POR FELIPE SILVEIRA
Há 30 anos, em Cascavel (Paraná), um grupo de camponeses decidiu criar o maior movimento social do mundo, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Não, eles não sabiam que aquela organização de gente simples que apenas queria ter condições de trabalhar no campo seria o maior movimento do planeta. A ideia era lutar pela terra para poder produzir e viver, mas o movimento se tornou deste tamanho por ser uma das poucas alternativas lúcidas frente à marcha neoliberal da política nacional e internacional.
Trinta anos mais tarde, o MST se torna cada vez mais urgente e necessário, com seus princípios de igualdade e solidariedade. Acredito que podemos falar em distribuição e compartilhamento – da riqueza, do trabalho e do conhecimento.
É urgente porque o agronegócio faz cada vez mais mal ao mundo. Alimenta cada vez menos pessoas, e quando as alimenta as envenena junto, com seus tóxicos cada vez mais venenosos para espantar pragas, aumentar o tamanho e o lucro. O agronegócio gera cada vez mais desemprego, forçando ainda hoje o êxodo rural que incha as cidades, aumentando a miséria.
Sobre isso, acho importante frisar que o inchaço de Joinville a partir dos anos 60 se deu pelo esvaziamento do campo, onde a vida estava cada vez mais difícil para o agricultor. Nesse período, as hoje grandes empresas de Santa Catarina receberam muita grana (muita mesmo) do Estado para aumentar seus parques fabris. Os trabalhadores destas fábricas vieram, sobretudo, do campo, principalmente de SC e PR. Resumindo, o dinheiro que era pra ser usado em políticas públicas para benefício da população foi usado para o enriquecimento dos empresários amigos dos militares que estavam no poder.
O MST nasceu do aumento dessas dificuldades da vida no campo, já no final da ditadura civil-militar, e propôs um novo modelo de sociedade ao Brasil. Sua coragem e seus métodos são exemplares.
O MST é cada vez mais urgente, ainda mais com uma bancada ruralista que representa um (agro)negócio que registrou o superávit de US$ 82,91 bilhões em 2013, mas a luta pela reforma agrária popular é uma luta de todos nós que desejamos e precisamos de um país mais justo, igualitário, cujas diferenças sejam respeitadas, assim como os direitos de todos.
Esse texto é uma homenagem a todos os lutadores, trabalhadores e inocentes mortos nas lutas por um mundo melhor.
quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014
terça-feira, 11 de fevereiro de 2014
O descaso matou mais um no trilho de trem; promessa do contorno ferroviário se arrasta desde 2008
POR CHARLES HENRIQUE VOOS
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Foto: Agência RBS |
Digo isto porque a cidade de Joinville, na virada dos séculos 19 e 20, tinha uma economia extrativista de madeira e beneficiadora de erva-mate. A matéria-prima de muitos comerciantes poderia vir do planalto catarinense, sem contar a facilidade do escoamento de cargas para o porto de São Francisco do Sul. Para isto, o trem seria a grande solução. Entretanto, pelo traçado original, a ferrovia prevista para a região passaria 25kms ao sul de Joinville, ligando diretamente Jaraguá do Sul a São Francisco do Sul.
Defendendo os interesses que esta ligação regional poderia trazer para os empresários da cidade, em setembro de 1902, a Câmara Municipal intercedeu junto ao então Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Sr. Lauro Muller (catarinense, ex-governador da Província de Santa Catarina, e com ligações partidárias com a elite política joinvilense), solicitando a modificação do traçado da linha férrea. Veja mais sobre isso neste link.
Ou seja, o trilho de trem não era pra estar onde está. Só está devido a vontade dos empresários desta cidade.
A cidade se espraiou, a sua economia cresceu, e grande parte da ocupação urbana de Joinville aconteceu, até meados da década de 70, em torno da Estação Ferroviária. Os pobres ao sul, "pra lá do trilho", e os ricos ao norte e ao noroeste. Com o "boom" industrial, as ocupações adensaram-se para todas estas regiões, e incluíram novos vetores de ocupação, principalmente para operários: o leste e o oeste. O norte continuou sendo uma região de ricos, e o restante de classe média-baixa ou pobre.
