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Será? |
POR FELIPE SILVEIRA
Há 51 anos, no dia 1º de abril, o dia da mentira, as tropas do general Olímpio Mourão Filho chegaram ao Rio de Janeiro para desferir o golpe militar que jogou o Brasil em uma sangrenta ditadura de 21 anos. Jango, o presidente e chefe das Forças Armadas, poderia ter liquidado a marcha golpista, já que militares legalistas, sobretudo da Aeronáutica, haviam se oferecido para fazer o trabalho. O presidente não quis porque não queria ver o sangue de brasileiros derramado em uma guerra civil.
A data do golpe é primeiro de abril, o dia da mentira, apesar da resistência de seus adeptos, que tentam mentir emplacar a mentira do 31 de março. Leia aqui o texto de Mário Magalhães.
Mais do que nunca é preciso discutir a ditadura civil-militar (1964-1985). A maior tragédia que aconteceu aos brasileiros teve muitos responsáveis que ficaram impunes e essa impunidade tem consequências que sofremos diariamente. Precisamos conversar, discutir, debater e refletir sobre o assunto, para que tenhamos, enfim, condições de superar o trauma e avançar em nossa democracia.
Talvez uma das mais visíveis consequências da ditadura é a violência que tanto atormenta a sociedade brasileira. Uma violência alimentada dia e noite pela truculência das autoridades policiais, sobretudo a polícia militar (mas sem isentar a civil, que também é muito violenta). Uma violência alimentada também pelas desigualdades sociais que se acentuaram no período ditatorial, cuja política econômica esvaziou o campo e inchou os centros urbanos.
O que foi plantado à época se colhe hoje, em 2015, quando avança no Congresso a proposta de emenda constitucional 171, que visa a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Um congresso extremamente conservador, com diversos defensores do regime militar, que não vão cansar enquanto não afundarem ainda mais o Brasil. Ou seja, não basta terem feito a cagada. Querem tornar a violência ainda pior, encarcerando os jovens do país em um sistema penitenciário degradado de degradante, que engole pessoas e as devolve, quando as devolve, ainda pior.
Combater a desigualdade, principal causa da violência, eles não querem, e ainda fazem de tudo para evitar o combate. Foi isso que fizeram em 64, quando golpearam o povo brasileiro que avançava em reformas estruturais e democratizantes. Aqueles que tentavam mudar o país foram assassinados, sequestrados, torturados, espancados e pressionados a desistirem. O forte movimento de trabalhadores que lutavam pelas reformas e por melhores salários foi calado.
Então, se você é filho ou neto de operários naquela época, saiba que a vida da sua família poderia ter sido bem melhor em termos econômicos se não tivesse havido a ditadura. Se você é filho ou neto de migrantes do campo para a cidade, saiba que a vida da sua família foi fortemente afetada pela ditadura. Nossos pais e avós tiveram que abandonar o campo e vir para a cidade “com uma mão na frente e outra atrás”, se desfazendo da pouca terra que possuíam, para trabalhar em sub-empregos e morar no mangue.
É curioso notar que os defensores da ditadura se orgulham da política econômica do período, do tal “milagre econômico”. Uma mentira, pois o tal milagre gerou uma imensa dívida externa cuja conta veio a partir dos anos 80, quando os militares, claro, largaram o osso. O “milagre” da ditadura registrou um PIB médio menor (aumento de 6,29% ao ano) do que o PIB dos anos anteriores de Brasil democrático (aumento de 7,12% ao ano).
Depois de 51 anos de golpe e 30 de retomada da democracia, engatinhamos em avanços e corremos o risco de retroceder a galope. Não é fácil se livrar de 21 anos de extrema violência e propaganda enganosa, que deixou muitos privilegiados com pomposos lucros e status. Eles que hoje clamam por um novo golpe e reagem, como à época, a qualquer medida democratizante e contra a desigualdade.
Obs.: O título do texto faz referência ao livro de Paulo Francis, “30 anos esta noite”, publicado em 1994. O autor, a partir de suas memórias, fala sobre o golpe e sobre a ditadura que jogou o Brasil na valeta. Recomendo a leitura.