segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O karaokê aqui do lado

POR JORDI CASTAN

Morar numa área residencial em Joinville está cada vez mais difícil. Aos poucos, as áreas exclusivamente residenciais estão sumindo. Aqui perto da casa há um karaokê que todas as noites fustiga toda a vizinhança com a cantoria dos seus clientes. Reclamar? Para quê? Para quem? A Fundema, a Seinfra e os demais setores responsáveis da Prefeitura autorizaram e deixaram de fiscalizar.

Que não cumpra a legislação municipal sobre silêncio parece não importar a ninguém. A Polícia Militar tem sido mais amável e, quando a coisa passa do ponto, especialmente nos finais de semana, depois de muita insistência, tem agido. O problema é tanto do som, que à noite se espalha muito mais e com maior nitidez, alcançando mais de 500 metros de raio, como o fato que o karaokê não tem nenhum tipo de controle de qualidade e permite que qualquer um possa fazer uso do microfone. Como resultado, os que pior cantam são os que mais tempo o fazem, gritam mais alto e perturbam a paz e o sossego dos que gostariam de dormir depois da meia-noite.

Pretender que se respeite o limite de decibéis depois das 22 horas já sei que é utópico em Joinville. Numa cidade que autoriza a construção de galpões, que posteriormente serão ocupados por indústrias, comércios e todo tipo de atividades barulhentas em áreas residenciais, que se pode esperar? Uma Joinville que se omite de fiscalizar - e que vai crescendo de forma desordenada - não é o melhor exemplo.

Quando a situação fica crítica de verdade, aprovam-se leis, com o nome do vereador autor da ideia, para regularizar tudo aquilo que foi executado em desconformidade com a legislação. Se concede, assim, uma ampla anistia e se perpetua a cultura do fazer errado e legalizar ou regularizar depois. Como resultado temos uma "lei Cardozinho", para regularizar tudo o que sabidamente foi feito de forma irregular. E agora se debate a necessidade de aprovar uma lei para regularizar tudo o que as igrejas, salões paroquiais e outras instituições assemelhadas fizeram de errado e em desacordo com a lei. E são essas instituições as que primeiro deveriam dar o exemplo.

Assim Joinville vai ficando cada dia um pouco pior, com ferro-velho ou galpões de reciclagem operando irregularmente na zona rural e, depois, servindo de motivo para regularizar o que é ilegal. Construções ocupam irregularmente recuos ou têm alturas superiores às permitidas, mas serão legalizadas pela bondade de uns e pagamento de uma taxa que os redimirá de todos os pecados.
A nova LOT avança neste caminho de propor uma cidade mais conflituosa.  De legalizar muito do que está errado, o que acaba incentivando a fazer o que deveria ser exceção, acaba se convertendo em regra e os infratores acabam beneficiados. Se hoje já é difícil, no futuro será impossível conviver com o barulho, os incômodos e o desconforto.

A única fiscalização que tem agido com firmeza e independência é a da Vigilância Sanitária. A fiscal Lia Abreu tem se convertido num exemplo de como deve ser a fiscalização. O resultado é que constantemente é punida pela sua eficiência. E o seu trabalho tem sido dificultado com frequência, sem veículos e sem motoristas a fiscalização fica de pés e mãos amarradas. Quem ganha com a falta de fiscalização? Joinville não, com certeza.



Em tempo, se algum vereador tiver interesse em elaborar um projeto de lei que regule a qualidade da cantoria nos karaokês e impeça a bêbados e desafinados cantar depois das 22 horas terá o meu apoio incondicional. Imaginar que algum dos nossos vereadores fiscalizará a fiscalização é um sonho. Assim, as leis seguirão sem ser cumpridas... e quase todos felizes.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

A xenofobia só atinge o pobre, o negro, o favelado?

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Após a experiência prática de algumas situações, e a leitura de manchetes de jornais (e seus respectivos comentários no facebook), encontro cada vez mais pessoas xenófobas. Segundo o dicionário Michaelis, xenofobia é a aversão a pessoas e coisas estrangeiras. Este fenômeno é crescente, e reproduz uma série de preconceitos. Entretanto, precisamos nos lembrar que a vida é um atuar migrante, uma adaptação às circunstâncias... e muitos esquecem-se disto.

Quando uma cidade quer controlar o seu crescimento populacional, por exemplo, é comum levantarmos notícias de Prefeituras que colocaram mendigos, profissionais do sexo, e demais pessoas pobres em ônibus e mandaram para alguma outra cidade, bem longe dali. Mas são as mesmas Prefeituras que querem mais empresas na cidade e mais executivos morando nela. Até que ponto a xenofobia atinge as mais altas classes de nossa sociedade?

