sábado, 14 de abril de 2012

Se esta rua fosse minha...


POR GILBERTO PIRES GAYER


Uma das principais lembranças da minha infância e adolescência foi, sem dúvida, a qualidade de vida que ainda pude desfrutar pelas ruas de Porto Alegre, nos anos 60 e 70. Além da sensação de segurança, que ao contrário de hoje, tranquilizava a população. me lembro bastante do verde e das áreas ainda não ocupadas do nosso bairro e região. Na rua que morávamos existia um túnel verde de cinamomos, dos dois lados da via, em que subíamos e que cada guri tomava posse, construindo uma pequena cabana de papelão no seu entroncamento principal. Era ali que brincávamos por horas, observando quem passava, jogando as frutinhas dos cinamomos nos pedestres e fazendo um tiroteio entre a gente.

Mas o que é importante é que são muitas e muitas ruas em vários bairros bem arborizadas. Lembro-me até das amplas calçadas que rachavam em torno dos enormes jacarandás, timbaúvas, tipuanas e cinamomos, mas que ninguém reclamava, pois a beleza e frescor que ofereciam eram mais importantes.
Vieram-me a lembrança estas recordações quando há alguns meses circula pelas redes sociais e noticiários o título de “rua mais bonita do mundo” para a Rua Gonçalo de Carvalho, em PoA, e que conheço bastante. Na realidade, como falei, é apenas uma das tantas que existem por lá. Por mobilização dos seus moradores contra o projeto de um estacionamento que iria remover algumas de suas tipuanas, a associação de moradores se mobilizou e conseguiu reverter a situação. Este fato ganhou notoriedade, até em blogs e associações da Espanha e Portugal, sendo que daí surgiu a denominação e o título de rua mais bonita do mundo.

Hoje a Gonçalo de Carvalho tem um blog com notícias ambientalistas, sobre o planejamento e qualidade de vida da rua e do bairro www.goncalodecarvalho.blogspot.com.  Ganhou também status de Patrimônio Ambiental pela Prefeitura de Porto Alegre, fato que erradicou de vez qualquer ameaça da especulação imobiliária naquela rua, mesmo com o valor dos imóveis subindo surpreendentemente em razão da notoriedade que alcançou.



Posto isto, é irremediável tentar fazer comparações hoje com Joinville,  cidade que me adotou há 20 anos. Para começar, as calçadas dos bairros em Porto Alegre tem no mínimo 4 metros de largura (enquanto em Joinville não passam de 2 metros), o que pode proporcionar a implantação de uma arborização eficiente, com árvores de médio e grande porte. A Prefeitura mantém, há pelo menos 50 anos, viveiros onde produz e mantém mudas adaptadas as suas condições locais.  Existe corpo técnico e estrutura funcional para fazer a gestão das mais de 1,5 milhões de árvores públicas da cidade. Há pouco mais de 10 anos elaboraram o primeiro Plano Diretor de Arborização, baseado num amplo inventário urbano e observações ao longo de décadas, e que norteia as políticas públicas de gestão sobre o tema.


Mas acima de tudo, dois aspectos são fundamentais para alavancar a gestão de áreas verdes de uma cidade: a questão cultural de seu povo e a vontade política de fazer isto acontecer.

É primordial planejar e replanejar a arborização viária estabelecendo ações interativas solidárias com a comunidade que permitam manter a apropriação técnica com interesses, utilidades práticas e necessidades de uso.

É necessário promover a arborização como elemento de reforma e desenvolvimento urbano, buscando tecnologias alternativas para a convivência harmoniosa com os demais serviços prestados à população, através do estabelecimento de parcerias e convênios entre instituições de pesquisa e órgãos públicos envolvidos com a problemática da arborização (SANCHOTENE, 2000).

Joinville tem ainda uma caminhada bem longa em termos de arborização pública; mas como trata-se de investimento de médio e longo prazo, temos que começar logo.  


Gilberto Pires Gayer é Engenheiro Agronomo formado na UFRGS e trabalha na FUNDEMA há 17 anos, atualmente cedido para a SEINFRA.     

Imprensa comprada e a anencefalia


sexta-feira, 13 de abril de 2012

PARAÍSO


Edir Macedo sugere parar de usar internet

POR ET BARTHES


Mais uma da série das patuscadas promovidos pelos teleprofetas da Teologia da Prosperidade. O bispo Edir Macedo consegue uma façanha incrível: falar mais besteiras por minuto. Compara bebês recém nascidos a carros novos para sustentar seu argumento de que a vida só muda quando o espírito divino entra em você, coerente como só ele consegue ser. Em seguida, demonstra todo o seu conhecimento do vernáculo pátrio transformando o plural de senhor feudal em senhores "feudaus", além de não entender que os senhores feudais eram da Europa e não se apoiavam no trabalho escravo. Além de outras sandices, por fim ele sugere aos seus seguidores que deixem de acompanhar notícias e de acessar a Internet. Estará o latifundiário-mor da Universal com medo de ser desmascarado?


A sociedade do espetáculo e as máscaras

POR AMANDA WERNER

Foi-se o tempo em que éramos apenas hedonistas. Em que cultuávamos o prazer como premissa suprema da felicidade. Agora é preciso mostrar para o outro que temos momentos prazerosos o tempo todo. O “ter” e o “ser” ficaram para trás. Agora basta “parecer”.

A preocupação de, com muito esforço, adquirirmos bens e renda capazes de suprir necessidades futuras foi substituída por uma crescente preocupação em mostrar tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que nos torna melhores do que as outras pessoas. E, na medida que pensamos estar nos diferenciando, nos uniformizamos.

Hoje é importante fazer caridade, mas o mais importante é mostrar que o estamos fazendo. Teve até um caso recente na televisão local, onde a pessoa disse ter sido “acidentalmente” fotografada alimentando um animal faminto e abandonado na rua. Como somos bons. E ricos… e felizes.

Informamos ao nosso público, o tempo todo, onde estamos, com quem estamos e o quanto conseguimos comprar.

As festas de casamentos com despesas homéricas, custeando todos os novos “tem que ter” onde, por muitas vezes, por trás dos imponentes arranjos de flores e suntuosos vestidos de noiva existem recém-casados morando com os pais por conta das dívidas impagáveis, geradas pela tão sonhada festa. Por vezes verdadeiros casamentos de Chantilly (quem não se recorda do famoso casamento em um castelo na França, cuja duração não passou de três meses)? Mas este não é o propósito do texto. O casamento foi apenas um exemplo.

Aquele que pode comprar um carro zero por ano, o faz com tranquilidade. Enquanto aquele que não pode, na tentativa de ser igual muitas vezes não mede as consequências e se sacrifica para tal. Ou ainda, vive frustrado por não conseguir corresponder às expectativas.

Tomemos a superexposição nas redes sociais como outro exemplo. O Facebook (face – rosto) é o rosto que se quer mostrar. O problema de haver plateia para tudo é que acabamos por regular a nossa conduta de acordo com o que o público espera. E agimos como atores de nós mesmos, fazendo uma representação dramática da vida ideal.

Desse modo, desempenhamos papéis de forma a produzir impressões desejadas pelo público circunstante. E corremos um risco muito grande de perder a identidade. Esse novo jeito de interação social acaba por moldar o nosso comportamento. E, de repente, não sabemos mais quem somos.

O escritor francês Guy Debord já dizia: somos a sociedade do espetáculo. Nossa consciência adquirida socialmente se sobressai. Afinal, só conseguimos tomar consciência das pessoas que somos com o auxílio das outras pessoas. E a formação da nossa autoimagem nem sempre tem relação com fatos objetivos.

O risco desse tipo de conduta é nos pautarmos em fatos que nem sempre correspondem à realidade. É pensarmos que o conceito de felicidade não comporta dor, tristeza ou solidão. Afinal, não conseguimos mais ficar sozinhos, mandamos mensagens de texto o tempo todo, estamos sempre conectados na redes sociais. E mais: podemos dispor das pessoas à hora que quisermos, e até excluirmos alguém quando essa pessoa não mais nos agrada. É assim na vida real?

É possível que estejamos fabricando a nossa própria infelicidade. Como avatares de nossa própria vida, acreditamos e nos satisfazemos emocionalmente com nossas ilusões, não nos preparando para a vida de verdade. Será essa a nova vida real? As coisas são de fato o que parecem ser? A famosa indagação ainda vive: ser ou não ser? Eis a questão.