Como Joinville teve uma ocupação descontrolada pelo poder público municipal, sem o cumprimento de planos diretores, estudos ou qualquer preocupação com o futuro, os mais pobres foram ocupando as regiões em que o trilho de trem passava (oeste e sul). E nos últimos anos, as reclamações com congestionamentos e demais transtornos na região são grandes por parte de moradores destas regiões. Somado a isto, a Estação Ferroviária não tem mais importância como antigamente (devido a uma política rodoviarista que aniquilou as ferrovias nacionais) e a solução encontrada pelo governo federal seria o contorno ferroviário para que, incrivelmente, o trilho de trem passasse mais ou menos a 25kms ao sul da cidade, conforme o projeto original de 1901!
A então senadora Ideli Salvatti foi a pioneira nesta questão em 2008 e levantou a bandeira junto ao governo Lula, o qual liberou recursos em 2009, totalizando R$ 68 mi em investimentos. A empresa que executaria os serviços foi licitada e os trabalhos seriam interrompidos em 2011 devido a um problema com o solo, que cedeu. Devido a este atraso, as licenças ambientais ficaram vencidas, e todo o processo de licenciamento ambiental deveria ser refeito. Após o esquecimento da imprensa e classe política locais (como relatei no Chuva Ácida em 2012), o tema voltou a ter andamento somente no ano passado. Agora, o novo prazo para início das obras é março deste ano, e conclusão para 2017. Nove anos de espera, isto se não houver novo atraso.
Quantas mortes serão necessárias para que esta questão seja tratada com urgência em Joinville? É incrível como o poder público, ao longo de todos estes anos, foi omisso: viu os pobres se acumularem "num canto" da cidade, e os deixou com problemas urbanos gravíssimos, em risco de morte permanente. Caso Samuel e tantos outros estivessem andando em uma região rica de Joinville, o trilho do trem nem estaria ali pois, nesta cidade, o descaso não combina com a riqueza.
segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014
Foi um atentado
POR JORDI CASTAN
A colocação de um artefato explosivo de baixa potência na caixa de correio na residência do arquiteto Arno Kumlehn não é o resultado do acaso. Não há nada de fortuito. Foi um atentado. Um atentado precedido por avisos e ameaças. Por sorte, nesta ocasião não houve vítimas. Mas se não houver uma resposta adequada, nada impedirá que outro atentado de maiores proporções possa voltar a se produzir. As imagens provam a potência do impacto produzido pela explosão.
A colocação de um artefato explosivo de baixa potência na caixa de correio na residência do arquiteto Arno Kumlehn não é o resultado do acaso. Não há nada de fortuito. Foi um atentado. Um atentado precedido por avisos e ameaças. Por sorte, nesta ocasião não houve vítimas. Mas se não houver uma resposta adequada, nada impedirá que outro atentado de maiores proporções possa voltar a se produzir. As imagens provam a potência do impacto produzido pela explosão.
Arno Kumlehn é aguerrido e defende suas posições em prol de
uma Joinville melhor, com convicção e conhecimento. Sua militância no Conselho
da Cidade tem incomodado - e muito - os setores
mais recalcitrantes na defesa do modelo de desenvolvimento ultrapassado que estão
querendo impor a Joinville. O modelo que preconiza o lucro a qualquer preço e
que consegue juntar, num mesmo grupo, políticos desonestos (acreditemos que ainda
possa haver algum que seja honesto), especuladores gananciosos e, desculpem a
redundância, funcionários públicos preguiçosos e corruptos. É um contingente numeroso e barulhento.
Não poucas vezes este grupo majoritário tem feito ameaças,
veladas no início, quando ainda tinham um mínimo de vergonha e temor. Ultimamente, amparados pela impunidade e pelo apoio de importantes lideranças
locais, as ameaças, além de mais frequentes, passaram a ser feitas abertamente
na frente até de testemunhas. Eu mesmo tenho presenciado os “conselhos” dos
amigos que só estão preocupados com o melhor para Joinville e que vem com
preocupação que a LOT não tenha sido aprovada ainda.

