terça-feira, 24 de outubro de 2023

A rede social de Donald Trump está a afundar

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
O que você faria se fosse excluído de uma rede social? Não há muito a fazer nesses casos. Mas se você for um milionário egocêntrico há uma solução. É só criar a sua própria rede social. Foi o que fez o ex-presidente Donald Trump, depois de ser banido do Twitter (hoje X) após os ataques ao Capitólio dos Estados Unidos. A justificação foi a violação das regras contra o incitamento à violência. Trump até contestou a rede social, mas um tribunal federal recusou-se a revogar a decisão.

Com a recusa, o ex-presidente decidiu criar a sua própria rede social, chamada Truth Social. É simples assim? Não. Há pessoas que contestam a capacidade de Trump como gestor de empresas. E talvez tenham razão. A coisa não está a correr bem e a Truth Social enfrenta problemas financeiros. A empresa controladora da plataforma, Trump Media & Technology Group (TMTG), perdeu US$ 1,2 bilhão em 2022, e está à procura de novos financiamentos para evitar a falência.

Os problemas financeiros da TMTG são causados por uma série de fatores, incluindo a baixa base de usuários da Truth Social. A plataforma tinha cerca de 513.000 usuários ativos diários em abril de 2022, um número muito inferior aos 217 milhões de usuários ativos diários do Twitter, atual X. Há quem afirme que outra causa para os problemas financeiros da TMTG é a má gestão. A empresa foi acusada de nepotismo e de desperdício de recursos.

Em agosto de 2022, a TMTG anunciou que ia demitir 30% de sua força de trabalho. Mas (porque tem sempre um mas) a Truth Social continua a ser popular entre os apoiadores de Trump. A plataforma é vista como um espaço onde os conservadores podem expressar as suas opiniões sem censura. Em outra ponta, a empresa lançou uma versão do aplicativo para Android e aumentou o número de usuários inscritos.

No entanto, é difícil dizer se a Truth Social terá sucesso a longo prazo. A plataforma precisará aumentar sua base de usuários e melhorar sua gestão para se tornar lucrativa. Hoje tem uma base  muito menor do que as principais plataformas de mídia social, como o Twitter e o Facebook. E a rede trumpiana ainda não encontrou uma maneira de gerar receitas num outro patamar.

A Truth Social precisará resolver os problemas se quiser sobreviver. De acordo com o relatório financeiro da própria TMTG, a plataforma tinha 2,2 milhões de usuários inscritos em dezembro de 2022. Destes, apenas 771.000 eram usuários ativos diários. E todos sabemos que o número de inscritos não é necessariamente igual ao número de usuários ativos.

Pintado este quadro, fica a pergunta: a rede de Donald Trump vai sobreviver? Tudo pode acontecer, mas o horizonte é estreito. A plataforma está trabalhando para aumentar o número de usuários ativos, mas enfrenta uma concorrência feroz de outras redes de mídia social, que são mais populares e oferecem mais recursos. Além de que, sendo uma rede que pertence a Donald Trump, poderá sempre contar com a rejeição dos democratas.

É a dança da chuva.



domingo, 22 de outubro de 2023

Brasileiros em Portugal: população carcerária cresce

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
É cada vez maior o número de brasileiros em Portugal. Se vem muita gente boa, também há as frutas podres. Tanto é assim que hoje há 524 brasileiros presos em Portugal, o que representa 3,4% do total de prisioneiros do país. Os números são oficiais e remetem para a situação em dezembro de 2022. É um tema pouco discutido, mas que merece uma análise mais detida.

Os brasileiros são a maior comunidade estrangeira residente em Portugal. De acordo com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de Portugal, em outubro de 2023 havia 393 mil brasileiros residentes legalmente em Portugal. São números oficiais, mas todos sabemos que há muitos ilegais e muita gente projeta que no total sejam à volta de 500 mil. É 5% do total da população atual do país.

Tudo bem. O país precisa de trabalhadores que paguem impostos. O problema é que também vem muita gente torta. Hoje os brasileiros são a terceira nacionalidade mais representada no sistema prisional português, atrás de cidadãos portugueses (86,7%) e romenos (6,3%). Os principais crimes são o tráfico de drogas (24,2%), crimes contra a pessoa (22,6%) e crimes contra o património (19,6%).