A última onda xenófoba muito presente em nosso dia-a-dia atinge os haitianos. Após incentivos do governo brasileiro, vários deles estão vindo para o Brasil para ter uma vida diferente de seu país natal, que há décadas sofre com problemas políticos internos e uma grande desigualdade social. É um retrato muito parecido com a onda migratória dos anos 1800, quando alemães vieram para nossa região, fugindo do cenário catastrófico que estava a Alemanha pré-unificação. Ou semelhante aos italianos que vieram décadas depois, fugindo da Primeira Guerra e das poucas esperanças na Itália. São estes, inclusive, responsáveis por boa parte da herança étnica que temos aqui no sul do país, juntamente com os afro-descendentes, os ibéricos e a população indígena que aqui habita há muito tempo. Se olharmos mais recentemente, o forçado êxodo rural do século XX nas cidades brasileiras trouxe muita gente do interior para o litoral em busca de melhores oportunidades. O joinvilense médio não é o descendente germânico, mas, sim, uma mistura de várias etnias.

Os haitianos não vieram para invadir o país ou declararem guerra. Vieram para ter uma vida diferente e ocuparem postos de trabalho que geralmente não são ocupados por brasileiros. Há muitos municípios em que as Prefeituras locais criaram programas de atendimento específicos para estes migrantes, mas a população em geral ainda carrega um preconceito bobo, fantasiado de xenofobia. O executivo alemão que vem morar na região por causa da BMW não recebe o mesmo tratamento que o haitiano que expõe a sua trajetória de vida num jornal. O motivo: o primeiro é rico, o segundo é um "pobre coitado". Joinvilenses reproduzem há muitos anos piadas contra paranaenses, só pra citar um outro exemplo.

Infelizmente é uma praga que se espalha não só pela nossa cidade, mas por todas aquelas que sofrem grande crescimento demográfico. Dói demais escutar e ler pessoas com estes preceitos, esquecendo-se que, antes de mais nada, somos todos seres humanos nos adaptando às nossas diferenças, às nossas realidades, às nossas desigualdades. Somos todos migrantes em algum momento de nossas vidas, seja por nós mesmos ou nossos antepassados.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Outra vez o racismo

POR ET BARTHES

É ficção. Qualquer semelhança com personagens reais será mera coincidência.



“i”- “di”- “o” - “ta”

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A torcedora do Grêmio que chamou o goleiro Aranha de macaco é racista. Ponto final. É um fato captado pelas câmaras de televisão e não permite atenuantes. Não permite? Como sempre repito, no Brasil tudo o que é proibido é moderamente tolerado. E o caso ganhou contornos ridículos, porque houve muita gente a tentar “branquear” (a palavra é proposital) a imagem da moça.

Ora, há pessoas a dizer que, afinal, ela não é tão racista. Tive mesmo o desprazer de encontrar uma pessoa - torcedora do Grêmio, mas supostamente esclarecida - a defender que não foi um ato de racismo, mas um arroubo da juventude. É um daqueles absurdos que só se respondem com outro absurdo. E apliquei a Lei de Godwin (se não sabe o que é, a Wikipedia traz um verbete) para acabar logo com a discussão.

O gesto da moça não tem a ver com a idade ou o calor do momento. É racismo. É ignóbil. É escroto. É só olhar para a foto - essa que publico aqui - e ver que ofender o goleiro foi  uma questão de escolha. Enquanto a moça se esguela a repetir a palavra “ma”-”ca”-”co”, a loira do lado, que parece ter a mesma idade, permanece em silêncio. Aliás, sem ser um especialista em leitura de feições, parece que está incomodada.

Mas o absurdo só tende a piorar. E não é que tem gente da imprensa à espera de um encontro entre Aranha e a torcedora racista? Mas a ideia não é discutir o tema racismo de forma séria. O que se pretende é produzir um espetáculo, levantar as audiências. Uma música dramática, uma lagriminha no canto do olho, um abraço entre o goleiro e a torcedora. E pronto. O Brasil chora com a reconciliação. Não há mais racismo.

O bom nesse episódio é que Aranha não topou. Porque há o risco - ridículo, volto a repetir - de se desenhar um quadro invertido. A mocinha ainda acaba por se tornar heroína. E, se bobear, o goleiro ainda acaba virando o vilão dessa história. Enfim, mantenho a minha posição de primeira hora: aos racistas, sejam mocinhas simpáticas ou não, o rigor da lei. Sem contemplações.

É como diz o velho deitado: “i”- “di”- “o” - “ta”.