Estamos acostumados a ler, ver e ouvir na imprensa imagens
brutais de atentados terroristas com dezenas de mortos e feridos e acreditamos
que estamos livres de este tipo de situações em Joinville, que ninguém aqui
ousaria usar da violência para calar a voz dos dissidentes. Só o desespero dos
que ofereceram vantagens que não poderiam cumprir pode justificar um ato de tal
brutalidade. Só a cobiça dos que com as
mudanças propostas na LOT poderão multiplicar seu patrimônio por dezenas ou
centenas de milhares, pode ser a justificativa para tamanha violência.

Foi um atentado e agora é a Policia Civil quem deve
investigar o Boletim de Ocorrência 0084-2014-00734. Há que identificar os
autores e os mandantes. Quem mandou explodir não tem coragem
para fazer e manda fazer. É tão hipócrita que ainda da tapinha nas costas e liga
oferecendo sua solidariedade.
sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014
Menos Rachel, mais jornalismo
Não sei o que me deixou mais inquieta após ver o vídeo da Rachel Sheherazade que circulou como água (ou mais, literalmente) na internet sobre o rapaz acorrentado no Rio de Janeiro. Se foi o efeito cascata que isso gerou na rede, com comentários mais absurdos do que o da própria apresentadora, ou se foi o posicionamento do grupo SBT ao se isentar do fato, alegando que não irá responder pelo conteúdo, já que foi uma simples "opinião" da apresentadora. (Só esqueceu de reconhecer que a apresentadora é a âncora do principal telejornal da emissora.)
O comentário de Rachel foi infeliz, preconceituoso e oportunista. Infeliz porque Rachel posa de porta-voz de uma parcela da sociedade que defende fazer justiça com as próprias mãos e se diz cristã. Eu disse, uma parcela. Pois a outra parcela ficou indignada tanto quanto eu fiquei. Preconceituosa porque Rachel usa dois pesos e duas medidas, dependendo da situação (sua opinião sobre um delinquente branco e rico é diferente sobre um delinquente preto e pobre) como bem mostra seus comentários sobre Justin Bieber e o "marginalzinho" pobre do Rio de Janeiro, no vídeo logo abaixo. Oportunista porque pretende ganhar "ibope" com um assunto tão polêmico. Até aí tudo bem, emissoras de TV vivem do "ibope", mas há de separar "isso" de jornalismo. Jornalismo mesmo não emite opinião, só pra começar a conversa. Imagine você, se cada jornalista quiser dar sua opinião sobre uma matéria? Pois é, melhor nem imaginar.
Falando em jornalismo de verdade, eu aprovo a nota de repúdio emitida pelo Sindicato dos jornalistas profissionais do Rio de Janeiro e da Comissão de Ética da mesma entidade contra os comentários de Rachel. Nela os profissionais se manifestaram radicalmente contra tais declarações, as quais consideram violação não só dos direitos humanos, mas do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros e do Estatuto da Criança e do Adolescente, além de fazer apologia à violência.
Eis os pontos do Código de Ética citados pelo sindicato:
Art. 6º É dever do jornalista:
I – opor-se ao arbítrio, ao
autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na
Declaração Universal dos Direitos Humanos;
XI – defender os direitos do cidadão,
contribuindo para a promoção das garantias individuais e coletivas, em especial
as das crianças, adolescentes, mulheres, idosos, negros e minorias;
XIV – combater a prática de perseguição
ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de
gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de
qualquer outra natureza.
Art. 7º O jornalista não pode:
V – usar o jornalismo para incitar a
violência, a intolerância, o arbítrio e o crime;
No mesmo entendimento, o deputado federal Ivan Valente, do Partido Socialismo e Liberdade, divulgou que o PSol irá encaminhar ao Ministério Público uma representação contra o SBT e a jornalista Sheherazade por apologia à tortura e ao “justiçamento”.
Eu espero que esses exemplos sirvam para avaliarmos esse e outros conteúdos que aparecem disfarçados de jornalismo na TV, nas rádios e nas redes. É importante não confundir "liberdade de expressão" com "vontade de opressão". E para finalizar, reforço que não estou aqui defendendo bandido, estou apenas defendendo o jornalismo - e isso já tem sido uma tarefa difícil nos dias de hoje.
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