segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Cercar o jardim do MAJ é a solução?

POR JORDI CASTAN
Há um movimento a favor de fechar, com grade, o jardim do MAJ - Museu de Arte de Joinville. Um grupo de vizinhos do museu tem se manifestado abertamente contrário à forma como o jardim está sendo usado por grupos de jovens. Há, inclusive, acusações fortes de uso e comercialização de drogas e de consumo de bebidas alcoólicas. A única proposta apresentada até agora é a de fechar o jardim com uma grade. Em outras palavras, empurrar o problema para outro lado. Ou seja, esconder o problema em baixo do tapete.
O mau uso dos espaços públicos é um problema mais complexo e mais profundo do que poderia parecer à primeira vista. A coisa vai além, muito além da gestão destes espaços, da sua manutenção ou do seu fechamento. Espaços públicos são um problema de educação, de segurança, de cultura, de saúde pública e, principalmente, de gestão. Problemas complexos não se resolvem de forma simplória. Exigem uma abordagem multidisciplinar e o diagnóstico correto. Só assim será possível identificar corretamente o problema central e poder avaliar as causas e os efeitos.
A proposta de gradear, colocar concertinas e câmaras de monitoramento, como a forma de resolver os problemas de segurança, mostra uma superficialidade estulta dos que a defendem. Na verdade, os problemas quando não se resolvem ou pioram ou mudam de lugar. Se não houver uma ação articulada, estruturada e bem planejada para a resolução, o problema do MAJ se transferirá para outras áreas próximas, como o Parque das Aguas, o Cemitério do Imigrante ou para a Rua das Palmeiras, para citar outras áreas centrais que poderiam ser ocupadas.
Não é possível aplicar em toda Joinville a lógica que o cidadão individual aplica na sua residência. Não há como gradear todos os espaços públicos, porque os espaços públicos devem ser geridos de forma democrática. E, claro, devem estar abertos a todos. Esta é a obrigação e responsabilidade do poder público. O desafio é olhar o problema de forma global, fugir das soluções fáceis, resultado de análises superficiais. E para isso é preciso enxergar toda a cidade de forma holística, envolvendo a todos e não só construir grades que nada resolvem. 
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sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Maledetto Rossi!!!!!!!

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Dizem que todo ser humano tem direito ao perdão. Todos, menos o Paolo Rossi. Para mim ele merecia ser julgado – e condenado – pelo crime de lesa-beleza do futebol. E vou mais longe. A punição devia ser uma tortura inspirada nestes novos tempos: o cara fechado num quarto escuro onde, a cada 30 segundos, era forçado a ouvir um coro de vuvuzelas.

O leitor que gosta do futebol bonito sabe do que estou a falar. Tudo aconteceu no dia 5 de Julho de 1982, no Estádio de Sarriá, num verão de Barcelona. A seleção brasileira, dirigida por Telê Santana, era a sensação da Copa do Mundo. E tinha uma qualidade rara. Além de ganhar os jogos de forma irretocável, ainda dava autênticos recitais de futebol.

O time brasileiro jogava por música (a gente nem ligava se o Serginho Chulapa e o Valdir Peres destoavam). E de forma tão afinada que mesmo os torcedores dos outros países pensavam que o campeão já estava encontrado. Quando, naquele dia quente, as equipes do Brasil e da Itália entraram em campo, ninguém tinha dúvidas de que seria apenas para cumprir tabela. Os italianos, mal das pernas, não eram páreo para aquele timaço.

E eis que surge esse Paolo Rossi para rasgar o script. O cara fez três gols e a Itália venceu por 3 a 2. Deve ter sido um dos dias mais tristes que eu vi no Brasil. Quem viveu o momento sabe como doeu. Não por acaso, no jogo seguinte da Itália, apareceu na torcida italiana uma faixa a dizer algo assim: “Rapazes, vocês destruíram um mito”.

Tenho uma memória firme desse dia porque fazia dois meses que era repórter de A Notícia (ainda estudante de engenharia) e lembro que a redação parecia um sepulcro. Havia muitos marmanjos, jornalistas com longa experiência, com os olhos vermelhos e marejados. E ninguém com disposição para trabalhar. Então, coube a mim fazer a “repercussão” da derrota nas ruas de Joinville. Mas, como diz a música, naquele dia “a cidade apavorada, se quedou paralisada”.

Maledetto Rossi.




Professor, um herói desprezado pela sociedade

POR DOMINGOS MIRANDA
O poeta e dramaturgo alemão Brecht, escreveu em sua peça Galileu Galilei: “Pobre do povo que precisa de herói”. E, no início de outubro, mês das crianças e dos professores, morreu heroicamente, na cidade mineira de Janaúba, a professora Helley Abreu Batista, de 43 anos. Ela lecionava numa creche municipal e lutou bravamente com o vigia que colocou fogo em uma sala de aula lotada de crianças. Mesmo com o corpo em chamas, a professora se esforçou para tirar as vítimas do meio do incêndio. Helley teve 90% do corpo queimado e dez horas depois morreu no hospital. Era casada e deixou três filhos: de um, 11 e 13 anos.

