quinta-feira, 27 de abril de 2017

Desconstruindo o "mito": o "dossiê Bolsonaro"

POR ET BARTHES
E já que Jair Bolsonaro tem sido o tema dos últimos dias aqui no Chuva Ácida, que tal ver este filme que se tornou viral. É um video em que o ativista digital Leonel Radde, que se apresenta como policial civil, apresenta um dossier sobre o “mito”. Ou seja, mostra a trajetória da vida pregressa do deputado e diz, entre outras coisas, coisas parecidas com o que tem sido comentado aqui no blog, mas com algum humor.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Jair Bolsonaro é honesto?













POR CLÓVIS GRUNER
Boa parte dos comentários ao texto do José António Baço ontem, no “Chuva Ácida” (abaixo), responde "sim" à pergunta. À maioria deles, o fato de o deputado não ser mencionado em nenhuma delação, nem figurar nas listas que fazem com que o noticiário político se confunda com a crônica policial, são provas mais que cabais de que ele não é corrupto.

E isso, dizem, basta para atestar sua superioridade moral e gabaritá-lo para concorrer à presidência nas eleições do próximo ano. O argumento é reiteradamente usado pelos seus eleitores e simpatizantes. A questão é: Bolsonaro realmente não é corrupto? Desculpem-me o sectarismo, mas nesse caso não há meio termo: para quem é minimante decente, a resposta é “não” e por inúmeras razões.

Defender ditaduras, a tortura e seus torturadores; fazer apologia ao estupro (de mulheres bonitas, porque as feias não merecem); incitar a violência doméstica; exibir pública e desavergonhadamente seu racismo..., tudo isso são igualmente formas de corrupção, todas desprezíveis.

Fossem decentes, e os eleitores e simpatizantes do deputado reconheceriam que sua incitação ao ódio e à violência, seu desprezo pela democracia, pelos direitos humanos e liberdades individuais, são motivos suficientes para condená-lo ao limbo político porque, insisto, em uma cultura democrática, essas são formas de corrupção, tão graves quanto as diariamente noticiadas.

O problema é que não vivemos em uma cultura democrática. Além disso, boa parte dos seus simpatizantes e eleitores não o admiram apesar disso mas, ao contrário, justamente por isso. O que me leva de volta à questão: Bolsonaro é, segundo os padrões pouco exigentes de seus admiradores, um político honesto? Ele não aparecer nas delações e, aparentemente, não estar envolvido nos escândalos da Lava Jato, é suficiente para afirmar que ele não é corrupto?

Não. E por quê? Ora, porque o assalto ao Estado pela aliança entre empreiteiros e políticos, como estamos esgotados de saber, não foi coisa pequena: milhões foram investidos não apenas para garantir essa ou aquela licitação, mas para literalmente colocar os governos a serviço dos interesses das grandes empreiteiras.

Um esquema dessa envergadura não se faz com políticos pouco influentes e preguiçosos. Quem investe tanto, quer, precisa contar com políticos não apenas disponíveis, mas dispostos e capazes de apresentar e passar projetos, de incluir uma emenda no orçamento, de aprovar uma Medida Provisória (aqui). Ou seja, a seu modo e muito peculiarmente, é preciso que eles, os políticos, sejam, além de corruptos, competentes.

Em 2015, após 25 anos de Congresso, Bolsonaro aprovou seu primeiro projeto, uma PEC que prevê a emissão de recibos em urnas eletrônicas (aqui). Ele justificou duas décadas e meia de salários e mordomias pagas pelo erário apelando ao fato de ser “discriminado”: “sou um homem de direita”, diz, e já li e ouvi gente afirmando que ele é “minoria” no Congresso.

Mentira. Hoje no PSC, um partido que está longe de ser nanico, Bolsonaro já foi filiado ao PPR, PPB, PTB, PFL e, finalmente, PP, pelo qual foi eleito em 2014. Como deputado federal, pertenceu à base aliada de todos os governos desde FHC, inclusive Lula e Dilma, até o PP abandonar a ex-presidenta pouco antes do impeachment, no ano passado.

