quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Joinville 1950


Carta aberta para o Aladdin: Fuja do mico!


POR FELIPE CARDOSO

Odiado por alguns, apreciados por outros, o carnaval, a tradicional festa do povo, aconteceu. Dentro de todas as problemáticas apontadas na festividade, a mais desprezada foi o racismo.

Todos os temas levantados no ano passado foram ignorados e, mais uma vez, tivemos que ver mulheres negras servindo de fantasias e a pele negra sendo ridicularizada com o blackface. Fora isso, de lambuja, tivemos que ouvir, em rede nacional, de uma subcelebridade branca, que o cabelo da Ludmilla (cantora negra) parecia Bombril.

Mas o que mais chamou atenção foi a foto de uma família formada por pais brancos e um filho negro curtindo o carnaval fantasiados como os personagens do filme Aladdin, da Disney.

Ao colocar uma criança negra nas costas muitos negros e negras interpretaram que os pais quiseram representar um macaco (Abu), personagem do filme. Alguns saíram em defesa dos pais e afirmaram que o menino estava vestido de Aladdin (protagonista), com a mesma fantasia do pai, mas em uma tentativa de retratação, no Facebook, o pai do garoto confirmou que o que filho estava fantasiado de macaco: “Muitos podem ver um macaco na fantasia de ontem. Eu vejo o melhor amigo do Aladdin, que vai conhecer o Mundo Ideal com ele e a Jasmine”.

Acontece que associar um negro a um macaco é sim racismo, por mais que a sua intenção fosse das melhores não tem como desassociar o personagem da realidade política, social, econômica e cultural do nosso país. E outra, no filme, o macaco Abu é retratado como cleptomaníaco, praticando pequenos furtos no decorrer da trama, enquanto Jasmine é uma princesa e Aladdin o moço pobre, mas com o coração puro. Todas essas informações só dão maior carga as críticas apresentadas pelos negros e negras.

Não quis me pronunciar até entender todo assunto, mas vendo a nota escrita pelo pai do menino, senti a necessidade de tentar aprofundar um pouco mais sobre a temática racial para a família.

Além dessa informação, o pai e responsável pela caracterização informou que o menino negro era adotado. O rapaz pediu desculpas para quem se sentiu ofendido e disse que não foi essa a intenção (nunca é). Informou que era artista de teatro e ousou dizer que as páginas que denunciaram a fantasia estavam descontextualizadas. Bem, como disse acima, quem está distante da realidade do país não somos nós. Desde pequenos ouvimos tal comparação e lutamos diariamente para acabar com isso. É ofensivo demais e não podemos mais reduzir isso a um simples erro de interpretação.

Gostaria de lembrar que adotar uma criança negra, casar-se com uma pessoa negra ou ser amiga de uma pessoa negra não impede de ser racista.

Acho louvável a atitude de adotar uma criança (opinião pessoal), mas acredito que é preciso ter muito mais do que boa vontade para se ter um filho – isso vale para os pais biológicos também. É preciso, antes de tudo, ter sensibilidade e humildade para aprender. Vejo uma certa preocupação dos pais sobre o que ensinarão para os filhos, mas não vejo uma grande preparação para o que aprenderão com os pequeninos.

Se tratando de adoção, essa sensibilidade e humildade são ainda mais necessários. Entender e saber tratar de assuntos como a rejeição não é tão simples assim. Para uma criança negra, além desses casos, é preciso falar sobre racismo. E não adianta achar que não tocando no assunto, esse tema nunca aparecerá. A diferença de tratamento, os olhares, o diálogo… Várias ações farão seu filho perceber que há um abismo entre ele (negro) e vocês (brancos) e se essa sensibilidade e humildade não forem trabalhadas com frequência será difícil entender as dificuldades apresentadas pela criança, detectar o problema e tentar encontrar a solução.

Neste momento pode parecer confortável ouvir as palavras dos amigos minimizando o problema em comparar uma criança negra a um macaco. Mas o problema não acaba por aí. A responsabilidade com o filho é para a vida toda. Os danos psicológicos podem ser grandiosos se você tentar reduzir ou descartar algum problema racial que o seu filho enfrente, principalmente na fase de construção da identidade dele. E acredito que aqui, apenas o amor não seja capaz de dar suporte. É preciso conhecimento, politização.

