segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Uma prefeitura sem a cultura de valorizar a cultura

POR JORDI CASTAN
A cultura não é prioridade em Joinville. Não é segredo. Juntar turismo e cultura, então, é um desserviço a ambos os setores. Cultura deveria ser tratada com a importância que efetivamente tem e merece. Poderíamos começar com coisas simples, até porque as complexas, aqui em Joinville, estão fora de cogitação. Então, a única alternativa seria fazer as fáceis, coisas que o secretário que aí está seria capaz de planejar, executar e colher os resultados. Provavelmente a parte mais difícil é explicar para o prefeito que vale a pena investir em cultura e que com pouco investimento é possível obter bons resultados.

Vamos a um exemplo simples, algo que poderia ser feito, que bastaria querer fazer. Aproximar os alunos da rede pública dos museus. Incentivar que os museus de Joinville sejam lugares de estudo, de desenvolvimento multidisciplinar. Levar mais crianças a se interessar pela arte, a história e a cultura da sua cidade. Um programa que facilitasse o acesso aos museus.

A primeira proposta seria aumentar o horário de visitação dos museus, que hoje funcionam só das 10 às 16 horas. Um horário que está mais voltado a atender os "interesses" e a conveniência do serviço público que os da sociedade. Um caso típico do poste mijando no cachorro. Museus que passam a maior parte do dia fechados não servem a seu objetivo

A segunda proposta seria a de disponibilizar transporte gratuito para os alunos da rede pública para que possam visitar os diversos museus de Joinville. O serviço já existiu no passado, mas com o tempo desapareceu. As escolas que querem visitar algum dos museus de Joinville devem se cotizar para contratar os serviços de uma das duas empresas que monopolizam o serviço na cidade. O orçamento que as empresas cobram pelo serviço é de R$ 400,00. Um absurdo. O poder público não oferece o serviço e tampouco se preocupa para que o serviço seja oferecido por um preço justo e razoável. O resultado é que os alunos são alijados do acesso a rede de museus municipais.

Seria preciso querer. E é esse “querer” que o poder público tem tanta dificuldade em assumir. Digamos, por exemplo, que depois dos horários de pico, um daqueles ônibus que passa a manhã ou parte da tarde estacionado em qualquer um dos terminais urbanos, fosse colocado à disposição das escolas para visitas a museus, sambaquis, parques e espaços culturais, as escolas só precisariam programar as suas atividades e agendar o transporte.

Fácil né? Seria preciso apenas que alguém quisesse. Ou seja, com um pouco de boa vontade e sem nenhum recurso extraordinário, se facilitaria o acesso à cultura a milhares de alunos da rede pública. Mas como em Joinville o problema não é de dinheiro e sim de gestão, já podemos imaginar que esta solução não será implantada.

Em tempo: quantos alunos visitaram os museus de Joinville no ultimo ano escolar? Quanto poderia aumentar a visitação se houvesse um programa de estimulo a visitação? Quais museus são os mais visitados? Qual é o perfil do visitante dos museus? Qual o melhor horário de funcionamento, para o visitante? Vai que o poder público de repente passa a se interessar pela cultura e estimula o acesso a cultura para todos.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Eu, ele e o radinho

POR YAN PEDRO
É comum, entre uma vitória em casa e uma derrota fora (como virou costume nesta Série C), me pegar pensando nas chances que o Joinville teve para evitar este inferno pelo qual estamos passando. Parece coisa de louco ficar remoendo o passado, mas, para mim, é inevitável.

Da surreal noite na qual Jael perdeu dois pênaltis, passando pela derrota improvável do Náutico para o Oeste, o dia que mais me marcou no rebaixamento do JEC em 2016 foi 8 de outubro de 2016, quando percebi que a queda estava praticamente decretada.


O personagem desta foto é desconhecido. Eu não o conheço, sequer vi seu rosto pra registrar o momento. Mas, mesmo assim, sei bem o que ele passou na tarde daquele sábado, e por que ficou ali - parado, incrédulo, colado ao radinho - por mais de cinco minutos depois do apito final.

O rádio, companheiro de quando não havia TV e os holofotes de série A e B, contava o que ele custava acreditar: o Joinville - embora ainda não matematicamente - estava rebaixado para o inferno da terceira divisão.

O que ele poderia pensar naquele momento? Na dificuldade em subir para a Série B, lá em 2011? Na alegria de 2014, quando subimos como campeões para a primeira divisão? Ou na euforia de 2015, que deu lugar a frustração logo no primeiro semestre, com a perda traumática do título catarinense? 