Mas não é só: qual posição defendida pelo parlamentar justifica afirmar que ele é ou pertence a uma “minoria” dentro do Congresso, “discriminado” pelos seus pares? A homofobia, o machismo, o racismo, sua conhecida truculência? Não. Seu desprezo pelos direitos humanos? Tampouco.

Os frequentes elogios à ditadura civil militar; sua homenagem pública a Brilhante Ustra; sua posição favorável à redução da menoridade penal e o endurecimento das chamadas “políticas de segurança pública”; suas críticas ao Estado laico; seu apoio a projetos como o “Escola sem Partido”? Não, não, não, não e, finalmente, não.

O que sobra é óbvio: Bolsonaro não aprovou nenhum projeto em 25 anos não por ser “discriminado”, mas porque é um deputado ruim e sem brilho. Não fosse um fascista, e não estivéssemos nós mergulhados nesses tempos sombrios, ele seria só mais uma figura excêntrica em um Parlamento cheio delas.

Alguém com esse perfil definitivamente não interessa a empresas e empresários que se servem da coisa pública para fins privados. Em poucas palavras: não é que Jair Bolsonaro não aparece em delações e junto a políticos corruptos porque ele próprio não seja um. Não há nenhuma relação entre a omissão a seu nome e a sua alegada honestidade.

Ele não está lá porque é incompetente.

terça-feira, 25 de abril de 2017

Bolsonaro e uma geração intelectualmente inútil

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Falar sobre Jair Bolsonaro é um tema enfadonho. Devo ter escrito um ou dois textos, feito uma ou outra citação. E só. Porque tenho uma posição clara sobre o putativo candidato à presidência: nenhum país cometeria a tolice de eleger um beócio como Bolsonaro para a presidência. As pesquisas mais recentes revelam que ele não consegue ultrapassar a barreira dos 10% nas intenções de voto. Mas – porque tem sempre um “mas” – estamos a falar do Brasil. Um dia destes tropecei nuns “bolsominions” e deu vontade de analisar.

Diz a sabedoria ancestral que o preço da liberdade é a eterna vigilância. É bom que a sociedade não se distraia. E há pelo menos um motivo para preocupação: uma geração perdida. Tenho lido – e o quotidiano confirma – que os seguidores do deputado são jovens entre os 18 e os 35 anos (e também uma molecada que sequer vota, mas cultua o “mito”). É uma geração intelectualmente inútil. Aliás, se houver alguma utilidade, será como objeto de estudo.

Quem são? No caso da molecada, tenho lido e ouvido que são aqueles caras para os quais ninguém liga na escola (as meninas, principalmente). E viram rebeldes... “porque sim”. Todos sabemos que a adolescência é um tempo de opções esquisitas. No entanto, ver adultos a apoiar Bolsonaro – alguns na universidade e alguns até com diplomas na parede – faz doer o cérebro. Não é preciso ser um neurocientista para concluir que alguma coisa atrapalha os processos mentais dessa gente. É o fracasso das sinapses.

Deve estar aí a identificação. Porque Bolsonaro é o retrato do fracasso. 1. Não tem obra. É um deputado medíocre. 2. Não tem ideias. Falta consistência intelectual. 3. Não tem um discurso. É mal articulado. 4. Não tem um programa. Limita-se a uma meia dúzia de clichês moralistas mal amanhados. Enfim, é um político que só convence os idiotas. Neste caso, a idiotia é como o sarampo: infecciosa, viral, transmissível, contagiosa e comum na infância (infância mental, claro). Mas por sorte existe uma vacina.

Bolsonaro é um significante carente de significado. Os seus seguidores desempenham o papel de construir esse “mito”, transferindo para a sua imagem o que de pior lhes vai pela cabeça. É um coquetel de ignorância: misoginia, homofobia, agressividade, incapacidade de debater, ódio aos pobres, culto da violência, antidemocracia, negação do outro, anticomunismo primário, elogio das ditaduras etc. Tudo em Bolsonaro aponta para o retrocesso civilizacional.

