quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

A esquizofrenia nossa de cada dia


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO


Se eu tivesse que escolher o personagem do ano, não teria dúvidas: é Thamsanga Jantjie, o cara que apareceu como tradutor de sinais nas cerimônias do funeral de Nelson Mandela. Depois de ter sido apanhado pela fraude o homem alegou ser esquizofrênico e ouvir vozes. Para mim Jantijie é o símbolo da esquizofrenia que ataca a humanidade.

E nem era preciso ir muito longe para encontrar exemplos. Há uma certa esquizofrenia nessa tendência de beatificação do próprio Nelson Mandela. Afinal, parece que o homem não tinha inimigos (nem mesmo os que o prenderam por décadas), quando muitos dos países que lá estiveram representados foram coniventes com a sua prisão e o regime do apartheid. Falou-se de paz e ignorou-se a sua defesa da luta armada.

E por falar em armas, eis outro sintoma de esquizofrenia. Se olharmos para o mundo vamos ver a Rússia, que vende armas ao regime Bashar-al-Assad, enquanto as potências ocidentais municiam os opositores do regime sírio. E poucas coisas podem ser mais esquizofrênicas do que ver o assassinato de 1.300 pessoas com armas químicas que, segundo (não) sabemos, tanto podem ser do governo quanto da oposição.

Mas viajemos até ao Brasil. Tem gente que sai aí pelos meios de comunicação ou pelas redes sociais a gritar “cadeia para os mensaleiros”, mas assobia para o lado e faz ouvidos moucos quando ouve palavras como Siemens, Alstom, metrô, helicóptero, cocaína ou tucanoduto. É um dos sintomas da esquizofrenia: ela faz ver coisas ou faz ver apenas o que se quer.

E em Joinville, que mais parece uma Casa Verde (para quem conhece Simão Bacamarte)? Ninguém entende o que se pretende com a tal LOT. Uma pessoa é flagrada em ato corrupção e condenada a umas horinhas de trabalho comunitário. Um moleque de 16 anos chefia o tráfico de drogas num bairro da cidade. O prefeito diz publicamente que a corrupção diminuiu e ninguém pergunta que raio de corrupção é essa. Um vereador processa uma cidadã que o criticou. A cidade ainda se excita com chaminés, como se vivesse no século XVIII. E mais, muito mais.

Portanto, a esquizofrenia, na figura de Thamsanga Jantjie, que tanto podia ser sul-africano quanto brasileiro, é a personagem do ano.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Mudar tudo para que nada mude

POR JORDI CASTAN


Mudar tudo para que nada mude.

Aproxima-se o final do ano. Encerra o primeiro ano da gestão do prefeito Udo Dohler e a cada dia que passa é mais difícil identificar diferenças com gestões anteriores. Claro que um observador atento poderá facilmente provar que o discurso é distinto, que a imagem construida pelos marqueteiros e a assessoria é outra. Mas quanto mais avança, mais fica parecida com todas as gestões anteriores, menos aquela que deveria ter servido de modelo e referência, a do empresário Wittich Freitag. Mas essa é outra historia.

Inaugurado o pomposo trinário formado pelas Ruas Timbó, Max Colina e XV. O prefeito anuncia depois de uma caminhada de poucas quadras pela Rua Timbó que serão feitas obras de melhoria na maioria das ruas que cortam a Rua Timbó. Para o contribuinte fica a duvida. Foi inaugurado incompleto? Faltou concluir? Como o prefeito informou que as novas obras serão custeadas com os recursos que “sobraram” do orçamento da Rua Timbó, a dúvida do contribuinte aumentaP porque fica difícil entender como pode ter sobrado dinheiro numa obra que se alastrou mais que a construção das catedrais góticas da Europa medieval, e que parou várias vezes por falta de recursos.
 
A impressão é a de que para não atrasar mais a obra do trinário a obra foi entregue incompleta e agora as obras que faltam estão sendo apresentadas como “melhorias”. Em tempo, o número de acidentes nas ruas do trinário mereceria atenção especial da imprensa e ação imediata dos órgãos de planejamento e de trânsito do município. Se foi o IPPUJ foi que planejou e o ITTRAN que é responsável pelo trânsito, é provável que para os seus responsáveis tudo tenha sido executado a perfeição e não haja nada para melhorar. As oficinas mecânicas, as empresas de guincho e as companhias de seguro e principalmente os moradores da região podem ter opinião diferente.



Em tempo, é difícil entender por que em lugar de construir uma ciclovia decente, o projeto previu três ciclofaixas incompletas, que em alguns trechos concorrem com os ônibus, em outros simplesmente desaparecem para voltar a aparecer alguns metros mais adiante e continuam sem oferecer a segurança que os ciclistas precisam. Mas tentar entender a lógica das ciclofaixas em Joinville só é possível se analisado desde a perspectiva de que a quantidade de quilômetros prevalece sobre a qualidade do traçado e a segurança para os ciclistas.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Há menos corrupção em Joinville?

