segunda-feira, 9 de março de 2015

11 mortes e somando...

POR JORDI CASTAN


O prefeito anda irritadiço, transpira nervosismo. As suas postagens nas redes sociais revelam frustração, responsabilizam a conspiradores e inimigos, mais imaginários que reais, pelo resultado pífio do seu governo. A sua frustração com os resultados obtidos  se esconde em frases triunfalistas e carregadas de positivismo, com as que enche o twitter a cada manhã. Não deveria surpreender se até o fim do mandato não publica um livro de autoajuda com uma recompilação das melhores frases e com recursos do Simdec. Um livro que facilmente seria um campeão de vendas entre assessores e comissionados.

Um dos temas em que o prefeito tem mostrado especial sensibilidade é com o planejamento. Ou melhor, com a falta dele. É fácil e rápido fazer uma lista de todos os casos em que o planejamento tem falhado, não cumpre prazos, estoura o orçamento e não tem alcançado os resultados pretendidos. Mais esforço exigiria identificar alguma obra ou ação que tenha sido bem planejada e executada corretamente.

Um dos episódios mais emblemáticos do elevado custo desta falta sistemática de planejamento é a duplicação da Santos Dumont. O início das obras sem desapropriar as áreas a duplicar, sem recursos para desapropriar e sem previsão para fazê-lo foi o primeiro erro. Na ânsia de querer mostrar serviço, vimos o foguetório que o prefeito de hoje criticou nos mandatários que o antecederam. Ou as mudanças de mão, reprovadas pela população desde o primeiro momento e que o tempo provou terem sido mal avaliadas - e, pior, planejadas -, além dos aumentos de custo ao orçamento original.


A falta de projetos detalhados e precisos, ainda hoje não há certeza de qual será a melhor solução no entroncamento entre a avenida Santos Dumont e a Rua Tuiuti. O prefeito, em lugar de reconhecer os erros, insiste em ver conspiração no que não é mais que pura incompetência. Há quem ache que isso tudo é falta de "geston". Que maldade confundir uma com a outra. O prefeito deveria aproveitar as primeiras horas da manhã para ler mais. Uma sugestão seria ler Thomas Jefferson, pois encontraria frases como esta: "Quando um homem assume uma função pública, deve considerar-se propriedade do público." Quem sabe assim ficasse menos irritadiço e mais humilde.

Em tempo, desde que iniciaram as obras de duplicação já houve 11 mortes. E as únicas certezas até agora são que a conclusão ainda vai demorar muito e que o número de mortes não vai parar em 11.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Lia Abreu, cadê você?

POR SALVADOR NETO

Talvez venha a ser mais um daqueles mistérios insolúveis da província, mas jornalista impertinente que sou, ouvidor das ruas e das gentes que a percorrem dia após dia na luta pela vida, e por serviços e estruturas públicas de qualidade, parodiando o Salsicha, companheiro de Scooby Doo, personagens dos desenhos animados, e também o grande poeta Castro Alves em seu poema Vozes D’África, questiono:

Lia Abreu, cadê você? Onde estás que não respondes? Será que interditaram para sempre sua voz? Será que te disseram “Porque te calas?”, e você aceitou? 
Cerca de um mês atrás postei em minha página pessoal no Facebook uma pequena nota sobre o afastamento de Lia Abreu, fiscal sanitarista reconhecida pela firmeza, e por vezes dureza, com que fazia seu trabalho de fiscalizar. Governadores, Prefeitos, Secretários, e os áulicos que os cercam, reclamavam das interdições que ela determinava diante do quadro deplorável de muitas escolas, estaduais e municipais, em Joinville (SC). Fui bombardeado pelo cordão dos puxa-sacos, dependentes de cargos públicos e partidários de ocasião.


E isso porque apenas perguntava: “Pergunta que berra aos ouvidos da imprensa, e ela não corre atrás: onde anda a fiscal sanitarista Lia Abreu? Afastada? Não mais? Onde está o contraditório? Cadê a apuração e continuidade da matéria, ouvir secretária, a fiscal, o básico do jornalismo? Os pagadores de impostos querem saber o que houve, porque há escolas por aí que precisam ser fiscalizadas, e ela é uma servidora deste público que paga impostos... Porque te calas grande imprensa da província?”