Os “bolsominions” (a molecada e os que têm idade mental de criança) ganharam notoriedade porque representam uma espiral de irracionalismo. O país vive um movimento que se aprofunda, aprofunda, aprofunda... e nunca acaba. Os seguidores de Bolsonaro apostam no caos político e institucional. E representam uma desafio para a democracia. É aquilo que Karl Popper chamou “paradoxo da tolerância”. Ou seja, a democracia deve abrigar, no seu seio, os que desejam acabar com a própria democracia? Eis a questão.

É a dança da chuva.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Armas na faculdade? Não tem perigo...

POR ET BARTHES
Nos Estados Unidos, há estados onde os estudantes podem levar armas para a faculdade. É perigoso? Não. Porque a nova linha de roupas com coletes à prova de balas vem resolver esse problema. É claro que estamos a falar de uma brincadeira. Mas em se tratando de defensores de armas, que geralmente são mais lentos na compreensão dos fatos, é preciso explicar no fim: “isto é uma piada”.

O gestor partido ao meio

POR JORDI CASTAN
Italo Calvino é o autor da trilogia “O Barão nas Árvores”, “O Cavaleiro Inexistente” e “O Visconde Partido ao Meio”. São três historias divertidas e enriquecedoras que recomendo ler mais de uma vez. Difícil escolher uma das três, porque cada uma traz uma provocação. Gostei e recomendo “O Visconde Partido ao Meio”. É a história de um nobre que, no fragor de uma batalha contra os turcos, é partido ao meio por uma bala de canhão. E cada uma das duas metades segue tendo vida própria.


O livro é a historia de cada uma destas metades e do seu encontro. Na história, cada uma das metades carrega uma parte do visconde Medardo de Terralba. Numa, a sua bondade, raiando a estultícia; na outra, a maldade mais perversa. O livro relata a luta eterna entre o bem e o mal. Não é o meu objetivo fazer uma resenha do livro. Proponho fazer outra leitura, mas trocando o bem e o mal pela disputa imemorial entre a inteligência e a inépcia.

Desnecessário dizer que esta é uma luta desigual. Que já conhecemos o resultado e que lamentavelmente não há final feliz. Que o mocinho não vence e que a inépcia reina opípara nestas terras. Imaginemos, por um momento, que resultado de um acidente qualquer um suposto gestor - um piano a cair-lhe na cabeça, por exemplo - o dividisse ao meio, em duas metades idênticas. Numa, toda a inteligência. Noutra, toda a inépcia.


Imaginemos ainda que cada uma das metades tivesse vida e vontade própria. E que a metade tomada pela inépcia decidisse se candidatar a qualquer coisa. Suponhamos, para efeito de ficção, que optasse por ser candidato a prefeito da sua vila e que fosse eleito. A situação que os seus concidadãos enfrentariam a partir do dia seguinte à posse seria ter o suprassumo da inépcia à frente dos destinos da cidade. Ou seja, sem o mínimo de inteligência para se contrapor.

Ou seja, a cidade estaria sujeita a um prefeito inepto, que multiplicaria sua inépcia e a da sua gestão, se rodeando de outras pessoas tão ineptas quanto ele. Gente sem um pingo de bom senso e no estado mais embrionário da inteligência e do conhecimento. A vila iria cada dia mergulhando numa situação mais caótica e insustentável.

Esta situação extrema conduziria fatalmente ao crescimento do índice de necedade em todas as repartições e órgãos públicos. O inepto buscaria a companhia e o referendo dos seus iguais. A inteligência seria uma ameaça nessa terra de néscios. E seria banida, vista com um perigo. Imaginariam os seus concidadãos que exista outra metade vagando a esmo pelas ruelas da vila. Ficaria como última esperança, aos seus decepcionados eleitores, a ilusão que outro acidente fortuito juntasse um dia a duas metades. 

Não há um final feliz nesta história. Primeiro porque não está claro que exista de fato outra metade e que esta metade reúna toda a inteligência, conhecimento e sabedoria que falta à metade que foi eleita e governa a vila. Há, inclusive, quem acredite que não estaríamos frente a uma metade, senão que isso seria o todo e que a alegada inteligência nunca tenha existido. Que tenha simplesmente sido o resultado de uma campanha publicitária bem orquestrada, ou que seja um caso de hipnotismo ou até de alienação coletiva.