascituro não é apenas sobre o aborto e não pode ser lido e entendido somente por este prisma. O retrocesso maior está na afirmação da desigualdade, jurídica inclusive, da mulher, que vê diminuído ainda mais o direito sobre seu próprio corpo, objeto de tutela do Estado. Houve um tempo em que esta desigualdade, ainda presente no cotidiano e que se expressa de diferentes maneiras, desde a recorrente culpabilização da vítima em casos de estupro (e a Fernanda comentou isso em ‘post’ recente aqui no blog), a prisão de manifestantes pela policia atendendo a pedidos de um padre, até artigos de filósofos na grande imprensa; houve um tempo, enfim, em que esta desigualdade era assegurada juridicamente.

No primeiro Código Penal republicano, o adultério era considerado crime quando praticado por mulheres, em qualquer situação. Aos homens, eram reservadas penas mais brandas apenas se o adultério implicasse na negligência do cumprimento do seu papel de provedor da família. Tal premissa, inclusive, inocentou inúmeros assassinos de mulheres, absolvidos sempre que apelavam à “defesa da honra” como justificativa ao homicídio. Avançamos bastante desde então para aceitar, passivamente, retrocedermos a uma condição em que as mulheres, uma vez mais, estarão à mercê de uma lei retrógrada, flagrantemente inspirada em princípios que não são os da laicidade e da igualdade de direitos, mas de uma concepção religiosa e fundamentalista de mundo e de pessoa. Porque é exatamente disso que se trata o Estatuto do Nascituro: ele joga no lixo o pouco de equidade conquistada nas últimas décadas para tornar a mulher, uma vez mais, objeto da vontade fálica do Estado, tudo sob a proteção da lei. Ele diz a ela em juridiquês o que o machismo, o conservadorismo e o fundamentalismo religioso vêm afirmando desde há muito tempo: foda-se você, seu corpo e os seus direitos!