Um olhar mais curto permite dizer que o golpe foi um sucesso. Afinal, o objetivo foi alcançado: derrubar Dilma Rousseff e levar os golpistas ao poder. Mas parece que não foi suficiente. Se é fácil tomar o poder, mais difícil é mantê-lo. E é aí que o sol queima o vampiro. Porque vai ficando evidente para os brasileiros, cada vez mais, que o golpe tinha o objetivo de proteger os corruptos. E não o contrário, como foi o discurso da época.
Em pouco mais de um ano, a ideia de que “não foi golpe” caiu de podre. Os “negacionistas” são cada vez mais raros e resumem-se aos amblíopes políticos. Diz a frase surrada que contra os fatos não há argumentos. E os fatos confirmam, no dia a dia, o que qualquer pessoa com dois dedos de testa já sabia e que, aliás, havia sido antecipado na frase do senador Romero Jucá: “tem que mudar o governo para estancar essa sangria”.
Os fatos vêm em catadupa. O mais recente foi protagonizado pelo operador financeiro Lúcio Funaro, que entregou Eduardo Cunha. Segundo a delação premiada, o ex-deputado teria recebido uma verba de R$ 1 milhão para comprar votos pela destituição de Dilma Rousseff. Alguém duvida? A patranha é tão evidente que que os advogados da ex-presidente já anunciaram o pedido de nulidade do processo de impeachment. Deve dar em nada, claro.
O golpe está a está a se esboroar e o atual Executivo é um bom retrato disso. O presidente está refém do próprio golpismo e dos fatos que isso acarreta: enfrenta a falta de credibilidade, é incapaz de convencer da sua legitimidade e, acossado por sérias denúncias de corrupção, tenta negociar a própria sobrevivência. Parece uma comédia, mas na realidade o país vive uma tragédia: o entreguismo tem sido uma marca destes tempos.
O Congresso Nacional, formado em sua maioria por corruptos dispostos a tudo, inclusive salvar o couro de Michel Temer, demonstra não ter escrúpulos. Mas tudo tem um preço, claro. Nem é preciso ir longe. Lembram das denúncias de corrupção no caso das propinas pagas pela JBS? Diz a imprensa que a operação “salva Temer” exigiu cerca de R$ 17 bilhões, em emendas e perdões de dívidas. Dinheiro do bolso de quem?
E por fim temos o Judiciário no fundo do poço. O poder de onde deviam emanar as garantias do estado de direito tornou-se um sorvedouro de dinheiro, um mundo à parte que flutua acima dos cidadãos comuns. O STF, por exemplo, é formado por deuses num Olimpo próprio. Não por acaso perdeu o respeito da população. E o pior: não consegue se livrar do estigma de estar superpolitizado (superpartidarizado, mesmo).
Mas há quem ainda espere pela estocada final: tirar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva do caminho das eleições em 2018. Essa seria a segunda parte do golpe: evitar Lula e acabar com o PT. E mesmo que isso viesse a acontecer, ainda assim o golpe seria um fracasso. Porque os golpistas não conseguiram se tornar alternativa para ocupar esse vazio. Foram com muita sede à jugular da nação e com isso fecharam a tampa do próprio caixão.
Enfim, o que o golpe conseguiu foi transformar o país numa imensa distopia. Pobre Brasil.