sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Entrevista no vestiário: mulher não entra

POR ANA RIBAS DIEFENTHAELER
Nasci torcedora do Grêmio, de Porto Alegre, por obra e graça de meu pai Francisco. Muito criança, ainda, servia de antena humana para ele ouvir os jogos do tricolor pelas ondas da rádio Guaíba, que só chegavam ao pequeno receptor a luz, lá na minha Santa Maria, por força de minha intervenção, por assim dizer, eletromagnética, segurando, durante o jogo inteiro, a  anteninha de arame.

Interessante começar a amar o futebol dessa forma, por pura imaginação das jogadas, ouvindo os comentários e xingamentos de meu pai e mentalizando cada passe, cada drible, cada cruzamento, sentindo disparar o coração a cada jogada mais perigosa, de “por pouco, muito pouco, pouco, mesmo”... E foi um tempo áureo, em que o Imortal foi heptacampeão gaúcho, impossível não se apaixonar... Era o Grêmio de Alcindo, o maior goleador da história do clube. E de Everaldo, como esquecer? Na copa de 70, Brasil tricampeão, lá estava nossa estrela dourada, primeiro gaúcho campeão mundial, recebido no Rio Grande como herói.

Mas, anos depois, quando cheguei à universidade, começou um hiato de décadas, entre este grande amor e eu. Envolvida em política estudantil, quase não falava de futebol que, para boa parte da minha turma, era um dos maiores fatores de alienação do povo brasileiro – a Copa de 1970, em plena ditadura militar, deixara graves sequelas ideológicas.

No entanto, lembro bem de uma menina, quando já começavam, nem assim tão alegremente, os anos oitentas. Repórter do interior gaúcho, um dia, me confidenciou que tentara, desesperadamente, ser deslocada para a editoria de esportes do jornal – e seu chefe, na terceira ou quarta tentativa, disse a ela, literalmente: “como é que eu vou mandar uma loira bonita dessas para entrevistar jogador no vestiário? E se um cara te estupra”?

A moça chorou e respondeu que um dia seria uma ótima repórter de campo. Mas voltou a fazer as pautas sobre educação e saúde. E nunca mais soube dela. Hoje temos várias jornalistas cobrindo futebol, comentaristas, juízas e bandeirinhas, uma liga feminina, excelentes jogadoras, entre elas a imbatível Marta, a melhor do mundo em exatas cinco premiações da FIFA.

Mas, nem tudo são rosas, para usar uma expressão quase politicamente incorreta. E um fato recente, envolvendo o técnico do arquirrival Internacional, hoje na série B, ressuscita antigas dores. Guto Ferreira, desconfortável com um questionamento da repórter Kelly Costa, da RBS TV, disse que não responderia com outra pergunta porque ela “é mulher e não jogou”. Pouco depois, pediu desculpas, mas o estrago já estava feito. Não. As mulheres, como em muitos redutos ainda quase exclusivamente masculinos, não se equiparam ao homem também no quesito futebol. E os salários? Ó...








Ana Ribas Diefenthaeler é gremista, 
jornalista e editora do blog
http://reticencias.etc.br

Sigam Janaína Paschoal: a diversão é garantida












POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Dizem que cada povo tem os heróis que merece. Faz sentido. Ou não seria possível explicar a popularidade da jurista Janaína Paschoal, uma das autoras do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Aliás, apenas esse fato é suficiente para que tenha angariado hordas de admiradores entre os paneleiros antipetistas. A própria professora não se preocupa em esconder o seu antipetismo.

E um dia Janaína Paschoal descobriu que as redes sociais – mais precisamente o Twitter – eram uma excelente forma de chegar ao mundo. Desde o primeiro tuíte nada mais segurou a senhora. Os micos locais ganharam tons internacionais. Mas revelou-se um problema. É que a ídola dos paneleiros é exatamente como uma panela num panelaço: faz muito barulho, mas é vazia de conteúdo.

Sei que não sou um dos seus “amados” (é como ela começa as mensagens), mas como habituée desta rede social tenho me divertido com as suas intervenções. A mulher é um pitéu. Não tenho certeza, mas parece que a estreia em micos internacionais foi quando afirmou que “com uma base militar na Venezuela, Putin estará a um passo de atacar o Brasil”. E não é blefe. “Estão rindo? Pois eu estou falando sério”, arrematou.