“Realmente o meu filho Mateus vai me ensinar muito como nos blindarmos do preconceito na cabeça das pessoas”.

Com certeza. Se você tiver a sensibilidade e a humildade de conhecer e apresentar todo o universo negro para o seu filho desde a infância, ele se tornará uma grande pessoa e saberá trilhar o próprio caminho com segurança, sabendo quem é, de onde veio e para onde pode ir. Mas sem a humildade de reconhecer o próprio erro, como o racismo – que mesmo sendo involuntário, continua sendo racismo – ficará ainda mais difícil de trilhar todo esse caminho.

Acredito que o contato com os movimentos negros e a leitura de grandes obras que tratem do assunto poderão contribuir muito para a criação do seu filho que uma hora ou outra vai querer saber mais sobre a sua história e procurará ícones que se pareçam com ele e que façam sentir orgulho de quem ele é e de como ele é.

Você poderá apresentá-lo as maravilhosas obras de Cartola, Jovelina, Jamelão, Nelson Sargento, Simonal, Pixinguinha. A grande história e contribuição política de Abdias do Nascimento e Leci Brandão. A coragem de Carlos Marighella. A luta de Zumbi, Dandara, Ganga Zumba, Tereza de Benguela. A genialidade de Ruth de Souza, Zezé Motta, Grande Otelo, Machado de Assis. A enorme contribuição de Lélia Gonzalez. Poderá incentivá-lo a ouvir as letras contundentes dos Racionais MC’s e Facção Central. Poderá contar as histórias de lutas por direitos civis e igualdade racial em outros países, como nos EUA e na África do Sul. Contar a história de líderes como Martin Luther King, Angela Davis, Malcolm X, Nelson Mandela. Histórias e ícones negros que nem sempre nos são apresentados nas escolas e nas universidades.

Adotar uma criança negra não te garante um lugar no céu, mas certamente lhe fará conhecer histórias, lugares e pessoas impressionantes, ajudando a desconstruir o seu preconceito e, principalmente, ajudando seu filho a construir a própria identidade.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Udo quer ganhar de qualquer jeito

POR FELIPE SILVEIRA

Primeiro Udo Döhler vem a público para dizer que decidiu não contratar uma turma de médicos residentes para o Hospital São José, de modo que economizaria R$ 1,3 milhão aos cofres municipais. Ou seja, o prefeito/empresário se valeu de uma notícia ruim (menos médicos no hospital) para fazer uma propaganda boa de si mesmo, vendendo a imagem de “gestor”.

O anúncio, obviamente, repercutiu de maneira negativa para a prefeitura. Afinal, cortar profissionais da saúde pública, ajudando a precarizá-la, é exatamente o contrário da ideia que sua campanha eleitoral vendeu. A prioridade, diziam, era justamente a saúde, a especialidade do empresário que se candidatava ao executivo.

Diante das críticas, Udo vem a público novamente para explicar que não existiu corte algum. A prefeitura se apressou para esclarecer a “confusão” que os outros estavam fazendo. De fato, não houve demissões dos atuais residentes. Apenas não existiu a contratação de 38 novos, de uma turma de 56 que estava prevista para chegar. Ou seja, 18 serão contratados, informação que não constava na primeira nota divulgada pela prefeitura.

Ora, mas se não houve corte algum, não existiu economia alguma, conforme Udo propagandeou na primeira vez que veio a público, certo? Se houve o corte, então houve economia. O prefeito precisa decidir qual das propagandas quer fazer. Não pode simplesmente vender duas imagens que se contradizem. Ou ele cortou e economizou ou ele não cortou e consequentemente não economizou.

Eu acredito que houve o corte, pois a contratação dos residentes estava prevista e era aguardada por outros profissionais do São José. Os médicos residentes estão em fase de conclusão de curso, de modo que sua atividade é supervisionada por outros médicos. Eles fazem uma diferença enorme no atendimento à população, pois fazem as atividades que os médicos fazem, a um custo muito menor.

