sexta-feira, 21 de julho de 2017

Robôs-sexuais serão as prostitutas do futuro

POR LEO VORTIS
POR LEO VORTIS
Quem já viu a série televisiva “Westworld” deve estar familiarizado com o tema dos robôs humanoides. A história tem lugar num futuro onde a tecnologia é capaz de produzir réplicas tão perfeitas que fica difícil saber quem é máquina e quem é humano. É um parque temático onde os robôs, chamados anfitriões, existem para servir os seres humanos. É uma terra sem lei. O visitante pode matar um robô sem que isso seja considerado crime.

Mas talvez o ponto que mais chame a atenção são as “robôs-sexuais”, que estão ali para servir os visitantes. O fato de serem sempre mulheres (o que não impede o contrário) mostra uma (cripto)sociedade que reproduz o poder do macho. Daí para a realidade é um pulinho. Porque a humanidade caminha a passos largos para a criação de androides (e ginoides) cada bez mais perfeitos. E ninguém duvida que uma das primeiras aplicações deve ser o entretenimento sexual.

Muitas das empresas que  hoje fabricam bonecas sexuais já estão a pesquisar – algumas muito avançadas – soluções tecnológicas que permitam criar modelos capazes de falar ou de se movimentar. A distância para Westworld ainda é longa, mas a indústria vai a caminho. Alguns especialistas em robótica estimam que serão necessários cerca de 50 anos até que os robôs quase humanos sejam uma realidade.

Eis um exemplo de hoje. A RealDoll Abyss Creations, uma empresa especializada no desenvolvimento de bonecas sexuais, tem “produtos” em dimensão real e com possibilidade de alguma interação. Mas a partir deste ano estão introduzindo elementos de inteligência artificial. É notável o design hipersexualizado das suas bonecas, desenvolvidas de forma a reproduzir os estereótipos da mulher destinada ao sexo.

A questão já levanta problemas éticos no mundo real. Será lícito produzir robôs para o prazer sexual dos humanos? Há quem aposte num futuro no qual “robôs-prostitutas” irão trabalhar em bordéis ou poderão ser companhia para pessoas solitárias. E há ainda quem fale em robôs usados para tratamento, em casos de violadores e pedófilos. É este último caso é o que mais levanta discussão e pede a intervenção dos estudiosos.

A questão é séria. Tanto que já existe um doutorado em Ética de Robôs e Inteligência Artificial, com uma perspectiva feminista sobre as novas tecnologias (aqui). Enfim, uma coisa é certa: são novos tempos... e exigem novas abordagens.


A empresa fabrica bonecas quem parecem mulheres verdadeiras...

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Vereador socialista Rodrigo Coelho "detona" Lula


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇOPOR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Depois da discussão sobre os galos - vai para a panela, não vai para a panela - o vereador socialista Rodrigo Coelho, do PSB, voltou a ser destaque na Câmara de Vereadores de Joinville. O vereador protagonizou o momento pelo qual o Brasil esperava: subiu à tribuna para expressar a felicidade pelo anúncio da condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E o país parou para ouvir.

Com o seu conhecido talento para a oratória e num discurso mobilizador, o vereador falou em nome próprio e do PSB de Joinville. Uma ação que faz todo o sentido, uma vez que o seu partido é feito de gente incorruptível. É uma das poucas siglas que escapa incólume ao envolvimento com a corrupção ou mesmo apoio ao cada vez mais popular Michel Temer. Não confundam: o Sport na lista da Odebrecht nada tem a ver com o seu partido.

Sem meias palavras e num tom escorreito, o vereador afirmou que o ex-presidente Lula é o “chefe de todo o esquema que foi denunciado e comprovado pela Lava Jato”. Se ainda pairava qualquer dúvida sobre a culpa, parece que agora ficou tudo muito claro. O peso da afirmação do vereador vem esclarecer os fatos e pôr uma pedra sobre a questão. Detonado por Coelho, agora o ex-presidente Lula é carta fora do baralho. É Joinville fazendo história.