Crimes contra a pessoa, contra a vida: eis algo que assusta os portugueses. É um tipo de crime que acontece em Portugal, mas numa escala muito inferior ao Brasil. Para se ter uma ideia, basta dizer que a palavra “latrocínio”, muito comum no Brasil, raramente é ouvida em Portugal. O número de brasileiros presos em Portugal tem aumentado nos últimos anos.

Essa tendência pode indicar que Portugal está se tornando um destino popular para criminosos brasileiros. De acordo com uma análise do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de Portugal, 82,6% dos brasileiros presos no país têm antecedentes criminais. O SEF verifica os antecedentes criminais dos estrangeiros que solicitam visto para Portugal. Mas é fácil burlar o sistema.

O SEF está trabalhando para melhorar a verificação de antecedentes criminais de estrangeiros que solicitam visto para Portugal. Mas é importante ressaltar que é impossível impedir completamente que criminosos com antecedentes criminais entrem no país. Resumo da ópera: os brasileiros são necessários a Portugal, mas a mentalidade da violência não... 

É a dança da chuva.



quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Milei pode vencer. O que há com nuestros hermanos?

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O que há com os argentinos? Será que vão eleger o estroina Javier Milei nas eleições presidenciais? Uma pesquisa recente da Atlas Intel diz que ele lidera as preferências, com 36,5% das intenções de voto, seguido por Sergio Massa, com 29,7%, e Patricia Bullrich, com 23,8%. Tudo indica que haverá um segundo turno, mas Milei mantém um enorme potencial de votos. Mas a mesma pesquisa traz uma revelação inquietante: Milei tem o maior apoio entre os eleitores com idade entre 18 e 30 anos.

O candidato usa uma motosserra como símbolo de campanha, numa metáfora para a proposta de “cortar o Estado”. Milei usa essa simbologia para sugerir que ele está disposto a tomar medidas radicais para reformar o Estado argentino. Mas, afinal, quais são as propostas do candidato do partido La Libertad Avanza? Há a promessa de um liberalismo econômico radical. Milei, que nunca administrou sequer uma mercearia, tem como prioridade e promessa de redução do gasto público. Isso sempre pega bem, em qualquer país.

O candidato vai ainda mais longe e promete a privatização de empresas públicas, como as Aerolíneas Argentinas e a Correo Argentino. Uma ampla liberalização da economia é outra promessa, que inclui ainda a redução de impostos. Mas além dessas propostas econômicas, Milei defende uma série de medidas conservadoras no plano social, como o aumento da pena de morte, a proibição do aborto e a legalização da venda de armas de fogo. Não é por acaso a admiração que ele tem por Donald Trump ou Jair Bolsonaro. 

Os opositores de Javier Milei não perdoam e produzem um chorrilho de críticas. A começar pelo fato de acusaram as suas propostas econômicas de serem radicais e inviáveis. Mais do que isso, a redução drástica do gasto público e a privatização de empresas públicas levariam ao desemprego, à pobreza e à instabilidade econômica. No plano social, a pena de morte, a proibição do aborto e a legalização da venda de armas de fogo são medidas capazes de produzir enormes retrocessos em termos de direitos humanos. 

Os críticos de Milei também apontam a sua postura, considerada arrogante e desrespeitosa. E afirmam ser apenas um populista oportunista que se aproveita do descontentamento da população. Mas a ideia mais fora da casinha tem a ver com a venda de órgãos humanos. O candidato argumenta que a venda de órgãos é uma forma de aumentar a autonomia individual e de permitir que as pessoas possam tomar suas próprias decisões sobre os seus corpos (um contrassenso em relação ao corpo das mulheres e o aborto).

Enfim, o domingo está à porta. Os argentinos parecem resistir, mas há um antídoto para evitar a catástrofe: é só olhar para o vizinho Brasil e ver a desgraça que foi o governo Bolsonaro.

