terça-feira, 25 de abril de 2017

Bolsonaro e uma geração intelectualmente inútil

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Falar sobre Jair Bolsonaro é um tema enfadonho. Devo ter escrito um ou dois textos, feito uma ou outra citação. E só. Porque tenho uma posição clara sobre o putativo candidato à presidência: nenhum país cometeria a tolice de eleger um beócio como Bolsonaro para a presidência. As pesquisas mais recentes revelam que ele não consegue ultrapassar a barreira dos 10% nas intenções de voto. Mas – porque tem sempre um “mas” – estamos a falar do Brasil. Um dia destes tropecei nuns “bolsominions” e deu vontade de analisar.

Diz a sabedoria ancestral que o preço da liberdade é a eterna vigilância. É bom que a sociedade não se distraia. E há pelo menos um motivo para preocupação: uma geração perdida. Tenho lido – e o quotidiano confirma – que os seguidores do deputado são jovens entre os 18 e os 35 anos (e também uma molecada que sequer vota, mas cultua o “mito”). É uma geração intelectualmente inútil. Aliás, se houver alguma utilidade, será como objeto de estudo.

Quem são? No caso da molecada, tenho lido e ouvido que são aqueles caras para os quais ninguém liga na escola (as meninas, principalmente). E viram rebeldes... “porque sim”. Todos sabemos que a adolescência é um tempo de opções esquisitas. No entanto, ver adultos a apoiar Bolsonaro – alguns na universidade e alguns até com diplomas na parede – faz doer o cérebro. Não é preciso ser um neurocientista para concluir que alguma coisa atrapalha os processos mentais dessa gente. É o fracasso das sinapses.

Deve estar aí a identificação. Porque Bolsonaro é o retrato do fracasso. 1. Não tem obra. É um deputado medíocre. 2. Não tem ideias. Falta consistência intelectual. 3. Não tem um discurso. É mal articulado. 4. Não tem um programa. Limita-se a uma meia dúzia de clichês moralistas mal amanhados. Enfim, é um político que só convence os idiotas. Neste caso, a idiotia é como o sarampo: infecciosa, viral, transmissível, contagiosa e comum na infância (infância mental, claro). Mas por sorte existe uma vacina.

Bolsonaro é um significante carente de significado. Os seus seguidores desempenham o papel de construir esse “mito”, transferindo para a sua imagem o que de pior lhes vai pela cabeça. É um coquetel de ignorância: misoginia, homofobia, agressividade, incapacidade de debater, ódio aos pobres, culto da violência, antidemocracia, negação do outro, anticomunismo primário, elogio das ditaduras etc. Tudo em Bolsonaro aponta para o retrocesso civilizacional.

Os “bolsominions” (a molecada e os que têm idade mental de criança) ganharam notoriedade porque representam uma espiral de irracionalismo. O país vive um movimento que se aprofunda, aprofunda, aprofunda... e nunca acaba. Os seguidores de Bolsonaro apostam no caos político e institucional. E representam uma desafio para a democracia. É aquilo que Karl Popper chamou “paradoxo da tolerância”. Ou seja, a democracia deve abrigar, no seu seio, os que desejam acabar com a própria democracia? Eis a questão.

É a dança da chuva.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Armas na faculdade? Não tem perigo...

POR ET BARTHES
Nos Estados Unidos, há estados onde os estudantes podem levar armas para a faculdade. É perigoso? Não. Porque a nova linha de roupas com coletes à prova de balas vem resolver esse problema. É claro que estamos a falar de uma brincadeira. Mas em se tratando de defensores de armas, que geralmente são mais lentos na compreensão dos fatos, é preciso explicar no fim: “isto é uma piada”.

O gestor partido ao meio

POR JORDI CASTAN
Italo Calvino é o autor da trilogia “O Barão nas Árvores”, “O Cavaleiro Inexistente” e “O Visconde Partido ao Meio”. São três historias divertidas e enriquecedoras que recomendo ler mais de uma vez. Difícil escolher uma das três, porque cada uma traz uma provocação. Gostei e recomendo “O Visconde Partido ao Meio”. É a história de um nobre que, no fragor de uma batalha contra os turcos, é partido ao meio por uma bala de canhão. E cada uma das duas metades segue tendo vida própria.


O livro é a historia de cada uma destas metades e do seu encontro. Na história, cada uma das metades carrega uma parte do visconde Medardo de Terralba. Numa, a sua bondade, raiando a estultícia; na outra, a maldade mais perversa. O livro relata a luta eterna entre o bem e o mal. Não é o meu objetivo fazer uma resenha do livro. Proponho fazer outra leitura, mas trocando o bem e o mal pela disputa imemorial entre a inteligência e a inépcia.

Desnecessário dizer que esta é uma luta desigual. Que já conhecemos o resultado e que lamentavelmente não há final feliz. Que o mocinho não vence e que a inépcia reina opípara nestas terras. Imaginemos, por um momento, que resultado de um acidente qualquer um suposto gestor - um piano a cair-lhe na cabeça, por exemplo - o dividisse ao meio, em duas metades idênticas. Numa, toda a inteligência. Noutra, toda a inépcia.