A greve geral de 1917 em Joinville


POR DOMINGOS MIRANDA
"Patrões cederam, mas depois perseguiram as lideranças".

Há exatos cem anos o proletariado se uniu numa greve geral e parou, na época, a segunda maior cidade do País. A partir daí os trabalhadores passaram a ter um papel de mais destaque na sociedade. Alguns resultados, frutos desta mobilização, vieram em seguida, tais como o surgimento do Partido Comunista do Brasil (1922), a primeira lei de seguridade social (1923) e a lei das oito horas de trabalho (1943). Até hoje, toda a conquista do trabalhador se deu através de muita luta e organização.

O descontentamento da classe operária já vinha num crescente desde o início do século por conta dos baixos salários e da carestia. A erupção deste vulcão social se deu em São Paulo, em 9 de julho de 1917, quando os operários de uma fábrica têxtil entraram em greve por melhoria salarial e das condições de trabalho. Mesmo com a repressão violenta, o movimento se espalhou como fogo em palha seca e em poucos dias 70 mil trabalhadores estavam em greve geral e a capital paulista parou totalmente durante uma semana. Após intensa negociação, chegou-se a um acordo e os grevistas conquistaram reajuste salarial de 20%, sem a dispensa de qualquer participante do movimento.

A vitória teve repercussão nacional e o movimento paredista se estendeu por outras cidades de vários Estados. Em Joinville, cidade de formação educacional prussiana baseada na ordem e no respeito aos chefes, o descontentamento escapou do controle. Em 23 de julho de 1917 estouraram greves em várias fábricas pela primeira vez. Por causa da 1ª Guerra Mundial, os preços das mercadorias dispararam, provocando grande carestia e gerando descontentamento geral. O exemplo de São Paulo foi a fagulha que incendiou as mentes dos operários. Com as máquinas paradas, os empregadores foram obrigados a chegar a um acordo e se comprometeram a vender alimentos por preço de custo. A greve se encerrou no dia 1º de agosto.

Pegos desprevenidos, os empresários se mobilizaram em torno de suas associações para evitar o aparecimento de  novos conflitos trabalhistas e fizeram intensa propaganda contra “os agitadores”. No dia 4 de agosto, o jornal Gazeta do Comércio publicou manifesto dos patrões pedindo ao operariado que fechasse os ouvidos aos pregoeiros da demagogia que “outra coisa não fazem senão fomentar agitações estéreis e perniciosas ao próprio operariado”. No entanto, para os líderes dos grevistas a repressão foi mais violenta. Foram publicadas as famosas “listas negras” – onde constavam os nomes dos trabalhadores ditos  desordeiros – que foram banidos do interior das fábricas.

Passados cem anos, muita coisa mudou. Mas a razão das greves permanece a mesma, pois o patrão busca maior lucro, geralmente em cima de salários reduzidos. Isto fica evidente quando se vê a mais recente pesquisa do IBGE, com dados do cadastro da Central de Empresas, mostrando que o nível dos salários dos operários de Joinville está abaixo da média do Brasil. A greve geral de 1917 mostrou o caminho, mas a luta não pode parar.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Matamos pessoas de frio e de desigualdade hoje

POR FELIPE SILVEIRA
Na semana passada, o Profissão Repórter mostrou um pouco da realidade de pessoas que moram na rua por N motivos. A imagem de uma criança tomando banho na água fria do metrô chocou muita gente. Outras nem ligaram, mas será que ainda são gente?

A imagem de pessoas em situação de rua, sejam elas crianças, mães, pessoas que perderam tudo ou outras em situação de drogadição não é novidade para quem se chocou vendo pela TV. Quem sempre se preocupou com os direitos básicos das pessoas sabe a dimensão do problema, os fatores causadores e o quanto estar na rua amplia os problemas dessa população que fica mais sujeita à violência, à falta de saúde, de educação…

E um comentário resume bem a contradição quando a questão é moradia: “Tanta gente sem casa, tanta casa sem gente”.