Como sempre acontece nestas horas, a tragédia fez com que as autoridades enaltecessem, com razão, aquela professora reconhecida por suas qualidades profissionais e com uma coragem e solidariedade inimagináveis. Mas, neste país onde o que mais se destaca é o farisaísmo e a hipocrisia, há muito discurso e poucas medidas práticas. Basta ver que o piso nacional dos professores, em torno de R$ 2 mil, não é respeitado na maioria dos Estados. Por outro lado, juízes e procuradores formam uma casta de marajás que recebem até R$ 100 mil por mês, muito acima do piso constitucional. Utilizam os célebres penduricalhos para burlar a lei.

A sociedade, em grande parte formada por zumbis que não sabem fazer respeitar a cidadania, permite que tais aberrações continuem existindo como se não houvesse nada de anormal. Os mesmos governantes que alegam não ter recursos para pagar o piso dos professores, se calam diante dos salários estratosféricos dos juízes. O presidente Temer, no ano passado, sancionou um reajuste de 57% para o judiciário, uma categoria com os melhores salários do país. Quando há vontade política a coisa muda de figura. O Maranhão, um dos Estados mais pobres do Brasil e administrado por um governador comunista, decidiu pagar os melhores salários para os professores da rede estadual de ensino, com piso de R$ 5 mil.

Em outros países os professores são respeitados e valorizados, mas aqui, seguindo uma tradição histórica de nunca dar destaque à educação, eles são tratados como profissionais de segunda classe. Os mestres são desrespeitados pelo governo, pelos pais e pelos alunos. Inúmeras vezes os estudantes agridem os mestres e fica tudo por isso mesmo, em um silêncio vergonhoso do restante da população.

O médico e escritor Augusto Cury botou o dedo nesta ferida. Escreveu: “Os professores são heróis anônimos, fazem um trabalho clandestino. Eles semeiam onde ninguém vê, nos bastidores da mente. Aqueles que colhem os frutos dessas sementes raramente se lembram da sua origem, do labor dos que as plantaram. Ser um mestre é exercer um dos mais dignos papéis intelectuais da sociedade, embora um dos menos reconhecidos. Os alunos que não conseguem avaliar a importância dos seus mestres na construção da inteligência nunca conseguirão ser mestres na sinuosa arte de viver”.

Se a sociedade quer valorizar os professores, cobre dos seus governantes mais respeito a estes profissionais e exijam salários dignos para eles. Este será o primeiro passo para sairmos da indigência moral em que nos encontramos. Palavras duras, mas necessárias.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Temer, o escravo de 594 almas

POR CHARLES HENRIQUE VOOS
Com a infeliz declaração de que "só temos a comemorar", o atual Ministro da Agricultura e empresário do setor de agrotóxicos, Blairo Maggi, explicou o sentimento do governo federal sobre as novas regras que definem a fiscalização do trabalho escravo no Brasil. Mesmo que a Secretária Nacional de Cidadania, Flávia Piovesan, diga que é um "retrocesso inaceitável", não há como negar que o Brasil acabou por regularizar o trabalho escravo. As novas burocracias impostas, e comemoradas pelos grandes empresários urbanos e agrários, praticamente impedem qualquer investigação isenta ou denúncias frutíferas. Trabalhadores nacionais e estrangeiros, do campo e da cidade, especialmente pobres e crianças (crianças!), são os mais atingidos. Estamos pagando um preço quase inimaginável para o sustento de Temer no poder.

O nosso país ainda mantém muitas heranças do período colonial, e a escravidão é uma delas. Os negros possuem um passivo social gigantesco por causa disso, apesar de grande parcela da população negar e ainda acreditar no falso discurso da meritocracia. Ainda sustentamos nossos privilégios nesta lógica de séculos atrás. Por outro lado, os dados sobre trabalho mostram algo que pouco enxergamos: nos últimos dez anos, mais de 1.500 pessoas foram libertadas de condições assim, por todo o Brasil, em média. Para piorar, agora está tudo muito bem regulamentado, mesmo que o governo fale em "novas regras para a fiscalização".



Ocorre que a deturpação de direitos sociais pelo atual governo está virando rotina, especialmente como moeda de troca para o chefe do executivo se livrar de acusações contra o seu nome. Para se livrar do primeiro pedido de Impeachment, patrocinou o Congresso com emendas e medidas provisórias que beneficiaram os representantes setores do agronegócio, das igrejas e outros setores conservadores. Não por acaso, visto que a bancada desses ramos tem uma grande relevância na composição do Congresso. A regularização do trabalho escravo, lembremos, é uma estratégia para compor com a segunda acusação, a qual já tramita pela Câmara.

Sendo assim, temos um presidente que é o verdadeiro escravo, mas de 513 deputados e 81 senadores. Para se manter no poder, atende a todos os interesses de seus donos, nem que, para isso, tenha que cortar os nossos direitos. É uma luta desenfreada para realinhar conservadoramente o país. E ainda faltam a Previdência, bem como outras surpresas desagradáveis que logo virão. Com Supremo, com tudo.