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quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Notas sobre o fim do IPPUJ

POR CHARLES HENRIQUE VOOS


Há alguns anos defendo que o IPPUJ (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Joinville) precisa de reformulação, e não estou sozinho nisso. É praticamente um consenso entre vários especialistas que a entidade não estava mais conseguindo cumprir o seu papel, pois ela parou no tempo e não era mais a vanguarda que se imaginara no momento de sua fundação, em 1991. Porém, acredito que os mesmos defensores de uma reforma serão os críticos do que o Prefeito Udo Dohler irá fazer com a instituição dentro de algumas semanas.

Ninguém do governo fala com esses termos mas, na verdade, o IPPUJ será extinto e absorvido, após a devida reforma administrativa na Câmara (onde Udo tem larga maioria), em uma outra secretaria, a de "Planejamento Urbano e Desenvolvimento Sustentável", sob comando do empresário-cria-da-acij-jovem Danilo Conti, atual secretário de Desenvolvimento Econômico.

A extinção do IPPUJ, nesses moldes, caminha ao mais perverso modelo de urbanismo existente no mundo contemporâneo e que chamamos de "empresariamento urbano", pois todas as principais diretrizes da nova entidade serão pautadas pela visão empresarial. Conti, por exemplo, deturpou todo o sentido do conceito de "smart cities" ao criar o "Join.Valle" para impulsionar os negócios da turma ligada à inovação empresarial. Conforme consta na coluna de Economia do Jornal A Notícia do dia 10 de Janeiro de 2017, as prioridades da nova pasta serão "a revisão do Plano Diretor, a instituição de novo modelo do programa de competitividade das empresas joinvilenses e a definitiva formatação do Plano de Mobilidade urbana".

Está certo que a Prefeitura necessita pensar na impulsão da economia, mas o planejamento de uma cidade é uma tarefa que transcende isso. É um ato que envolve pensar em pessoas e suas necessidades relacionadas ao espaço urbano. A visão empresarial, por sua vez, mira exclusivamente na renda e em um modelo muito simplista de cidade: a cidade feita para os negócios. A mesma edição do jornal diz, ainda, que "em 2018, a equipe comandada por Conti pretende ter completa radiografia das potencialidades econômicas e de negócios do município de Joinville, a partir da consolidação das regras urbanísticas definidas na nova Lei de Ordenamento Territorial, a LOT, que foi aprovada pela Câmara em dezembro".

Assim como fez com o Conselho da Cidade, quando seus indicados apoiaram abertamente a eleição de Álvaro Cauduro de Oliveira (não preciso descrever quem ele é, né?) para a Presidência, Udo está dando o poder de pensar a cidade para a ética empresarial - e o Conselho nunca questionará isso, pois está "dominado". Basta relembrarmos o que essa ética fez com o espaço urbano de Joinville e veremos que, nem de longe, é a melhor solução. Antes tivesse continuado com o velho IPPUJ. Ruim com ele, pior sem ele.

quinta-feira, 5 de maio de 2016

O empresário, o trabalhador e o Bolsa Família




POR CLÓVIS GRUNER

Não fazia ideia de quem era Danilo Conti há até poucos dias. Seu nome entrou no meu radar por conta de um comentário publicado em sua página no Facebook no dia 01 de maio. Nele, Conti parabenizava a todos que, como ele, sobrevivem sem o Bolsa Família. “Hoje o dia é nosso!”, congratulava-se com aqueles que considera seus iguais: os que trabalham e labutam – não há outra interpretação possível – ao invés de viverem das esmolas atiradas aos parasitas sociais pelo governo por meio de programas como o Bolsa Família.

Conti, descobri depois, é um jovem empresário joinvilense que, até 2015, presidia o Núcleo de Jovens Empresários da Acij, de onde saiu para assumir a Secretaria de Integração e Desenvolvimento Econômico, nomeação devidamente chancelada pela entidade, segundo a coluna “Livre Mercado” de A Notícia. Se não chega a ser uma novidade – afinal, Udo Döhler também foi eleito com a chancela da Acij, entidade cujos interesses e expectativas estão acima dos da cidade há várias gestões –, surpreende o quanto, apesar de pertencer a uma nova geração de empreendedores, Danilo Conti parece não se diferenciar substancialmente de seus predecessores.

No site de sua agência, a iZi, em  meio ao trivial (cases de sucesso, relação de clientes atendidos, etc...) um pequeno amontoado de textos, abrigados sob o lamentável título “Filosofada”, revelam um publicitário e empresário que acredita no poder da autoajuda e na capacidade criativa e transformadora das garagens, entre outras coisas. Mas ser crédulo e careta, no fim das contas, não deixa de ser em parte uma escolha, e Conti está longe de ser o único a confundir literatura de autoajuda com filosofia – ou “filosofada”, segundo ele. Mas enfim...