Quando o vi se levantar e ir embora cabisbaixo, um nó envergonhado se formou na minha garganta. Por sorte, ou talvez por já estar mais conformado, consegui segurar as lágrimas. Mas sabia que, a partir daquele 0 a 0 em casa com o Paysandu, o JEC era um paciente em estado terminal, à espera de os aparelhos serem desligados.

Sim, até houve uma breve melhora, mas somente aquela breve e enganadora antes de, finalmente, dar adeus e voltar para o inferno da Série C, da qual não temos certeza de que conseguiremos escapar este ano.






Yan Pedro é jornalista,
cronista esportivo
e torcedor do JEC

Terrorismo do Exército mata na OAB

POR DOMINGOS MIRANDA
O Exército já prestou serviços gloriosos ao Brasil, tais como a campanha do Tenentismo, para moralizar a política, a participação na Segunda Guerra Mundial e as forças de paz em vários países. No entanto, houve períodos em que muitos de seus integrantes mancharam para sempre a instituição com a prática de torturas nos quartéis e atos de terrorismo. Um destes fatos vergonhosos aconteceu no dia 27 de agosto de 1980, quando uma carta-bomba explodiu na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), matando a secretária da entidade, Lyda Monteiro da Silva. Quatro militares do Centro de Investigações do Exército (CIE) estavam envolvidos na ação.

Na época do atentado, o Brasil vivia em plena ditadura e muitos militares da “linha dura” não aceitavam a chamada abertura política. Em 1979, a anistia colocou em liberdade os presos políticos e permitiu o retorno dos exilados. Todos os setores oposicionistas sofriam nas mãos destes descontentes de farda. Em 1980, o bispo de Nova Iguaçu, dom Valdyr Calheiros, e o jurista Dalmo Dalari foram sequestrados e barbaramente espancados. A OAB denunciava estes desmandos e foi colocada no alvo dos facínoras fardados.

A carta-bomba destinada ao presidente da OAB, confeccionada pelo sargento Guilherme Pereira do Rosário, foi entregue pessoalmente pelo sargento Magno Cantarino Motta, codinome Guarany.  Quem coordenou a ação terrorista foi o coronel Freddie Perdigão Pereira. Uma servente da OAB foi testemunha ocular da entrega da carta e, somente 20 anos mais tarde, confirmou o responsável pela entrega: Guarany. As investigações feitas na época não deram em nada e nenhum culpado foi punido.

Lyda Monteiro da Silva abriu a correspondência destinada a Eduardo Seabra Fagundes, presidente da OAB, quando ocorreu a explosão. A secretária teve um braço arrancado e outras mutilações pelo corpo. Morreu na ambulância, a caminho do hospital. No mesmo dia houve outros atentados no Rio: no gabinete do vereador  Antônio Carlos de Carvalho (com cinco pessoas feridas) e na sede da sucursal do jornal Tribuna Operária (do PCdoB). No ano seguinte aconteceu um outro atentado que fracassou, durante as festividades do 1º de Maio, no Riocentro, com a presença de mais de 10 mil pessoas. A bomba explodiu no colo de um sargento e feriu gravemente um capitão, ambos estavam no interior de um carro Puma.

Era um período de grande intranquilidade. Bombas explodiam em bancas que vendiam jornais alternativos, verdadeiras operações de guerra eram montadas para tentar enfraquecer as greves operária, seu líderes eram presos e tentaram calar a Igreja Católica (tomaram dela a sua rádio).  De janeiro de 1980 a abril de 1981, a “tigrada”, como era conhecido o grupo radical do Exército, realizou 74 ações terroristas. Elio Gaspari, em seu livro “A ditadura acabada”, afirma  que  “a Comunidade de Informações, que trabalhava em seu benefício, não desvendara um só dos atentados que ocorriam no país”.

Nos dias atuais causa calafrio quando vemos um ex-capitão, que em 1987 ameaçara colocar bombas nos quartéis por causa dos baixos soldos, figurar em segundo lugar nas pesquisas como candidato a presidente da República. Não devemos descuidar das serpentes, quando menos se espera, elas podem nos picar. Terrorismo nunca mais.s

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Sobre parafusos e especulação imobiliária


Há uns 20, 30 anos, você começa a comprar terras superdesvalorizadas na periferia da cidade. E, ao mesmo tempo, vai pressionando os governos a investir nas áreas mais valorizadas para diminuir ainda mais o preço da terra na periferia, visando mais compras a preços ridículos. Quando você não tem mais o que comprar, começa a dizer por aí que o desenvolvimento da cidade precisa ser invertido, em direção às suas terras, porque "lá é onde o trabalhador mora".

