POR FILIPE FERRARI
Caso você não tenha estado em animação suspensa na última semana,
com certeza acompanhou a vitória da judoca brasileira Rafaela Silva, que lhe
garantiu o primeiro ouro brasileiro nas Olimpíadas do Rio.
Foi um feito que realmente emociona, principalmente por conta da
trajetória da atleta, que foi qualificada enquanto “épica” pela BBC Brasil, e
que é um grande exemplo de superação, principalmente depois do resultado da
judoca em Londres, e dos ataques racistas que ela sofreu por conta disso. A
história de Rafaela realmente é uma história de superação, nos mais diversos
sentidos.
Entretanto, ao invés da pura e simples comemoração, o que se seguiu
nas redes sociais foi uma guerra ideológica de apropriação da trajetória da
atleta. De vencedora do racismo, a bolsista do governo, passando pelo apoio
inefável do exército, até mesmo a exemplo da mais fatídica meritocracia que
pode existir nesses nossos ermos tupiniquins.
Essa reação à vitória de Rafaela é um reflexo da radicalização pela
qual o Brasil bem passando. Direita, esquerda, centro, acima e abaixo tentam,
de alguma forma, utilizar-se da luta e da trajetória de alguém para reafirmar
conceitos e discussões políticas rasas que tem preenchido cotidianamente as
timelines alheias.
Independente do olhar que se lance sobre a trajetória de Rafaela,
importante seria pensar o porque tal trajetória ainda é digna de nota dentro de
um país rico como o nosso, e pensar em maneiras de proporcionar caminhos nos
quais ninguém mais precise ser exemplo, ser discurso a ser encampado por
correntes ideológicas mais preocupadas em satisfazer o próprio ego do que
realmente proporcionar transformações.
Em todo esse quiproquó online, que menos se notou foi o sorriso e a
satisfação da mulher humilde, negra, sargento, atleta, moradora da Cidade de
Deus, da qual desconhecemos talvez 99% da sua história de vida. A alegria foi
ofuscada pelo emparelhamento político e ideológico radicalizado que vem
fincando raízes cada vez mais profundas na realidade brasileira.