A quantidade de casas vazias poderia abrigar tranquilamente as famílias e pessoas que estão nas ruas, mas “nós” não queremos isso. Queremos a manutenção de um sistema que jogue gente na rua, sem importar se as crianças vão passar fome, tomar banho gelado e ficar doente. Ou se os mais velhos vão morrer de frio nas calçadas.

Hoje fez frio e muita gente ficou preocupada com gente na rua. Talvez até tenha doado algum cobertor, levado comida para alguém. É uma atitude louvável. Mas não é o que resolve o problema. Temos que resolver é este sistema que deixa pessoas sem casa e deixa as casas vazias.

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Joinville é uma cidade governada pelo achismo



POR JORDI CASTAN

Alguém realmente acredita que quando foi alterada a circulação frente ao Mercado Público, os decisores sabiam o que faziam? Ou que, quando da aprovação da LOT, alguém apresentou os estudos técnicos que avalizem as decisões tomadas pelos técnicos do extinto IPPUJ, da Câmara de Vereadores e dos próprios vereadores? Ou do aumento escandaloso da COSIP?


Os prazos de execução das obras públicas, os custos dos projetos ou a falta de relação entre o projetado e os resultados alcançados são exemplos de ignorância supina. E fica a pergunta: por que Joinville não levanta cabeça?

Com certeza há muitas razões para que Joinville esteja no atoleiro em que está metida. Uns dizem que a cidade anda em círculos. Outros que anda para trás, como os caranguejos. A verdade é que a cidade não sobrevive à comparação com cidades próximas em muitos quesitos, como segurança, mobilidade, qualidade de vida, saúde ou qualquer outro que utilizemos.

Assumo o risco de ser simplista demais, de reduzir o debate a um único critério. Mas mesmo assim vou propor uma análise sobre o processo de decisão municipal. É importante esclarecer que este processo de decisão e de tomada de decisão não é novo. Vem sendo praticado faz décadas e o resultado é que sem estudos, sem informações precisas e sem conhecimento adequado, as decisões tomadas pelos gestores municipais são puro achismo. 

O resultado não é o previsto, porque Joinville está cada dia pior. Um gestor precisa tomar decisões a cada dia. E, grosso modo, podemos dizer que há três processos que envolvem a forma de decidir. 

1. Há decisões das que sabemos os resultados. Esse é o jeito melhor e mais simples de tomar decisões. Se solto a bola que tenho na mão ela cairá no chão, não tem erro. O resultado da decisão é conhecido e não é preciso ser um Isaac Newton para saber.

2. Há aquelas em que os resultados são desconhecidos, mas as probabilidades são conhecidas. Em esse caso há um risco inerente à decisão que estamos tomando. É como entrar num casino e apostar, pois sabemos quanto estamos apostando e quais as probabilidades. Não há surpresas e não há resultados que possam ser alterados por uma terceira pessoa.


3. Finalmente há aquelas em que os resultados são desconhecidos, assim como as probabilidades. Isso é incerteza. É não saber o que vai acontecer como resultado das decisões que acabamos de tomar. É essa incerteza a que tem pautado as decisões tomadas em Joinville e que estão  transformando a cidade no que é hoje.

Os gestores acreditam que tomam suas decisões baseados no segundo modelo. Mas o fato é que estão prisioneiros do terceiro modelo, o da incerteza. Porque acham que estão tomando as decisões a partir do conhecimento as probabilidades, mas na verdade não as conhecem. Porque as ignoram, não têm a menor ideia de qual será o resultado e tampouco das probabilidades envolvidas.

Joinville poderia até se desenvolver se as decisões fossem tomadas a partir do risco, se houvesse um coeficiente de risco e os nossos gestores e os técnicos que os subsidiam e os abastecem com informações corressem riscos, riscos calculados, riscos conhecidos, riscos que a cidade pudesse correr.