A indignação é geral dentro do maior hospital da região. Como os residentes tocam boa parte do trabalho médico, a previsão é terrível. Para quem vendeu a imagem de especialista em saúde, do homem que ia resolver o caos, essa é uma economia que não vale a pena.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Os maiores marxistas do mundo











POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um é marxista e tende para o marxismo. O outro também é marxista, mas pende para a anarquia (não confundir com anarquismo). Viveram em tempos diferentes e já foram desta para... para lugar incerto. Um era ateu e não acreditava nesse papo de vida após a morte. O outro não levava essa coisa de morrer muito a sério. Mas vamos ficcionar* um encontro entre dois dos maiores marxistas da humanidade: Karl Marx e Groucho Marx, numa mesa de bar.
Karl Marx – Senta aí, Groucho. Queres beber alguma coisa? Comer um bife? Ou és vegetariano?
Groucho Marx – Não sou vegetariano, mas como animais que são. E aviso que não pago. Pagar a conta é um costume absurdo.
Karl – Sempre o dinheiro. A propriedade privada tornou-nos tão estúpidos e limitados que um objeto só é nosso quando o possuímos.
Groucho – Vê-se que morreste pobre. Sabes que o segredo do sucesso é a honestidade. Se conseguires evitá-la, não tem erro...
Karl – O dinheiro é a essência alienada do trabalho e da existência do homem.
Groucho – Tens razão. Há muitas coisas na vida mais importantes que o dinheiro. Mas custam tanto.
Karl – O dinheiro não é tudo. E, cá para nós, o declínio da sociedade burguesa é inevitável. Por que não te juntas aos comunistas?
Groucho –Não entro para clubes que me aceitam como sócio.
Karl – Sabes que o capitalismo gera o seu próprio coveiro.
Groucho – Não fales em coveiros. Eu pretendo viver para sempre... ou morrer tentando.
Karl – Tenta entender. O comunismo não é para nós um estado que deve ser estabelecido, um ideal para o qual a realidade terá de se dirigir...
Groucho – Ora, estes são os meus princípios. Mas se não gostas deles, eu tenho outros.
Karl – A revolução é o motor da história. Podes crer...
Groucho –  Ok... todo mundo precisa crer em algo. Portanto, creio que vou tomar uma cerveja.
Karl – Tens uma falta de fé muito sólida. Mas lembra: tudo o que é sólido desmancha no ar.
Groucho – Então vamos beber a tal cervejinha, que é líquida. E fazer um brinde às nossas esposas e namoradas: que elas nunca se encontrem.
Karl – O meu casamento com a Jenny sempre esteve acima dessas coisas.
Groucho – O casamento é uma bela instituição. Naturalmente, se você gostar de viver numa instituição. Aliás, eu fui casado por um juiz... devia ter pedido por um júri.
Karl – É isso. Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha...
Groucho – Ahã. Karl, tu andavas na política, vivias sempre fora de casa, no exílio e até na cadeia... e tiveste seis filhos? Ah... e tiveste tempo para engravidar a empregada? Se trabalhasses em casa...
Karl – Ei, eu nego essa coisa da empregada.
Groucho –Também corri atrás de uma garota por dois anos, apenas para descobrir que os gostos dela eram exatamente como os meus: nós dois éramos loucos por garotas. Eu sou solidário, Karl.
Karl – É... o caminho do inferno está pavimentado de boas intenções.
Groucho – Boas intenções? Tu não assumiste a criança. O Engels é que perfilhou o moleque. Aliás, esse sim é um amigão...
Karl – É um companheiro de luta. Os filósofos limitam-se a interpretar o mundo de diversas maneiras, mas o que importa é modificá-lo. Engels percebeu isso. E fez muito por mim.
Groucho – Mas é como eu sempre digo: ninguém é completamente infeliz diante do fracasso do seu melhor amigo.
Karl – Olhaê... vou nessa. Prazer em conhecer, Groucho.
Groucho – Prazer? Ora… conheço Groucho há anos e não tive prazer nenhum nisso.

Um Marx é pouco. Dois é bom. Três é um trio.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Até quando cabeças vão rolar por falta de prioridade para cultura, educação e lazer?