Imaginemos ainda que cada uma das metades tivesse vida e vontade própria. E que a metade tomada pela inépcia decidisse se candidatar a qualquer coisa. Suponhamos, para efeito de ficção, que optasse por ser candidato a prefeito da sua vila e que fosse eleito. A situação que os seus concidadãos enfrentariam a partir do dia seguinte à posse seria ter o suprassumo da inépcia à frente dos destinos da cidade. Ou seja, sem o mínimo de inteligência para se contrapor.

Ou seja, a cidade estaria sujeita a um prefeito inepto, que multiplicaria sua inépcia e a da sua gestão, se rodeando de outras pessoas tão ineptas quanto ele. Gente sem um pingo de bom senso e no estado mais embrionário da inteligência e do conhecimento. A vila iria cada dia mergulhando numa situação mais caótica e insustentável.

Esta situação extrema conduziria fatalmente ao crescimento do índice de necedade em todas as repartições e órgãos públicos. O inepto buscaria a companhia e o referendo dos seus iguais. A inteligência seria uma ameaça nessa terra de néscios. E seria banida, vista com um perigo. Imaginariam os seus concidadãos que exista outra metade vagando a esmo pelas ruelas da vila. Ficaria como última esperança, aos seus decepcionados eleitores, a ilusão que outro acidente fortuito juntasse um dia a duas metades. 

Não há um final feliz nesta história. Primeiro porque não está claro que exista de fato outra metade e que esta metade reúna toda a inteligência, conhecimento e sabedoria que falta à metade que foi eleita e governa a vila. Há, inclusive, quem acredite que não estaríamos frente a uma metade, senão que isso seria o todo e que a alegada inteligência nunca tenha existido. Que tenha simplesmente sido o resultado de uma campanha publicitária bem orquestrada, ou que seja um caso de hipnotismo ou até de alienação coletiva.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Odebrecht é o tema da semana

A Odebrecht é o tema do momento (faz tempo que não sai de cartaz). E hoje fazemos uma recolha de charges sobre o tema que têm circulado pela internet, em tempos mais recentes ou mais remotos. A recolha começa pelo Sandro Schmidt, o chargista da casa, e passa, por exemplo, pelo Frank Maia, um dos traços mais conhecidos do público catarinense. Os direitos autorais obviamente pertencem aos chargistas.

















O vampiro, a histeria e os criadores de baleias azuis

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
O que “M – o Vampiro de Dusseldorf” tem para ensinar? É, provavelmente, um dos primeiros casos - talvez o mais emblemático - em que o fenômeno da histeria coletiva é levado ao cinema. A trama, inovadora em 1931, ano de lançamento do filme, hoje estaria perdida em meio à banalidade de tantas séries criminais que pululam nas telinhas nossas de cada dia.

O filme é baseado na história verídica de um serial killer que viola e mata meninas. E serve também para mostrar a estreita linha que separa a realidade e o delírio. O caso assume contorno de mito, no sentido da falsificação perceptiva, e produz uma situação de histeria coletiva. Qualquer homem visto a conversar com uma criança pode ser acusado de ser o assassino.

A população da cidade (os fatos reais aconteceram em Dusseldorf, na Alemanha) entra em estado de paranóia. As denúncias são tantas que mais atrapalham que ajudam a polícia. A perda de racionalidade torna-se tão evidente que leva os bandidos da cidade a se juntarem na procura do tal “vampiro”, apelido pelo qual o assassino ficou conhecido.

Qualquer cinéfilo – daqueles realmente preocupados com a arte – deve ter tropeçado no filme de Fritz Lang, considerado por muita gente uma das 100 melhores produções cinematográficas de todos os tempos. Qualquer pessoa com sensibilidade para o social pode encontrar aí um motivo de interesse sobre o fenômeno da histeria coletiva.

É uma doença do inconsciente social. Dizem os especialistas que é mais comum em grupos, como, por exemplo, os trabalhadores de uma empresa, os seguidores de uma religião ou mesmo os alunos de uma escola. Mas, claro, numa situação limite também pode acometer populações inteiras, como mostra o filme alemão. E o que dizer da internet?

Uma pequena pesquisa permite saber que essa é uma patologia marcada por um elevado grau de ansiedade, pela perda de controle sobre as emoções e, em consequência disso, por atos inopinados. O pior de tudo é que essa histeria pode ser provocada de forma artificial, desde que haja o interesse em manipular os comportamentos.

Lembrem Edward Bernays, o sobrinho de Sigmund Freud, para quem a manipulação das massas era extremamente fácil. Numa escala ampliada, torna-se um fenômeno perigoso, como foi o caso do nazismo. Aliás, é um fenômeno muito bem descrito por Wilhelm Reich no seu “Psicologia de Massas do Fascismo”. A escalada do nazismo é o retrato de um delírio coletivo.

O leitor e a leitora devem estar a perguntar a razão deste texto. Simples. É que esta semana tive uma pequena discussão com algumas pessoas sobre a tal baleia azul. Tentei racionalizar, argumentar. Mas é impossível dialogar quando há tantos ruídos histéricos. E moralismo. Quem não cai na patranha é logo visto como insensível.

Há uma “vampirização” do fenômeno, mas em versão digital. As pessoas pegam numa mentira (nos dias de hoje conhecidas como “fake news”) e, pela reprodução nas redes sociais, fazem com que se torne realidade. Mesmo que não haja fatos a sustentar. O resultado é que pessoas podem morrer.

É a dança da chuva.

O ator Peter Lorre em cena do filme