Mas Joinville está gerenciada desde a ignorância, desde o desconhecimento, desde o mais puro achismo.  A cidade segue à deriva comandada por uma tripulação sem bússola, sem cartas náuticas e por comandantes que insistem teimosamente em sinalizar o rumo da barca sem conhecimento e guiados pela pertinaz ignorância. Por isso Sêneca esta mais atual que nunca: “Não há bons ventos para quem não sabe aonde vai”.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Lula: ser solidário é estar contra a perseguição política


POR MARIA ELISA MAXIMO
Contra as reformas, contra a retirada de direitos e contra a condenação do Lula. Sim, uma coisa não exclui a outra e precisamos ocupar todos os espaços, na rua e por aqui.

Sem me arvorar em uma análise política profunda (que nem tenho propriedade para fazer), apenas partilho minhas singelas percepções: o repúdio à condenação do Lula não significa, neste momento, estar cego aos seu erros e à sua eventual parcela de responsabilidade no cenário que se apresenta.

Definitivamente, ele não está sendo condenado pelos seus erros enquanto presidente. Quem foi condenado ontem foi o líder político, metalúrgico, representante dos pobres, que curiosamente ainda representa uma ameaça aos interesses de uma elite política e econômica.

Por isso, o repúdio à condenação de Lula é análogo à defesa da democracia. Não se trata de "ter políticos de estimação". Aliás, que expressão mais tola e infantil, que só poderia vir de setores da direita bestializada que têm se esforçado para banalizar a política.

Estar solidária ao Lula é, agora, estar contra a perseguição política que criminaliza a esquerda e só a esquerda. É estar em defesa dos seus acertos, do pouco de justiça social alcançada e que está sendo aniquilada de forma galopante. Estar solidária ao Lula é, ao mesmo tempo, repudiar a mesma dinâmica persecutória que se concretiza nas escolas, dia a dia, pelas mãos da Escola sem Partido. Estar solidária ao Lula é estar em defesa de todos os presos políticos e de todas as vítimas da violência policial que escolhe seus alvos pela cor da pele, pelas palavras de ordem, pela cor da camisa e das bandeiras.

Do outro lado, a "selfie" com policiais, outrora viralizadas pelos manifestantes de final de semana, vestidos de verde e amarelo, equivale ao aceno camarada aos Aécios que não saem de onde estão independentemente do tamanho da mala de dinheiro, das delações, das provas.

Portanto, sair às ruas em defesa do Lula é arregimentar a pouca energia que nos resta na esperança de uma saída para 2018, contra uma "justiça" parcial e seletiva que, sem rodeios, não age "no combate à corrupção". Não é possível que alguém ainda acredite que seja isso...

Fora.


quinta-feira, 13 de julho de 2017

Lula foi pro paredão


POR CLÓVIS GRUNER
Eu tenho dúvidas quanto à inocência de Lula, mas tampouco estou certo sobre qual a extensão de sua culpa. Sérgio Moro, obviamente, não compartilha minhas relutâncias: sua sentença, proferida na quarta-feira (12), é um calhamaço de 238 páginas de muitas certezas. Nela, o juiz curitibano condena o ex-presidente a nove anos e seis meses de reclusão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Como era esperado, a publicação da sentença causou furor nas mídias e redes. No segundo caso, entre os eleitores e simpatizantes de Lula, viu-se um misto de indignação e surpresa. Consigo entender a primeira reação. Se eu, que não estou convencido da plena inocência de Lula, sempre achei uma excrescência o processo movido contra ele por Moro, é ainda mais fácil entende-la vindo de quem parece disposto a queimar mais que as duas mãos por ele.

Agora, surpresa? Alguém mesmo achava que seria diferente? Desde que o processo começou, Moro torrou milhões de recursos públicos em uma espécie de reality show jurídico; foi alçado à condição de novo herói e salvador da pátria; viu seu rosto estampado em capas de periódicos e adesivos nas traseiros de veículos; atropelou garantias legais e se comportou como um inquisidor; agiu de maneira truculenta quando lhe interessou, e xavecou sorridente no ouvido de amigos quando a ocasião lhe agradava. 