POR SALVADOR NETO


J
oinville ficou horrorizada esta semana com a decapitação de um jovem de 16 anos no bairro Jardim Paraíso, comunidade já estigmatizada como lugar de alta violência e tráfico de drogas. Afinal, a polícia ainda não sabe quem cometeu a barbárie, não sabe onde está o corpo, e tampouco se o jovem foi realmente assassinado no bairro. E mais: em que pese o comando do governo Colombo trocar comandantes da polícia civil ou militar, o que não muda é a essência, ou seja, a falta de efetividade na investigação. Se a polícia sabe de gangues, etc, porque não coíbe e prende? Mistérios para um Sherlock Holmes provinciano desvendar!

Mas, para além da alta criminalidade que não vem de hoje na maior cidade catarinense, há aspectos que a elite empresarial, social e política joinvilense não gosta de tocar. Nossa juventude está à mercê dos chefes do crime por pura falta de oportunidades culturais, de lazer, de esportes, de inclusão no mercado de trabalho que lhes garantam uma vida digna, saudável e longe do mundo das drogas, do tráfico, das ruas que engolem esses adolescentes para o dinheiro fácil. A Prefeitura de Joinville – governo Udo Döhler do PMDB cortou recursos para a única festa popular, o carnaval. Preferiu gastar na festa alemã Bierfest, que não deu em nada.

Enquanto a cultura, a educação integral, o lazer e os esportes não forem prioridades para os governantes, a grana gasta em segurança com câmeras, mais soldados, viaturas – e é sempre bom lembrar que é o nosso dinheiro suado que paga tudo – servirão apenas para agradar a elite assustada que mora em áreas centrais, longe da periferia que assiste essas barbáries em frente às suas casas, causar “sensação” de segurança e fonte para imagens para lindos vídeos de propaganda dos “governos” atuantes que temos (??). 

Em mais um lance que exemplifica o que digo, que mais lazer, cultura, educação não são prioridades, o governo Udo Döhler desistiu da construção de um Ponto de Cultura com recursos já garantidos pelo Governo Federal da ordem de R$ 1,2 milhão, que seria construído no bairro Vila Nova, zona oeste da cidade. Irônico é que no mesmo ano de 2015 o vice de Udo, o advogado Rodrigo Coelho que também preside a Fundação Cultural de Joinville, anunciou que a obra era uma “prioridade” do governo do PMDB. Nota-se. E a população também nota. Afinal, prioridade é palavra forte, bonita, mas só da boca para fora.

É lastimável que as lideranças políticas que se sucedem no comanda da cidade continuem a usar as mesmas práticas retóricas, discursos bonitos, e práticas iguais a seus antecessores. Este governo atual se consagra no quesito abandono da cidade, pois carros, ônibus e bicicletas afundam nos buracos das ruas; as praças e parques que ainda existiam razoavelmente cuidados, hoje estão largados ao relento e esquecimento; mobilidade urbana é miragem e outra peça de ficção na propaganda oficial, e paro por aqui, pois faltaria espaço para elencar o atraso em que nos encontramos.

Por tudo isso é que, contrariando os puxa-sacos oficiais e os mal informados, continuo a denunciar – e isso vale não só para Joinville – que ou a sociedade definitivamente muda seu modo de agir na fiscalização, acompanhamento e cobranças de suas lideranças políticas e empresariais (sim, está na hora de deixarem os pobres subirem os degraus na escala social, pagando melhores salários e distribuindo lucros), exigindo investimentos em cultura, esporte e lazer de fato, ou continuaremos a ver cabeças rolando em sacolas, corpos em malas jogados em rios, mortos perfurados com dezenas de tiros em frente às casas.

A violência se combate com educação, cultura e lazer. Sem isso, a barbárie chegará também nas casas da elite, e aí pode ser tarde demais para quem se horroriza pela tv, jornais e rádios. Nossa juventude está literalmente perdendo a cabeça no crime, como vemos em grandes centros, e nós estamos passivos observando o que virá adiante. Que rolem cabeças no poder político via uso do voto popular e participação efetiva do povo na fiscalização, não mais nas ruas da cidade que elegemos para morar, viver e criar filhos e netos.


É assim nas teias do poder...