É a dança da chuva.



terça-feira, 17 de outubro de 2023

A Polônia voltou!

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Bem-vinda de volta, Polônia.

Foram longos anos de um governo que nada ficou a dever à democracia. Mas os jovens, sempre eles, estão aí para corrigir os rumos erráticos desse governo autoritário. A participação eleitoral nas eleições parlamentares polonesas deste ano atingiu fantásticos 73,1%, a mais alta desde 2001. E o mais entusiasmante: a participação dos jovens foi elevada, com 59,5% dos eleitores com menos de 30 anos comparecendo para votar.

A alta participação eleitoral é um sinal positivo para a democracia polonesa. Não apenas porque os cidadãos poloneses estão interessados no processo político, mas porque assim se livraram do governo autoritário de Andrzej Duda. A mensagem é simples: chega de autoritarismo, de políticas anti-LGBTQ+ e de confronto com a União Europeia.

O futuro governo da Polônia, liderado por Donald Tusk, é de centro-esquerda. Tusk é um político experiente que já foi primeiro-ministro da Polônia e presidente do Conselho Europeu. Ele prometeu restaurar a democracia e o Estado de Direito na Polônia, além de fortalecer as relações com a União Europeia. Em tempo, o partido de Tusk não foi o mais votado, mas tem uma maioria em coligação.

As diferenças são óbvias e tendem para a volta da Polônia ao círculo dos países democráticos:
- Nas políticas sociais, uma vez que atual governo do PiS implementou uma série de políticas sociais conservadoras, como a proibição do aborto, a restrição dos direitos LGBT+ e a redução dos direitos dos trabalhadores. O governo de Tusk promete reverter essas políticas e promover a igualdade e a justiça social.

- Em termos de política externa, o governo de Andrzej Duda tem sido um crítico da União Europeia, adotando políticas que desafiam as normas do bloco. Tusk promete fortalecer as relações com a União Europeia e trabalhar em conjunto para resolver os desafios comuns.

- Na economia, o antigo governo do PiS adotou uma política econômica de austeridade, que reduziu os gastos públicos e aumentou os impostos. O governo de Tusk promete promover o crescimento econômico e o emprego, com investimentos em infraestrutura e educação. Um fator de peso nestas eleições.

Em 2021, a Comissão Europeia bloqueou o pagamento de 36 bilhões de euros em fundos europeus à Polônia, devido a preocupações com o estado de direito no país. A Comissão alega que a Polônia violou o princípio da independência do judiciário, o que representa uma ameaça à democracia. Ter dinheiro e não usar por ter líderes reacionários é apenas estúpido.

É a dança da chuva.

Donald Tusk, que deve formar governo na Polônia


segunda-feira, 16 de outubro de 2023

Ucrânia, Israel e a morte do argumento

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Eis uma coisa que a invasão da Ucrânia e agora a guerra entre Israel e o Hamas ensinaram: há uma enorme infantilização dos argumentos. As pessoas já não se ocupam de uma argumentação a sério e qualquer besteirinha (senti)mental é alçada à qualidade de argumento. Ora, todos aprendemos na escola que "um argumento é um conjunto de afirmações conectadas, das quais pelo menos uma (a premissa) pretende oferecer razões para mostrar que a outra (a conclusão) é verdadeira". Esqueçam isso. O argumento está morto, pelo menos no reino das redes sociais.

É por essa razão que ficou impossível discutir questões como a invasão da Ucrânia e, por estes dias, a guerra entre Israel e o Hamas. Não há adultos na sala, quando o ambiente são as redes sociais. Tudo isso resultado deste novo modelo de sociedade que é a infocracia. O quê? O conceito foi cunhado pelo filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, no livro "Infocracia: Digitalização e a Crise da Democracia", publicado em 2022. É simples. O pensador define a infocracia como uma forma de governo em que o poder é exercido por aqueles que controlam a informação.