O problema é quando esse publicitário e empresário se torna uma pessoa pública (no duplo sentido: porque ocupa um cargo público e porque desempenha uma função política e, logo, pública), e nesta condição decide reproduzir mentiras baseado tão somente em sua ignorância e seu preconceito. Especialmente sobre um tema sobre o qual há muita informação séria disponível, oficial ou não, a apenas um clique de distância. Nesse sentido, as duas linhas de Conti no Facebook valem por um textão, na linguagem das redes. E merecem um textão como resposta.

O primeiro e o menor dos equívocos de Conti é confundir o BF com seguro desemprego. Qualquer um hoje, mesmo o mais ignorante, sabe que isso é mentira, e só a desonestidade e a má fé do secretário explicam a “confusão”. Mas, como falei, esse é dos equívocos, o menor. Desde que foi criado, em 2003, o BF foi responsável pela diminuição no número de brasileiros vivendo em situação de pobreza extrema, que caiu de 12 para aproximadamente 4,5% na primeira década do programa. Diminuíram igualmente as taxas de analfabetismo e mortalidade infantil. O resultado é altamente positivo se levarmos em conta o volume total de investimentos públicos, algo em torno de 0,5% do PIB nacional, para atender cerca de 14 milhões de famílias. Mesmo as recentes irregularidades encontradas em auditoria do TCU, que identificou cerca de 160 mil famílias cadastradas com indícios de erro ou fraude, não invalidam nem comprometem a pertinência do programa.

Acesso à renda e exercício da cidadania – Primeiro, porque é mais fácil corrigir as distorções encontradas do que, por exemplo, cassar o mandato de Eduardo Cunha, réu no STF e até esta manhã, presidente da Câmara. Além disso, o prejuízo aos cofres públicos, R$ 195 milhões, se significativo, ainda assim é muitíssimo menor do que, por exemplo, o R$ 1 trilhão em dívidas de empresas públicas e privadas perdoadas pelo Estado; os quase R$ 600 milhões pagos em juros aos bancos só em 2015; ou os R$ 19 bilhões sonegados por grandes corporações empresariais, como a Rede Globo e a RBS, investigados pela convenientemente esquecida “Operação Zelotes”.

Mas os aspectos positivos não são apenas estatísticos. O desenho do programa, ao substituir as tradicionais “cestas básicas” por um complemento de renda depositado diretamente na conta bancária dos beneficiados, desenvolveu um senso de autonomia praticamente inexistente em famílias e comunidades que viviam em situação de carência extrema. A associação entre dinheiro e liberdade de escolha propiciou aquilo que o economista Amartya Sen chama de “capability”, grosso modo, a oportunidae de se desenvolver novas capacidades em condições socialmente favoráveis. De acordo com Sen, indivíduos são mais livres à medida que tem à sua disposição mais e melhores opções de escolhas, mas também possibilidades concretas de exercê-las.

Um bom desempenho escolar, por exemplo, depende certamente de um conjunto de habilidades e esforços individuais, mas é preciso igualmente condições objetivas para tanto, entre elas uma boa nutrição, escolas com infraestrutura e professores capacitados e bem pagos. A conclusão é obvia: se a liberdade de escolha é um dos fundamentos de qualquer sociedade democrática, o acesso à renda é uma das condições imprescindíveis a um exercício mais pleno da cidadania. Além disso, para Amartya Sen, há uma relação direta entre dinheiro e desenvolvimento e liberdade individuais: além do empoderamento, o acesso à renda contribui para novas atitudes mentais, produzindo sujeitos menos dependentes e mais responsáveis.

No primeiro turno das últimas eleições presidenciais, os três candidatos com chances efetivas de vitória se comprometeram a não apenas manter o BF, mas a ampliá-lo. Mesmo Aécio Neves, de todos certamente o mais elitista dos presidenciáveis – as outras eram Dilma Rousseff e Marina Silva – tratou de desmentir os boatos que tentaram apresentá-lo e sua candidatura como inimigos do benefício, a colocar em risco sua continuidade. A seu favor, o senador mineiro reivindicava projeto de sua autoria que visava, justamente, transformar o Bolsa Família em programa de Estado, e não de governo, teoricamente fortalecendo-o e assegurando sua continuidade independente do partido ou mandatário de plantão.

Essas informações estão, todas, disponíveis e acessíveis. Porque, a consulta-las, o secretário de Integração e Desenvolvimento Econômico preferiu repetir preconceitos, apequenando-se e também ao município do qual é um dos administradores – e onde, aliás, cerca de sete mil famílias são beneficiárias do Bolsa Família – só se explica pelo preconceito, a ignorância (nesse caso, voluntária) e a má fé pura e simples. Tivesse uma boa assessoria, e Danilo Conti seria orientado a, publicamente, pedir desculpas pelo comentário. Na verdade, se tivesse uma boa assessoria, Conti talvez nem o fizesse. Uma pena. Porque a mim, pessoalmente, não deixa de ser interessante saber o que vai pela cabeça de quem administra a cidade e é em parte responsável pela qualidade de vida dos cidadãos que nela vivem.