Aliás a Venezuela é uma obsessão de Janaína Paschoal. A cor vermelha também. Um dia destes, a falar na votação para a Assembleia Constituinte, a professora fez uma divertida ligação. “Maduro foi o primeiro a votar na eleição que impôs aos venezuelanos! Ele vestiu VERMELHO!(sic) Vermelho é a cor do PT. Eles são parte de um todo!”. Ah... é claro que ela tinha que ligar Maduro à república petista da cobra.

E a zoa maior veio nessa mesma altura, quando ela escreveu uma série de tuítes dirigidos a Donald Trump. Em inglês, claro, porque o presidente norte-americano é monoglota. A professora disse que Lula e Dilma são responsáveis pelo que se passa na Venezuela. E, para arrematar a coisa toda, acusou o atual inquilino da Casa Branca de ser responsável pela situação venezuelana, por sua omissão. Bomba neles? Não sei se Trump respondeu.

Enfim, para você que não tem conta no Twitter, eis uma recomendação. Corra já criar uma conta lá porque é muito divertido. Janaína Paschoal é garantia de diversão. Aliás, devo dizer que é como uma droga: viciante. Se fico dois ou três dias sem ler um tuíte amalucado da senhora começo logo a ressacar.




quarta-feira, 2 de agosto de 2017

É preciso oferecer cinema ao povo

POR DOMINGOS MIRANDA
A cultura é um produto supérfluo? Esta é uma pergunta recorrente em momentos onde o que mais se fala é cortar custos no serviço público. Mas a bailarina Ana Botafogo, diretora artística do Balé do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, que sofre na própria pele esta questão, esclareceu o assunto quando esteve em Joinville, no Festival de Dança. Para ela, “em tempos de crise, é a arte que sustenta o moral do povo sofrido”. E como todos sabem, Joinville é uma cidade onde o povão tem poucas alternativas de arte e lazer. O cinema, por exemplo, a cada dia que passa fica mais distante da massa.

A sétima arte ficou restrita às salas de exibição dos shoppings centers, com preços salgados para os trabalhadores. Um casal com dois filhos gastará em torno de R$ 100,00 numa única exibição de filmes. Os antigos cinemas se transformaram em igrejas ou simplesmente fecharam as portas. Há cerca de 10 anos o então vice-prefeito Rodrigo Bornholdt apresentou projeto de transformar as duas salas de cinema fechadas, onde hoje é o Big, em um cine popular, com ingressos a preços simbólicos. Era uma tentativa de oferecer arte às pessoas da periferia e que, infelizmente, não se concretizou.

Há experiências de sucesso neste sentido em outras capitais. Em Belém, no Pará, a prefeitura desapropriou o cinema mais antigo da cidade (que estava fechado) e começou a passar filmes de graça para a população. Em São Paulo, durante a gestão do prefeito Fernando Haddad, foram construídas 20 salas de exibição de filmes nos bairros. Não precisa dizer que a aceitação foi total. Há mais de duas décadas o grupo Titãs cantava a sua canção Comida: “A gente não quer só comida. A gente quer comida, diversão e arte”.

Para enfrentar estes tempos bicudos há que se buscar alternativas políticas, mas não apenas isso. É preciso oferecer novas formas de entender a realidade. E nada mais adequado para esta questão do que o cinema. Há um século o mundo viu a maior transformação ocorrida numa sociedade com a Revolução Soviética. Uma das ferramentas usadas pelas lideranças comunistas para conscientizar o povo sobre os novos tempos foi a sétima arte. Não por acaso que neste período surgiram os maiores diretores de cinema do mundo, como Eisenstein, Dziga Vertov, Vsevolod Pudovkin e tantos outros.

Não seremos tão pretensiosos de propor uma revolução, mas levar cinema ao povo de Joinville fará uma grande diferença. Assistir filmes como Central do Brasil, O Carteiro e o Poeta, Cinema Paradiso, Diários da Motocicleta, As Vinhas da Ira ajudam a levantar o moral de quem está afogado em problemas. Oferecer cinema ao povo é mais do que lazer, é um remédio para a alma. Está nas mãos do prefeito dar este presente à nossa sofrida gente.

terça-feira, 1 de agosto de 2017

Venezuela: onde todos brigam e ninguém tem razão

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
É difícil acompanhar os acontecimentos na Venezuela, em especial em tempos de forte turbulência. Limito-me a seguir com interesse as informações que chegam através da comunicação social (com desconfiança, admito). Mas uma notícia recente chamou a atenção por ser muito peculiar. A Assembleia Nacional, que tem maioria da oposição, aprovou a nomeação dos novos juízes do Tribunal Supremo de Justiça.

