POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Capitalismo e capitalistas é o tema. E nada
mais oportuno que começar pelo investidor Martin Shkreli, um dos casos mais
recentes de sucesso do capital lá para as bandas de Wall Street. O que o tipo tem de tão especial para ser um expoente (à luz do capitalismo)? Ora, o sucesso está
associado ao dinheiro. E, aos 32 anos, Martin Shkreli é um capitalista que faz
dinheiro, muito dinheiro. Importam os meios usados?
Eis a fórmula do sucesso do investidor norte-americano. Há pouco tempo, ele criou a
Turing Pharmaceuticals, da área de medicamentos, e comprou a patente da droga
pirimetamina, usada no combate a doenças como a AIDS e a malária, por
exemplo. Até aí tudo normal. Mas o capitalismo existe pelo lucro. E para lucrar o máximo e o mais rápido possível, Shkreli não perdeu tempo: aumentou o preço do remédio, de modestos US$ 13,50 para exorbitantes US$ 750.
Eis a pergunta: há algo errado, do ponto de
vista dos capitalistas? Não. O cara vislumbrou a oportunidade (é meritocracia),
investiu (é empreendedorismo), deu um novo rumo ao negócio (é inovação). E
lucrou... sem gastar uma gotinha de suor. Ou seja, o homem fez apenas o que
todo bom capitalista faz. Sem dilemas éticos. Aliás, imagino que os defensores do capital achem normal e não vejam falta de escrúpulos no episódio. Mas...
O capitalismo é um sistema legal, social, econômico
e, sobretudo, cultural. Mas há uma coisa que definitivamente não
é: ético. Nunca foi, nunca será. E quanto mais muda, mas vai em outro sentido: o velho capitalismo de terra e trabalho, que também nunca andou de mãos dadas com a ética, foi ultrapassado. Ou seja, morreu aquele modo de
produção original: tirar da terra, transformar pela força de trabalho humana e
vender no mercado com mais-valia.
Hoje o capitalismo é sustentado pela cultura
do dinheiro e do individualismo. Os resultados práticos? O dinheiro faz dinheiro, sem haver
trabalho. E foi nesse sistema de cassino que surgiram os famosos “lobos de Wall
Street” (que têm seus similares em todo o mundo), conhecidos pela ganância e o
foco exclusivo no dinheiro. Parece ser o caso do investidor norte-americano na compra da patente. O problema é que esse tipo de sistema sem ética leva o mundo a um caminho muito perigoso.
O resultado de décadas de capitalismo
financeiro tem sido um autêntico desastre: 0,7% da população adulta detém precisamente
45,2% da riqueza mundial. Nessas condições, é estranho ver defensores do
capitalismo entre os 99,3% restantes. É a prova provada de que o capitalismo fracassou. Mas é aí que entra a cultura. A grande
vitória do capitalismo é no plano cultural. Ou seja, é fazer acreditar na sua superioridade, mesmo quando os números mostram que o contrário. E de forma acachapante.
E, para terminar, um aviso aos leitores anônimos:
não venham escrever comentários essa conversa de que por criticar capitalismo a
pessoa tem que ir para a Coreia. Nem vou discutir. Isso só vai demonstrar que vocês têm um QI
muito inferior ao de um símio. Melhor que voltem para as árvores.
É a dança da chuva.