A infocracia é um produto da digitalização, que provocou um aumento exponencial da quantidade de informação disponível. Isto, por sua vez, tem tornado cada vez mais difícil, para os indivíduos, a distinção entre informação verdadeira e falsa. Na infocracia, os indivíduos são bombardeados com informações, o que leva a uma situação de "information overload" e, a partir daí, à alienação por excesso. É lógico inferir que a infocracia pode ser usada para manipular as pessoas e controlá-las, seja por governos ou pelas big techs. Todos sabemos.

O autor sul-coreano adverte que a infocracia representa uma ameaça à democracia, pois pode levar à desinformação, à propaganda e à manipulação. O conceito é relativamente novo, mas já está sendo discutido por uma ampla gama de estudiosos e especialistas, em especial no que toca à relação entre informação e o poder. O desenvolvimento de novas tecnologias, como a inteligência artificial e a análise de dados, que permitem coletar e analisar grandes quantidades de dados de forma mais rápida e eficiente. Se isso serve para os governos, também serve para as big techs.

As pessoas caminham alegremente nesse universo infocrático, crentes de que têm poder de expressão. Na verdade, são simples peões no jogo, reféns da tecnologia e expostas à vigilância e à manipulação. E sequer têm noção disso, porque é parte do processo de alienação: o exercício do poder tem que parecer natural e sem coerção.

É a dança de chuva.




domingo, 8 de outubro de 2023

A Armênia pode desaparecer enquanto estado soberano?

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

As relações entre Rússia e Armênia passam por um período de tensão, devido à guerra na Ucrânia e à perda do território de Nagorno-Karabakh para o Azerbaijão em 2020. A Rússia tem sido um aliado tradicional da Armênia, fornecendo apoio militar, econômico e diplomático, mas deixou o país à míngua nos episódios mais recentes. Há a percepção de que Vladimir Putin não tem feito o suficiente e isso levou a um aumento do sentimento anti-russo. As relações entre Rússia e Armênia devem continuar tensas no futuro próximo, o que levou o país a buscar uma maior aproximação com a União Europeia e os EUA. E não existe vazio em política

Há poucos dias, a União Europeia decidiu ampliar a ajuda humanitária à Armênia. A presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, voltou a condenar a ação militar do Azerbaijão no enclave separatista de Nagorno-Karabakh. O alto representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros, Josep Borrell, disse que não é possível ficar indiferente ao fato de que mais de 100 mil pessoas tenham sido obrigadas a abandonar as suas casas. No entanto, a posição da União Europeia tem ambiguidades, por causa da dependência do petróleo e, sobretudo, do gás natural do Azerbaijão, cujos gasodutos não passam pela Rússia.

A situação da Armênia é complexa e há quem sustente a ideia de que, no limite, o país corre o risco de desaparecer enquanto estado autônomo. Há muitos os argumentos a apontar nesse sentido. A Arménia é do tamanho de Santa Catarina e tem uma população de apenas três milhões de pessoas. Isso torna o país mais vulnerável a pressões externas. A geografia também é um aspecto a ter em conta, uma vez que o país está cercado por países pouco amigos, como o Azerbaijão, a Turquia e o Irã. Do ponto de vista econômico, a Arménia é um país pobre e sem recursos naturais, o que torna mais difícil ter uma “moeda de troca” para se defender de agressões externas.

Os acontecimentos recentes parecem confirmar esses argumentos. Em 2020, o Azerbaijão, com o apoio da Turquia, lançou uma ofensiva contra o Nagorno Karabakh, um enclave armênio em solo azeri. A ofensiva foi bem-sucedida e o Azerbaijão recuperou o controle de grande parte do território do Nagorno Karabakh. A Rússia, aliada da Arménia, nada fez para impedir a ofensiva do Azerbaijão. Um player importante nesse conflito é a Turquia, uma vez que Taip Erdogan está a negociar a construção de um oleoduto em território azeri, mas que passa pela Arménia. É um importante avanço estratégico para a Turquia que vem aumentando a sua influência na região. Por questões históricas, Taip Erdogan é hostil à Arménia e a sua interferência aumenta o risco de que o país seja forçado a ceder territórios ou a se tornar um estado vassalo da Turquia. O passado entre os dois povos é marcado por muita complexidade.

