POR LIZANDRA CARPES
Há quase dois anos, instituições de defesa
de direitos, movimentos sociais e igrejas se reuniram em Joinville para formar
uma Frente de Apoio aos imigrantes trabalhadores e trabalhadoras. São realizadas desde então reuniões mensais e foi proposta uma Audiência Pública, que aconteceu em agosto do ano passado
(06/08/2015). Protocolamos abaixo assinado no gabinete do atual prefeito com
mais de 2000 assinaturas, solicitando melhor atendimento aos migrantes. A partir
da audiência pública foi criada uma comissão de discussão da temática que
envolvia o poder público e a sociedade civil. No entanto, pouco avançamos no
atendimento a estas pessoas.
Trabalho, educação/idioma e um uma casa de
passagem são as principais
reivindicações desta população. Em Joinville não temos um espaço que sirva de
referência para a população de rua e para a população migrante. Os espaços
públicos não estão preparados para atender esta demanda. E quem chega à cidade
cai na estatística da vulnerabilidade social e da violência cometida por um
município que não tem políticas públicas referente a esta temática. Os
imigrantes têm os mesmos direitos que qualquer cidadão nato no Brasil e merece
nosso respeito e acolhida digna, uma vez que vem contribuir com sua cultura e
seu trabalho.
O mundo é dividido em fronteiras que cercam
territórios. São as linhas imaginárias, ou não, traçadas geograficamente e que
definem o que tem direito de ir e vir no mundo inteiro. No entanto, estes
traços ocupam marcas muito mais profundas na história, seja de uma localidade,
ou de vidas. As fronteiras dentro do sistema capitalista globalizado são mais
importantes que as vidas que vem e vão e muito mais que isto, estabelecem
instâncias de poder. De acordo com o filósofo esloveno Slavoj Zizëk, as
mercadorias e o dinheiro têm trânsito livre no mundo, o ser humano não.
Como não associar as fronteiras aos muros
das casas? E muito mais do que isso, como não associar as fronteiras
geográficas com aquelas que são traçadas no coração? As ideologias, as crenças
religiosas, os preconceitos, a ignorância: tudo isso de alguma forma, cria uma
fronteira. O racismo, a xenofobia, a intolerância religiosa, são fronteiras em
forma de muralhas que separam e aniquilam vidas.
As fronteiras do mundo estão marcadas com a
história de Aylan Kurdi, o menino de três anos, sírio, que foi encontrado morto
à beira do mar quando ele e a família tentavam fazer a travessia de barco entre
a Turquia e a Grécia. O sangue derramado por conta das fronteiras é de todas
aquelas milhares de pessoas que passam meses à deriva no mar,
aguardando compaixão de algum governo para atracarem em porto seguro com suas
famílias. Ailan Kurdi simboliza muitas vidas, muitas mortes e também muitas
fronteiras. A comoção com a imagem do menino congelada, da incapacidade humana
de compaixão não se estende aos milhares de migrantes que ainda estão sofrendo
violações de direitos.
Os limites das fronteiras são proteger o
território, custe o que custar, mesmo que o custo sejam vidas e os traços
destas linhas cruéis foram feitos pela humanidade. No entanto, a história pede
uma nova construção e se o migrante for recebido como ser humano e não como
mero estrangeiro. Quem sabe, assim é possível mudar o rumo de outras histórias.
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O caso do pequeno Aylan ainda está na memória das pessoas |