Muitos defenderam o afastamento porque ela foi “acusada”, e seria para não “atrapalhar” as investigações (?). Ou seria o objetivo principal o linchamento moral, a perseguição dura e direta para ser ver livre de um calo que incomoda a muitos poderosos? Quem sabe outro motivo teria sido impedir que várias escolas sem as mínimas condições de receber os alunos, fossem interditadas? Aliás, outra pergunta sem resposta: quantas  escolas foram visitadas, fiscalizadas, e se foram, por quem, e quantas até hoje? Lia Abreu, cadê você?

Ontem, quinta-feira (5/3), sai nota na coluna do jornalista Jeferson Saavedra, em A Notícia, que disse o seguinte: “A Prefeitura de Joinville abriu sindicância contra a fiscal da Vigilância Sanitária, Lia Abreu (foto), por supostamente agir de forma “intimidadora” durante as vistorias nas escolas estaduais. Ela também não teria tido “bom senso” em suas manifestações. Ela terá prazo para se defender. Lia foi suspensa por 60 dias no final de janeiro.” Que tal? Preparando terreno para o golpe final? Ou seria uma chantagem emocional? Pressão? Coação?

Notem que agora, depois do “afastamento”, vem a “sindicância”, por ela agir de forma “intimidadora” (?). E tem mais: faltaria à fiscal sanitarista “bom senso”. O que seria bom senso? Talvez deixar escolas ruírem na cabeça das crianças e jovens da maior cidade de SC? Proporcionar aos estudantes a maravilha de utilizar banheiros químicos porque banheiros das unidades não funcionavam? Deixar que curtos circuitos colocassem em risco a vida de muita gente, ou que os estudantes levassem guarda-chuvas para dentro das salas por chover mais dentro que fora da sala de aula?

Lia Abreu, cadê você? Onde estás que não respondes? Ou será que não foram te perguntar nada, os tais veículos de comunicação? Nós do Chuva Ácida perguntamos sim, quais as razões para teu afastamento, agora um processo de sindicância? Funcionária pública concursada, com extensa carreira de serviços prestados à comunidade que paga impostos e deseja ver a coisa pública funcionando como deveria, você precisa dar a sua versão dos fatos. Porque a Prefeitura vem dando em doses homeopáticas em colunas dos jornalões.

Nós, que pagamos impostos que pagam salários dos servidores, Prefeitos, Governadores, Secretários, e também dos áulicos do poder, queremos saber o que se esconder por trás destes silêncios ensurdecedores. Porque as escolas continuam a espera da ação dos governantes para sua recuperação, da mesma forma que obras de infraestrutura que só servem para discursos fáceis e conquistas de votos. Depois, esperem, é o que nos dizem.


O tempo da mordaça acabou há 30 anos. Assim como a população respeitava o seu trabalho de fiscalização – menos os atingidos por ela – ela agora precisa te ouvir e saber a verdade. Desinterdite a sua voz Lia Abreu. A sociedade aguarda ansiosa.


quinta-feira, 5 de março de 2015

Melhor não perguntar.


Neopolitizados contra tudo

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Não há como fugir ao poder das redes sociais. Se os meios de comunicação social tradicionais monopolizavam a mediação da informação, hoje esse espectro ficou muito alargado. Para o bem e para o mal. O lado bom é que a circulação de discurso tornou-se mais democratizada. O lado mau é que, frente a um volume enorme de inputs, muitos patinam na hora de fazer uma gestão coerente da informação.

Um dos resultados deste novo quadro é o surgimento dos neopolitizados (neologismo que circula por aí). Quem são? Pessoas que antes estavam arredadas das trocas discursivas e agora encontram lugar de expressão pública nas redes sociais. O problema é que, em expressivo número de casos, os neopolitizados limitam-se a ser “contra tudo isso que está aí”. Ou seja, há apenas a rejeição moralista daquilo que consideram errado.

Como caracterizar essas pessoas? Sem querer fazer sociologia, há coisas óbvias. A rede social mais popular no Brasil é o Facebook, com quase 90 milhões de usuários (pessoas que acessam pelo menos uma vez por mês). Um dado interessante é o acesso por faixas etárias, que revela uma distribuição quase equânime entre os 25 e 54 anos (o público vai até aos maiores de 65 anos).

