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segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Os homens que não amam as mulheres













POR CECÍLIA SANTOS

Um jornalista e uma hacker investigam o desaparecimento misterioso da sobrinha de um milionário há 20 anos, e no caminho desvendam uma série de assassinatos de mulheres cometidos com requintes de sadismo, pelo mero prazer de matar. Várias das vítimas são prostitutas de países do Leste Europeu, mulheres de quem “ninguém vai sentir falta”, segundo um dos assassinos. É a trama do primeiro livro da Trilogia Millenium, do autor sueco Stieg Larsson, cujo título é “Os homens que não amavam as mulheres”. 

Eu não quero falar sobre a chacina de Campinas, mas sobre como homens que comentam em redes sociais e portais de notícias estão encontrando justificativas para o assassino, ressuscitando o velho crime de honra, culpando a vítima pela morte premeditada e covarde de toda uma família.

São comentários de embrulhar o estômago. Há homens que defendem a submissão da mulher, outros colocam a mão no fogo pelo assassino quanto à acusação de que ele teria abusado sexualmente do filho. Isso é que é camaradagem entre machos.

Mas, segundo muitos, o grande culpado pela chacina é o feminismo. No balaio de sérias deturpações da realidade contidas nas cartas deixadas pelo assassino (que mistura a política nacional, o sistema prisional, os impostos e os direitos humanos), o ódio do assassino de Campinas não é dirigido apenas à ex-mulher, mas às mulheres que a apoiaram.

E eu sinto muito, mas é justamente isso que o feminismo faz: nós nos apoiamos umas às outras, fazemos o possível para que mulheres não sejam assassinadas, acolhemos as que sofrem violência e lutamos todos os dias contra a opressão de gênero. É até constrangedor explicar que o feminismo não quer colocar as mulheres acima dos homens, quer apenas que os homens parem de nos matar.

Não somos nós que destruímos famílias, o que destrói é a prepotência dos homens que não aceitam que as mulheres sejam tratadas como pessoas com direitos, vontade própria e autonomia. É compactuar com a misoginia dos amigos e relativizar ou justificar o feminicídio.

Os agressores de mulheres e feminicidas não são monstros, são apenas filhos saudáveis do patriarcado, gente que você encontra no elevador, no trabalho, na igreja, no bar, que até parecem ser bons maridos e pais de família, mas que, quando contrariados, são apenas homens que não amam as mulheres.

Tragédia em Campinas: “Chega!! Ela tem que pagar pelo que fez”















POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um dos danos colaterais do mundo digital é que os idiotas ganharam voz. Ok... numa democracia eles também têm direito à expressão. É democrático, mas perigoso. A idiotia espalhada pelos facebooks, twitters ou mesmo nos comentários de blogs acaba virando uma mantra no qual muitos se reveem. E repetem. Todas essas vozes juntas ganham uma ressonância que faz parecer um discurso, quando é apenas algaravia. 

Tudo isso para falar no terror em Campinas e no homem que matou a ex-mulher, o filho e mais 10 pessoas durante a passagem de ano. Como quase sempre acontece nos casos de suicidas, o cara deixou uma carta. Os manuais de redação ensinam que não se deve publicar o conteúdo de bilhetes ou cartas de suicidas. Mas neste caso faz sentido. Afinal, o homem demonstra ter um perfil muito próximo do que se tem nas redes sociais. 

Era mal informado. “... na verdade já estou preso na angustia da injustiça, além do que eu preso, vou ter 3 alimentações completas, banho de sol, salário, não precisarei acordar cedo pra ir trabalhar”.

Era alienado. “Cadê os ordinários dos direitos humanos? Estão sendo presos por ajudar bandidos né? Paizeco de bosta”.

Era machista. “A vadia foi ardilosa e inspirou outras vadias a fazer o mesmo com os filhos, agora os pais quem irão se inspirar e acabar com as famílias das vadias. As mulheres sim tem medo de morrer com pouca idade”.

Era violento. “...vou levar o máximo de pessoas daquela família comigo, pra isso não acontecer mais com outro trabalhador honesto”.

Era louco de pedra. “Agora vão me chamar de louco, más quem é louco? Eu quem quero justiça ou ela que queria o filho só pra ela? Que ela fizesse inseminação artificial ou fosse trepar com um bandido que não gosta de filho”.

Pensava ser honrado (mais que os outros). “Eu morro por justiça, dignidade, honra e pelo meu direito de ser pai!”.

O assassino tem um perfil igual ao de milhares de pessoas que, todos os dias, inoculam desinteligência no espaço digital. E forma-se um caldo de cultura de intolerância, iliteracia e ódio. O pior é que essa gente de bem crê ter uma moralidade acima dos outros. Nem é preciso ir longe: lembram do assassino do ambulante do metrô, que disse não ser “má pessoa”? Eis o perigo. Há uma óbvia corrosão dos valores. 

Culpa das redes sociais? Claro que não. Há outros fatores, claro. Mas é inegável que elas são o espelho de uma sociedade cada vez mais débil e dominada pela ignorância. Porque a cultura do ódio tornou-se parte do código genético das redes sociais. E transportam um risco potencial. Porque, como escreveu o assassino, “na verdade somos todos loucos, depende da necessidade dela aflorar!”.

É a dança da chuva.


Reação típica dos lunáticos da cultura do ódio. Um culpa a esquerda, outro quer armar a população