Em 1915, o Império Otomano prendeu e executou líderes armênios. A partir daí, o governo otomano deportou e massacrou sistematicamente a população armênia. Cerca de 1,5 milhão de armênios foram mortos. A Turquia nega o genocídio – e até tenta um branqueamento desse passado – mas a maioria dos historiadores concorda que o genocídio aconteceu. Não é seguro afirmar que a Armênia vai desaparecer enquanto estado autónomo, porque isso não acontece do nada e há os equilíbrios internacionais. Mas os acontecimentos recentes mostram que o país está a enfrentar sérios desafios e que seu futuro é incerto. É importante olhar para alguns depoimentos sobre a questão:

- O ex-presidente armênio Robert Kocharyan disse, em 2021, que o país está em perigo de "desaparecer do mapa".

- O ex-primeiro-ministro Nikol Pashinyan disse, em 2022, que a Armênia precisa "reavaliar sua estratégia de segurança" para lidar com os novos desafios.

- O analista político armênio Ruben Safrastyan disse, ainda este ano, que a Armênia está "em uma situação muito difícil" e que o país precisa "tomar medidas urgentes" para se proteger.




sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Em merenda que está ganhando não se mexe

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Há uma frase do futebol que funciona quase como um mandamento: "em time que ganha não se mexe". O problema é que a regra não vale para a atual administração da Prefeitura de Joinville, com os seus frêmitos novidadeiros. É o caso das mudanças no sistema da merenda escolar da rede municipal. Mantendo a semântica futebolística, podemos dizer que o técnico mudou, o time marcou um gol contra e a torcida não perdoou.

Nos últimos dias, as redes sociais foram invadidas de reclamações de pais, alunos ou mesmo funcionários. E, claro, dos políticos. “Por que terceirizar? Governo Federal aumentou o repasse para alimentação escolar. Joinville já foi referência na qualidade da merenda, ganhando prêmios! As cozinheiras se sentem prejudicadas com essas mudanças e as crianças também com filas e porções menores”, questionou a vereadora Ana Lúcia Martins, na sua conta na rede social X (ex-Twitter).

É preciso reavivar a história recente. Em 2010, Carlito Merss, então prefeito de Joinville, recebeu o prêmio de melhor gestor da merenda escolar do Brasil, na categoria Grandes Cidades e Capitais. O prêmio foi concedido pelo Ministério da Educação, em parceria com a Associação Brasileira de Municípios, num reconhecimento ao trabalho da gestão municipal de Joinville na área da merenda escolar.

Quais foram as razões para a distinção? A prefeitura implementou uma série de ações para melhorar a qualidade da alimentação oferecida aos alunos da rede pública municipal, incluindo a aquisição de alimentos de qualidade, produzidos localmente, o desenvolvimento de cardápios saudáveis e nutritivos, a implementação de um sistema de controle de qualidade e a capacitação dos profissionais da área de alimentação escolar. 

O problema é que a moçada do Novo, partido que hoje ocupa a Hermann Lepper, é muito chegada em modernices. E vai que decidiram implantar um sistema que exige até o uso de QR Codes. OK... vamos contemporizar. Toda vez que um novo sistema é implantado existe o risco de haver confusão. Só que as reclamações não param. É menos comida, dizem uns. Não pode repetir, reclamam muitos. Não pode perder o cartão de controle, alertam outros.  Até houve alguém a dizer que chegou a faltar comida. 

Por que essas coisas acontecem? Vamos voltar à linguagem do futebol, com uma frase de Nelson Rodrigues: “o escritor brasileiro não sabe bater um escanteio". O que ele quis dizer com isso? Que muitas vezes as elites estão desconectadas da realidade do povo. Neste caso, alguém acredita que o atual prefeito já esteve numa fila de merenda de escola pública? Nem por sonho. É uma questão de classes sociais. Pois como diziam os mais antigos,  “quem nunca fez um bolo, não sabe como se cozinha".

