O que “M – o Vampiro de Dusseldorf” tem para ensinar? É, provavelmente, um dos primeiros casos - talvez o mais emblemático - em que o fenômeno da histeria coletiva é levado ao cinema. A trama, inovadora em 1931, ano de lançamento do filme, hoje estaria perdida em meio à banalidade de tantas séries criminais que pululam nas telinhas nossas de cada dia.
O filme é baseado na história verídica de um serial killer que viola e mata meninas. E serve também para mostrar a estreita linha que separa a realidade e o delírio. O caso assume contorno de mito, no sentido da falsificação perceptiva, e produz uma situação de histeria coletiva. Qualquer homem visto a conversar com uma criança pode ser acusado de ser o assassino.
A população da cidade (os fatos reais aconteceram em Dusseldorf, na Alemanha) entra em estado de paranóia. As denúncias são tantas que mais atrapalham que ajudam a polícia. A perda de racionalidade torna-se tão evidente que leva os bandidos da cidade a se juntarem na procura do tal “vampiro”, apelido pelo qual o assassino ficou conhecido.
Qualquer cinéfilo – daqueles realmente preocupados com a arte – deve ter tropeçado no filme de Fritz Lang, considerado por muita gente uma das 100 melhores produções cinematográficas de todos os tempos. Qualquer pessoa com sensibilidade para o social pode encontrar aí um motivo de interesse sobre o fenômeno da histeria coletiva.
É uma doença do inconsciente social. Dizem os especialistas que é mais comum em grupos, como, por exemplo, os trabalhadores de uma empresa, os seguidores de uma religião ou mesmo os alunos de uma escola. Mas, claro, numa situação limite também pode acometer populações inteiras, como mostra o filme alemão. E o que dizer da internet?
Uma pequena pesquisa permite saber que essa é uma patologia marcada por um elevado grau de ansiedade, pela perda de controle sobre as emoções e, em consequência disso, por atos inopinados. O pior de tudo é que essa histeria pode ser provocada de forma artificial, desde que haja o interesse em manipular os comportamentos.
Lembrem Edward Bernays, o sobrinho de Sigmund Freud, para quem a manipulação das massas era extremamente fácil. Numa escala ampliada, torna-se um fenômeno perigoso, como foi o caso do nazismo. Aliás, é um fenômeno muito bem descrito por Wilhelm Reich no seu “Psicologia de Massas do Fascismo”. A escalada do nazismo é o retrato de um delírio coletivo.
O leitor e a leitora devem estar a perguntar a razão deste texto. Simples. É que esta semana tive uma pequena discussão com algumas pessoas sobre a tal baleia azul. Tentei racionalizar, argumentar. Mas é impossível dialogar quando há tantos ruídos histéricos. E moralismo. Quem não cai na patranha é logo visto como insensível.
Há uma “vampirização” do fenômeno, mas em versão digital. As pessoas pegam numa mentira (nos dias de hoje conhecidas como “fake news”) e, pela reprodução nas redes sociais, fazem com que se torne realidade. Mesmo que não haja fatos a sustentar. O resultado é que pessoas podem morrer.
É a dança da chuva.
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O ator Peter Lorre em cena do filme |