POR JORDI CASTAN

No meu post de semana passada, A corrupção nossa de cada dia,  neste mesmo espaço o tema era a percepção da corrupção. Como o brasileiro percebia a corrupção e o desempenho do Brasil em comparação com outros países. As conclusões não eram as melhores: o Brasil não esta bem e o brasileiro percebe.

Quase que no mesmo dia, o prefeito Udo Dohler declarou, na ACIJ, que a corrupção na Prefeitura Municipal de Joinville era menor no seu governo. A afirmação foi notícia e se o prefeito, além da sua percepção, apresentasse dados concretos, deveríamos parabenizar a atual gestão municipal.

O problema é que o prefeito parece estar se referindo à sua percepção ou expressando unicamente sua opinião. E aí a afirmação muda de figura e perde força.

O único caso noticiado pela imprensa de corrupção na Prefeitura Municipal de Joinville foi a detenção em flagrante de uma fiscal da Seinfra. É bom lembrar que a ação foi resultado da denúncia do empresário que estava sendo achacado. A detenção e a ação da Polícia Federal não foi o resultado de nenhuma auditoria interna da prefeitura, assim que não seria correto agora que alguém do governo quisesse se promover às custas de uma denúncia e da ação da polícia.

Fica devendo o prefeito Udo Dohler. Dizer com dados e mostrando casos concretos onde reduziu a corrupção? Em que setores? Que processos? Quais os funcionários envolvidos que foram identificados e eventualmente punidos? Porque confundir a sua percepção com a realidade é perigoso. Seria o equivalente a confundir realidade e fantasia.

Ao afirmar que a corrupção diminuiu, também afirma não só que ela continua existindo, afirma que antes havia mais. A infeliz afirmação joga na vala comum muitos funcionários probos, que, com motivo, querem saber em que setores, que secretarias, que fundações ou que institutos se escondem os corruptos. Se agora há menos que antes, então faltou dizer o que foi feito. Quem foi demitido, quem sofreu processo disciplinar ou foi remanejado. A sensação que acaba prevalecendo é que a afirmação do prefeito é vazia, uma frase retórica e que sem provas e dados concretos é só uma frase de efeito.

Outra opção é a de que, existindo mesmo corrupção na administração municipal, os corruptos foram identificados e medidas foram tomadas, mas a sujeira foi colocada em baixo do tapete e ninguém ficou sabendo. Qualquer uma das opções não é nada boa para Joinville e projeta mais sombras que luzes sobre uma administração que assumiu com imagem de honesta e moralista e que ainda esta devendo respostas concretas nesse quesito.

A corrupção diminuiu? Conte mais senhor prefeito, todos gostaríamos de saber. Quem? Quando. Onde? Quanto? Mais que gostar de saber, temos o direito de saber.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Isso não é gente de Joinville

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Quando mudei para a cidade houve uma coisa que me chamou logo a atenção: a expressão “ser de Joinville”. No princípio pensei que tivesse alguma coisa a ver com o processo de colonização, que encheu a cidade de sobrenomes cheios de consoantes a indicar uma “linhagem” europeia.

Mas foi suficiente pouco tempo para perceber o que a expressão realmente queria dizer: era apenas a mentalidade provinciana (sempre) em construção. O “ser de Joinville” significava, antes de tudo, a recusa do outro. Ou seja, a recusa da diferença. A pequena burguesia local queria apenas parar o tempo mental da cidade. E tem conseguido pelo menos atrasá-lo.

No seu “Mitologias”, o pensador francês Roland Barthes dá uma contribuição para entender o que se passou em Joinville ao longo das últimas décadas (e podemos recuar muito no tempo). Diz ele que a pequena burguesia produz uma espécie de fascismo que é usado pela burguesia, os reais donos do poder econômico.

Barthes defende a tese de que o “pequeno burguês é um homem impotente para imaginar o outro. Se o outro se mostra diante de si, o pequeno-burguês cega, ignora-o, nega-o, ou então transforma-o nele próprio. No universo pequeno burguês todos os fatos de confrontação são fatos reverberantes, todo o outro é reduzido ao mesmo”.

É por isso que a pequena burguesia joinvilense tem dificuldades em assimilar os imigrantes pobres, o homossexuais, os libertários, os disruptores, os que lutam na defesa dos seus interesses. Porque para essa pequena burguesia que “é de Joinville”, o outro só existe se for um “igual”. Se não for um igual torna-se pária.

O que significa, então, “ser de Joinville”? Não é uma coisa geográfica. É cultural. Ser de Joinville significa ser gente "ordeira, honesta, trabalhadora" e, principalmente, que fica quietinha no seu lugar e não provocar ondas. O que, convenhamos, só responde aos interesses dos que têm tirado proveito da cidade ao longo dos tempos, de forma legítima ou não.

Mas isso não esconde o fato de que a cidade vive da virtude pública e do vício privado. Por isso, quando a pequena burguesia entra numa onda sair aí pelas redes sociais a dizer que “isto é Joinville”, talvez seja melhor tomar cuidado. Porque se as pessoas olharem a cidade à lupa há o risco de abrir um armário cheio de esqueletos.