É a dança da chuva.



quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Bolsonaro, Osair e a cultura do estupro

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Duas notícias destes dias que estão muito ligadas. 1. A primeira diz que Bolsonaro virou réu na Justiça por incitação ao crime de estupro. Estamos a falar do conhecido caso da deputada Maria do Rosário, quando o bonitão disse que ela "não merecia ser estuprada" por ser "muito feia". 2. Em segundo lugar a notícia, publicada por alguma imprensa alternativa, de que Osair Antonio Souza, secretário municipal de São João do Itaperiú (tão pertinho, né?) teria afirmado que a ministra Rosa Weber, do TSF, merece "ser eternamente estuprada".

O que há de comum entre os dois episódios? A "cultura do estupro", claro. É um produto da sociedade patriarcal, que ao longo da história foi causando assimetrias entre homens e mulheres. E o pior: ainda hoje é a moldura do quadro mental de homens com a cabeça no século XVIII. O caso é sério no Brasil, onde a cultura do estupro é um problema real e silencioso. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelam que uma em cada cinco mulheres já foi vítima de violência sexual. E apenas um em cada 10 estupros é denunciado.

Para muitos homens as mulheres ainda são simples objetos sexuais. A violência de gênero – física e simbólica – é usada como mecanismo de controle e dominação. É o que torna comum a aceitação da violência sexual, a culpabilização das vítimas e a normalização do estupro. Daí o discurso carcomido do patriarcado: as mulheres são responsáveis pelo estupro, os homens não podem controlar seus impulsos sexuais ou que é normal agir de forma sexista.

Quando uma pessoa tem a atenção da mídia, como é o caso de um presidente da República, esse comportamento acaba virando referência para muitos. Jair diz uma anormalidade lá em Brasília e Osair se sente à vontade para repetir aqui em São João do Itaperiú. E assim a cultura do estupro vai se reproduzindo e tarda em desaparecer. Menos mal que a lei pode atuar nesses casos. Jair é réu. É esperar que Osair também venha a ser.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Bolsonaristas estão feito baratas tontas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O governo Lula vai bem e recomenda-se. O Brasil vem colhendo uma série de bons resultados, tanto no plano interno quanto externo. Fui de férias na semana passada e fiquei uns dias na Espanha. Deu para ver que o noticiário dos nuestros hermanos vem abrindo espaços para o presidente Lula, apesar de não haver uma unanimidade. Em alguns casos, fica evidente o papel relevante do líder brasileiro no plano internacional, mas em outras situações o tom é mais crítico – os europeus não perdoam as ambiguidades do presidente no caso da invasão da Ucrânia.

Fazendo a ponte para o plano interno, as coisas também são favoráveis. Apesar de algumas resistências provocadas pelo “criptoprimeiro-ministro” Arthur Lira (que usa o seu poder de influência para barganhar e tirar vantagens), há motivos para otimismo. A economia cresce acima das expectativas, a inflação fica abaixo das previsões, o arcabouço fiscal dá garantias de estabilidade econômica, as exportações mantêm a tendência de alta. E, imaginem, a reforma fiscal pode acontecer depois de décadas de tentativas frustradas.

Mas o sucesso do governo, tanto no plano externo e interno, tem outras consequências. A oposição bolsonarista está numa tremenda enrascada. Os malucos estavam na torcida para tudo falhar e deram com os burros n´água. Dá um certo prazer constatar o fracasso da profecia de Paulo Guedes. Lembram? O iluminado ex-ministro previu que o Brasil ia virar “uma Argentina em seis meses e chegar a uma Venezuela apenas um ano e meio”. O mais hilário é ver que o tipo agora diz que o sucesso é resultado do trabalho dele. Ipiranga vai na canga.

Que fazer? Sem ideias e sem um projeto de governo, os bolsonaristas estão feito baratas tontas. E ficam agarrados à lógica da mentira. É mentir, mentir, mentir. O problema é que na maioria dos casos as mentiras tendem para o absurdo. O meu bolsonarista predileto, por exemplo, agora ataca o governo Lula com publicações sobre “orçamento secreto, cartão corporativo, queimadas da Amazónia, viagens para o exterior, vacinas (dengue), BNDES e gastos em publicidade”. É puro suco de bolsonarismo. Tudo o que Bolsonaro fez é assacado ao atual governo.

