POR RAQUEL MIGLIORINI
No "Plano de Governo" do vice-presidente Michel Temer, encontramos, a partir da
página 16, o subtítulo Uma Agenda Para o
Desenvolvimento, com o propósito de criar condições para um crescimento
médio de 4% ao ano, ao longo da próxima década, e com isso aumentar a renda per
capita. Para isso, "alguns princípios deverão ser cumpridos, com grande esforço
do Legislativo, porque as leis existentes são, em grande parte, incompatíveis
com eles".
Devo
confessar que fiz uma longa pausa aqui. Meus neurônios começaram amplas
sinapses para compreender por que uma Câmara de Deputados com tantos opositores
ao atual governo Dilma Rousseff e tantos favoráveis ao talvez futuro governo
Temer/Cunha não coloca as votações paradas em prática. Porque, todos os meus
neurônios sabem disso, a Câmara serve para isso. Boa parte do que está parado
resolveria muitos problemas.
E esse é o
momento em que o leitor pensa que ou sou otimista inveterada ou ingênua de dar
pena. Nem uma coisa nem outra. Segue trecho final, transcrito do plano: "Obedecendo as instituições do Estado democrático, seguindo estritamente as
leis e resguardando a ordem, sem a qual o progresso é impossível. O país precisa
de todos os brasileiros". Bem, parece que seguir as leis não tem sido prioridade
ultimamente e que nem todos os brasileiros estão cumprindo seu papel.
Na
página 19 encontramos o seguinte texto no item h: "... O Brasil gasta muito com
políticas públicas com resultados piores do que a maioria dos países relevantes".
Como disse Mujica, quem nunca passou fome acha que se gasta muito com políticas
públicas.
Agora,
o que realmente me assustou, inclusive porque é da minha área, foi o item k: "promover
a racionalização dos procedimentos burocráticos e ... a realização de
investimentos, com ênfase nos licenciamentos ambientais que podem ser efetivos
sem ser necessariamente complexos e demorados". Parece que esse é o mantra do
PMDB, porque vemos isso em Joinville também. Acham que licenciamento ambiental
é um impedimento para o dito progresso.
Como pode ser efetivo sem ser complexo?
Como será possível um estudo verdadeiro e imparcial para implantação de uma
grande empresa se não houver tempo hábil para estudos geológicos, biológicos,
socioeconômico, químico, florestal e demais? Como conferir o que foi entregue
pela empresa com a realidade do local? Sabemos bem que remediar o estrago de um
empreendimento mal feito é muito pior que evitá-lo. Alguém se lembra da
Samarco?
Precisamos
parar com essa visão colonial de sermos o quintal mal cuidado do primeiro
mundo, onde se joga todo tipo de sujeira e se destrói ecossistemas tão frágeis
e importantes para o globo, em detrimento do progresso financeiro de alguns.
Não me fale de desenvolvimento sustentável para todos onde há interesse
econômico de poucos.
O
plano termina assim: "Nossa promessa é reconstituir um estado moderno,
próspero, democrático e justo”. Que não se acrescente, posteriormente:
destruído, poluído e doado.