Enfim, alguém achava que Sérgio Moro faria algo diferente do que fez? Não porque ele foi “treinado pela CIA”, essa bobagem que vem sendo repetida à exaustão por parte da militância petista. Mas porque essa era a única opção que lhe cabia, a única possível. O próprio Moro parece ter clareza disso, e assume em vários momentos da sentença um viés que procura reafirmar seu caráter eminentemente jurídico, sem contaminação política. 

Logo no começo, por exemplo, ele se defende das acusações de abuso de poder e de estar à frente de uma “guerra jurídica” contra o ex-presidente: “Em síntese e tratando a questão de maneira muito objetiva, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está sendo julgado por sua opinião política e também não se encontra em avaliação as políticas por ele adotadas durante o período de seu Governo. (...) Não tem qualquer relevância suas eventuais pretensões futuras de participar de novas eleições ou assumir cargos públicos”.

Há outras passagens semelhantes, e uma das mais significativas é o exercício teleológico de Moro na tentativa de justificar, a posteriori, a condução coercitiva de Lula em março do ano passado, afirmando que ela serviu para impedir eventos que poderiam ter acontecido, mas que não ocorreram graças à medida. Um pouco confuso? Eu sei, mas desconfio que seja exatamente essa a intenção. Mas por detrás da tagarelice jurídica, há uma intenção bastante clara: Moro investe boa parte da sentença na tentativa de “despolitizá-la”.

DESDOBRAMENTOS POLÍTICOS – Ocorre que um jurista supostamente bem formado e informado como Moro deveria saber que, em Direito, não existem decisões puramente “técnicas”, o que é dizer: não existem decisões que não sejam também políticas. E não menos importante: se ela é principalmente técnica e não tem motivação política, não seria preciso dizê-lo. É uma armadilha semântica antiga, e ao cair nela Moro só confirma aquilo que, supostamente, nega.

E se a decisão é também, ou principalmente, política, não há porque escapar de fazer dela uma avaliação que leve em conta seus desdobramentos... políticos. E, de imediato, duas questões se colocam, nenhuma de fácil resposta. A primeira, e mais óbvia: afinal, a culpa de Lula está provada “sem dúvida razoável”, para usar o jargão das séries americanas de tribunal? Não. Mas a sentença tampouco prova o contrário.

Explico melhor. Em uma leitura desapaixonada – o que a essas alturas, reconheço, é muito difícil – é difícil encontrar nela evidências suficientes para sustentar a condenação. Moro chega a afirmar, com base em entrevistas de Lula, que este foi conivente com o “comportamento criminoso dos subordinados” após o Mensalão (você não leu errado), e que a ausência de uma postura condenatória mais explícita “pode ser considerado como elemento de prova” no julgamento que ele, Moro, conduz.  

Há, além disso, um uso flagrantemente desigual dos depoimentos da acusação e da defesa, e afirmações sustentadas quase que exclusivamente nos depoimentos orais das testemunhas. A impressão, ao final da leitura, é que Lula já estava condenado, pouco importa o que o processo trouxe de evidências. Um pouco como aquele pesquisador que vai a campo munido de hipóteses mais do que de problemas, Moro já sabia de antemão qual o resultado final do julgamento e o processo apenas lhe forneceu os argumentos de que precisava para a condenação.

Mas se não há evidências suficientes de culpa, isso tampouco significa que o Lula que surge da sentença seja de todo insonte. Se já era difícil sustentar a sua inocência antes, tantas são as vezes que seu nome aparece mencionado em processos e delações, a leitura das duas centenas de páginas dificulta ainda mais proclamá-la com a convicção característica de seus defensores. E exatamente pelos mesmos motivos já expostos.

Explico de novo: a sentença é inconclusiva, apesar das convicções de Moro. E há nela evidências suficientes para colocar muitas pulgas atrás da orelha a respeito das relações no mínimo suspeitas de Lula com executivos e outros dirigentes da OAS, e dessa com a cúpula dirigente do Partido dos Trabalhadores. Se não há provas materiais suficientes para condenar Lula juridicamente, há evidências inquietantes que colocam em dúvida sua postura ética e do PT à frente do governo. 

A ELEIÇÃO ESTÁ LOGO ALI – A segunda questão: e como a sentença afeta o cenário político a curto e médio prazo? Para a tristeza de muito marmanjo, a condenação em primeira instância não envia Lula para a prisão, porque ele pode recorrer da sentença em liberdade. Além disso, ela tampouco tira Lula da corrida presidencial de 2018, que ele lidera com relativa folga em todas as pesquisas até aqui. Como a condenação se deu na primeira instância, a decisão não basta para barrar as pretensões eleitorais de Lula.

É que a Lei da Ficha Limpa incide apenas sobre candidatos condenados a partir da segunda instância – no caso do ex-presidente e virtual candidato, a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que tem poucas chances de julgar o caso antes de iniciada a campanha eleitoral. E mesmo que a sentença seja confirmada, o tribunal não pode afastá-lo da disputa eleitoral se sua candidatura já tiver sido admitida pelo TSE.

Isso embaralha tudo e, claro, torna qualquer prognóstico para o próximo ano no mínimo bastante arriscado. Mas a condenação pela Vara de Curitiba, no fim das contas, serve tanto aos interesses políticos petistas como de seus opositores, que por enquanto estão no governo – na verdade, alguns já estavam nele antes, com o PT. Eles não precisarão ver Lula preso para usar a decisão de Moro contra ele e o partido – aliás, já estão a fazer isso. 

Claro, não há garantias que isso lhe tire as intenções de voto. Mas em se tratando de partidos, principalmente PMDB e PSDB, também envolvidos em esquemas de corrupção, com alguns de seus principais nomes praticamente inviabilizados eleitoralmente – como é o caso de Aécio Neves – e cujo único projeto imediato é escapar da cadeia, a simples condenação pode ser suficiente para desviar o foco de parte do eleitorado de seus próprios crimes. Mero diversionismo, mas pode dar certo por um tempo. 

Para o PT, arrastar a situação também tem suas vantagens, porque sua situação não é muito diferente. Como seus adversários, o partido não tem, hoje, um programa e um projeto para o país, investindo o que lhe resta de energia na tentativa de garantir a candidatura e a eleição de Lula. 

A condenação pode servir, aos petistas, para inflar ainda mais a imagem de um Lula martirizado por uma “justiça burguesa” que, mancomunada com interesses nacionais e internacionais escusos, pretende levá-lo à cadeia. Nessa narrativa, sua prisão seria o desenlace do golpe iniciado com o impeachment de Dilma Rousseff. Também há algo de diversionismo nisso. Mas também pode dar certo por um tempo.

O empresariamento urbano matou o IPPUJ


 POR CHARLES HENRIQUE VOOS
Há algum tempo, quando Udo iniciou o seu primeiro mandato, apareceu a vontade do executivo municipal em extinguir as fundações municipais. Alegou-se, desde então, a pouca efetividade destes órgãos e que supostamente dariam "prejuízo" para os cofres públicos (mesmo que a função do Estado seja, realmente, gastar com políticas públicas). Assim, as extinções se sucederam rapidamente por meio de várias reformas administrativas: Instituto de Trânsito, Fundação de Esportes, Fundação Cultural, Promotur, até chegar no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Joinville, o IPPUJ.

Apesar de ter copiado as estruturas curitibanas de planejamento urbano (por lá existe o IPPUC), a cidade de Joinville deu um grande passo, no início dos anos 1990, ao criar um setor específico na Prefeitura para se pensar a cidade e sua política de desenvolvimento urbano.

Desde o governo Luiz Gomes, criador da pasta, vários projetos importantes passaram pela colaboração técnica do IPPUJ: lei de uso e ocupação do solo de 1996, reformulação do transporte coletivo (completado no começo dos anos 2000), Plano Diretor de 2008, Macrozoneamento, Plano de Mobilidade, LOT e tantos outros que não cabem citar agora, assim como a discussão do mérito dos lembrados. Ocorre que, com a criação do Estatuto da Cidade em 2001, estimava-se a ampliação da influência do IPPUJ nas decisões públicas, o que não ocorreu.

