O PT ainda não descobriu que não existe apenas um deus. A História nos mostra que enquanto os escravos rezavam para conseguir a libertação, seus senhores rezavam para continuar progredindo, lucrando. Um só deus não conseguiria dar conta das duas demandas. Seria uma grande incoerência, injustiça, algo inaceitável na nossa cultura: uma divindade corrupta.
O PT, que não chega nem aos pés das divindades, tentou fazer o impossível, por meio de uma política de coalizão: ajudar pobres e ricos ao mesmo tempo. Durante os primeiros anos de governabilidade o projeto pareceu dar certo e, mesmo após 2008, com o início da crise mundial, o Partido dos Trabalhadores continuou investindo. O poder de consumo deu aos pobres a ilusão de uma vida melhor, de repente, aqueles que sempre estiveram longe de ocupar os mesmos espaços que os ricos, estavam nos aeroportos, nos shoppings, lojas, e diversos outros espaços antes restritos as classes mais abastadas. O acesso à universidade também foi outro ganho importante na vida das classes baixas.
Nesse sentido, mesmo sem reformas significativas que de fato poderiam mudar a situação de desigualdade no país, o governo petista navegou em mar tranquilo enquanto mantinha a expansão do crédito, e portanto, o consumo a todo vapor. No entanto, isso durou enquanto a economia no Brasil mantinha o crescimento. E, em que pese o incômodo visível da classe média e da elite brasileira com a ascensão dos pobres, a conciliação das classes ainda parecia algo possível.
A situação mudou quando a economia brasileira não resistiu ao cenário global, principalmente com a queda das compras das commodities brasileiras por parte de seus principais compradores - China, EUA, Europa e Mercosul. Com o fim do boom das commodities a economia começou a dar sinais de queda, e na medida em que a estagnação econômica se tornou inevitável, a pressão por parte de industriais, bancários, e de toda a elite que lucrou aos montes no período em que o Brasil estava em franca ascensão foi para que, como sempre, a corda estourasse do lado mais fraco.

Agora, além dessas traições e pressões midiáticas, Dilma terá que tratar do ajuste fiscal que já reduziu o subsídio do desemprego, o auxílio na doença, cortes nas áreas sociais, transformações de ministérios em secretarias, dentre outros tantos vetos que acabaram por prejudicar a classe trabalhadora, principalmente os mais pobres. O governo ainda se prepara para fazer a reforma na Previdência Social, que poderá trazer mais malefícios para a população. Mesmo assim, com todos esses ataques contra os mais pobres, os empresários, ruralistas e o setor financeiro não ficaram satisfeitos, o que já era esperado de quem nunca aceitou dividir.
O que querem, realmente, é a saída do PT do poder. Para isso, tentarão utilizar de todos os meios possíveis. Conduções coercitivas, vazamentos de áudio, impeachment, manchetes... Trabalhando sem provas, apenas com suposições, os políticos Dilma e Lula, são alvos de investigações. Enquanto isso, Michel Temer e Eduardo Cunha, citados e denunciados, permanecem intactos, assim como Aécio, Alckimin, Serra... “Vamos por partes”. Aham, sabemos bem. A lista é gigantesca, temos tempo de sobra para ir por partes.
Há quem afirme, ainda, que o ódio entre as classes surgiu no governo petista. Uma inverdade. O período de governança do PT apenas serviu para evidenciar um fato concreto e antigo que sempre existiu: a luta de classes, que tem origem no próprio capitalismo, onde aqueles que são mais favorecidos e detém o capital (ou acreditam que detém) não querem estar próximos dos menos favorecidos e, muito menos, perder seus privilégios. Desta forma a simples divisão de classes resulta na luta de classes, quando as classes de cima temem que sejam alcançados em direitos e conquistas, passam a agir de forma hostil para que a distância entre eles permaneça. Como água e óleo, pobres e ricos não se misturam, mas os petistas ignoraram os avisos.
A presença do pobre pode até ser tolerada, mas nunca será aceita na Casa Grande. E foi justamente isso que aconteceu. O Partido dos Trabalhadores cometeu um pecado grandioso: ousou sentar-se a mesa da Casa Grande. Comeu, bebeu e fez negócios com os senhores que rezam para ter progresso. Agora recebe o castigo do deus dos ricos. Terá que pagar cada centavo pelas graças recebidas, por cada programa social que garantiu as suas reeleições.
O PT sai da Casa Grande cantando: “você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão”. Mas se engana que acha que voltará para a senzala. Ao analisar os discursos dos petistas, principalmente do ex-presidente Lula, fica evidente que o partido ficará do lado de fora, apenas esperando para retornar e sentar-se a mesa novamente, para tentar a continuar sua política de coalizão.
Enquanto isso, continuamos nós, aqui, transformando as senzalas em quilombos, rezando para conseguir a nossa libertação.