Olhando à distância parece estar tudo bem. Mas não. De fato, a oposição nomeou um tribunal paralelo, com a missão de dar um chega para lá na Assembleia Constituinte proposta pelo presidente Nicolás Maduro. Confuso? Fica pior. A notícia dava a entender que a coisa era séria mas, apesar de todo o aparato montado, a nomeação parece ter sido um gesto simbólico da oposição. É tudo muito insano.

Mas os juízes do Tribunal Supremo de Justiça, o que está no poder, subiram nas tamancas e não quiseram saber de brincadeiras. Os magistrados classificaram o ato como fora da legalidade e advertiram que poderia levar os outros juízes – os do Supremo da oposição – para a prisão. Uma matéria no jornal “El Nacional”, que está longe de ser favorável a Nicolás Maduro, fez uma cobertura como se tudo fosse mesmo a sério.

Este exemplo serve para mostrar que o país está um caos e que resta pouca serenidade. O futuro tende a ser ainda mais difícil para a Venezuela e os venezuelanos. O atual presidente sectariza posições e demonstra não querer largar o osso. A oposição, que conta com a benevolência da imprensa mundial, também não está para os ajustes. O país parece estar à beira do abismo e pronto a dar um passo em frente.

Vista ao longe, a Venezuela parece terra de ninguém. Ou melhor, terra de dois poderes políticos antagônicos, cada uma a viver sob o seu próprio código (o episódio do TSJ não é um acaso). Depois da votação do último domingo, é certo que o país passe a viver definitivamente sob as regras de dois tipos de poderes diferentes. O pior é que ambos carentes de legitimidade. Enfim, como diz o ditado, em casa que falta pão todos ralham e ninguém tem razão.

É a dança da chuva.

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Militantes e simpatizantes: os que vão à luta e os que ficam no sofá



POR JORDI CASTAN
A situação de abulia, marasmo e inação que Joinville atravessa exige cidadãos mais militantes e menos simpatizantes. Pessoalmente, sempre fui militante. Durante anos a fio participei de assembleias, reuniões, visitei moradores nas suas casas, distribui folhetos, convidei pessoalmente para audiências públicas, charlas e palestras. Nunca me furtei a participar. Fiz e faço com entusiasmo, dedicação e comprometimento.

Durante todo este tempo de militância defendendo uma cidade melhor, com mais verde, foco na sustentabilidade e com maior qualidade de vida impressionava-me o fato que houvesse tanta gente que apoiasse nosso movimento e as iniciativas que dele se originavam. Gente que me dizia a cada nova ação: "desta vez, espero que ganhemos!", "vai fundo, escreve, bota a boca no trombone", "continuem assim". Ou os que, com entusiasmo ainda maior, declaravam seu apoio irrestrito aos nossos pleitos. Mas não faziam nada.


Com um pequeno grupo de militantes voluntários,  distribuíamos cartazes, panfletos e participávamos das reuniões. Os que militamos por uma Joinville e por um país melhor temos uma palavra que define exatamente a essas pessoas que têm a mesma esperança e desejo que nós mas que não agem, porque não têm a mesma vontade que nós. São os que chamamos simpatizantes.

O que é um simpatizante? São os que, como nós, esperam e desejam a vitória. Ora, esperar a vitoria não custa nada, todos a esperamos e a desejamos ardentemente. Mas os simpatizantes renunciam a fazer algo para que essa vitória possa se concretizar. Em quanto o militante age, o simpatizante se omite. Tanto uns como outros tem a mesma esperança na vitoria. A diferença não esta na esperança, o que diferencia uns dos outros é a vontade e a ação.

As pessoas que fazem que as coisas mudem não são as que esperam, mas as que lutam. Sobram em Joinville simpatizantes das boas causas, aos que carinhosamente vou denominar militantes de sofá, ativistas de rede social. Mas faltam militantes com vontade e ações para mudar esse desastre em que estamos mergulhados.

O desafio que hoje temos como sociedade é assumir um lado e fazer aquilo que depende de nós. Ou seja, fazer aquilo que pode ser feito, partir da esperança inativa para a vontade ativa. Enfim, Joinville só está como está porque sobram simpatizantes e faltam militantes.