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domingo, 21 de outubro de 2012

A decisão do dia 28


POR ÁLVARO JUNQUEIRA

Em 1989, analisando o embate eleitoral Collor x Lula, escrevi no jornal A Notícia um artigo intitulado “O caos com Collor e a ordem com Lula”. Foi a única vez que cometi o desatino de sugerir o voto no petista. E por que o fiz? Pela simples razão de que via em Collor um mal muitíssimo maior. Eleições muitas vezes nos colocam diante desse tipo de encruzilhada, obrigando-nos a votar no mal menor.

Como jornalista e sociólogo, jamais me aventurei pela seara das pitonisas que acreditavam poder prever o futuro, mas, qual um oráculo involuntário, cheguei a profetizar nesse texto que, em poucos meses, a massa desarticulada que idolatrava Collor iria abandoná-lo, mercê da impossibilidade de cumprir sequer as mais básicas promessas do candidato.

E ele se veria em meio ao deserto clamando: “Não me deixem só!”. Frase pronunciada por ele, ipsis literis, depois de ver frustrada a sua convocação para que o povo se vestisse de verde e amarelo, pusesse bandeiras nas janelas e fosse às ruas defendê-lo da ameaça do impeachment. Vejam o que disse o populista e demagogo Collor de Mello: "Nós temos que dar um sinal de que nós somos a maioria. Vamos inundar esse país de verde e amarelo. No próximo domingo saiam de casa com uma peça de roupa com uma das cores da nossa bandeira, exponham nas suas janelas toalhas, panos, o que tiverem com as cores da nossa bandeira, porque, assim, nós estaremos mostrando onde está a verdadeira maioria. A minha gente, o
meu povo, os pés descalços, os descamisados...".

Felizmente, recebeu como resposta milhares de pessoas vestidas de preto e, logo depois, milhões de caras-pintadas nas ruas.

Por que fiz essa viagem no tempo? Porque no segundo turno das eleições deste ano em Joinville a história parece estar se repetindo, e como já ensinou o péssimo profeta Marx, ela sempre se repete como farsa.

E qual é a farsa? Ela é fruto de uma onda nefasta que varre o mundo, reduzindo os padrões de cultura a níveis liliputianos, apequenando as exigências morais e cívicas dos aspirantes a detentores de poder e abastardando valores civilizacionais sedimentados em séculos de aquisições aluvionais. Hoje, lamentavelmente, vivemos numa sociedade do espetáculo. Nela, qualquer celebridade – seja um palhaço, um ex-BBB, um cantor, uma mulher-fruta pode aspirar e, muitas vezes conseguir, ser representante do povo.

Nessa sociedade do espetáculo, a qualificação vale menos do que o configuração (visual, estética, artística, esportiva, religiosa), a história de vida rende menos frutos do que a presença constante nas várias mídias (jornal, rádio, TV, púlpito), a comprovada capacidade de gestão é menos valorizada do que alguns diferenciais considerados politicamente corretos, como ser negro, mulher, de origem humilde, ter sido vítima de injustiças e por aí vai...

Exemplos? O negro Obama, o retirante Lula, a mulher Dilma, a verde Marina, o perseguido Mandela. Mesmo sem entrar no mérito das qualidades de cada um desses exemplos, é visível que em torno de cada um deles cria-se uma aura de santificação e inimputabilidade que praticamente impede que se faça um debate franco e aberto, onde as qualidades de cada um possam ser aferidas, pesadas e sopesadas. A força da marca que trazem estampada na testa dá-lhes uma vantagem imerecida, posto que lastreada numa
metafísica influente, repetida ad nauseam em todos os foros, todas as plataformas, todas as mídias, interrompendo o saudável fluxo das informações pró e contra. Atacar um desses ícones da sociedade do espetáculo é praticamente uma heresia.

Em Joinville, este ano, temos uma situação típica desse quadro de degeneração da coisa pública, de decomposição dos valores mais altos, de apodrecimento das estruturas morais que fizeram da cidade o modelo de comunidade que ela é hoje.

Temos, de um lado, aquele que, muito apropriadamente, o José Antônio Baço chamou de “candidato oba-oba”, e que eu chamo de candidato da saliva, de apóstolo do blábláblá, de promessinha irresponsável, de demagogo populista, de pastor de ovelhas obedientes, porque encantadas com seu palavrório vazio, oco, superficial, sem prumo, sem lastro na realidade.

Quando olho em seus olhos, tenho a mesma sensação ruim, aflitiva, incômoda que tinha ao olhar nos olhos do ensandecido Collor de 1989. Vejo a mesma convicção totalitária, daqueles que não enxergam uma sociedade plural, mas apenas rebanhos a serem tangidos e encaminhados ao que os pastores consideram o bom – e único - caminho.

De outro lado, temos um candidato que é a antítese mais completa dessa tal sociedade do espetáculo. Elenquemos um a um os requisitos necessários para brilhar nesse circo dos horrores e ele não preencherá nenhum. Não passa de um cidadão honesto, trabalhador, bem sucedido, branco, rico, do sexo masculino, ruim de palanque, fraco na TV, seco e pouco risonho na TV...

Mas será que Joinville, essa Joinville que ainda ostenta tantos problemas graves a serem sanados, precisa de um alegre animador de auditório ou de um bom administrador; de um pregador de mentiras confortáveis ou de um portador de verdades inconvenientes; de uma subcelebridade midiática ou de um gestor capaz de resolver os muitos entraves ao nosso desenvolvimento com qualidade de vida?

Esta é a encruzilhada que teremos à nossa frente no próximo dia 28. Há, sim, uma opção, mesmo para aqueles que no 1º turno não escolheram nenhuma das duas opções restantes. Que seja um voto pelo mal menor, sem problema. O importante é ter claro que à beira do abismo o passo à frente é um suicídio consciente. Um passo atrás, muitas vezes, serve para ganhar impulso.

Álvaro Junqueira é sociólogo e jornalista