O que é possível concluir? Ora, muitas dessas pessoas foram criadas nos tempos da ditadura ou apanharam os seus eflúvios. E há coisas que demoram a desaparecer. Ainda hoje algumas influências dos anos de chumbo parecem interferir no inconsciente social. É o que permite, por exemplo, explicar a existência de pessoas que pedem a volta da ditadura e clamam pelo fim da democracia.

Tendo sido criados num sem ambiente de liberdade de expressão, muitos sentem dificuldade em compreender o debate e o ato de esgrimir argumentos. Reclamam, reclamam e reclamam. E limitam-se a isso, pois a indignação fica reduzida ao chorume nas redes sociais. Discursos erráticos e rezingões não produzem mudanças.

É como diz o velho deitado: se você está contra tudo, então não está contra coisa alguma.



quarta-feira, 4 de março de 2015

Vai, Udo, na contramão do mundo!

Clima não é problema para os bicicleteiros de Copenhague
POR FELIPE SILVEIRA

Não esqueço de uma resposta do então candidato Udo Döhler durante a campanha à prefeitura. O tema era mobilidade urbana e Udo respondeu de bate-pronto: 300 km de asfalto. Essa era a proposta do empresário para um dos temas mais complexos e debatidos da política do nosso século.

Estava ainda no início da corrida eleitoral e acredito que Udo tenha dado respostas melhores até ser eleito. Mas, pra mim, aquela resposta foi bem representativa sobre o candidato da elite econômica da cidade. Um homem despreparado para a política do século 21, que adentrava ao jogo para seguir uma tradição da dominação econômica e política local.

O problema é que essa velha política ganhou o espaço que precisava nos últimos dois anos e tem deixado pra escanteio temas relevantes e que estavam mais avançados em um passado recente. Como o caso das políticas públicas em prol da bike como meio de transporte.

O trânsito de Joinville está cada vez pior e a gestão municipal tem uma enorme parcela de responsabilidade. Um exemplo: o atual governo deixou a cidade sem estacionamento rotativo até hoje, o que gera um caos em busca de lugar para estacionar no centro da cidade. Os donos dos estacionamentos privados é que se deram bem na história. Sem contar a questão do transporte público (que deixa empresas de outros homens da elite econômica operar um serviço público sem devido processo licitatório), sem contar que não há novidade alguma para quem opta pela bike como meio de transporte, sem contar que não se faz o debate sobre o assunto. Também pudera. Na campanha, Udo disse que no futuro todo mundo vai ter carro. Deve pensar que não importa o resto.

Enquanto isso, carros (veículos a motor em geral) seguem como um dos fatores que mais contribui para a poluição do planeta. Além de outros malefícios, como o alto número de acidentes de trânsito e os gastos com saúde por causa do trânsito (por causa da poluição ou por causa de acidentes).

Udo vai na contramão de grandes cidades do mundo que já passaram pela experiência do foco no transporte individual. Cada vez mais cidades da Europa e dos Estados Unidos fecham seus centros para carros e desenvolvem políticas de incentivo ao uso da magrela no dia a dia. Enquanto Boston derruba elevados, aqui ainda estamos tentando arrumar dinheiro para construí-los. Enquanto Londres limita a circulação de carros na área central, aqui incentivamos cada vez mais. Enquanto Copenhague integra a bicicleta ao ônibus, aqui sobrecarregamos os motoristas com a dupla função de cobrador.

As desculpas para não usar a bicicleta são muitas, mas as soluções são fáceis e conhecidas. Por exemplo, empresas podem instalar vestiários com chuveiros para funcionários se trocarem, além de estacionamento para as bikes de funcionários e clientes. O governo pode atuar para diminuir a velocidade média dos carros, com radares (oi, Udo) e campanhas de educação no trânsito. Também é preciso investir em vias para ciclistas em determinados casos. Integrar a bike ao transporte público também é fundamental, assim como gerar empregos perto dos locais de moradia das pessoas, diminuindo as distâncias que precisam ser percorridas.

É preciso colocar a bike na agenda novamente. Tratar a mobilidade urbana com a cabeça no século 21, com benefícios para as pessoas, e não com ideias ultrapassadas, elitistas, maquiadas como planejamento para o futuro.


Abaixo, um vídeo do projeto Cidade para Pessoas sobre a política de mobilidade urbana adotada em Copenhague, que a transformou em referência no assunto. Vale muito a pena ver: