POR GILBERTO PIRES GAYER
Uma das principais lembranças da minha
infância e adolescência foi, sem dúvida, a qualidade de vida que ainda pude
desfrutar pelas ruas de Porto Alegre, nos anos 60 e 70. Além da sensação de
segurança, que ao contrário de hoje, tranquilizava a população. me lembro
bastante do verde e das áreas ainda não ocupadas do nosso bairro e região. Na
rua que morávamos existia um túnel verde de cinamomos, dos dois lados da via,
em que subíamos e que cada guri tomava posse, construindo uma pequena cabana de
papelão no seu entroncamento principal. Era ali que brincávamos por horas,
observando quem passava, jogando as frutinhas dos cinamomos nos pedestres e
fazendo um tiroteio entre a gente.
Mas o que é importante é que são
muitas e muitas ruas em vários bairros bem arborizadas. Lembro-me até das
amplas calçadas que rachavam em torno dos enormes jacarandás, timbaúvas,
tipuanas e cinamomos, mas que ninguém reclamava, pois a beleza e frescor que
ofereciam eram mais importantes.
Vieram-me a lembrança estas
recordações quando há alguns meses circula pelas redes sociais e noticiários o
título de “rua mais bonita do mundo” para a Rua Gonçalo de Carvalho, em PoA, e
que conheço bastante. Na realidade, como falei, é apenas uma das tantas que existem
por lá. Por mobilização dos seus moradores contra o projeto de um
estacionamento que iria remover algumas de suas tipuanas, a associação de
moradores se mobilizou e conseguiu reverter a situação. Este fato ganhou
notoriedade, até em blogs e associações da Espanha e Portugal, sendo que daí
surgiu a denominação e o título de rua mais bonita do mundo.
Hoje a Gonçalo de Carvalho tem um blog
com notícias ambientalistas, sobre o planejamento e qualidade de vida da rua e
do bairro www.goncalodecarvalho.blogspot.com. Ganhou também status de Patrimônio Ambiental
pela Prefeitura de Porto Alegre, fato que erradicou de vez qualquer ameaça da
especulação imobiliária naquela rua, mesmo com o valor dos imóveis subindo surpreendentemente
em razão da notoriedade que alcançou.
Posto isto, é irremediável tentar
fazer comparações hoje com Joinville, cidade que me adotou há 20 anos. Para começar,
as calçadas dos bairros em
Porto Alegre tem no mínimo 4 metros de largura
(enquanto em Joinville não passam de 2 metros ), o que pode proporcionar a
implantação de uma arborização eficiente, com árvores de médio e grande porte.
A Prefeitura mantém, há pelo menos 50 anos, viveiros onde produz e mantém mudas
adaptadas as suas condições locais.
Existe corpo técnico e estrutura funcional para fazer a gestão das mais
de 1,5 milhões de árvores públicas da cidade. Há pouco mais de 10 anos
elaboraram o primeiro Plano Diretor de Arborização, baseado num amplo
inventário urbano e observações ao longo de décadas, e que norteia as políticas
públicas de gestão sobre o tema.
Mas acima de tudo, dois aspectos são
fundamentais para alavancar a gestão de áreas verdes de uma cidade: a questão
cultural de seu povo e a vontade política de fazer isto acontecer.
É primordial planejar e replanejar a
arborização viária estabelecendo ações interativas solidárias com a comunidade
que permitam manter a apropriação técnica com interesses, utilidades práticas e
necessidades de uso.
É necessário promover a arborização
como elemento de reforma e desenvolvimento urbano, buscando tecnologias
alternativas para a convivência harmoniosa com os demais serviços prestados à
população, através do estabelecimento de parcerias e convênios entre
instituições de pesquisa e órgãos públicos envolvidos com a problemática da
arborização (SANCHOTENE, 2000).
Joinville tem ainda uma caminhada bem
longa em termos de arborização pública; mas como trata-se de investimento de
médio e longo prazo, temos que começar logo.
Gilberto Pires Gayer é Engenheiro
Agronomo formado na UFRGS e trabalha na FUNDEMA há 17 anos, atualmente cedido
para a SEINFRA.