Faz lobby para alterar o zoneamento, coloca diretor seu como laranja de entidade de trabalhadores no conselho da cidade (órgão que vai debater o novo zoneamento), manda ele para audiências públicas criticar os movimentos sociais, assume entidades empresariais que dão espaços privilegiados na mídia para defender seu interesse e investir em políticos amigos (ou vendidos mesmo) até que, depois de um tempo, o novo zoneamento é aprovado e suas terras passam a ficar extremamente valorizadas.

Meses depois da nova lei ser aprovada pelos seus políticos amigos (que assumiram o poder com a sua ajuda e das entidades que comandava), você manda o seu diretor ir ao jornal novamente mas, desta vez, para dizer que está lançando projetos imobiliários em mais de três milhões de metros quadrados de terras.

Aquelas que você comprou a preço de banana, mas agora, graças a sua atuação política e rentista-exploradora, vai te dar um lucro enorme, lembra?

E todo mundo na cidade acha normal. Ninguém questiona. Conselho da Cidade, então? Tem que pedir autorização pra falar e o nome é capaz de não ser colocado nas atas públicas, já que criaram uma norma para esconder os integrantes e seus interesses explícitos nas decisões. Quem denuncia isto é demitido, processado, chamado de "arruaceiro" pelos políticos e colegas de profissão, sendo que estes deveriam ser os primeiros a se levantar contra devido ao seu conhecimento técnico, mas se escondem porque seus clientes são os mesmos lobistas.

E assim a tragédia urbana se multiplica: crianças, mulheres, jovens e pobres se reproduzem na miséria criada por aqueles que dizem estar agindo em seus nomes.

O poder de alguns aumenta, e a fábrica de coalizão de consensos se mantém como a coisa mais impiedosa do local.

Em uma cidade latino americana qualquer, agosto de 2017.

De repente o matagal se tornou vetor da especulação imobiliária

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Os honoris causa de Lula são ofensa para os "odiadores"

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
É entediante retornar ao mesmo tema vezes e vezes sem conta. Mas hoje volto a falar nos títulos de Doutor Honoris Causa atribuídos ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E, para começar, deixo um statement que considero definidor: os doutores (gente com doutorado) que eu conheço não reclamam dos títulos atribuídos ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De fato, a maioria até aplaude.

Mas ainda existe muita gente que reage com o fígado a cada título recebido pelo o ex-presidente? Eis a ironia. Quem reclama é justamente o pessoal pouco afeito às coisas do conhecimento: os “sábios” das redes sociais, os comentaristas dos blogs e, claro, essa petty bourgeoisie com canudo, que se acha superior (sem o ser, claro). É triste, mas na maioria dos casos estamos a falar de gente que tem um certo desprezo pelas letras.

Lula parece ser duro de engolir. E há pelo menos três pontos a destacar. 1. Mesmo que o discurso seja de negação, a prática mostra um indisfarçável ódio de classe. 2. Há uma excessiva veneração dos títulos acadêmicos no Brasil. Afinal, ao longo da história, quando os mais pobres não tinham acesso à universidade, o diploma tornou-se fator de distinção social. 3. Há o preconceito contra um homem que nasceu na pobreza e chegou à presidência.

Episódios ridículos se sucedem. Um dos mais recentes ocorreu na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), que pretendia atribuir o título ao ex-presidente. Um juiz mandou suspender a entrega da distinção, num claro atropelamento das regras de autonomia das universidades. E foi mais longe. Ordenou que a Polícia Federal estivesse presente para impedir o evento. Isso é tão terceiro-mundo.

Ora, é preciso respeitar. Lula já recebeu títulos em algumas das mais renomadas instituições do mundo, como a Universidade de Coimbra, a Universidade de Salamanca ou o Instituto de Estudos Políticos de Paris. O Sciences Po, como é conhecida a escola francesa, por exemplo, foi fundado em 1871 e desde então só atribuiu esse grau honorífico a 16 pessoas. Lula é o primeiro latino-americano. Não é para qualquer um.

Em qualquer país civilizado a atribuição dessas distinções encheria os cidadãos de orgulho. E Lula poderia mesmo contar com um republicano silêncio dos seus desafetos políticos. Mas no Brasil é diferente. O sucesso e o reconhecimento internacional do ex-presidente soam quase como ofensa. É o gatilho que espoleta as reações dos “odiadores”, gente que transformou o ódio em vocação.

É a dança da chuva.