Todo governo precisa de uma oposição decente para estar alerta e corrigir cursos. Mas decência é tudo o que não se pode esperar do bolsonarismo. Sem discurso nem ideias, o que resta aos bolsonaristas é o espetáculo deprimente, como os protagonizados por gente inútil do calibre de Nikolas Ferreira, Gustavo Gayer ou o "jornalista" Alexandre Garcia. É bom ver o bolsonarismo definhar, mas também é importante ter em mente que o Brasil precisa de uma oposição séria e a sério.

É a dança da chuva.



quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Sérgio Moro cidadão honorário de Joinville. Podem rir. Ou chorar...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Joinville nunca engana. Quando você pensa que a coisa não pode piorar... ela despenca para um buraco ainda mais fundo. E não é que a Câmara de Vereadores quer atribuir o título de cidadão honorário ao atual senador Sérgio Moro, ex-juiz incompetente da Operação Lava-Jato? O projeto foi apresentado por um vereador que atende pelo nome de Nado (PROS). É como diz a expressão popular: de onde você nada espera, daí é que nado sai.

A explicação é o fato de Moro ter atuado na comarca de Joinville, entre 1999 e 2002, com “elevada atuação técnica”. Parece brincadeira? Não é. “Em Joinville, sua atuação foi marcada a ferro na tez local e é reconhecida pelo engajamento na efetivação do Estado de Direito, com atuação lapidar, exemplar, íntegra, dotada de elevada atuação técnica, coerência, e, sobretudo, coragem para atuar com profundo respeito às leis e à Constituição”, pontuou a justificativa.

“Marcada a ferro na tez local”? Quem escreve uma tonteria destas? A coisa pretende ser uma frase de efeito, mas o único efeito que provoca é uma convulsão estilística da tão maltratada língua portuguesa. Mas até faz algum sentido, porque isso de “marcar a ferro” é coisa de gado. O problema é que o gado de Jair Bolsonaro, maioritário de Joinville, já não se alimenta do mesmo capim que os seguidores de Sérgio Moro. Os dois brigam para conquistar a invernada da extrema direita e andam às cabeçadas. 

A argumentação diz que o ex-juiz atua com “profundo respeito às leis e à Constituição”. Onde estava essa gente quando surgiu o consórcio da Vaza-Jato, liderado pelo Intercept? Lembram? Foi aquela série de reportagens que revelaram as ações muito controversas da força-tarefa da Lava Jato. Foi quando ficou escancarado o conluio entre Sérgio Moro e o promotor Deltan Dallagnol. O ex-juiz é o que podemos chamar um “depedrador” do Estado de Direito.

Por que Joinville gosta de Moro? É simples. Porque o ex-juiz fez o favor de prender Lula pouco antes das eleições de 2018 e, desta forma, estendeu o tapete para a eleição de Jair Bolsonaro. A gente pode reclamar e dizer que o “quociente intelectual” da cidade é muito baixo, mas a sua gratidão é férrea. Aliás, mesmo depois da desgraça que foi o governo de Jair Bolsonaro, a cidade resiste como um dos bastiões do bolsonarismo mais obtuso (passe a redundância).

A imprensa diz que a homenagem acontece no dia 6 de setembro, na Câmara de Vereadores de Joinville. É bom ter pressa, porque o futuro do homenageado parece turbulento. Em linguagem pouco jurídica, podemos dizer que o ex-juiz “está mais sujo do que pau de galinheiro”. Muito boa gente acredita que, ainda em 2023, o atual senador Sérgio Moro vai se tornar o ex-senador Sérgio Moro, porque a possibilidade de cassação surge forte no horizonte. E nada garante que a coisa fique por aqui.

Para finalizar, deixo aqui a minha sugestão. O vereador que propôs a distinção a Sérgio Moro também devia ser homenageado. E de forma exemplar. Ouvir umas 10 horas ininterruptas de discursos de Sérgio Moro, com a sua inconfundível voz de marreco, dicção atrapalhada e dificuldade em lidar com a língua portuguesa. Depois disso ele iria pensar duas vez antes de propor esse tipo de besteira.