Pelo contrário, o instituto foi se apequenando, por diversos motivos, que vão desde o seu desvio de função (grande parte dos setores era dedicado aos projetos de reformas de prédios públicos e de otimização dos layouts dos espaços), passando pela baixa renovação do corpo técnico (o que fez sumir a ousadia necessária ao se pensar uma cidade e gerou uma baixa adaptabilidade dos seus funcionários às novas concepções urbanísticas contemporâneas, como cidade para pessoas, gestão democrática das cidades etc.), e chegando até o domínio absoluto do empresariamento urbano, conforme visto nos últimos anos.

Empresariamento urbano é um conceito que surgiu ao final dos anos 1970 pelo geógrafo britânico David Harvey para explicar como as ideias empresariais tomaram também o planejamento das cidades. Tanto que o termo "gestão urbana" começa a aflorar no mesmo período sob a aurora do neoliberalismo. Anos mais tarde, a primeira expressão global do empresariamento urbano acontecerá em Barcelona, graças aos jogos olímpicos de 1992.

Com o boom imobiliário que o Brasil sofreu do início do segundo governo Lula até as crises da Lava Jato e companhia, o cenário era perfeito para tornar as cidades o palco da expansão imobiliária. Não importava se planos e leis deixavam de ser seguidos, o importante era interligar o crescimento econômico ao uso do espaço, dando ao planejamento uma roupagem empresarial e conectada aos megaprojetos, megaeventos, multinacionais e afins. O projeto global do Berrini, em São Paulo, a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 foram expressões vivas de como o planejamento das cidades brasileiras ganhou a alma de empresa.

Ou seja, a parte política do processo, de discussão, debates com a comunidade, e todo aquele processo lento de construção social ficou engavetado, culminando em poucas iniciativas sólidas que ocorreram sob a égide do Estatuto das Cidades. Aqui em Joinville esse processo foi evidenciado a partir da LOT, já que o empresariado local levou uma enorme derrota na confecção do Plano Diretor de 2008. O empresariamento urbano ditou boa parte das regras a partir do governo Merss, sendo explicitado à milionésima potência a partir de Dohler, quando este leva as vontades da ACIJ para dentro da Prefeitura¹. Álvaro Cauduro foi eleito presidente do Conselho da Cidade com apoio maciço dos representantes do executivo municipal.

Para sacramentar os fatos, após alguns gestando as mudanças, o IPPUJ foi extinto e se fundiu com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, surgindo a famigerada Secretaria de Planejamento Urbano e Desenvolvimento Sustentável. Capitaneada por um ex-dirigente da ACIJ, a nova pasta tem a audácia de confundir o seu propósito, quando lança mão do conceito de Smart Cities (segundo a visão da gestão, seria uma nova forma de alavancar os negócios, ao invés de utilizar a tecnologia para melhorar a vida das pessoas, como a noção original prega), quando vai à imprensa para falar coisas relativas aos anseios dos empresários ou quando é submissa às vontades empresariais para alterações da novíssima LOT, criando um fazejamento administrativo em prol da especulação imobiliária e da flexibilização urbana, no mais puro tom maquiavélico da coisa.

Deve-se lembrar que o IPPUJ foi criado com o intuito maior de melhorar a vida das pessoas na cidade, mas agora há um espaço para potencializar os negócios na cidade. E isto é, sem sombra de dúvidas, uma grave inversão da visão sobre quem constrói Joinville e para quem ela é,  sem qualquer espaço para o contraditório, considerando que a sua morte foi silenciosa e ninguém chorou a sua perda, sobretudo aqueles que deveriam mas estão intimamente atrelados aos donos da cidade.

Ruim com IPPUJ, desastroso sem ele.
 
¹ https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/158257