As palavras têm poder e o uso estratégico da linguagem não é novidade na política. Os ciclos eleitorais têm o condão de revelar a semântica como uma arma poderosa. Uma palavra bem escolhida ou uma expressão bem articulada podem influenciar opiniões, direcionar narrativas e, em última instância, afetar o voto dos eleitores. Os norte-americanos são craques nisso. Quem não se lembra do “Yes, We Can”, na campanha de Obama? Ou o “sem medo de ser feliz” de Lula? São dois clássicos.
Os últimos dias foram pródigos em reviravoltas nos EUA. Saiu Joe Biden, entrou Kamala Harris. E tudo mudou, inclusive o uso da linguagem. Um exemplo recente é a tática dos democratas, que passaram a chamar Donald Trump de “weird” (estranhão) nas suas intervenções. A escolha da palavra não é aleatória. Há uma estratégia bem pensada por trás da ideia. Porque Trump é mesmo esquisitão. Ao longo dos últimos anos, os norte-americanos conviveram com o estilo doidão do ex-presidente. Mas lá em casa, sentados no sofá, os eleitores pensavam:
- Este tipo é mesmo estranhão.
O fato é que a coisa pegou. Porque só cola se houver alguma razão. O mais formidável é que a ideia da esquisitice contaminou também os eleitores de Trump (que, vale dizer, não são menos esquisitos). O fato é que a termo carrega conotações que podem dar uma chacoalhada na imagem do republicano. “Estranhão” sugere que ele é imprevisível, fora do comum e, de certa forma, desconectado da realidade convencional. E é fácil acreditar. O epíteto é muito eficaz em contrastar Trump com a imagem de estabilidade e normalidade que o país precisa.
No ambiente político, em especial nos EUA, as palavras são cuidadosamente escolhidas de forma a evocar reações emocionais e cognitivas específicas no eleitorado. Kamala Harris traz uma imagem de competência, firmeza e inovação. Ou seja, é o oposto de um Trump “estranhão”. Quando os democratas dizem que o opositor é esquisitão, a crítica não é apenas às suas políticas ou comportamentos específicos. A ideia é criar uma narrativa que “infantiliza” o candidato republicano.
A semântica das eleições é um campo de batalha onde cada palavra conta. Na era da comunicação instantânea e das redes sociais, a capacidade de capturar a atenção do público com uma palavra ou frase pode ser decisiva. A caracterização de Trump como “estranhão” pelos democratas é uma jogada calculada para dominar a narrativa e influenciar as conversas nas mídias sociais, nos debates e nas discussões cotidianas dos eleitores.
É o que faz lembrar do caso Bolsonaro. Talvez os seus opositores não tenham encontrado as palavras certas para criar uma narrativa desmoralizadora. Ou talvez a culpa seja da seriedade de políticos que ainda não perceberam uma coisa elementar: em tempos de comunicação digital, a semântica é tão importante quanto a substância. E por vezes é preciso sair das vestes vetustas. Porque em ambiente político as palavras podem moldar percepções.
É a dança da chuva.
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