POR CLÓVIS GRUNER
Em seu último texto, o Charles Henrique listou alguns dos
eventos bizarros que marcaram a semana em Joinville e região. Gostei da ideia,
nacionalizei os parâmetros de busca e inspirado no Stanislaw Ponte Preta, decidi
listar o meu próprio Febiapa, o Festival de Bizarrices que Assola o País. A
lista, claro, não é definitiva. Bizarrice é como ônibus em Joinville: sempre
cabe mais um.
ERA PRA SER UM FESTIVAL DE ROCK – Mas virou um samba do
crioulo doido. Pode ser purismo, mas mesmo com o showzaço do Bruce Springsteen é
difícil engolir Beyoncé e Justin Timberlake.
“Ah, mas o Brasil é um país rico e eclético musicalmente, então é super normal ver
a Ivete Sangalo no Rock In Rio”. Tudo bem, mas então por que ninguém chama o Iron
Maiden para tocar no carnaval da Bahia?
Pelo menos o espírito rebelde do rock esteve presente na
noite em que tocou o Capital Inicial. Claro, já não se fazem discursos como
antigamente, mas ninguém tem culpa do Dinho Ouro-Preto não ter a mesma
eloquência, sei lá, de um Renato Russo. A ironia é que no auge do Brock, os
anos de 1980, o Capital era uma banda meio coadjuvante; quem frequentava a
primeira divisão eram a Legião Urbana, Ira!, Titãs. Mas como as bandas da
primeirona ou acabaram ou viraram caricaturas de si mesmas, inesperadamente sobrou
ao Capital encarnar nos palcos o que restou da década. É foda cara, diria Dinho
Ouro-Preto. Eu acho bizarro.
UM PARTIDO PARA OS “HOMENS DE BEM” – Cansados de passar os
dias de pijamas lendo Reinaldo Azevedo, os militares decidiram que é hora de
colocar o bloco na rua e estão empenhados na viabilização do Partido Militar Brasileiro (PMB).
E que ninguém os acuse de serem despretensiosos: “100% democrática”, a sigla
pretende mandar menores infratores para a cadeia, garantir o porte de armas
para homens de bem (não dizem nada sobre as mulheres) e instituir a prisão
perpétua. E se depender do PMB, beneficiados pelo Bolsa Família não votam – talvez
o primeiro passo para a volta do voto censitário.
O embasamento teórico do novo partido vem da fina flor do
pós-estruturalismo. Diz a cartilha do PMB que o “filósofo Michel Foucault
pregava a segregação das pessoas nocivas à sociedade, para evitar que elas
viessem a cometer novos crimes, protegendo a população de bem”. O PMB jura que
está tudo lá no “Vigiar e punir”, o mesmo livro onde, segundo Reinaldo Azevedo,
Foucault defendeu que “o castigo físico é preferível
às formas que entende veladas de repressão postas em prática pelo estado
moderno”. Eu nunca li nada disso em Foucault, apesar de conhecer toda a sua
obra. O PMB e o “tio Rei” ou não conhecem ou não entenderam Foucault, apesar
da referência. São desonestos ou ignorantes, portanto. Bizarros, de qualquer forma.
“UM CHUTE NOS BAGOS INFRINGENTES” – Foi assim que o Sandro
definiu a aprovação dos tais “embargos infringentes” em mais um episódio do maior julgamento da
história do mundo de todos os tempos. Claro, quem levou o tal chute
foi o Joaquim Barbosa, mas os sacos doeram Brasil afora. Não se contendo de
tanta indignação, o joinvilense Roger Robleño postou em seu Facebook foto de
uma página da biografia de José Dirceu onde ficamos a saber que ele e o ministro
Celso de Mello dividiram um quarto em alguma república, ainda estudantes.
Talvez na ocasião Dirceu lhe trouxesse quitutes sempre que retornava das
visitas à família no interior e agora lhe cobra o favor. Robleño também
simulou espanto com a falta de coerência do ministro, mas bastaria uma googlada
para lembrar que Celso de Mello foi bastante coerente em seu voto: ele já havia
afirmado, em 2012, ser favorável aos réus recorrerem do julgamento, se
necessário, lançando mão justamente dos embargos infringentes, previstos no regimento do STF.
Mas nenhuma reação repercutiu como a das atrizes globais que
postaram foto no Instagram, em gesto rapidamente copiado pela família da ex-É o
Tchan Carla Perez. E o que era pra ser um protesto, foi rapidamente transformado em piada. Além do exagero, há mais em comum na indignação de Robleño e do elenco da
novela das nove: seletiva, ela revela o baixíssimo nível de informação de seus
protagonistas. Bastaria ler o editorial da Folha de São Paulo
sobre o assunto, um jornal que desde a ditadura civil
militar já ofereceu carros e credenciais o suficiente para provar que não faz
parte de nenhuma conspiração lulo-petista para
acabar com o Brasil. Por que, em tempos onde informação não é mais monopólio
de alguns poucos e o acesso é não apenas relativamente fácil como
democrático, há quem prefira brincar de Teletubbies, é algo que não sei
responder. Mas é bizarro. De novo, de novo: bizarro.
LEU A VEJA? AZAR O SEU – Saiu em
“O Globo” e repercutiu nas redes sociais: o governador Sérgio Cabral seria
alçado à condição de Ministro de Estado no início do ano que vem. Um assessor da
presidenta tratou de desmentir a informação, mas em se tratando dos arranjos
partidários, fico com o apóstolo Tomé: só acredito vendo. Em todo caso, antes
de se mudar de mala e cuia para Brasília, Cabral ainda nos deve resposta a
uma pergunta tão simples quanto vergonhosa: onde, afinal, está Amarildo?
Enquanto isso, Dilma foi à ONU,
onde discursou condenando a espionagem americana e exigindo maior
equidade no Conselho de Segurança. Nada de excepcional: ela fez
exatamente o que se espera de uma chefe de Estado que viu a soberania do país ser tripudiada pela arrogância de uma grande potência. A repercussão na
imprensa internacional foi positiva. O inglês The Guardian destacou: Brazilian president: US surveillance a ‘breach of international law’. O espanhol El
Pais foi na mesma direção: Rousseff condena las prácticas de espionaje ante las Naciones Unidas. E o francês Le Monde foi incisivo: A l’ONU, Dilma Rousseff qualifie l’espionnage américain d’“affront”.
A repercutir a fala da
presidenta, Veja preferiu ecoar uma combalida oposição: “Dilma critica EUA e
faz discurso na ONU de olho em 2014”, tascou a revistona, sem deixar muito
claro o que alhos tem a ver com bugalhos pois, até onde sei, os
embaixadores estrangeiros nas Organizações Unidas não votam nas eleições presidenciais brasileiras. No
ano passado outro periódico inglês, a revista The Week, chamou a Veja de “gossip
magazine”. Se trabalhasse em uma revista de fofoca, eu ficaria indignado.
Bizarro, muito bizarro!